abruzzo

O Moreno inventou um maldito fim de semana de esqui, pra aproveitar a última neve antes do próximo inverno.

E aqui faço um adendo pra comentar o que já comentei aqui antes: todo mundo na Europa esquia, desde motoristas de ônibus, como o Moreno, a pedreiros, carpinteiros, fazendeiros.

Outro adendo: odeio frio, odeio tudo o que tenha qualquer coisa a ver com frio, não sou nem um pouco esportiva, não acho a namorada do Moreno boa companhia (sobretudo depois que engravidou “por acaso” cof cof), e estava doida pra ficar curtindo a minha casinha nova e passando roupa.

Mirco nunca tinha esquiado. Primeiro porque todo mundo sabe que é um esporte relativamente perigoso, ainda mais na Itália onde neguinho não respeita regras em nenhuma ocasião – no último inverno morreram umas quatro ou cinco criaturas, todas em acidentes idiotas nas pistas de esqui, causados por excesso de velocidade e desrespeito às regras e ao bom senso. Segundo porque é um esporte caro e sinceramente achamos que há coisas muito mais interessantes pra fazer com o nosso dinheiro. Terceiro porque normalmente o pessoal vai esquiar por aqui mesmo, na Itália, e costuma-se ir de carro, coisa que o Mirco abomina. Dessa vez, não sei por que diabos, aceitou o convite do Moreno. E lá fomos nós, sábado depois do almoço.

Moreno dirige mal. É imprudente, corre pra cacete, fica nervoso por qualquer coisinha, freia errado nas curvas. Acostumada a andar de carro com meu pai, que é tipo o melhor motorista do mundo, e com o Mirco, que é meio desatento mas só quando se empolga na conversa, e que é extremamente cagão e prudente, pra mim andar de carro com o Moreno é sempre traumático e nauseante. A estrada até o Abruzzo é um porre, inclusive porque a região é montanhosíssima e toda hora tem um túnel imenso pra atravessar. Mas a paisagem é interessante, e os montes cobertos de neve já eram visíveis muito antes de nos aproximarmos do Gran Sasso (literalmente, Grande Pedra), o ponto mais alto da Itália e meca dos esquiadores botenses da Itália central.

Achamos a cidadezinha onde ficava o hotel, descarregamos as malas e fomos dar um pulo em L’Aquila (“A Águia”), a capital da província de Abruzzo. O Abruzzo é que nem o Molise, a região de Marche ou Campobasso: não acontece nada nunca, e a gente nunca ouve notícias sobre esses lugares no telejornal. São regiões tipo assim Espírito Santo, sabe, que se um dia sumir ninguém vai perceber. Pelo menos eles têm o Gran Sasso, mas só se fala dele no inverno. Eu pensava que L’Aquila valia a pena a viagem, mas não achei nada de particular. Como toda cidade italiana no fim de semana, tava cheia de gente na rua, toda emperequitada e maquiada subindo e descendo o Corso, a via principal. Ô gente provinciana! Voltamos pro hotel, jantamos e fomos dormir.

No domingo Moreno emprestou roupas de esqui pro Mirco, que imediatamente colocou aquele macacão ridículo de trás pra frente, e depois do café da manhã cedíssimo fomos comprar os passes pra subir de bondinho até o alto da montanha, um dos pedaços do Gran Sasso (estávamos na estação de Campo Imperatore). Os meninos alugaram esquis e lá foi Moreno dar aula pro Mirco, atoladíssimo. Marta, porque está grávida, e eu, por todos os motivos listados no adendo, acompanhamos os pimpolhos a pé mesmo, descendo a pista mais bobinha. O tempo estava ótimo, um sol do cacete, eu completamente cega apesar dos óculos escuros, agradecendo a mim mesma de ter passado filtro solar 50 três vezes antes de sair do hotel. Depois de dar umas aulinhas pro Mirco e de decidir que ele já estava mais ou menos autônomo Moreno pegou as cadeirinhas suspensas (como diabo se chamam em português eu não lembro) e foi esquiar nas pistas hard – já falei que ele é imprudente. O tempo começou a fechar de repente, e começou a fazer um frio do cacete e a nevar MUITO. Eu e Marta mandamos os dois plantar batatas, pegamos as cadeirinhas e chegando ao bar do hotel que fica dentro da estação de esqui prontamente tomamos chocolate quente e ficamos forçando uma conversa chata por duas horas, até os pimpolhos voltarem. Almoçamos, eu e Marta voltamos pro hotel, cada uma pro seu quarto, e os meninos só chegaram mais tarde. Dormimos, vimos TV, jantamos e voltamos a dormir.

Ontem a manhã estava linda outra vez. Os meninos foram esquiar e eu e Marta fomos fazer uma caminhada ao longo da estradinha que sobe a lateral da montanha. Quando voltamos eles já tinham tomado banho e feito o check out, e rumamos pro litoral do Abruzzo, onde os tios do Moreno têm um apartamento de praia. Só que pegamos um trânsito do cacete no pedágio, prevalentemente por causa da incivilidade dos italianos quando dirigem, ocupando duas filas ao mesmo tempo pra ver qual anda mais rápido e conseqüentemente fodendo tudo. Mas finalmente chegamos a Villa Rosa, já em Teramo, outra província de Abruzzo, e achamos o prédio dos tais tios. Almoçamos peixe e saímos a pé pra tomar sorvete no centro. Eu não agüentava mais aquele papo de quem não tem o que dizer e só fica falando de quem morreu, quem casou e quem comprou carro novo, e já estava arrancando os cabelos de nervoso. Quando finalmente entramos no carro nem acreditei. Só que a viagem de volta também foi longa, porque o Moreno pegou outra estrada pra evitar os engarrafamentos da cabeçada voltando do feriadão. E nem deu pra entrar logo em casa quando chegamos, porque o Mirco deixou a carteira de motorista na loja onde alugou os esquis e fomos direto da garagem de casa pros Carabinieri de Bastia pra perguntar o que fazer, enquanto os caras da loja não mandam a carteira pelo correio.

Sabe um fim de semana completamente desperdiçado? Programa de índio mesmo? Ecco. Fiquei contente pelo Mirco porque ele sempre se diverte com o Moreno, mas se de agora em diante ele resolver levar a sério essa coisa de esquiar, que vá sozinho. Pelamordedeus!!! Primeira e última! Pode me convidar pra qualquer cidade ou qualquer roça, mas praia e montanha NÃAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAO!

Fotos aqui. Poucas porque a bateria descarregou e porque eu tava muito, mas muito de saco cheio demais da conta até pra fotografar.