A coisa mais chata do mundo não é aula de matemática. A coisa mais chata do mundo não é filme da Xuxa, nem irmão que acende a luz do quarto enquanto você está dormindo, nem coceira na sola do pé, nem música sérvia. Dividindo o primeiro lugar da lista pacamanquiana de coisas mais chatas do mundo, juntamente com os Brasileiros Chatinhos que Moram na Alemanha e Se Acham OOOOS Alemães estão o frio e a neve.
Ao contrário da Luciana, desde a primeira vez que eu vi neve, já odiei. É bonitinho na hora, mas logo depois as ruas ficam imundas e a neve vira uma coisa cinzenta asquerosa. Fora que toda a complicação que a neve e o frio causam na sua vida já são suficientes, pelo menos pra mim, pra achá-la horrorosa, mesmo antes de virar a coisa cinzenta asquerosa.
Uma vez comentei com o Duduzão que a diferença entre o calorão e o frião é que o calorão te irrita, mas o frião, além de irritar, dói, e muda a sua vida. Pular umas ondinhas, jogar um balde de água na cabeça são suficientes pra aliviar o calor, pelo menos momentaneamente. Mas o frio não se alivia, meus queridos. Estando fora de casa não há modo de escapar, não importa o quanto você esteja bem coberto. Se estiver ventando, então, sai de baixo.
O ar frio corta o seu rosto, deixa a sua pele descascando e os lábios sangrando. Os olhos lacrimejam e o nariz escorre sem parar. As vias aéreas DOEM quando você respira. Suas extremidades (leia-se nariz, orelhas, mãos e pés) doem enquanto estão congeladas e principalmente durante o descongelamento. Uma vez fiz a burrice de entrar em casa num dia muito frio e entrar direto no banho mais ou menos quente. Putz grila, olhei pros meus pobres pezinhos e parecia que eu podia ver todos os capilares enlouquecento, dilatando feito doidos, comprimindo os tecidos adjacentes; a dor, a dor alucinante!!! E as orelhas, quando saem do ambiente gelado pra um ambiente requentado? Difícil conter a vontade de segurá-las, porque a sensação é a de que vão cair a qualquer momento.
O frio congela as portas do carro, que ficam difíceis de abrir. Se tiver chovido algumas horas antes, as ruas e estradas congeladas, ou mesmo nevadas, tornam o já pouco simples ato de dirigir (vocês já pararam pra pensar na complicação cerebral-motora que é dirigir? Né coisa fácil não, quéridos!) uma coisa de maluco. Outro dia fomos de carro até o Subasio. Com a Fiat Punto chegamos várias vezes a subir até o alto mesmo, e depois descer pelo outro lado, até Spello um lindíssimo passeio, diga-se de passagem, com ou sem neve. Mas dessa vez, com a Volvo, que é muito mais pesada, depois de um certo ponto não conseguíamos mais nos mover. As rodas giravam em falso e o carro saiu completamente de controle. Mirco é bom de roda, mas na ladeira congelada não tem piloto que tire a coisa de letra. Levamos séculos pra conseguir virar o carro e descer, e ficamos bem uns 5 minutos atravessados na estrada porque o carro simplesmente quis ficar naquela posição.
No frio cavalar mesmo, até a gasolina congela. Na Sérvia, no caminho de Majilovac ao aeroporto, vimos dois caminhões parados porque o diesel havia congelado. E o freio de mão? Perdi a mania de puxar o freio de mão quando estaciono o carro, agora deixo o bichinho engrenado porque senão na manhã seguinte ele se recusa a sair do lugar.
E as roupas? E a chatura de carregar sempre dúzias de apetrechos a mais pendurados sobre o seu corpo? E o saco que é ter que tirar luvas, chapéu/gorro, cachecol, casaco, malha de lã, toda vez que se entra em um lugar aquecido? E o outro saco que é ter que botar tudo isso de novo quando se sai do lugar aquecido? E os cabelos, que não secam nem com reza forte? (lembrem-se que cabelo ruim e secador são coisas incompatíveis). Eu saio na rua de cabelo molhado mesmo, não tô nem aí. No máximo taco minha boina cinza por cima, mas normalmente não uso nada. Os italianos ficam todos escandalizados achando que eu vou pegar pneumonia.
(E aqui faço um adendo de caráter estritamente pessoal: chapéu é que nem pé, não existe UM bonito sequer).
E as mãos descascando, por mais creme Neutrogena formulado para pescadores noruegueses que eu passe? E a dor nas articulações dos pés, que começa com uma coceirinha básica e depois vira um joanete vermelho?
E a impossibilidade de andar a pé na rua por causa do vento gelado? Essa é a pior. Eu adoro dirigir, mas como toda boa carioca sou acostumada a andar a pé pra lá e pra cá, subindo e descendo a Visconde de Pirajá pra ver as modas, parando pra comprar banana no cara que vende fruta na esquina, ou pra tomar um suco de fruta, ou um milkshake de Ovomaltine no Bobs de Ipanema vendo os pivetinhos encherem o saco dos outros na calçada; correr na Lagoa todo dia, mesmo no inverno; poder parar pra conversar com alguém que encontrei na rua sem ter que fugir pra algum lugar fechado por causa do frio. Essa prisão automobilística é horrível, horrível.