31.07.05

*sigh*

Ontem foi um dia miraculoso. Paulo Cintura cancelou a aula da uma às três, o Salame não pôde alongar a aula de meio-dia à uma, almoçamos em Torgiano e a comida estava ótima, a tradução dos materiais de construção está na metade e revelou ser menos difícil do que eu imaginava (embora não o suficiente pra deixar que eu tirasse uma soneca depois do almoço), jantamos na festa do ganso na bela e fresca Bettona, e fechamos a noite nos perdendo em Spoleto, pro papai ver a Ponte das Duas Torres, construída sobre a antiga estrutra de um aqueduto romano.

Hoje vamos almoçar na Arianna, pra fazer companhia pra avó do Mirco. Ettore e Arianna vão a um encontro de carros de época em Collemancio, perto de Cannara, e vão almoçar por lá mesmo.

E depois tenho que voltar pros malditos tijolos, telhas, portas, traves, calhas. Se arrependimento matasse.

Postado por leticia em 09:26

30.07.05

livrinhos

Esse calor me cansa. Parece que vai melhorar nos próximos dias, mas por enquanto ainda é um parto sentar aqui e traduzir do italiano pro inglês um relatório cheio de estranhos materiais de construção, quando poderia estar deitada na cama, o ventilador na cara, lendo Nicolas Eymerich, Inquisitore, de Valerio Evangelisti, que é interessante pelo assunto mas estilisticamente pouco atraente. O diabo é que é o primeiro de uma série. Malditos autores de séries.

Meu pai trouxe com ele uma bolsona de coisas que minha mãe mandou por ele quando esteve no Rio, mês passado. Então ganhei sapatos, camisas escandalosamente bonitas, banana passa, gelatina Royal, bijuterias lindas, e os livros que comprei pelo Submarino: Equador (Miguel Sousa Tavares), dica da paratyfílica Newlands, A Língua Exilada (Imre Kertész), se não me engano dica da Cora, e alguns clássicos russos e da literatura brasileira.

O problema é que também comprei coisas em francês mês passado, mas preciso de tempo, paciência e dicionário pra dissecar esses livros, já que ainda titubeio um pouco quando leio o Le Figaro. Mas o tempo, cadê, cadê?

Postado por leticia em 15:17

29.07.05

caldo infernale

Ontem foi, tenho certeza, o dia mais quente do ano por aqui até agora. Voltando da oficina de lambreta ao meio-dia e meia, enfiada na jaqueta leve de algodão que sempre uso quando saio de motorino pra não bronzear os braços, achei que fosse desmaiar de tanta abafação. A massa quente que eu singrava era tão infernal quanto o bafo que nos saúda quando abrimos o forno pra ver se o bolo está pronto. Juro que nunca senti tanto calor na minha vida. Nem no 157 no engarrafamento na São Clemente, na hora do almoço em pleno verão carioca. Juro.

Postado por leticia em 22:30

28.07.05

less is more

Miraculosamente consegui terminar a série The No. 1 Ladies' Detective Agency, de Alexander McCall Smith. Os livros são deliciosos, simples como a vida no Botswana – simples são a linguagem, os personagens, as reflexões, os casos resolvidos por Mma Ramotswe. Facilmente devoráveis. Recomendo.

Postado por leticia em 22:33

27.07.05

é chato ser foda

Uma das coisas boas da Itália é que, apesar do preconceito com os imigrantes, a meu ver plenamente justificável e que muito freqüentemente compartilho completamente, é que a curiosidade dos botenses às vezes é grande o suficiente pra vencer o preconceito.

Explico. Meu currículo de tradutora já correu o país inteiro, mas entendo que não deve ser muito comum ler coisas tipo "formada em Medicina", "Cambridge Proficiency", "professora de inglês", "ex-vendedora de salame de javali", "curso de roteiro cinematográfico na PUC-RJ", "nascida no Rio de Janeiro, Brasil", tudo isso no mesmo currículo. Então é normal que neguinho só me ligue quando a coisa aperta e surgem trabalhos bizarros que ninguém tem capacidade, ou vontade, de traduzir, e só alguém com um currículo tão estranho e inverossímel quanto o meu tem saco pra encarar. Mas às vezes acontece, e com isso já fiz trabalhos pra agências de tradução de Biella, láaaaaa nos confins do Império Austro-Húngaro, pra empresas na Toscana, e semana passada me ligaram de Foligno pedindo a tradução de uns textos técnicos sobre extintores de incêndio. Não posso ir a Biella nem quero me desabalar pra Toscana pra conhecer as outras agências, mas Foligno é aqui do lado, então liguei avisando que eu ia aparecer pra ver pessoalmente em que pé estavam as coisas. E fui, de carona com meu pai.

E o que aconteceu foi o seguinte: enquanto eu conversava com a dona da agência, uma morena muito escura por causa de melanócitos excessivamente ativos (assim ela me disse), entrou na sala um senhor barbudo e branquelo, de camisa pólo azul-celeste. Ela pediu que ele, inglês da gema mas com experiências de vida na França, na Espanha e em outros lugares, conversasse um pouco comigo em inglês. E aí repetiu-se a cena que sempre acontecia na loja do Fabrizio, o Louco: uma espécie de jogo de adivinhação, pra ver se ele descobria, pelo meu sotaque, de onde eu era. Cismou que eu era americana, e eu neguei. Começou a enunciar todos os países de língua inglesa, e eu, rindo, balançando a cabeça. Sobrou Malta, ele disse, mas o inglês maltês é esquisito. Tem certeza que você não é californiana?

Tudo isso resultou em uma nova oferta de trabalho. Porque o andar de cima é da agência de tradução, e no andar de baixo funciona, sempre pertencendo à mulher dos melanócitos assanhados, uma filial de uma famosa escola de inglês aqui do interior da Serra Leoa. Segundo o senhor inglês, que é um amor, é claro que posso dar aula (eu já tinha falado com essa escola pelo telefone, pra pedir o número de fax pra mandar o currículo, e foram muito enfáticos ao me dizer que só contratam native speakers), desde que, claro, não diga que sou brasileira. Então ficou combinado que quando (e se; não discutimos salário nem nada ainda) eu começar a dar aulas, vou virar nativa da Flórida. Então tá.

O chato de Foligno é que eu não posso ir de lambreta. E que se eu realmente conseguir voltar a estudar, vai ficar fora de mão pacas, porque é na direção oposta à de Perugia. Mas a gente dá um jeito.

E eu que só queria que me dessem livrinhos legais pra traduzir. SOMEONE GIVE ME SOME GOOD FUCKING LITERATURE!

Postado por leticia em 21:52

26.07.05

:)))))))))))))

Vocês estão acompanhando o mundial de esportes aquáticos no Canadá? Eu fico hipnotizada com as imagens. Ando dormindo pouquíssimo porque fico até tarde vendo aquela gente se remexendo na água fresca, enquanto eu morro de calor na cama.

Merecidíssimo o ouro francês no nado sincronizado individual. A francesinha, bonita e elegante, com cara de safada, fez uma coreografia muito legal, ao som de uma música animada. Aliás, já perguntei isso aqui, mas acho que é mais uma daquelas perguntas que permanecerão sem resposta por todo o sempre: por que diabos toda música de patinação, nado sincronizado e outros esportes viados é sempre um porre? Caramba!!! A francesinha não, a música era, hm, estranha, mas fácil de teatralizar, e a atleta é expressiva, recita parágrafos inteiros com um olhar, e ainda por cima nada sem aquele maldito pregador no nariz, ou seja, nada de rosto deformado. Bár-ba-ra. Mereceu de verdade, eu achei.

Maravilhosas as imagens debaixo d’água dos nadadores no início da raia, na partida ou logo depois da virada, quando dão pernadas de golfinho com os braços alongados acima da cabeça. Lindos, sereios, todos, homens e mulheres. As mulheres são interessantes de ver: as japonesas, bronzeadíssimas; as australianas, sorridentes; as americanas, iguais; as chinesas, minúsculas; as alemãs, rígidas; as polonesas, sérias; as canadenses, decepcionantes; as suíças, poucas. Os homens são todos deuses, com aqueles músculos que parecem ter sido desenhados daquele jeito todo natural, que dão vontade de tocar pra ver se são de verdade, de contornos tão suaves e ao mesmo tempo tão claramente definíveis. Os atletas talianos, claro, são os únicos machos da competição com sobrancelhas feitíssimas. Um deles papou uma medalha de ouro, numa prova em que o insosso di Phelps parece que baianizou e chegou entre os últimos. Os ombros são largos, trapézios e dorsais salientes pululam pra fora dos maiôs e macacões estilo tubarão. Onde foram parar as sunguinhas?

Divertidíssimas as imagens debaixo d'água dos jogadores de polo aquático. Na superfície, aquela chatice, bolinha pra cá, bolinha pra cá, aquela touquinha feia. Do peito pra baixo, o pau comendo soltíssimo, um puxa a sunga do outro, cotoveladas a torto e a direito, chutes bem mirados, abraços de tamanduá.

E vou dormir sonhando com os meses em que nadei das cinco e quarenta da manhã às seis e meia, eu e todos os velhinhos da Tijuca.

Postado por leticia em 23:56

25.07.05

Éri Potter-â, como se diz aqui

Meu Harry Potter finalmente chegou, maldita Amazon e malditos correios italianos. Mas preciso de calma pra ler, e com todo esse calor e com meu pai meio que por aqui e com o fim do mês chegando e trazendo consigo as faturas de julho pra resolver, joguei pra escanteio. Li as primeiras páginas e notei que não lembro mais de coisa nenhuma. Talvez seja melhor recomeçar do início da série, só pra dar uma refrescada na memória. Sacrifício... ;)

Postado por leticia em 22:37

24.07.05

russian sunflowers, anyone?

Meu pai chegou no civilizadíssimo horário de três e meia da manhã. Descambei-me pra Santa Maria pra entregar-lhe a chave do quarto, já que o hotel é pequeno e não tem recepção aberta à noite. Fui dormir às cinco e meia.

O resultado foi uma enxaqueca daquelas de querer dar um tiro na cabeça. Em vez do tiro, tomei meu remedinho mágico, esperei uma horinha e a maldita dor foi-se, enquanto assistíamos ao Valentino Rossi ganhar mais uma e botar o coitado do Alexandre Barros no chinelo.

Ainda conseguimos ir jantar na ridícula festa do vinho, em Collemancio. Mas quando cheguei em casa a cabeça ainda latejava. Maldita, maldita dor.

Postado por leticia em 23:30

23.07.05

babbo

Ontem acordei cansadíssima. Tinha sonhado que estava com algum problema nos meniscos. O sonho era tão real que acordei com os joelhos doendo, e a dor só passou quando entendi que não estava mais dormindo. Que horror.

**

Meu pai deve chegar hoje. Veio de carro de Portugal. Ontem fomos visitar o Leguinho e fiquei imaginando qual vai ser a reação dele quando vir meu pai, que ele não vê há sei lá quanto tempo, uns três anos? Ele sempre adorou papai. Nossa teoria era que ele estava acostumado a viver rodeado de mulheres – eu morei um tempo com a minha avó, e além de nós duas só vinha a Lúcia, a faxineira, lá em casa. Meu pai tem uma voz grossa e rimbombante, e sempre achamos que aquilo devia ter um grande efeito sobre o coitado do cachorro. Estou curiosa, vamos ver a que horas papai vai chegar.

Postado por leticia em 09:04

22.07.05

ai, meus tomates

Com as temperaturas tórridas das últimas semanas, todo pé de tomate da Itália está carregado de frutos. Aqui no interior do Zaire mesmo quem não mora em casa e não tem quintal conhece alguém que mora e tem, e que dá tomates de presente pra quem não mora e não tem. Como conseqüência, todo mundo está entupido de tomates e não tem nem mais a quem dar de presente. Até eu, que não tenho nada a ver com a missa, estou com a geladeira botando tomate pelo ladrão. Um velhinho pra quem Mirco fez um pequeno conserto nos pagou com duas sacolas cheias de tomates. Alguns despachamos pra Gianni e Chiara, que grunhiram "ai, não, mais tomates" porque a mãe do Gianni mora em casa e nessa época do ano planta, bem, tomates. Outros, os mais maduros, usei pra fazer molho e congelar. Mas mesmo assim ainda temos uma sacolona cheia, mais alguns verdes pra salada que pegamos ontem à noite na Arianna.

Abobrinhas também estão com tudo nessa época do ano. A diferença é que eu adoro abobrinha, enquanto que o tomate cru não me apetece, e mesmo o molho não me anima muito. Quase sempre faço macarrão com molho de tomate pro almoço do Mirco, enquanto eu mesma como o mesmo macarrão "in bianco", com abobrinhas e/ou cenouras e/ou atum ou salmão, ervilhas, milho, enfim, na hora invento. Ontem almocei massa curta com abobrinha, cenoura e grão-de-bico. Ficou ótimo.

Melões e melancias também estão no auge. Não gosto muito de frutas, e essas duas em particular eu detesto, mas gosto de ver caminhões cheios delas estacionados nas beiras das estradas, vendendo imensas melancias suculentas e lindos melões tipo cantaloop, aquele todo estriado fora e laranja dentro. Gostaria de gostar de melão e melancia. Aqui fazem o maior sucesso, e melão com presunto cru é um dos mais clássicos pratos de verão, ainda mais pro jantar, quando é melhor comer menos.

Só não ousem botar as frutas na geladeira. O melhor método pra "refrescar" frutas é deixá-las dentro de uma bacia com água fresca, de preferência do poço (água de poço é SEMPRE fresca, e no inverno endurece as mãos de tão fria). Lembrem-se que melancia gelada dá dor de barriga.

Ho ho.

Postado por leticia em 09:01

21.07.05

a rã arranha a aranha

Hoje sinto que poderia ter morrido.

Quando fui pegar o motorino de manhã, pra ir buscar meu salário mais do que atrasado na escola, por acaso dei uma olhada no capacete antes de enfiá-lo na cabeça. Por acaso vi uma teia de aranha. Por acaso olhei dentro do capacete e vi uma aranhona marrom, daquelas bonitonas, com as pernas finas e elegantes. Sacudi a bichinha pra fora, pedi desculpas por destruir sua nova casinha, limpei as teias. E depois respirei fundo e me acalmei, porque o nervoso que me deu quando percebi a aranha em tempo, e entendi que se não tivesse percebido nada e ela tivesse começado a se manifestar dentro do meu capacete com a minha cabeça lá dentro também, eu com certeza, COM CERTEZA teria tido um acidente muito sério.

Postado por leticia em 15:10

20.07.05

gente chata é foda

Hoje me estressei com um marroquino nos correios.

Não tinha fila; era aquele horário morto de logo-antes-do-almoço em que, em um país de mangioni como a Itália, ninguém ousa sair de casa pra não perder o rango. Como sou uma menina prática e saio de casa com toda a papelada preenchida e devidamente ordenada, fui direto ao balcão com a minha tralha (uma sacola de compras que não coube no porta-treco do motorino) e meus três conjuntos de coisas a resolver: o papel pra depositar dinheiro na conta, o papel pra depositar dinheiro na poupança, e a conta de água pra pagar. Junto comigo tinham entrado na agência dois marroquinos, que voaram na minha frente pra pedir um carnê em branco pra pagar sei lá o quê. Vejam bem, já começaram mal; eu tenho vários carnês em branco em casa e na oficina, porque se precisar pagar alguma coisa nos correios eu preencho e já chego lá com tudo pronto. But that's just me.

Continuaram mal, porque em vez de ir a uma das mesinhas que estão ali pra isso mesmo, ou seja, pra neguinho preencher coisas, ficaram no balcão ao lado do meu. Enquanto um preenchia, o outro ficava me olhando. Eu lá com a carteira aberta, documentos à vista, dinheiro espalhado nos três montinhos diferentes (o da conta, o da poupança e o da conta de água), e o diabo do marroquino me olhando. Até que não resisti e pedi muito educadamente se ele não podia fazer o favor de ir um pouco mais pro lado.

Pronto! Caiu o céu sobre as nossas cabeças.

- Qual é o problema?

- O problema é que eu não gosto de ver que tem gente pendurada no meu ombro enquanto eu faço as minhas coisas.

- Eu não estou fazendo nada.

- Não importa, não quero ninguém olhando quanto dinheiro eu tenho na carteira.

- Tá me chamando de ladrão?

- [bufando] Olha só, fofo, esse negócio de preconceito comigo não cola, porque eu sou tão imigrante quanto você. A diferença é que eu não incomodo os outros. [E que tenho os dentes, digamos, melhorzinhos. E falo italiano direito. E sou cheirosa. Entre outras coisas.] Você poderia ser qualquer outra pessoa, o papa, o Bono, o Tolkien em pessoa, e eu iria ficar irritada do mesmo jeito. Não quero ninguém respirando na minha nuca enquanto eu cuido da minha vida.

- Tá me chamando de ladrão! Eu não fiz nada! Eu fico onde eu quiser!

- Fica onde quiser coisa nenhuma. Não tá vendo a placa ali no começo da fila? "Por uma questão de privacidade, por favor aguarde sua vez atrás da linha amarela". Tá vendo?

- Eu não sou ladrão! Não me interessa quanto dinheiro você tem!

- Ainda bem, até porque eu não tenho nenhum mesmo. Mas não quero ninguém bafejando no meu cangote. [ainda mais com esses dentes cor de ferrugem].

Antes que ou eu ou ele resolvesse cair na porrada, uma funcionária que estava arrumando elásticos num canto resolveu abrir outra caixa, bem longe de mim, e chamar os marroquinos.

Ora, tenha santa paciência. Depois não sabem por que ninguém os suporta.

Postado por leticia em 15:01

19.07.05

da série pequenas coisas...

Já comentei aqui antes o quanto é uma mão na roda ter um lanterneiro na família.

Meu capacete é daqueles completos, que cobrem também o rosto e a mandíbula, e não só o topo da cabeça. É grande demais pro espaço embaixo do selim, então toda vez que eu saía de casa com o motorino tinha que ficar carregando aquele maldito capacêtchi pratchiádu, como diz o Mirco, pra cima e pra baixo. E poucas coisas na vida são menos portáteis do que um capacete.

Em um fornecedor de peças, procurando sei lá o que pra um caminhão, Mirco bateu os olhos num porta-trecos daqueles que se fixam na traseira das lambretas e das motos. Vagabundo, de plástica tabajara, mas com chave, com alça e removível. Trouxe pra casa e pronto, chego eu tarde em casa, cansada depois da aula com os Salames, o Mirco jantando com Gianni e Chiara, e dou de cara com aquele negócio em cima da mesa da sala, com um bilhetinho.

No dia seguinte aproveitamos que tinha pouco movimento na oficina e bolamos um jeito de fixar o negócio na lambreta, que é modelo velho e não tinha a base metálica que serve justamente pra isso. Mirco inventou um sistema lá maluco, pegou uns restos de chapa de ferro, dobrou, limou, cortou, furou, pintou de preto, aparafusou, e pronto! Ganhei um porta-treco de lambreta. Não posso me empolgar e entupir de compras, senão o peso na traseira fica grande demais e a lambreta não pára de pé. Mas é o suficiente pra botar o capacete. Maravilha :)

Postado por leticia em 23:07

18.07.05

il segretario

O novo secretário é gente boa. Meio infantilzinho, mas aqui é coisa comum. Fisicamente é a cara do meu irmão, só tem os cabelos mais claros. É bonzinho pacas e está aprendendo rápido. Não é nenhum primor de esperteza e dinamismo e tenho a impressão de que em um determinado momento vai ter que escolher: ou acordar pra vida e ficar esperto, ou sofrer feito um cão na mão do Ettore e do Mirco, que são pessoas maravilhosas mas quando se trata de trabalho e coisa séria viram bicho.

Estou gostando de explicar as coisas pra ele. Juntos estamos revendo todo o meu método de trabalho. Ele é interessado e pede explicações, dá sugestões. Miraculosamente tem mais intimidade com o computador do que a imensa maioria da sua geração, o que já é um grande ponto a seu favor. Fiz pra ele um passo-a-passo do que fazer quando chega uma fatura, quando chega um caminhão, quando chegam peças pra pintar, quando chegam peças de um fornecedor. Expliquei que se a gente mantiver um método de trabalho, as chances de errar são pequenas. Expliquei que esse meu método de trabalho não veio do nada, mas de adaptações do que a coitada da Elisabetta, menina confusíssima, fazia antes, e de outras coisas que eu inventei pra simplificar a minha vida escritorial. Ele ficou todo agradecido e já começou a sacar umas coisinhas básicas.

Parece que vai funcionar bem. Acendamos velinhas.

Postado por leticia em 21:15

17.07.05

altro matrimonio

Ontem fomos a um casamento legal. Mario Belli, o florista de Santa Maria, e Maria Rita, siciliana criada aqui no interior do Zaire.

A festa foi legal porque a cerimônia foi relativamente rápida, e porque Gianni e Chiara também foram convidados (o Gianni faz natação com o Mario). O jantar foi num lugar lindo, lá pros lados de Valfabbrica, com uma vista maravilhosa e um ventinho fresco delicioso pra aliviar o calorão. Os convidados eram jovens e muito alegres. A mesa em frente à nossa fez uma bagunça desgraçada, obrigaram o garçom (que se chamava Carmine) a beber, fizeram poesia erótica pro noivo, pediram pro frade Carlo tirar a roupa, brindaram em rima a noite toda.

O cardápio: um zilhão de antipasti, frios e quentes. Risottino mantecato alle fragole ed ortica (risoto com morangos e urtiga. Eu juro que tava bom, a não ser pelos morangos, que não tinham nada a ver, apesar da moda de fruta na comida). Ravioli primavera al tubero nero di Norcia (ravioli tricolores com trufas pretas de Norcia). Tagliata di Angus aromatizzata (carne argentina – cof cof – cortada em fatias, temperada com vinagre balsâmico) e verdure grigliate (abobrinha, tomate e berinjela na grelha). Filetto al pepe verde e rosa (filé de vitela com pimenta verde e rosa), flan di patate (um pudinzinho de batata que era pura farinha), bouquet di fagiolini (um raminho de vagens amarradas com bacon) e insalatina capricciosa (uma saladinha básica). E depois o bolo de casamento, que era um mil-folhas com creme, que dispensei pela ausência de cacau.

A noiva estava linda – os sicilianos costumam ser bonitos e ela não é diferente. O vestido era elegante e simples, e só o cabelo tava meio esquisito. O Mario é bonitão, altíssimo, forte, simpático. A mãe dele é muito gente boa, e apesar da recém-viuvez estava muito feliz. Roberto e Cristiana, também nossos amigos, estavam na mesa com a gente, mas em um inexplicável gesto de extremo mau-gosto "tiveram que sair" mais cedo. Considerem que um jantar desse tipo custa mais ou menos 70 euros por convidado, e sair no meio é um terrível desperdício do dinheiro dos noivos. Ainda mais quando o presente dos convidados (ele é RIQUÍSSIMO, ÍSSIMO, ÍSSIMO) foi ridículo – um guia da Califórnia, onde os esposos vão passar a lua-de-mel, e uns trocados em dólar "pra comprar um chiclete no aeroporto". Una figuraccia, um papelão. Enfim. Fora esse detalhe que deixou todo mundo meio desconfortável, até que me diverti. Chegamos em casa muito tarde, e chapamos lindamente.

Postado por leticia em 15:26

15.07.05

hm

E nessa onda de pensamento positivo a respeito da faculdade, resolvemos fazer um pedido ao centro do emprego em Bastia, pra que encontrassem uma nova secretária pra oficina. Se eu conseguir realmente estudar, a partir de setembro não vou mais ter tempo pra ficar lá, e conseqüentemente vamos precisar de uma secretária.

Confesso que a idéia ao mesmo tempo me alegrou e me entristeceu. Alegrou porque é um porre ficar ali na oficina, porque eu e Mirco brigamos muito quando trabalhamos juntos, e porque eu não quero toda aquela responsabilidade. Entristeceu porque não deixa de ser chato perder esse tipo de conhecimento, de controle, de poder. Uma espécie de ciuminho, sabe. Há outros motivos também, mas são só meus.

Mas é por uma boa causa. Apesar do curso que eu quero fazer (Comunicação Internacional) não ser muito badalado/reconhecido e conseqüentemente não ser do tipo que abre portas profissionais muito facilmente, tem muita coisa interessante no currículo. Eu já sendo velha demais pra ser contratada como aprendiz (ganha-se uma titica e o empregador não paga impostos), quando eu me formar (olha o otimismo) alguém que estiver interessado em mim vai ter que necessariamente me contratar normalmente, o que é muito bom. Então vamos pensar positivo, acender velinhas, essas coisas.

Postado por leticia em 22:46

14.07.05

como é difícil estudar nesse país

Depois de muito tribulare, finalmente consegui entrar em contato com a agência pelo direito ao estudo de Perugia. Por semanas só conseguia ouvir a voz automática mandando apertar 1 se quisesse saber se tenho direito a comer de graça, 2 pra saber minha nota na faculdade, 3 se quisesse saber se meu pedido pra estudar no exterior foi aprovado. Nada de aperte 0 pra falar com alguém, e eu precisava falar com alguém, já que só queria saber o que raios tenho que fazer pra entrar com um simples pedido de bolsa. Por acaso, descobri o número direto do setor bolsa de estudos (até então eu estava ligando pros números que encontrava no site da agência e na lista telefônica), e me mandaram fazer primeiro o pedido on-line, pelo site.

O site estava atualizado, jacaré? Não, né. Clicando no botãozinho "pedido de bolsa" abre-se uma janelinha dizendo "não é mais possível fazer pedidos para o ano acadêmico 2004/2005". Lindo, né. Liguei de novo pra agência e a menina disse ah é, só vão atualizar no dia 18... Quero só ver. Pode ser que seja uma coisa tão complicada preencher o tal pedido que eu precise ir até lá pra ter um mínimo de assistência, já que por telefone já vi que a coisa é complicada. Vamos ver no que vai dar.

Postado por leticia em 22:36

13.07.05

uia

A notícia não boa da semana é que a namorada dos cachorros está no cio outra vez. Toda hora ela vem encher o saco dos meninos, estacionando-se do lado de fora do portão do quintal e tentando os coitados com olhares sensuais e piscadelas. O resultado é que todos ficam de mau humor, a não ser o Demo, que é leve e consegue escalar mesmo a cerca mais alta, e some a noite inteira. Chega de manhã ou de madrugada exausto, chorando pra que alguém lhe abra o portão. Até aí tudo bem, sempre foi assim. Só que hoje de manhã ele apareceu, depois de mais uma noitada de sexo selvagem, com um buraco na testa, tão fundo que se vê até o osso. Não se sabe o que aconteceu; pode ter sido outro cachorro, pode ter sido um carro, alguém pode ter dado uma porrada nele. O fato é que o Ettore ficou impressionado com o tamanho da cratera, e chegou até a ter pena do bicho – e quando chega a esse ponto é porque realmente é A CRATERA. Não quero nem ver.

Postado por leticia em 22:31

12.07.05

:))))))))

E a boa notícia da semana é que meu pai vem me visitar. Ainda não sei quando, mas vem.

Postado por leticia em 07:26

11.07.05

contact

Sabem quem me cumprimentou, a seu modo, claro, hoje de manhã? Um coelho selvagem. Eu vinha correndo pela via Sofia e quando fiz a curva da pontezinha dei de cara com ele. Ficou parado na beira do campo de girassóis, muito sério, me olhando com os olhinhos piscando. Depois de alguns segundos de contato visual, deu de ombros e sumiu no campo.

Postado por leticia em 22:24

09.07.05

teste: você é italiano?

1) Você está andando a 20 km/h na rua principal da sua cidadezinha, na hora do rush. Atrás de você, uma fila de carros andando devagar, por sua causa. Você tem que virar à esquerda pra ir comprar gel pro cabelo na Acqua e Sapone. Você:

a. Dá a seta pra esquerda, reduz e vira, necessariamente nesta ordem.

b. Reduz mais ainda, pára, dá a seta pra esquerda, espera mais um pouco e vira, devagar. Não necessariamente nesta ordem.

c. Reduz mais ainda, pára, dá a seta pra esquerda, espera mais um pouco, e quando os motoristas atrás de você começam a buzinar e te ameaçar de morte, você bota a mão pra fora, junta as pontas dos dedos, sacode a mão e grita "ma che cazzo vuoi?".

2) Você está novamente na avenida principal da sua cidadezinha, novamente na hora do rush, quando todos estão doidos pra chegar em casa pra almoçar aquele pratão de macarrão. Há vários ônibus de turismo avacalhando mais ainda o trânsito, velhinhos de bicicleta, adolescentes de lambreta, velhos quase cegos dirigindo Api, ou seja, o máximo de caos que é possível encontrar em uma cidade pequena no interior do Zaire. À sua direita, há uma baia para os ônibus municipais, bem em frente a uma banca de jornal. Você se lembra de que não comprou La Gazzetta dello Sport hoje ainda. Você:

a. Continua na sua direção normal, liga a seta, vira à esquerda cinco metros adiante no estacionamento em frente à banca de jornal, estaciona o carro, faz dez passos pra atravessar a avenida, compra o seu jornal e volta pro carro.

b. Mete o pé no freio, não lembra que existe seta, e joga o carro na baia do ônibus, deixando-o estacionado igual à sua cara enquanto você vai comprar o jornal e bater papo com o jornaleiro. Quanto maior for seu carro e mais torto estiver estacionado, mais será difícil, pra quem estiver saindo do estacionamento dos correios, ver se há carros vindo da esquerda.

c. Opção b, mas com a mão pra fora do carro, gesticulando, e berrando pela janela, para os motoristas que buzinam atrás de você: "mavaffanculo, va'!".

3) Você está vindo de Perugia na direção de Foligno. Há dois quilômetros placas vêm avisando que quem quer ir a Foligno deve manter-se à direita, e quem vai a Cesena deve ficar na esquerda. Você vai a Foligno. Você:

a. Pega a direita o mais rápido possível, depois de ultrapassar um caminhão lento que virou à direita na direção de Terni, 50 metros antes da saída pra Foligno.

b. Fica na esquerda, não porque está ultrapassando ninguém, mas porque é mais legal, até o último minuto possível, quando então joga o carro pra direita, fechando quem vinha atrás e passando por cima da zebra e a dois centímetros da divisória de concreto.

c. Opção b, e quando o motorista de trás pisca o farol você olha pelo retrovisor, levanta a mão direita, junta a ponta dos dedos e diz claramente "che c'è, stronzo?".

Postado por leticia em 08:16

08.07.05

Post PMM (Para Mim Mesma)

até o presente momento:

Matilda (Roald Dahl)
Kingdoms of the Celts (John King)
The Great Gatsby (Fitzgerald)
Great Expectations (Dickens)
I Racconti (Tommaso di Lampedusa)
The Da Vinci Code (...)
Lady Chatterley’s Lover (D. H. Lawrence)
The BFG (Roald Dahl)
The Old Man and the Sea (Hemingway)
The Curious Incident of the Dog in the Night-Time (Mark Haddon)
La Voce del Violino (Andrea Camilleri)
La Stagione della Caccia (Andrea Camilleri)
The Importance of Being Earnest (Oscar Wilde)
Bartleby (Herman Melville)
Salem's Lot (Stephen King)
Boy (Roald Dahl)
La Gita a Tindari (Andrea Camilleri)
L'Odore della Notte (Andrea Camilleri)
Il Giro di Boa (Andrea Camilleri)
Todas as Festas Felizes Demais (Fabio Danesi)
Io Non Ho Paura (Niccolò Ammaniti)
L'Impero dei Draghi (Manfredi)
The House of Mirth (Edith Wharton)
The Kite Runner (Khaled Hosseini)
Breakfast at Tiffany's (Truman Capote)
Middlesex (Jeffrey Eugenides)
Fight Club (Chuck Palahniuk)
The Bookseller of Kabul (Åsne Seierstad)
The No. 1 Ladies' Detective Agency (Alexander McCall Smith)
The Godfather (Mario Puzo)
The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy (Douglas Adams)
In Patagonia (Bruce Chatwin) – não terminado, chato demais
Un Mese con Montalbano (Andrea Camilleri)
Gli Arancini di Montalbano (Andrea Camilleri)
Henderson the Rain King (Saul Bellow)

Postado por leticia em 07:37

07.07.05

motorino

E por falar em lambreta.

Eu achei que depois do tombo no ano passado eu fosse ficar com medinho de pegar o motorino de novo. Mas foi justamente o contrário: cada vez que saio com ele, mais eu gosto. Nunca vou ter a desenvoltura dos adolescentes que andam dos 14 aos 18 anos de motorino pra lá e pra cá, desviando audazes dos carros e conversando entre si enquanto pilotam, mas já me sinto muito mais segura do que no início. Agora que o calor tá brabo, então, é uma maravilha. Nada de carro-microondas depois de horas no sol. O motorino cabe em qualquer sombrinha e assim o selim não esquenta a sua bunda. Só tem que lembrar de usar filtro solar, senão os braços ficam pretos. Algum tipo de jaqueta também é aconselhável, porque os insetos e pedrinhas e plantinhas que se chocam com o seu corpo durante o percurso na roça são inúmeros.

O Mirco de vez em quando tem nostalgia de lambreta e vai pra oficina ou jantar na Arianna ou encontrar o Moreno ou comprar luvas de borracha no Ipercoop de motorino. Uma vez ele encontrou o Moreno na praça em Bastia, e enquanto estacionava a lambreta levou várias olhadas estranhas de teenagers bastiolos que não gostaram muito da presença de um intruso no seu território. Porque motorino no verão é coisa de adolescente VIP bastiolo, que gesticula pro colega no motorino ao lado enquanto pilota, que cola adesivos no capacete, que usa óculos escuros gigantes da Dior e calça jeans da Richmond e camiseta Datch. (No inverno motorino é coisa de imigrante pobre que não tem carro e tem que encarar o vento gelado na fuça). Achei engraçada a história, o Mirco intimidado por adolescentes por ser velho demais pra andar de lambreta :)

Obs.: Claro que velho também anda de lambreta. Lambreta velha. Daquelas que você tem que pedalar pro motor pegar, e que não passam dos 20 por hora. São foférrimos os velhinhos de motorino.

Postado por leticia em 18:30

06.07.05

ai meus sais...

Paulo Cintura acabou de ligar cancelando a aula. Tá com diarréia, segundo ele porque comeu melancia gelada ontem à noite.

E viva a hipocondria italiana.

Postado por leticia em 17:48

05.07.05

uhuuu

Hoje fiz uma coisa muito maneira, aproveitando que o Aluno Gentil e a Quarentona Estressada cancelaram as aulas: fui ao aeroporto de bicicleta, pegar nossas passagens de agosto pra Parrí. Não é o máximo? Aproveitei que o dia tava nublado e não tava muito calor, tinha um ventinho de chuva esquisito mas não forte o suficiente pra dificultar as pedaladas, e lá fui eu, quinze minutos de ida e quinze de volta entre campos de girassol, milho e linho (que tem a maior pinta de capim vagaba), até o Aeroporto Internazionale dell'Umbria (cof cof). A mocinha extremamente enrolada da Alitalia disse que é quase certo que titio dará as caras por essas bandas, mas não antes de 2006. Mas se for verdade, me aguardem, fofos, porque pior que a gente, só o Tom Jobim que passava o fim de semana em NY: vamos almoçar em Paris e jantar em Londres váaaaaaaaarias vezes... ;)

Postado por leticia em 17:52

04.07.05

a foca

Há alguns dias nossa querida vizinha fofoqueira, a Foca Monaca, nos surpreendeu. Eu sei que ela freqüenta a tia chata do Mirco, mas não imaginava que se lembrasse dos nossos nomes, até porque não damos muita confiança. Mas outro dia cheguei em casa depois de uma aula com o Paulo Cintura, às dez da noite, e dei de cara com ela e a família pegando um arzinho fresco em cadeiras de plástico no jardim de casa. O yorkshire histérico, que acho que se chama Jimmy mas não tenho certeza, começou a latir. Aí veio a surpresa, porque ela começou a falar com o cachorro, vai lá, Jimmy, vai lá com a Letizia, olha quem é, é a Letizia, Jimmy! E eu pensando, comé que essa mulher lembra do meu nome? Porque aqui, mesmo todo mundo me chamando de Letizia que nome mais italiano não existe, o fato de que eu não sou italiana faz com que todos esqueçam meu nome, automaticamente, como se eu me chamasse Mohamed, Ivanova, Suely Maria, Rosemary, Tanaka, Shun-Li ou outra coisa que eles não conseguem pronunciar. Estranhamente, quando eu chamei o cachorro veio, em vez de continuar latindo como sempre faz. Veio, e ainda deitou no chão, no meio da rua, de barriga pra cima. Enquanto fiquei lá coçando a barriga dele, porque afinal de contas ele é histérico e chato mas é sempre um cachorro, leia-se gente boa, a Foca se aproximou e começou o interrogatório:

- Ué, cadê o Mirco?
- Não sei, acabei de chegar, ainda não nos falamos. Não sei nem se está em casa.
- Eu achei que você trabalhasse com ele.
- Também trabalho com ele. Mas dou aula de inglês em Perugia quando não estou na oficina [reparem no meu estranho bom humor nesse dia; em vez dos tradicionais sim e não resolvi ser explicativa]
- Ah tá... E volta a essa hora?
- Pois é, coisas da vida.
- Você faz a contabilidade da oficina?
- Faço, entre outras coisas.
- Ah tá... E não tem secretária não?
- Não, sou eu a secretária agora, só que eu não fico lá oito horas por dia.
- Ah tá...

Nisso chega o Mirco de lambreta. Olha ele aí, eu digo. Por isso que ele não ligou como faz sempre quando termino de dar aula, porque tava de lambreta.

- Ué, mas ele usa lambreta? E o carro?
- Fui jantar na casa da Arianna [o Mirco não chama os pais de pai e mãe, mas de Ettore e Arianna]
- Ah tá... Mar por quê, o carro quebrou?
- Não, é que tá fresquinho, gosto de andar de lambreta. E eu queria parar na estrada pra pegar um girassol pra Z [sou eu], mas estavam todos muito longe da beira da estrada, não consegui.
- Ah tá... Então essa lambreta é de vocês, não sabia...
- Bom, vamos subir, né? Boa noite!
- Boa noite, boa noite!

Na manhã seguinte saímos cedo pra oficina e vimos a Foca sentada, de camisola lilás de babados, no balancinho do quintal. Dormindo.

Postado por leticia em 23:21

03.07.05

juruna e eu

Não sei como, mas Moreno conseguiu nos convencer a ir ao Lago Trasimeno com ele, a nova namorada e mais dois casais.

Praia na roça é assim: tem nome (Zocco Beach. ...), é gramado e não areia, é lago e não mar, a mulherada vai de salto alto, não se vêem cangas mas só toalhas com araras e golfinhos, ninguém cai na água porque é lamacenta, não tem guarda-sol mas tem a sombra das árvores, e tem o stand da rádio local, com DJs pentelhos que saúdam a galera "in" que passa, como se ser "in" em Bastia Umbra ou Magione ou Passignano sul Trasimeno tivesse o poder de alterar rotas de meteoros ou de mudar o destino da humanidade. Santa paciência, Batman.

Jantamos torta al testo num lugar de beira de estrada perto de Magione. O lugar é famoso e a fila era colossal, a comida não era lá essas coisas, o peixe tava salgado, o presunto idem, a nota fiscal não especifica os itens nem os preços, o que facilita a picaretagem. De fato, na nossa mesa pagamos por duas garrafas de Coca que nunca chegaram, e por uma salada de camarão (a minha) que também não se fez viva.

E terminamos o dia tomando sorvete em Magione, cidadezinha que não conhecíamos.

O problema nem foi o programa de índio, porque pra mim qualquer programa que inclua bronzeamento voluntário é necessariamente programa de índio, mas a companhia mesmo. Eu adoro o Moreno, mas ele às vezes é de uma imaturidade irritante, e é natural que escolha companhias igualmente infantis. Sua nova namorada tem 30 anos, ainda tem hora pra voltar pra casa senão o pai dá piti, acabou de terminar uma temporada part-time como assistente em um consultório de dentista, e não sabe o que vai fazer da vida de agora em diante. Outro casal era formado por uma modelo ex-candidata a miss, horrorosa, mondronga e com Q.I. de uva sem caroço, e o namorado é DJ de discoteca e faz as sobrancelhas. Outro ainda era um engenheiro amigo do Moreno que usa bandana na cabeça, mora sozinho porque é divorciado mas a mãe vem limpar a casa e cozinhar e fazer compras pra ele, e a namorada é arquiteta mas se está com um como ele não pode ser nenhum primor.

Eu realmente não tenho mais paciência pra essas coisas, juro.

E o pior é que todo esse povo provavelmente vem jantar aqui em casa sexta-feira.

Postado por leticia em 23:05

02.07.05

titio spielberg

Ontem foi um dia infinito. Manhã na oficina, vários giros de lambreta pra buscar peças, parafusos, tinta e outras coisas legais, almoço corrido, duas aulas seguidas, fofoca com Valerio em vez de aula de francês, e mais uma aula comprida em Perugia. Terminei às nove e meia e fui direto pro cinema, encontrar Mirco e Moreno. Vimos The War of the Worlds.

Olha, eu gosto dessas coisas. Gosto de blockbusters, gosto de E.T.s, acho o Tom Cruise simpático e a Dakota Fanning um bom exemplo de que nem toda criança precoce é necessariamente um nojo. Gostei do filme, mas preciso, preciso ler o livro. Porque acho que VER os E.T.s não era necessário – anzi, acho que o medinho é maior quando a gente fica no escuro, sem saber exatamente do que temos medo. Alguém aqui já leu o livro pra dizer se os E.T.s saci-pererê são descritos fisicamente? E se o final é tão brusco? Mas assim no bojo, eu gostei. Cinema-pipoca dos bons. A única coisa chata é que os filmes do Spielberg são tão, mas tão barulhentos que às vezes me irrito. Tem SEEEEEMPRE cenas com um monte de gente falando ao mesmo tempo, ou, pior, berrando ao mesmo tempo. Sempre muitos, muitos gritos histéricos. Eu detesto gente que grita, ainda mais gente que grita sem parar. Mas no geral vale a pena ver. Os efeitos especiais são maneiros, o roteiro tem ritmo meio desigual mas dá pra levar e, principalmente, a idéia de que os vírus somos nós, baby, já muito bem explicada em Matrix, é a coisa mais parecida com religião que faz parte da minha vida.

Postado por leticia em 10:02

01.07.05

vai pro tronco ou não vai?

Os Salames estão acabando comigo. Não só porque o horário das aulas deles é terrível – terminar o expediente às dez e meia da noite é o ó – mas porque são realmente duas mulas. Ela nem tanto, mas ele, além de mula, é chatíssimo. Chatíssimo, íssimo, íssimo. Junte a isso um calor desgraçado na sala de aula, e pronto, imaginem o nível de endorfinas no meu organismo como anda: no porão do fundo do poço.

A boa notícia, se não pro meu bolso, pra minha saúde física e mental, é que a partir da semana que vem passo uma turma pra Margherita, filha de italianos da Basilicata mas born and bred na Inglaterra. Resolvemos, em reunião, que estudantes mais avançadinhos farão a primeira metade do curso com um professor não native speaker, e na segunda metade pegam um native speaker. Os Mosqueteiros não quiseram mudar de professor e continuei com eles até o fim, e a Quarentona Estressada também, mas com essa turma, que até que é legal mas tarde e longe demais pro meu gosto, deixei bem claro que é uma política da escola e que a mudança seria obrigatória. Depois de um breve muxoxo mudei de assunto e a partir de segunda a pobre Margherita é quem vai chegar tarde em casa. Num güento mais, chega.

Postado por leticia em 23:07