Louvre

Hoje é o aniversário da minha avó.

Saímos uma meia hora mais cedo do albergue e fomos diretamente ao Louvre. Nem vou falar nada porque realmente não há o que dizer. Rodamos muito, entramos na muvuca pra ver a Mona Lisa, e mais tarde saímos do museu pra catar um lugar pra almoçar. Fomos cair num lugarzinho chamado Le Pelican. Eu tava com vontade de comer crêpe salgado ou então uma quiche de qualquer coisa, e no quadro-negro com os pratos do dia e especialidades da casa havia boas opções tanto de quiche quanto de crêpe, e sentamos, apesar de não parecer lá muito limpinho. Só uma senhora loura e sorridente, enfiada numa jaquetinha cinturada completamente fora de moda, com mangas bufantes, atendia. Botava a mesa, tirava a mesa, pegava os pedidos, trazia os pedidos, fazia a conta, pegava o dinheiro, dava o troco. Sem perder a classe, jamé. Só que nessa lerdeza levamos horas pra comer – e no final das contas não tinha nem a crêpe que eu queria, nem a quiche pela qual eu tinha me interessado, e acabei comendo outra coisa. Mirco foi de omelete mesmo, que é mais seguro.

Uma coisa legal de Paris, e, dizem, da França em geral, é que ninguém fica te enchendo ou fuzilando com o olhar ou dando indiretas pra você sair do restaurante. Se você não pedir a conta, ninguém te traz. Ninguém te expulsa. Você tem toda a calma do mundo pra comer e bater papo. Estranhamente, na Itália não é assim. Digo estranhamente porque o culto à comida aqui é quase uma religião, a cozinha é uma coisa levada muito, muito a sério, e o italiano adora papear, então realmente não entendo por que qualquer refeição em qualquer restaurante aqui dura pouquíssimo. Os pratos vêm voando, mesmo quando tudo é preparado na hora; a conta vem assim que os pratos vazios são retirados, e se você insiste em ficar sentado à mesa logo vem aquela sensação de mal-estar, de estar atrapalhando, ocupando a mesa de quem quer sentar.

Um casal sentado ao nosso lado, numa mesa minúscula como a nossa (outro motivo de reclamação do Mirco, as mesas microscópicas), puxou papo. A senhora era filha de italianos e falava muito bem a língua. O marido arranhava algumas palavras, aprendidas de tanto ouvir os sogros falando alto em italiano :) Foram muito gentis, mas nos deixaram em paz quando chegaram os crêpes de Nutella (que, aliás, poderiam perfeitamente ter sido a base da minha alimentação durante toda essa semana, se não fosse o meu bom senso) e foram embora.

Nós voltamos ao Louvre e terminamos de ver o que faltava. CLARO que eu sei que pra admirar direito tudo o que há lá dentro são necessários vários dias. Mas lembrem-se de que eu NÃO PODIA PARAR EM PÉ, pra admirar nada. Vimos TODAS as salas de TODOS os setores, andares, departamentos, mas tudo correndo, porque senão o sangue descia ao tornozelo direito, não conseguia mais subir por causa do edema, e a dor era verdadeiramente lancinante. Deixo aqui fotos das estátuas de Aníbal e de Júlio Cesar, colocados lado a lado, de um cabeção da Ilha de Páscoa, e de um tríptico medieval muito bonito.

Quando finalmente eu pedi arrego, botamos a carinha pra fora do museu e tava chovendo MOOOITO. Todo mundo parado ali embaixo da entrada esperando a chuva passar pra atravessar a rua e pegar o metrô. Ainda passamos no supermercado antes de voltar pro albergue. Dei uma descansada com os pés pra cima, tomei meu banho complicado e descemos pra jantar.

Ontem o Mirco teve piedade de uns espanhóis que cozinharam o macarrão por meia hora e acabaram comendo uma coisa desforme com pseudomolho de tomate, e convidou os meninos pra jantar com a gente. Só que eles deram o bolo e acabamos oferecendo a pasta que sobrou ao John, americano de 20 anos que estava rodando pela Europa há algumas semanas sem dinheiro nenhum. Ele tinha comprado um pacote de macarrão e uma lata de molho, que deveriam durar a semana inteira. O cara é uma figura, como vocês podem ver. Foi a primeira vez que eu conheci um semi-rasta. Ele explicou que foi um amigo dele quem fez os dreadlocks, levando quatro horas pra fazer metade da cabeça, enquanto ele levou duas horas pra fazer a cabeça inteira do amigo. Mas por que MEIA cabeça? Ele disse que seus dreads eram de inspiração celta (???), que os celtas misturavam mechas normais de cabelo com dreadlocks e trancinhas, mas ele achava muito confuso e resolveu organizar melhor a coisa, por isso fez só meia cabeça. Então tá. Ele pinta, num estilo confuso que eu não entendi direito como é, e disse que tem intenção de ir morar em Praga, porque ele é completamente anti-americano e quer morar na Europa, onde há um melhor relacionamento com a arte. Como Praga é a única capital européia que ainda é economicamente viável pra quem não tem um tostão, como ele, foi a cidade que ele escolheu. In bocca al lupo, John.

Conversamos também com um alemão de língua presa e duas meninas austríacas muito bonitas, e conhecemos duas gêmeas de Florianópolis que estavam passeando na Europa com a mãe, tão simpática quanto elas duas. Marcamos um jantarzão coletivo pra amanhã.

(Na foto vê-se uma sacola cheia de conchinhas, que o John estava tentando furar com aquela tesoura, pra fazer um colar. O Mirco está com os óculos fundo de garrafa do John.)