O nosso pacote turístico não incluía café da manhã, então acordamos e saímos à caça de um lugar legal pra comer. Acabamos descobrindo um lugar legalzinho a cinqüenta metros do hotel. Anotem aí: se chama Faborit, são espanhóis mesmo e só têm duas lojas, em Madrid e Barcelona. A decoração é legal, não servem café em copos de isopor mas em xícaras e mugs bem bonitas e modernas, o chocolate batido é uma delícia e os meninos provaram o cappuccino e aprovaram, os croissants também, e ainda têm uma boa variedade de sanduíches salgados, pra gente como eu que tem pavor de café da manhã doce. O menu café da manhã custa 2,15 euros (se não me engano) e inclui um café/leite/cappuccino/chocolate etc mais um minisanduíche ou um doce croissant, enroladinho, etc. O pessoal é simpático e há jornais espalhados pros clientes lerem. Mas tem uma placa na parede: atenção aos seus pertences porque nesta zona operam muitos batedores de carteira profissionais. Atenção ao verbo operar, que achei quase de uma licença poética.
Resolvido o problema do café da manhã pro resto da semana, resolvemos ir caminhando na direção do Parque del Buen Retiro, que fica pertinho do hotel. Na verdade nossa intenção era ver logo de cara o Museo del Prado, mas, quem diria, fecha às segundas. Então vagamos pelo parque, que é muito bonito e bem cuidado, até a hora de almoçar.
Onde comer? Quando você está em companhia de italianos isso será SEMPRE um problema de vida ou de morte. Eu sou chatinha pra comer, mas se tenho que passar uma semana à base de porcarias porque não acho um lugar decente, pra mim não é o fim do mundo. Pra eles é o fim do mundo com direito a juízo final negativo, sem trocado pra pagar o Caronte. Acabamos entrando, mais por curiosidade do que pelos pobres sanduíches expostos na vitrine. O susto: vinte milhões de presuntos pendurados nas paredes, cada um com o seu copinho de plástico pendurado embaixo, pra recolher as gotas da gordura que derrete. O balcão de aço inox todo amassado não era muito convidativo, e menos ainda as mesinhas lá no fundo, com toalha de plástico. Muito menos as paredes de azulejos velhos, cor de burro quando foge. Também não era atraente a gritaria. Mas a rapidez com que os balconistas fatiam o presunto, TUDO NA MÃAAAAAAAAAO, é impressionante. Tentei fazer um vídeo mas do ângulo em que eu estava o negócio não saiu. Os meninos comeram bocadillos de pão francês com o famoso jamón espanhol, delicioso mas cortado em fatias tão grossas que dava até tristeza, e eu preferi ficar na tortilla española mesmo, que nada mais é do que uma omelete com batatas. Tudo isso ouvindo os meninos discutirem como será que eles fazem pro presunto ficar assim tão diferente do prosciutto italiano (pra mim, honestamente, é tudo a mesma coisa).
Do Museo do Jamón fomos a um museu propriamente dito, o Centro de Arte Reina Sofía, que é todo modernoso e abriga obras modernosas também. Só fomos lá pra ver a exposição do Picasso e babar no Guernica, lógico, mas quando subimos ao segundo andar e demos de cara com todas aquelas instalações contemporâneas, telas brancas (algumas com pontinhos, como uma do Miró que o Gianni fotografou escondido) e outras idiotices pseudoartísticas, resolvemos decidir corredo aonde ir depois. Sentamos num banco em frente a uma instalação ridícula com xales espanhóis colados numa parede, abrimos o mapa e logo apareceu uma daquelas mulherzinhas que têm o emprego mais chato do mundo, que é de ficar passeando pelas salas do museu pra evitar que japoneses sorridentes tirem fotos com flash dos quadros. Puxou papo e o Gianni, com pena da mulher com o emprego mais chato do mundo, deu trela. Pronto! Acho que nunca ninguém tinha falado com ela antes, então se assanhou toda e foi chamar as amigas. As três juntas praticamente decidiram o nosso itinerário pro resto da semana e ainda deram dicas práticas, do tipo tirem as jóias e coloquem a mochila no peito e não nas costas porque aqui tem muito batedor de carteira… Filha, eu passei anos esperando o 157 na boca do Dona Marta pra voltar do Princesa, cê acha que eu vou dar mole em Madri?
Itinerário decidido, abandonamos nossas amigas do Reina Sofía. Pegamos o metrô e fomos direto pra Plaza de Toros, que é muito bonita, apesar de não ser cronologicamente antiga. A tristeza de ver que hoje tinha espetáculo… Pobre touro. O interessante é que os preços dos ingressos dependem se o lugar fica no sol ou na sombra. Os ricos ficam na sombra e pagam uma fortuna. Os pobres ficam lá torrando no sol, vendo o coitado do boi morrer espetado. Mais pão e circo do que isso, só o carnaval tupiniquim…
Deitamos sob os pinheiros de uma colina gramada atrás da Plaza, pra decidir o que fazer. Ainda estava relativamente cedo e resolvemos que dava tempo de dar um pulo no estádio do Real Madrid pra dar uma zoiada. O metrô já tava pago mesmo, não custava nada… Então lá fomos nós naquele calor dos infernos ver o diabo do estádio. A visita guiada custa acho que 9 paus, e como nenhum de nós é particularmente fã de futebol, acabamos só entrando na loja do time, que tem uma janela que dá pro interior do estádio. Aliás, a loja do Real Madrid, lotadíssima de gente comprando baboseiras caríssimas com Ronaldos mal desenhados ou esculpidos, é simplesmente o lugar mais chato do planeta. Saímos correndo pro hotel, e enquanto o Mirco tirava um ronco eu fui escrever cartões-postais.
Aí fiquei pensando sobre a minha primeira impressão sobre a cidade. Madri definitivamente NÃO é uma cidade fascinante. Mais suja do que as poucas outras que já vi aqui na Europa. E notei sobretudo a tristeza das vitrines: o vidro é sempre engordurado, tudo que era branco ficou encardido, os cartazes pendurados são escritos a mão ou feitos pelo filho do dono em fonte Comic com desenhos disformes e quase irreconhecíveis de omeletes, copos de cerveja, sanduíches de presunto. As revistas nas bancas de jornal, aquelas que ficam por trás dos painéis de vidro e que não são trocadas nunca, estão todas esmaecidas pelo sol africano. Assim como as garrafas de refrigerantes expostas nas vitrines. As lojas de roupas têm manequins horrendos, e as roupas parecem ter sido jogadas ali sem nenhum critério. Achei, como dizer, decadente pacas. Sabe aquelas lojas velhas, caindo aos pedaços, no centro do Rio? Estruturas não só antigas, mas velhas, mal conservadas, deprimentes? É assim. Claro que há alguns prédios lindos, lindos, e claro que as mulheres dão de mil a zero nas italianas, porque não usam quilos de maquiagem no rosto, não têm todas o mesmo corte e a mesma cor de cabelo, não usam salto quando não é pra usar salto, enfim, são NORMAIS. As pessoas são simpáticas e solícitas e falam um espanhol que eu entendo (odeio, mas entendo tu-di-nho, coisa que não acontecia na Argentina, por exemplo), mas, cacetes estrelados, COMO FUMAM! Fumam em tudo que é lugar e isso é uma das coisas mais irritantes da Europa. Acredito que um dia vão acordar pra vida, como já aconteceu na Irlanda, na Itália e em outros países que proibiram fumo em lugares públicos, mas até lá, putz, que porreeeeeeeeeeeee.
Tínhamos todos cismado com a paella. José, meu colega de trabalho de Barcelona, tinha me avisado que paella no jantar é que nem cappuccino depois do almoço, coisa de turista. Mas o Gianni e a Chiara são um porre pra comer e acham paella pesado demais pro almoço, então lá fomos nós pedir informações pro mocinho bonito da recepção: onde comer paella no jantar? Ele recomendou um lugar não muito longe do hotel, na Calle de la Reina, então encaramos a caminhada de 10 minutos e chegamos no tal restaurante. O nome La Paella de la Reina brilhava em neon verde sobre a porta de madeira sem charme. O menu colado na porta estava torto e amassado, mas praticamente tudo o que tinha ali a gente gostava, então resolvemos encarar. Não saiu barato, mas a paella estava ótima só o Mirco não gostou. O vinho branco estava uma delícia e voltamos contentes pro hotel.