nada a ver com nada

Estou precisando desesperadamente de um celular novo. Então fui e comprei um casaco.

É que dia 7 começaram oficialmente as liquidações em Perugia (cada província tem a sua data específica, oficial, e ai de quem desrespeitar), e lá fui eu à caça de um casaco verde-musgo que eu já tinha identificado há alguns meses na Sisley. Quando o vi pela primeira vez, fiquei olhando pra cara dele pra não esquecer, decorei o preço (150 euros) e armazenei as informações num canto do céLebro, pra voltar só quando as liquidações começassem. Ontem fez um frio desgraçado, passei a manhã em casa fazendo uma faxina daquelas pesadas como há muito não fazia, descalcarizando a casa toda, levei almoço pros meninos na oficina e assim que as lojas reabriram à tarde, às três e meia, eu já tava dentro da Sisley fuçando entre os casacos. Achei o bendito, e estranhamente achei o meu tamanho também, motivo pelo qual dificilmente consigo aproveitar liquidações. Novo preço: 85 paus. Valeu a espera ou não valeu? Sobrou até pra comprar um cachecol lindo de lã marfim, pra combinar com o gorro de cashmere da mesma cor que o Gianni fez na malharia onde trabalha, e me deu de lembrancinha de Natal.

Como também estava precisando de um par de botas pra alternar com o preto que eu uso direto ultimamente, passei na Bata e trouxe pra casa um lindo par marrom escuro, com estranhos adereços esporas-like com strass que posso tirar se não tiver coragem de usar, de couro da melhor qualidade. A moda esse ano é o estilo eqüestre, que eu acho bem legal mas sendo culotuda e imensa não posso me dar ao luxo: calças de pernas finas ou que terminam logo abaixo dos joelhos enfiadas por dentro de botas de cano altíssimo, com salto e ponta em estilo cowboy. Só que as botas aparecem nos modelos mais improváveis, daqueles feitos com retalhos de couros os mais variados, hediondos, aos com perolinhas, canutilhos e detalhes em prata e/ou oncinha. A gente chora de rir andando pelas ruas de Bastia, eu e Mirco. O que tem de calça jeans enfiada à força dentro das botas, com quilômetros de pregas escapando pelas bordas, não tá no gibi.

Moda aqui é uma coisa muito engraçada. As pessoas parecem todas saídas de uma revista de moda, com tudo sendo usado junto ao mesmo tempo agora. Mas os homens é que são mais engraçados, porque a gente não tá acostumado com macho vaidoso desse jeito no Brasil. Já falei aqui das sobrancelhas feitas dos homens, que me hipnotizam. Tenho um aluno que é a maior figura, e é o protótipo do homem italiano do interior do Zaire, do bastiolo fighettone. Bronzeado (porque acabou de voltar da clássica viagem à Tailândia; daqui a três semanas vai ser porque fez bronzeamento artificial), cabelos pretos como a graúna, sólidas sobrancelhas devidamente feitas, sorriso de vendedor (ele É vendedor), a gola da camisa tão alta e pontuda que se ele virar a cabeça pro lado é capaz de sofrer lesão ocular, sapatos marrons pontudos, celular que além de telefonar tira foto, serve de agenda, corta grama, essas coisas. O menino me ama e me dá aquelas olhadas 43 de conquistador barato que me dão uma vontade de rir desgraçada. E quando conta as barbaridades que manda em inglês por SMS às novas amigas tailandesas, é de matar. Anota todas as frases feitas, todos os chavões, todas as expressões de duplo sentido. Eu passo a aula toda tentando não olhar pra cara dele, pra não cair na risada. Ele deve achar que eu evito porque senão caio em tentação ;) Esclareço que ele não me ama porque sou linda, porque não é o caso, especialmente aqui onde todas são magras, fashion e têm cabelo liso e preto e cortado do mesmo jeito. É que acho que ele nunca conheceu alguém do sexo feminino tão interessante, engraçada e extrovertida (nem vou tocar no assunto modéstia porque vocês sabem o que eu penso a respeito). A cada besteira homérica que os alunos dizem eu finjo que levei uma facada e eles já aprenderam a dizer nomes de possíveis órgãos lesados dependendo da gravidade do que disseram. L’aorta addominale! Polmone destro! La milza, la milza! (o baço, o baço). Eu choro de rir, e eles também. Além do pseudo-gostosão vendedor temos duas clássicas fighettone nativas de Foligno. Meu maior medo é começar a falar como elas, porque pego sotaques muito facilmente. O sotaque de Foligno só não é mais horripilante do que o de Perugia, que bate TO-DOS os records de cafonice. Pena que não dá pra demonstrar isso pra vocês, porque a combinação fashion victim + sotaque cafona é de desopilar qualquer cirrose…