rio

É muito estranho estar aqui por todo esse tempo. Desde que fui morar no Malawi nunca vim pro Rio por mais de duas semanas, o que significa que as minhas vindas assumiam um caráter entre o turístico, porque o Mirco vinha sempre comigo, e o quase-business, já que tinha que resolver ene coisas.

Dessa vez em entrei, dentro do possível com trabalho e Carol ao mesmo tempo, numa espécie de rotina carioca. Um lance muito bizarro. Praticamente me catapultei de um planeta pra outro, já que a minha (provisória) vida aqui é diametralmente oposta à minha vida no interior do Butão. A essa altura do campeonato, já sei do que vou sentir falta quando voltar pro interior da Suazilândia: o queijo Minas Solidão comprado no Zona Sul, o pão de queijo da Eldorado, os pães da Nutrella de 35 kcal por fatia, as pessoas de legging e tênis direto andando na rua sem maquiagem, a cabeçada everywhere (eu adoro cidade grande, calçadas cheias, fauna variada, essas coisas), táxi que você faz sinal no meio da rua e ele pára (Bastia não tem táxi, lógico), o sotaque carioca, a Lagoa, que é um desbunde imoral de tão desbundante, os trocentos salões de beleza com manicures ótimas, a escova progressiva, os passeadores de cachorro, o cinema legendado, o milk-shake de Ovomaltine do Bob’s, os restaurantes e farmácias que entregam em casa, o porteiro que leva as sacolas de compras até o elevador, as janelas que podem ficar eternamente abertas all year round, o gosto particular da água de filtro de barro, as notícias dadas na minha língua, o comércio aberto direto sem pausa pro almoço, a sala bem grande aqui de casa, a feira da Nossa Senhora da Paz, as Lojas Americanas (adoro), a luz. E isso porque eu nem fui à Cidade ainda. Não vou sentir falta da sujeira nas ruas, desse povo feio pra cacete, das vinte vendedoras por loja, paradas em pé feito um exército de dois de paus esperando cliente, das novelas cada vez mais pavorosas, do Sarney, do trânsito e da dificuldade de parar o carro, de shopping que cobra estacionamento, da mendigada, da ladeira ridícula aqui de casa que é um martírio pra subir com carrinho de neném, das coisas todas caríssimas, da mania chata que carioca tem de buzinar O TEMPO TODO, do prédio de odiosos novos ricos aqui atrás que gargalham a trocentos decibéis a madrugada toda, do caminho casa-aeroporto-casa, da parte velha do Galeão que chega a dar ânsia de vômito de tão feia, de ovo de codorna. Entre outras coisas.

Notem que nem estou considerando a parte social porque aí já seria sacanagem; TODO MUNDO que eu conheço aqui é mais interessante do que as pessoas que conheço no interior do Burundi. Vou sentir tanta falta de conversas interessantes que estou tentando não pensar no assunto pra não me deprimir.

Por outro lado, enquanto estou aqui sinto falta da pizzinha semanal no Penny Lane, do Legolas, de poder ir pra tudo que é lugar perto de casa a pé sem ter que encarar ladeira na volta, de poder deixar o carro aberto e ligado enquanto desço rapidinho pra tirar dinheiro no caixa eletrônico, da minha garagem eLorme onde tudo cabe, da minha televisão na sala, das minhas plantinhas queridas, do macarrão da Arianna aos domingos, dos meus armários novos, dos mil tipos de queijos, das minhas roupas de inverno, da Benetton, do Ipercoop que tem tudo, de morar no primeiro andar, de não pegar trânsito praticamente nunca, de falar italiano, da minha poltrona Poang maravilhosa, da minha cozinha sensacional. Entre outras coisas.

Enfim, vida de expat é boa, mas é uma merda.