cultura na roça

Continuando a série programas deferentes, ontem saímos um pouco da rotina e fomos assistir a um ballet em Foligno, no Politeama, que já foi um teatro e hoje funciona como cinema.

Eu adoro ballet clássico. Fiz aulas durante alguns anos quando era pequena, mas parei porque sempre fui gorda, desastrada e desprovida de graça e elegância, coisas que uma bailarina não pode ser. Mas continuei gostando, e sempre que tinha temporada no Municipal eu ia. A última vez foi o que, há uns três anos, com a Syrléa? Vimos o Lago dos Cisnes, que é um dos meus preferidos.

O de ontem era Don Quixote, que não é lá um dos meus favoritos, mas dá pro gasto. Mirco, obviamente, nunca tinha visto um ballet, e estava curioso. Tínhamos visto o cartaz na saída do cinema na semana passada e nos interessamos. Eu liguei pra bilheteria ontem à tarde e a mulher disse que não precisava comprar antes, porque ainda tinha muito ingresso sobrando e eu poderia perfeitamente comprar na hora. Então pouco antes das nove da noite estávamos lá, numa pseudo-fila confusa, porque eles não só não foram capazes de botar uma bilheteria só pro ballet, então tinha público do ballet e dos cinemas na mesma fila, mas também só tinha uma pessoa atrás do balcão vendendo os malditos ingressos. Pra melhorar a confusão, professores e alunos de dança tinham desconto, e tinham que entrar na fila com um documento pra conseguir pegar os ingressos mais baratos. Acabou que o espetáculo começou com quase 20 minutos de atraso, porque senao não ia nem ter público, já que metade da galera ainda tava lá fora, na fila, passadas as nove horas, horario teórico do início do espetáculo.

A companhia de ballet é de um romeno e de uma milanesa que estudou dez anos na Rússia. O grupo tem a minha idade e eu honestamente esperava um pouco mais de profissionalidade, embora, pensando bem, se eles fossem realmente profissionais e bons de sapatilha não estariam se apresentando num ex-teatro em Foligno, of all places. O lance é que o palco do teatro é minúsculo, ao ponto que a coreografia, que não era a original de Petipas mas do próprio romeno, ficou claramente prejudicada. O bailarino principal chegou a dar um chute numas pedras cenográficas enquanto saltava piruetando; voaram bolinhas de isopor por todos os lados. A iluminação era sofrível, e o cenário parecia coisa desenhada pelos alunos da segunda série na aula de Artes (eu fui aluna da Nêga no Andrews, e vocês?). O figurino poderia perfeitamente ter sido montado todo na Ciganinha, na Saara do Rio, tal o excesso de babados. A menina que fazia o Sancho Pança já estava me irritando, sacudindo os braços sem parar como uma retardada. Os bailarinos eram completamente descoordenados entre si, principalmente os homens, que pulavam e levantavam as pernas sempre com um meio segundo de diferença entre um e outro. E três dos quatro bailarinos homens coadjuvantes eram fortes como estivadores, e não esbeltos como bailarinos costumam ser. A música era terrível, porque obviamente não tinha orquestra, por falta de espaço e por falta da orquestra propriamente dita. O público, não habituado a esse tipo de espetáculo, aplaudia a toda hora, e aplauso invadindo a música da cena seguinte não é a coisa mais legal do mundo.

Mas all in all foi um programa divertido. Fiquei lembrando de quando era criança e tínhamos sempre ingressos pro Municipal; assisti a Copélia, Gisele e o Quebra-Nozes trezentos milhões de vezes, sempre das frisas ou das primeiras filas da platéia. O barulhinho seco toc-toc das pontas de gesso no palco é sempre uma delícia. Fui dormir contente :)