Cada vez que deixo o Rio parece que a coisa fica mais difícil. A cada vez noto como estou sentindo mais falta da minha cidade (que é um desbunde), da minha mãe do meu irmão da minha avó, da minha velha casa, do milk-shake de Ovomaltine do Bob’s. Não acho que seja um lance de estar ficando velha; acho que essa falta de estímulos intelectuais aqui no interior do Malawi é que acaba intensificando a nostalgia generalizada. Sinto falta de conversas inteligentes, e acabo sentindo falta, por tabela, de todo o resto. Quando me peguei analisando a reforma ortográfica com minha mãe e meu irmão me dei conta de que não há NINGUÉM aqui com quem eu possa falar de coisas desse tipo. Ficar repetindo e rindo dos diálogos em inglês de House e Lost e comentando os figurinos de The Tudors, como fiquei com a Newlands, aqui é impossível. Ter alguém brilhante como o meu irmão me explicando como anda o governo Lula e essa confusão da Grampolândia é um privilégio que aqui eu não teria nem pagando. Pra não falar do quanto eu sinto falta de dividir a mesa com gente que não se debruça sobre o prato e não lambe a faca.
Vocês tão carecas de saber, e eu também, que eu não sou retardadinha e tenho mais cultura e céLebro do que 90% dos italianos, que são o povo mais chucro do planeta, e por isso me sinto muito sozinha aqui. Meus amigos são os amigos do Mirco, chucros e ignorantes, apesar de muito legais, e as conversas inevitavelmente giram ao redor de comida, carros, comida, roupas, comida, quem casou, comida, quem morreu, comida. Meus colegas de faculdade já são melhorezinhos, mas como todo adolescente é idiota por natureza e eles ainda estão saindo da adolescência, estão em fase de desidiotização, pra não falar do fato de que, sendo caipiras, têm muito pouca experiência. De tudo. Adoro-os todos e me divirto com eles, mas certos tipos de conversa e de reflexão requerem um mínimo de experiência e maturidade que eles não têm.
Veja bem, não estou reclamando-ando-ando e não me arrependo de coisa nenhuma; estou só constatando que toda escolha tem um revés. O revés da minha é esse: solidão intelectual. Além da falta do milk-shake de Ovomaltine do Bob’s, claro.