tremai

Ontem, voltando tarde do trabalho, vi uma estrela cadente. Primeira vez na minha vida.

E hoje a terra tremeu em Foligno. O primeiro terremotinho da minha vida. Olha que pra marinheira de primeira viagem eu até que me comportei muito bem. Ou seja, continuei fazendo o que eu tava fazendo – lendo Bartleby y Compañia enquanto o aluno das 3 não chegava – e a única coisa que passou pela minha cabeça foi a seguinte: se eu tiver que sair correndo e só der tempo de levar uma coisa daqui de dentro, vai ser o casaco cinza com gola coreana, que eu AMO e que vai ser útil porque tá frio pra burro lá fora, ou a minha bolsa superdescolada da Uncle K., com todas as minhas coisinhas bubus dentro (leia-se estojo mandado diretamente do Japão pela Hanae, minhas canetas coloridas, o caderninho que a Newlands me deu, a agenda, a carteira nova da Furla, meus óculos escuros queridos, o remédio pra enxaqueca, o propranolol preventivo de enxaqueca que me deixa zonzinha, meu Neutrogena pras mãos, as luvas e o chapéu, o resto de Trident sabor verão tropical, o batom da Natura)?

Foi assim: eu tinha acabado de papar a minha marmitinha (feijão, arroz, franguinho e salada) e de escovar os dentes. Sentei à mesa com o livro e o dicionário de espanhol. Ouvi a porta da frente bater; deve ser a mala da Mirella chegando do almoço. No mesmo momento senti uma tremida, como se eu estivesse em um chalé vagabundo de madeira, que sacoleja todo quando alguém mais desengonçado passeia no andar de cima, sabe? Não, não um tremor, uma sacolejada mesmo. Coisa light. Notei a água mineral balançando dentro da garrafa, mas passou logo. Ficou aquela sensação estranha de “mas foi só isso? Eu, hein” misturada com “ainda bem que foi só isso”. Achei que tinha imaginado tudo, porque não se pareceu muito com os relatos que eu já ouvi (talvez porque a maior parte das histórias que neguinho conta por aqui tenha a ver com terremotos de verdade, e não esse tabajarinha de hoje). Como eu estava sozinha no andar de baixo, minha suspeita só foi confirmada quando ouvi o pessoal lá do andar de cima, da agência de tradução, fazendo um fuzuê só, comentando o ocorrido. Mais tarde, quando meu aluno chegou, perguntei se ele também tinha sentido, e ele fez que sim. Que bom, não estou ficando maluca.

Nem uma taquicardiazinha, nem uma palidez no rosto, nenhuma descarga adrenérgica, nada. Ô propranolol bom da moléstia.

Update: O epicentro do terremoto foi em Spoleto, a mais ou menos a 20 quilômetros de Foligno. 4,2 graus da escala Richter.