Aih hoje to eu escrevendo

Aih hoje to eu escrevendo emails pros portugueses tentando vender cartucho vazio, quando me estaciona um Passat na frente do escritorio. Era um fiscal do trabalho, que vinha saber se a nova estagiaria tah toda regularizada direitinho (nao vou escrever o nome dela aqui porque ela usa CALçA JEANS DOURADA, BOTA DE SALTO AGULHA E SOMBRA CINTILANTE PRA TRABALHAR, entao voces ainda vao ouvir falar muito dela aqui, e como a Martinha volta e meia abre o blog pra ver fotos e pra tentar aprender Portugues, é melhor nao dar bandeira. Nao pela Marta, que nao suporta ela, mas porque vai que a garota tah do lado e ve o nome escrito, sabe como é…). O Chefe Idiota (que daqui pra frente serah chamado carinhosamente de CMI, ou Chefe Meio Idiota – ele deu boa prova de sua somente meio idiotice depois daquela chuva de elogios ao meu trabalho, hehehehe, e nas aulas de Ingles, embora pronuncie Hai eite em vez de I Hate, pega tudo muito rapido) entra na sala e me diz:
– E agora voce vai ali dar um passeio no jardim…

Lah fui eu, saindo por uma porta enquanto o fiscal entrava por outra. Como semi-clandestina, corro de fiscais feito o diabo da cruz. Subi as escadas, indo bater papo com a micro-mulher da Sardenha (ela tem 1,20 m) que faz os cartuchos jato de tinta, o romeno que estah na mesma situaçao que eu (esperando os documentos), e o ucraniano velho que estah hospedado na casa do CMI pra aprender a fazer cartucho, porque depois o CMI vai passar a explorar mao-de-obra barata na Ucrania. Daqui a pouco ouço vozes lah embaixo: CMI e o fiscal subindo. Caraca! A micro-mulher me deu a dica: vai pro sotao… Lah fui eu pro sotao, subindo as escadas na ponta dos pés. Me abaixo pra passar pelo vao, vejo no chao velhas louças de banheiro, vara de pescar, botas de borracha, espingardas (caçar ainda é uma coisa frequente na Italia, infelizmente). Ouço os dois entrando na sala dos cartuchos – escapei na hora. Dali a pouco vem a mae do CMI, Annunziata, me chamando aos sussurros: Letì! Letì! Descemos pra cozinha da casa. Se o cara entrasse e perguntasse de mim, eu diria que era amiga da Annunziata (amigas de escola, eu sugeri. Ela caiu na risada). Ela toda atarefada fazendo café, ligando a tv, me dando uns jornais pra ler, pra ficar com cara de “estou à vontade aqui porque estou na casa da minha amiga, minha bolsa estah no escritorio porque vim checar email, que na casa dos meus patroes (sou doméstica) nao tem”.

Que horror! Soh quando o cara foi embora é que conseguimos respirar de novo.

Essa vida de extra-comunitaria é uma merda mermo.

Agora tchau que tenho traduçao pra fazer.

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Dah pra perceber quando tenho traduçao pra fazer: fico enrolando, escrevendo, fazendo faxina, brincando de me maquiar, em vez de sentar a bunda e trabalhar. Mas agora eu juro que vou. To soh esperando a Aretha Franklin terminar de cantar Rescue Me.