update sobre a publicidade nos ônibus de gênova

Alguém tinha alguma dúvida de que a mensagem “a má notícia é que deus não existe, a boa é que você não precisa dele” não teria autorização pra ser estampada nos ônibus de Gênova? (vide post anterior)

A UAAR não escolheu Gênova por acaso: é a cidade do Monsenhor Bagnasco, um grandíssimo filho da puta com as idéias mais retrógradas que eu já vi na vida e que volta e meia solta uma asneira conservadora idiota. O cara é tão chato que já foi vítima de ameaças, não se sabe de quem, mas que infelizmente jamais se concretizaram (perdoem-me a vontade de ver uma carnificina rolando, mas é que o conservadorismo fossilizante desse país ME DÁ NOS NERVOS).

Pois bem: a empresa que produz aqueles adesivos que cobrem os ônibus de publicidade decidiu não aceitar o pedido da UAAR e não prosseguir com a propaganda. A desculpa oficial é a de que esse tipo de mensagem é ofensivo pra quem é religioso, o que vai contra a lei. Leia-se “nós também, como todo mundo, nos cagamos de medo da igreja, comemos na mão deles, se fizéssemos a propaganda iam dar um jeito pra que a gente perdesse todos os clientes e iríamos à falência, pra não falar da desmoralização que sofriríamos (provavelmente nossos amigos deixariam de falar conosco e tal), então achamos melhor dar essa desculpa da lei número tal e tal, foi mal aí”.

O problema é que A PORRA DA IGREJA CATÓLICA DE MERDA NOS BOMBARDEIA NOITE E DIA COM PROPAGANDA EM TUDO O QUE É LUGAR, pedindo dinheiro (há uma taxa obrigatória, o otto per mille, ou 8/1000, que vai necessariamente pra igreja ou pro governo, você escolhe. Quando chega a época de fazer essa escolha somos massacrados por propagandas idiotas da igreja na TV, que eu duvido que sejam pagas, por sinal) e enchendo o saco. O problema é que aquela mala do papa TODA HORA aparece na TV e na mídia em geral, como se o que ele diz tivesse alguma importância concreta pra todo mundo que não é católico. O problema é que, sendo outro grandíssimo filho da puta, ele diz, sim, coisas ofensivas que vão inevitavelmente parar na mídia – como aquele dia infeliz em que, botando sua carinha de Palpatine na sua janela costumeira, soltou, o tato em pessoa, aquela pérola sobre o catolicismo ser a única religião verdadeira. Vá tomar no cu. O problema é que a igreja faz campanhas deslavadas contra a fecundação artificial, forçando casais estéreis a viajar pra outros países europeus pra poder ter filhos. O problema é que a igreja faz campanhas deslavadas contra a pesquisa com células-tronco, contribuindo pra atrasar o que pode ser um gigantesco avanço da medicina. O problema é que a igreja faz campanha deslavada contra a eutanásia, até hoje ilegal na Itália, forçando pobres coitados a vegetar por décadas mesmo contra a sua própria vontade expressa por escrito e mandando pra cadeia pais que, não agüentando mais ver o filho naquele estado, acabam cedendo ao bom senso e desligando os aparelhos. O problema é que a igreja declara abertamente que não dá o mesmo valor a casais casados só no civil e àqueles casados no religioso. O problema é que a igreja praticamente força todo mundo a se casar mesmo não querendo, visto que um casal que viva junto há cinqüenta anos e tenha doze filhos sem nunca ter se casado não é visto como núcleo familiar perante a lei; se um dos dois entrar em coma, por exemplo, é possível impedir que o outro tome decisões médicas por não ser considerado membro da família. O último governo de esquerda tentou mudar essa lei medieval, mas é lógico que não conseguiu. O problema é que, embora este seja oficialmente um país laico, hospitais, repartições públicas e escolas de norte a sul têm sempre um maldito crucifixo nas paredes. Pra ficar no meu microcosmos, aqui no prédio todo ano montam uma merda de um presépio gigante com direito a luzinha e agüinha, cuja conta é dividida igualmente por todos. Não precisa nem dizer que nós não fomos consultados – simplesmente ligam a merda do presépio na tomada e they take for granted que eu acho superlegal e estou superdisposta a dividir a conta de luz, por menor que seja.

Tudo isso pra mim, que não sou católica e nunca fui (uhuuu), é EXTREMAMENTE OFENSIVO. Eu também pago impostos, aliás provavelmente mais do que a maioria dos italianos – católicos, praticamente todos – que são mestres em sonegar. Eu também respeito as leis – com certeza mais do que a maioria dos italianos, incivis por natureza. Eu também vivo aqui. Eu também produzo riqueza pro país. Por que o comportamento claramente ofensivo desses filhos da puta contra nós, não-católicos, não é considerado tal? Por que é que, vivendo em um país oficialmente laico, eu tenho que aturar as conseqüências diretas e indiretas sobre a minha vida do que esses grandíssimos filhos da puta decidem?

É por essas e outras que o Mirco se desbatizou mês passado. Foi oficialmente excomungado. Só não mandamos emoldurar e penduramos na parede porque o cretino do padre escreveu bem quatro páginas cheias de baboseiras em vez de mandar uma folha só dizendo “fulano de tal é, a partir de hoje e a seu próprio pedido, considerado não membro da Igreja Católica Apostólica Romana, com as seguintes conseqüências: não pode ser patrinho de batizado [viva!], não pode ser padrinho de casamento [eba!], não pode receber os últimos sacramentos [uhuuu!], não pode ser enterrado em cemitério católico [yay!], já que foi oficialmente excomungado [atualmente uma das palavras mais lindas de qualquer dicionário, no meu entender]”. Inveja cor-de-rosa de um membro de um grupo do Facebook que tinha sido batizado no Vaticano e por isso tem um certificado de desbatismo cheio de mumunhas, com brasão e “VATICANO” escrito em letras garrafais no alto. Chiquérrimo.

Grandíssimos filhos da puta. Câncer de pâncreas com dores excruciantes pra todos eles.

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O lado positivo da coisa é que está-se falando muito mais sobre o assunto do que teria acontecido se os ônibus tivessem saído com a propaganda. A esperança é que esse absurdo tome proporções tão avassaladoras que seja possível realmente mudar alguma coisa, limitar oficialmente o poder da igreja, fazer com que passem a pagar impostos como todo mundo, a não meter o bedelho no coma vegetativo dos outros, essas coisas. Dedinhos cruzados, faz favor.