do parto

Acordei mais ou menos à uma da madrugada do dia 26 pra 27 de janeiro pra fazer o enésimo xixi da noite. Só que o xixi veio acompanhado de uma dor muito chata que eu imagino que fosse uma cólica menstrual mais forte (não sei porque não tenho TPM). Na verdade eu tinha passado o dia inteiro sentindo essas dores, mas como fiquei batendo papo com a minha mãe, me distraí e nem prestei atenção. Dessa vez não dava pra ignorar: era forte MESMO. Como veio e passou, sentei no computador pra terminar umas três laudas de um trabalho que eu tinha que entregar no dia seguinte. Terminei às duas da manhã e ainda tentei dormir de novo, mas de vez em quando a dor voltava e não dava mais. Acordei Mirco e mamãe e tocamos pro hospital de Foligno.

Chegamos lá às quatro da manhã. Subimos até o segundo andar e demos de cara com a enfermaria de obstetrícia completamente vazia e às escuras. Ninguém na recepção, nada. Àquela altura eu já tava me contorcendo de dor e começando a mandar praquele lugar toda vez que sugeriam que era melhor eu sentar (também não sei onde queriam que eu sentasse, já que não tinha bancos nem cadeiras em lugar nenhum). Mirco desceu até a entrada do hospital pra catar alguém e voltou acompanhado de uma enfermeira que apontou pra uma salinha. Tocaram a campainha e saíram duas enfermeiras com cara amassada de sono. Uma delas pegou um interfone e falou “grávida em trabalho”. Logo apareceu a obstetra, uma senhora baixinha de óculos com uma cara sorridente que me botou logo pra fazer o traçado tocográfico. Eu avisei a ela que provavelmente já estava bem dilatada, já que de acordo com os últimos exames físicos e ultras a Carol tava prontinha pra nascer há o maior tempão, com a cabeça encaixadona. Mas ela tava com outra grávida na sala de parto e me deixou lá com o monitor. As contrações foram ficando mais freqüentes e eu já tava subindo pelas paredes de dor. Quando ela voltou, meia hora mais tarde, olhou pro monitor e travou-se o seguinte diálogo:

– Xiii, que contrações xexelentas… Pode ser que eu tenha que mandar você de volta pra casa…

– Nãoooooo! Dá pra fazer um exame físico? Eu tenho certeza que estou dilatadaAAAAAARGH!

– Vamos ver…

(Fez o toque)

– Caraca. O colo do útero tá mole feito manteiga, dilatadérrimo!

– …

– ‘Bora, ‘bora! Cadê a camisola?

Botei a minha camisola, apareceu alguém com uma cadeira de rodas, me sentaram na cadeira e me levaram embora pra sala de parto.

– Senhora, onde estão os seus exames?

– Putz, esqueci!

– Como assim, esqueceu? Não estavam na mala?

– Não, porque eu tinha outro traçado marcado pra daqui a quatro horas, os exames estavam perto da porta!

– Vou pedir pro seu marido ir buscar.

Chega a anestesista.

– Ouvi dizer que a senhora está sem os exames.

– Meu marido foi buscar. Mas os resultados da coagulação estavam todos OK. AAAAAARGH!

– Tem certeza? Olha lá, hein!

– Tenho sim, TAP, PTT, fibrinogênio, tudo normal. AAAAAAAAAAAAAAI!

– Vou confiar em você porque tô vendo que você é uma pessoa instruída e entende os riscos em caso contrário.

– Obrigada obrigada obrigadaaaaaaaaaaaaaaaaai!

Sento na borda da cama, curvada pra frente.

– Hm, a sua coluna é tão ruinzinha…

– (em pânico) COMO ASSIM RUINZINHA? AAAAAAAAAAAAAAI!

– Um pouco de escoliose, e os processos vertebrais são pouco visíveis, não tô conseguindo encontrar um ponto de referência… [vejam como ela foi diplomática e escolheu não comentar o fato de que eu engordei feito um javali e isso também não ajudou]

– Confio na senhora, doutoraAAAAAAAAAAAAAAAAAAAARGH!

– Vou tentar aqui… (passa um tempinho) Nada. Vou tentar de novo. (mais um tempinho) Hm, nada… Vou tentar só mais uma vez, senhora, se não der agora não vou ficar furando você não, vamos desistir.

– Pode me furar à vontade, pelamordedeus pelamordedeus pelamordedeus faz parar essa dor malditaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!

– Caramba, não sei como mas eu consegui!

A obstetra sorridente cochicha no meu ouvido:

– Não falei que essa anestesista era batuta?

(Ela passou o tempo todo me dizendo pra ignorar o idiota do ginecologista, que ficou puto porque eu não tava com os exames e era antipaticíssimo, e repetindo que a anestesista era foda e que ia conseguir com certeza.)

Dou um enorme suspiro de alívio quando sinto a anestesia fazer efeito. A dor é substituída por, perdoem-me o TMI, vontade de fazer cocô. Só que eu também estava com vontade de fazer xixi. Quando falei pra obstetra que estava apertada, ela achou que era vontade de fazer cocô, ou seja, o estímulo pra fazer força pro bebê sair. Eu, anestesiadona e totalmente fora do ar de tanto que eu já tava de saco cheio daquilo tudo, nem lembrei de especificar que eu queria era um xixizinho básico. Quando finalmente a obstetra deu o OK pra eu empurrar, chegaram duas enfermeiras suuuupersimpáticas, uma jovem lourinha e uma feia com cara de brasileira, e a pediatra, uma senhora de cabelos grisalhos cortados Chanel. Todas fazendo a maior torcida e me dando os parabéns por estar encarando tudo sozinha (a minha mãe estava na sala ao lado e o Mirco foi sumariamente enxotado por mim), a obstetra repetindo “vai, vai, força que os cabelos estão chegando!”, eu empurrando, sem gritar mas fazendo nnnnnnng! até a garganta doer… e nada. As contrações não eram fortes o suficiente. No final das contas me deram uma oxitocina básica e logo depois a Carol saiu, se esgoelando. Apgar 10 e 10. Nasceu às seis e meia do dia 27. Um parto relativamente rápido e sem complicações, com dois pontos de episiorrafia, mas quer saber… VAI DOER ASSIM NA CASA DO CARALHO. Ninguém merece, juro. Não consigo nem imaginar esse povo que encara trabalho de parto de não sei quantas horas sem anestesia.

Agora… Ô país mais atrasado, vou te contar – Foligno é o ÚNICO hospital de TODA A ÚMBRIA a oferecer epidural grátis e disponível 24 horas por dia. E quando eu dizia que ia ter neném em Foligno porque tinha epidural, todo mundo me olhava de modo estranho e perguntava, “ué, mas por que você quer epidural?”. Juro. Zaireeeeeeeeeeeeeee!

(A minha resposta pronta era “porque não estamos mais na Idade Média, dahling”).