Pois então, fim de semana passado rolaram as famigeradas eleições pro Parlamento Europeu. Como todo mundo já tá careca de saber, não existe uma “consciência européia”. Cada um quer resolver os problemas do seu próprio país coisa muito normal, aliás, principalmente quando pensamos que a Comunidade Européia é formada por gente muito, mas muito diferente, em todos os sentidos. Difícil chegar a um denominador comum. E basta dizer que quase ninguém foi votar. Em países como a Polônia e as nações Bálticas, que acabaram de entrar na CE, só uns 20% do povo foi às urnas.
Mas aí. Como tudo aqui na Itália, o sistema eleitoral deles também é muito confuso. As eleições pro Parlamento Europeu coincidiram com eleições locais em algumas cidades e regiões (tipo a Sardegna, que tem um regulamento diferente em relação ao resto do país por ser desavantajada, em muitos sentidos. Essa palavra desavantajada existe? Estou confundindo tudo com o italiano.). Em Bastia teve eleição pra sindaco (prefeito), mas em outras localidades não. Não entendi o padrão, se é que existe; não tenho a menor idéia de por que uns votam agora e outros não. Só sei que o voto ainda é no esqueminha ridículo de marcar xizinho na cédula de papel (que, aliás, é colorido, dependendo da região).
A Umbria é considerada uma região “vermelha”, e esse ano a surpresa ficou por conta de várias cidades tradicionalmente mais moderadas mas que dessa vez votaram em massa nos partidos de esquerda, acompanhando a tendência regional. Honestamente política não é um assunto que me interessa, ainda mais aqui, num país governado por um homem ridículo, baixinho, que fala tudo errado (lembram da história do Romulo e Remulo? Socorro!) e que comanda TODOS os canais de TV. Como eu digo sempre, a Itália é um país divertido, porque é um verdadeiro teatro do absurdo, e nada mais me surpreende aqui. Acompanhei muito pouco a propaganda eleitoral, que aqui felizmente não interrompe a programação normal e se limita a entrevistas e debates, sempre divertidíssimos, com gente falando tudo ao mesmo tempo, gesticulando, com jugulares pulando. Uma vez, depois do jantar, deixamos a TV num canal onde estavam rolando entrevistas com candidatos. Aparece um senhor grisalho de oclinhos e jeito enfezado abanando o fura-bolo no ar: era o Advogado Esqueci o Sobrenome Dele (aqui se usa muito o título de estudo da criatura, ao dirigir-se a ela, principalmente se for Avvocato ou Ingegnere), da Lista Consumatori, ou Partido dos Consumidores. Naquela enfezação toda e sempre usando linguagem muito coloquial, falou mal de tudo e todos, e reclamou de todas as coisas que também nos irritam aqui, sendo que o exemplo que eu lembro agora é o do raio do canone, ou assinatura, da TV. O que ele disse foi o que eu sempre pensei: se a qualidade dos programas da RAI chegasse pelo menos no dedão do pé dos da BBC, e se não houvesse propaganda, tenho certeza que ninguém reclamaria de pagar o canone que custa a bagatela de quase 100 euros por ano. Mas pagar pra ver porcaria, intercalada com intervalos comerciais de até 5 minutos, é coisa de doido! Mas a parte mais engraçada foi quando ele tirou do bolso uma caixinha de jóias, daquelas clássicas de anel de noivado. “Fui à joalheria… comprar umas cerejas!” Ele abre a caixinha e estão lá duas cerejas de verdade. Demos tanta risada que ficamos sem ar. É que as cerejas esse ano custam os olhos da cara, chegando até a 14 /kg, porque choveu muito, o frio se prolongou demais, caiu geada, e a cereja é uma fruta muito da fresca que se esburaca por qualquer coisinha. A produção caiu pra burro, em algumas regiões em até 70%, e a bichinha ficou cara mesmo, com preço de jóia. Mas que a cena foi engraçada, foi.
Sei que o Berlusconi ficou com cara de tacho porque a sua nojentíssima extrema-direita perdeu o trono em muitas localidades. Tenho escutado muito rádio, a estação da RAI, que transmite notícias, entrevistas, etc, e nada de música italiana horrorosa. Fala-se de tudo, de economia à guerra no Iraque, de problemas de saúde com médicos especialistas ao vivo no ar a erros de gramática ou conteúdo encontrados em livros, jornais, cartazes, placas estradais, etc. Aprendo horrores e ainda por cima me divirto porque o pessoal liga de casa pra dar o seu pitaco e a quantidade de imbecilidades disparada por minuto é impressionante. Mas tem-se falado muito dessas eleições e da situação da Europa como um todo e, claro, muito sobre a economia italiana. Muita gente contradizendo no ar o seu Berlusca, que de vez em quando dá o ar da graça e vai pro ar pra falar as suas besteiras mentirosas. Outro dia peguei o Berlusconi dizendo que iria baixar os impostos (é a mais nova promessa ridícula da direita) AINDA MAIS do que já tiham baixado. Liga um senhor e começa, ma Signor Presidente del Consiglio, MAS ONDE FOI QUE BAIXARAM ESSES IMPOSTOS, que eu não vi? Eu pago sempre mais impostos, todo ano! Se o senhor quiser lhe mostro a minha papelada! Nunca paguei taxas tão altas na minha vida, e as pensões nunca foram tão baixas!
Infelizmente tive que desligar e sair do carro bem na hora mais emocionante da discussão, porque tava atrasada pro trabalho.
Os cubanos (…) é que têm razão: homem que trabalha perde tempo precioso. Trabalhar só atrapalha a vida da gente.