10.06.06

êeeeeeeeeee!

A manhã foi dividida entre fila eterna nos correios, escolha dos pontos de luz e tomadas e telefone e cabo da TV no apartamento novo com o eletricista, passeio de bicicleta na volta pra casa, uns capítulos do Mankell. Depois, almoço de macarrão com frutos do mar e secondo de anéis de lula com vagem fresquinha. Depois, soninho e mais Mankell.

E aí saímos pra comprar meu carro.

O Mirco é assim: quando tem um problema pra resolver, resolve logo. Resolve ontem, se possível. Então já tínhamos acionado uma rede de informantes pra achar um carro a diesel pra mim, mas ainda não tinha aparecido nada de decente. Como diesel consome menos, os carros custam mais, então estávamos procurando algo meio velhinho mas com relativamente poucos quilômetros, possivelmente com a lataria estragada (porque depois os marroquinos pintam na oficina), e logicamente mais confortável do que o Objeto Decadente Identificado que é a Uno que eu dirijo. Natale, cunhado do Marco, trabalha num revendedor decadente de carros usados e cantou a pedra: achou um Corsa preto com a mecânica em ótimo estado (ele é um daqueles raros mecânicos natos, e cuida dos carros da família inteira) e soprou o preço pro Mirco, que foi lá fazer as pesquisas dele. Chegamos hoje no revendedor sem tocar no assunto Natale, lógico. O carro está sem uma calota, com uma lanterna traseira quebrada e com vários arranhões na carroceria. Perfeito. Ano 95, mas só 100.000 quilômetros (a Uno está no quilômetro 200.000 e passa, depois de ter já virado o contador não sei quantas vezes). Não tem ar condicionado, mas como é pequeno eu posso parar embaixo dos pinheiros da escola, na sombra. E, coisa mais linda: 1.4 diesel, o que significa que o bichinho anda direito na estrada sem ficar morrinhando e atrapalhando o trânsito, e o diesel eu abasteço na oficina (o Mirco compra diesel pro caminhão e pro forno pra pintura; compra a preço muito mais baixo do que no posto e ainda desconta imposto porque é tudo faturado). Precinho: 2400 euros, mais a passagem de propriedade que é um roubo mas inevitável, mais uma fortuna de seguro, também inevitável. Na verdade eu queria algo mais novo, que me desse mais segurança, mas um diesel de alguns anos a menos custaria MUITOS euros a mais, e não queria me descapitalizar completamente porque afinal de contas temos móveis pra botar dentro de casa, né.

Então estou contente com a compra. Porque o carro é MEU, me-me-re-me-meu. Comprado com o MEU dinheiro sem ajuda de NINGUÉM. É uma bosta, mas é MEU. MEEEEEEEEEU.

Finalmente meu chaveiro de galinha de couro da Furla vai servir pra alguma coisa.

Postado por leticia em 22:37

09.06.06

pelotas

Eu achando que tinha acabado Grissom – porque a programação televisiva de verão é completamente diferente da invernal e vários programas somem por meses – e quando chego em casa e ligo a TV vejo meus amiguinhos CSI na TV. Reprises, lógico, mas tá de bom tamanho.

**

Chegaram os computadores novos na escola! Finalmente, pois passei a semana toda roubando o laptop da Simona pra poder traduzir. Computador novo é bom, né? :) Adoro ficar configurando tudo. E já tasquei uma fotona do Leguinho no desktop, lógico. A Jayne tem uma do Sylvester Stallone. Tem gosto pra tudo.

Postado por leticia em 22:22

06.06.06

Hoje foi o último dia de aula com a minha turma em Cascia. Como eles não vão fazer a prova do FCE e não querem nada com a hora do Brasil mesmo, resolvemos fazer um tour de Cascia. Fomos até o jardim do monastério, visitamos o santuário (que fica dentro de uma igreja hedionda), e acabou a cidade. Pelo menos me poupei a chatice de uma aula infinitamente longa com alunos completamente desinteressados.

Mas foi um dia especial porque Bernardo e Sabrina, amigos da faculdade, pararam por aqui em meio à viagem à Europa. Jantamos na Trattoria da Elide, o restaurante do hotel aonde eu mando todo mundo que vem pra cá, porque é de um amigo do Mirco (e o hotel é uma gracinha e o restaurante é ótimo). Eu tava tão contente de encontrar os dois que metralhei mais do que nunca a noite inteira, até o ponto no qual nem eu mesma entendia o que estava dizendo. A noitada foi curta mas muito especial; me senti muito querida e chorei muito quando cheguei em casa. Gosto muito desses meninos, e morro de saudades da minha turma na faculdade, que era nota dez de verdade.

Então aproveito a oportunidade pra agradecer a todos os meus amigos mais queridos, que sabem quem são. Porque eu tô aqui longe, perdi o casamento de todo mundo, mas penso muito em todos vocês e sinto muita, mas muita falta mesmo.

Postado por leticia em 23:16

02.06.06

pedreiras

Hoje é feriado, dia da República. Mirco foi trabalhar assim mesmo, mas eu e mamãe pulamos o muro da obra e passamos a manhã no apartamento em construção, com metro e planta e lápis na mão, tentando decidir como melhor mobiliar a casa. O esquema de construção aqui é completamente diferente: você não vê ninguém trabalhando nas obras e pensa que é tudo abandonado, mas os prédios sobem rapidinho, apesar da complicada estrutura antisísmica obrigatória por lei. Não sei como fazem, até porque já não entendia nada disso no Brasil, lógico, então não tenho pontos de referência. O bombeiro marca os pontos de água e esgoto na parede de tijolos com uma lata de spray. Quer o bidê aqui ou ali? Posso botar o fogão aqui ou quer mais pra lá? Se você escolher um box de um metro por setenta, vai chegar até aqui, ó (sprayzada), tá bom? Acho muito prático. E realmente gostei desse bombeiro, que é muito baixinho, o que me dá um certo nervoso, mas é um amor: educado, disponível, e sobretudo paciente e cheio de boas idéias. Foi uma manhã bem produtiva, e o dia acabou cedo porque amanhã saio de madrugada pra levar mamãe ao aeroporto.

Postado por leticia em 22:05

01.06.06

Minha mãe pegou o trem errado de novo hoje, voltando de Roma, aonde tinha ido pra encontrar umas amigas de passagem na Europa. Deu uma volta do cacete pra chegar a Bastia, passando pelo lago Trasimeno e o cacete a quatro. Como sempre, fez mil amizades no trem e quando me ligou dizendo que estava em Tarantula (Terontola...) eu quase morri de rir no meio do supermercado. No final deu tudo certo, a não ser pela pizza pronta da Coop, que é ótima mas eu dei mole e não deixei assar direito, e ficou uma bosta.

Postado por leticia em 21:59

29.05.06

ela

Enxaquequinha básica, só pra constar.

Postado por leticia em 23:50

24.05.06

:)

Mamãe e Margareth saíram cedo de Santa Maria hoje, pra passar o dia em Roma e de lá pegar o trem pra Paris. O sonho da Margareth era conhecer Roma e Paris, e mamãe não vai à França desde a lua-de-mel, então pareciam duas crianças contando os detalhes da viagem pra gente e explicando os planos enquanto eu separava mapas e bilhetes do metrô que sobraram do ano passado. Sabe criança quando vai em excursão da escola pela primeira vez, sem os pais? Muito engraçado :)

Postado por leticia em 23:53

23.05.06

maratonista

Assisti à minha última aula de sociologia hoje de manhã, e depois encontrei mamãe e Margareth em frente à faculdade. Conseguimos dar uma boa voltinha em Perugia, que eu adoro, vocês sabem, antes de voltar pra almoçar correndo e sair correndo de novo pra trabalhar.

Minha mãe está preocupada porque me vê correndo pra cima e pra baixo o dia todo, correndo sempre, sempre, sempre. Acha que vou acabar tendo um treco. Enquanto eu agüentar o ritmo, vou continuar correndo, porque chegar aos 30 anos tendo como patrimônio total um cachorro e um celular é ridículo, então infelizmente tenho que correr atrás do tempo perdido. Sei que estou quase ficando maluca de tão cansada, e mais impaciente do que o normal (não com meus alunos, claro), e ando dormindo mal e enxaquecosa e chorona, mas daqui a pouco passa.

O que eu queria é que esse estresse todo pelo menos me fizesse emagrecer, mas é querer demais, né...

Postado por leticia em 21:50

22.05.06

a escolha de sofia

Fui com mamãe e Margareth escolher lajotas, azulejos e sinteco hoje de manhã. Achei que fosse enlouquecer de tanto pular de uma língua pra outra, ouvindo as duas matracas conversando e tentando ao mesmo tempo entender o que o sobrancelhudo me explicava. Acabei não decidindo coisa nenhuma, e ele ficou de fazer umas contas pra eu saber se podemos ou não bancar algumas alterações no que a empresa construtora nos oferece por contrato.

Porque a dúvida cruel é a seguinte: sinteco ou piso frio? Não temos tempo pra manutenção de sinteco, absolutamente, mas é lógico que é mais valorizado, mais elegante e, coisa muito importante, mais quentinho. Mas como estamos no segundo andar, sanduichados entre dois apartamentos aquecidos, vamos ter o apartamento mais quente do prédio e o piso frio provavelmente não vai ficar tãaaaaaao frio. Enquanto não escolhermos o chão não dá pra escolher mais nada, nem cor de parede, nem cor de móveis. Então vai ficando tudo no stand-by. Estou aberta a sugestões.

Postado por leticia em 20:45

20.05.06

mais uma

E aí hoje chegou a Margareth, amiga de infância da minha mãe, que mora há mais de 30 anos nos Estados Unidos. Nunca tinha vindo à Europa; quando soube que minha mãe vinha deu a louca e resolveu vir também. Chegou à tarde, descarregamos as coisas no hotel em Santa Maria de um amigo do Mirco aonde sempre mandamos todo mundo porque é uma gracinha, e fomos, adivinha, ver móveis. Acabamos jantando em casa, fiz penne alla Norcina que ficou bem gostoso apesar de improvisado e sem cogumelo, e depois ainda fomos tomar sorvete na praça em Santa Maria. Ô sábado gostosinho!

Postado por leticia em 22:44

14.05.06

mamãe chegou!

Então almoçamos cedo e fomos buscar minha mãe no aeroporto em Roma. De lá fomos diretamente à IKEA, que ela não conhecia, pra dar uma namorada nas cozinhas. Sabe como é, pagar 10.000 euros por uma cozinha é o fim da picada, e temos uma boa referência: a irmã do Mirco trabalha com cozinha (restaurante em casa, catering, take-away, cursos de cozinha, you name it – se você mora em Rotterdam, é uma ótima pedida porque a comida é Ó-TE-MA) e se dá muito bem com a sua IKEA, obrigada. Foi tudo meio corrido porque depois fomos jantar na Arianna, mas já deu pra ter uma idéia legal.

Agora, é um porre morar no fim do mundo porque essa viagem até o aeroporto é um pé no sacoooooooooooooooooooooooooo!

Postado por leticia em 22:00

09.05.06

desejos

Sabe quando você fratura alguma coisa e de repente começa a ver gente engessada em tudo que é lugar? Ou mulher grávida, que tem a impressão que todo mundo tá grávida também? Eu estou assim com duas coisas hoje em dia: carros e móveis.

A gente vai ao cinema ver um filme cheio de ação, o mocinho com uma pistola apontada na cabeça, um corte sangüinante na testa, o bandido falando cuspindo bem pertinho dele, uma mulher berrando no background, e eu cutucando o Mirco: adorei a cozinha. O pior é que ele responde: eu tava pensando exatamente a mesma coisa...

O carro que eu dirijo hoje é do Ettore. Na verdade é do Ettore mas era usado inicialmente como carro de cortesia pra clientes que eventualmente devessem deixar seus veículos na oficina. Como na oficina eles fazem caminhões e pouquíssimos carros, a Uno acabava sendo usada pelos marroquinos quando ficavam sem gasolina (eles vivem sem gasolina e sem crédito no celular, uma coisa impressionante). O carro custou 100 euros, então imaginem o número de quilômetros e o estado em que o coitado se encontra. Detesto dirigi-lo, detesto. Detesto porque é duro, porque treme todo quando chega aos 100 por hora, porque não tem rádio, porque o cinto de segurança corta o meu pescoço, porque já me deixou a pé no meio da rua duas vezes, porque fede a marroquino. Mas detesto sobretudo porque não é meu.

Se eu tivesse dinheiro hoje pra comprar o carro que quisesse, seria muito frugal: escolheria um city car, porque carros esportivos me dão um certo nojinho e SUVs são incompatíveis com a vida na Europa, embora estejam muito na moda aqui na Bota ultimamente. Quero um carro econômico, nesses tempos de carência de petróleo; quero um carro relativamente pequeno e fácil de estacionar, mas não tão pequeno ao ponto de balançar todo quando passa uma rajada de vento; quero um carro que tenha rádio, please; quero um carro que não cheire a marroquino mas, sobretudo, quero um carro que seja MEU, porque usar as coisas dos outros anda me irritando sobremaneira.

Escolheria algum desses: o Peugeot 1007, com a porta deslizante, que é uma fofura; ou um Renault Scénic, que diriji na França e é uma delícia; um Renault Modus, que é muito simpático e tem cores lindas; um Citroën Xsara Picasso porque sempre gostei, embora o modelo já esteja meio ultrapassado; um Nissan Note, que não é tão grande quanto parece e é bem bonitinho; uma Lancia Ypsilon ou uma Musa.

Como não posso comprar o que quero, estou à procura de uma Punto velha mas bem tratada. É um carro que dura e de mecânica fácil, e gostosinha de dirigir. Tínhamos achado uma no ponto, mas por motivos de falta de sorte generalizada não rolou. O lance é procurar, e torcer pra um negócio da China aparecer pela primeira vez na minha vida.

Postado por leticia em 22:57

07.05.06

terremoto, de novo

Então o que rolou essa madrugada foi o seguinte.

Pouco antes de uma da manhã. Acordo com o quarto tremendo e chacoalhando. Cato a mão do Mirco no escuro; não entendo o que está acontecendo. Ainda retardada de sono, pergunto "tremeu ou estou sonhando?" e Mirco responde "tremeu e como, levanta e se veste, vamos pra Arianna ver se tá tudo bem". Demorei séculos pra entender a ordem, porque ainda jurava que tava sonhando. Como o outro miniterremoto que presenciei, aquele em Foligno, fiquei com aquela impressão estranha que foi tudo coisa da minha cabeça, e sem saber o que fazer. Ir pra Arianna fazer o quê? E se o prédio cair (olha o retardamento...) e a gente perder todas as fotos das viagens e os meus livros? Será que o Leguinho sentiu alguma coisa? Porque dizem que os animais são sensíveis a esses negócios e dão o alarme antes mesmo que aconteça. Mas não ouvimos os cachorros aqui das redondezas; ninguém latiu, nem a Luna, a histérica do andar de baixo, nem o Romeo, o labrador da casa ao lado, nem o Jimmyyyyyyyyyyyy, o Yorkshire da Foca Monaca aqui em frente. Descemos as escadas correndo, e quando chegamos lá embaixo encontramos o bairro inteiro na rua, conversando. Todo mundo de moletom jogado às pressas por cima do pijama ;) Nos prédios novos em frente à casa da Arianna, todas as janelas acesas. Muita gente na rua batendo papo e discutindo o acontecido. Quantos graus? Não sei, mas não deve ter sido muito forte porque não ouvi louça chacoalhando. Onde será que foi o epicentro? Em Nocera de novo? Coitados, tomara que não, a cidade ainda nem foi reconstruída ainda, desde 97... Aliás, no terremoto de 97...

Fomos ver os cachorros. Demo nem se dignou a sair da cama pra nos saudar. Leguinho veio com os olhos vermelhos e as orelhas caídas; obviamente não tomou conhecimento de nada. Cachorro banana é isso aí.

Encontramos a avó do Mirco sentada na cama dos pais do Mirco, de pijaminha e touca na cabeça. Estava fazendo xixi quando a terra tremeu e levou um susto danado. Todo mundo comentando o terremoto de 97, aquele que destruiu a basílica de São Francisco em Assis e matou dois engenheiros que os frades cismaram que tinham que ir lá avaliar os danos, antes mesmo que passassem as últimas ondas de tremor, aquelas de acomodação das placas. A casa da avó do Mirco, em Tordandrea, foi o avô dele que construiu depois que voltou a pé da Etiópia, onde foi prisioneiro por alguns anos, até Assis. Ele mesmo construiu, sozinho. SOZINHO. Então quando teve o terremoto a galera foi toda dormir em tendas no jardim, por semanas, até que passassem os tremores da acomodação. Ele, que confiava no seu taco, dormiu sempre em casa. Fui eu quem construiu, não cai nem que a vaca tussa. Acho ótima essa história.

Hoje no jornal vimos que o tremor foi de 3.3. Não se sabe nada do epicentro; a notícia falava de "leve terremoto na província de Perugia" e de um outro tremor mais leve na ilha de Stromboli, na Sicília. Parece que aqui foram dois tremores, um de 3.1 e o outro alguns minutos depois, de 3.3. Não sabemos qual dos dois nós sentimos. Mas, cara, a sensação é MUITO bizarra.

Postado por leticia em 09:01

27.04.06

automobilmente azarada

O', e não é que a Uno me deixou na mão de novo?

Voltando de uma aula particular, o carro morreu no sinal. O sinal fechou de novo e eu lá, tentando reanimar o bichinho. Ao meu lado parou um carro do Carabinieri; perguntaram se o carro tava morto e eu respondi, defuntíssimo. Pararam atrás de mim e me ajudaram a ligar o menino de novo. Mico total, de parar o trânsito ;)

E na hora de ir embora pra casa, eu cheia de pressa pra chegar logo em casa e ver CSI tomando uma sopinha básica, e quem disse que o carro liga? Na rua da escola não passa ninguém nunca, meus alunos já tinham ido embora, não tinha ninguém nas redondezas às oito e meia da noite – paese di mangioni, às horas das refeições você não vê alma viva nas ruas! Esperei quarenta minutos jogando Tetris no celular, porque a luz interna do carro é muito fraca e não dá pra ler. Chegaram Mirco e Ettore, e acabamos comendo na casa da Arianna. Bosta de vida. Minha tia é que tem razão, pobre tem é que morrer!

Postado por leticia em 23:21

26.04.06

sintonia

Eu normalmente nem me manifesto, pra ver se funciona mesmo. Mas funciona. Quando estou com vontade de comer alguma coisa, lá pelas últimas aulas do dia, o Mirco invariavelmente manda um SMS sugerindo exatamente o que eu tava com vontade de comer. Hoje quase mandei um torpedo sugerindo uma pizza, mas deixei quieto. Cheguei em casa e lá tava um pedaço de pizza branca de alecrim me esperando. Bom :)))))

Postado por leticia em 22:16

22.04.06

casa nova

Então lá fui eu escolher as louças dos banheiros na Marini Edilizia. Optamos pelos sanitários suspensos, que facilitam a limpeza. Brancos. Também escolhi o termostato do chuveiro colocado externamente; é mais eficiente (se alguém resolver lavar louça enquanto eu estou no banho a minha água não perde temperatura) e, em caso de problema, não é necessário quebrar a parede pra consertar. Fiquei sabendo que, como nós não queremos a maldita banheira, que é mais cara do que um box pra chuveiro, temos direito ao maior box possível. As torneiras vão ficar pra depois, assim como os pisos e azulejos; só era preciso escolher agora as louças pro idraulico (o bombeiro) poder fazer as instalações corretas.

Aliás, segunda vou me encontrar com ele na casa nova pra ver direito a disposição dos banheiros e coisa e tal – as louças suspensas precisam de uma parede mais espessa por trás, então não posso instalá-las onde me der na telha – e vou aproveitar pra perguntar se dá pra fazer ralo no chão dos banheiros. Todo mundo acha estranhíssimo, como se eu estivesse falando de, sei lá, caminhar plantando bananeira ou comer rato grelhado. Cacetes estrelados, um ralo é um ralo, será que é tão difícil assim imaginar um ralo não dentro do chuveiro, mas fora? Tão difícil imaginar alguém lavando um banheiro em vez de dar uma limpadinha com paninho e Mastro Lindo? Enfim, vamos ver o que o idraulico diz.

Postado por leticia em 13:02

19.04.06

bizarrices

E hoje foi dia de passar a manhã em Perugia. Tinha consulta no Centro Cefalee ao meio-dia e meia, então aproveitei pra subir mais cedo e passar na agência da bolsa de estudos pra tentar resolver um pepinão (que, lógico, não consegui resolver). Como sempre, estacionei no estacionamento onde rola a feira de Ponte San Giovanni às quintas, mas quando cheguei no ponto de ônibus vi que o 3 tinha acabado de passar, então me sentei no banco de cimento pra esperar o próximo, que passaria vinte minutos depois. Um casal de meia idade vinha vindo pela calçada da outra direção, debatendo animadamente sobre o que me pareceu ser política (ele falava em metáforas e ela falava ao mesmo tempo que ele). Me perguntaram se o 3 tinha passado, respondi que o tínhamos perdido, e tirei da bolsa Il Cammello e la Corda, já quase no fim, pra ler enquanto esperava. O homem, barbudo e vestindo um terno xadrez fora de moda, esticou os zóio pra ver o que eu estava lendo. Levantei o livro com a capa virada pra ele, e ele, aaaaaaaaaah, a [editora] Sallerio! Como eu gosto da Sallerio! É bom esse aí?

Dali engrenamos num papo maluco porque a cada dois minutos ele desviava o assunto da conversa pra outra coisa. Acabei descobrindo que ele é professor de física na Università degli Studi di Perugia, e ela ensina arqueologia na universidade de Siena. Ele já morou fora, estudou nos EUA, e se comunica com os alunos por e-mail, enquanto que ela, peitudíssima e com os dentes castanhos, disse que a única tecnologia com a qual tem intimidade é a que existia até o século II d.C., e mais não lhe interessa. Conversavam animadíssimos, um corrigindo o outro, um completando a frase do outro, mudando de assunto toda hora mas sem mais deixar cair a peteca. Dei muita risada porque foi um papo completamente sem pé nem cabeça, que continuou no ônibus. Ele queria saber se Falcão, Tostão e seleção se pronunciavam "ón"; corrigi e expliquei, e ele ficou meio sem graça porque acho que passou a vida toda dizendo Falcón como se fosse entendidíssimo de português. E se a mulher não o tivesse arrastado pra fora do ônibus quando chegou no ponto deles, ele teria continuado ali, tentando dizer seleção em vez de seleçón.

Adoro esses encontros malucos tipo Forrest Gump.

Postado por leticia em 22:12

17.04.06

viva nós

E hoje é aniversário de um sem-número de mulheres fodas, inclusive euzinha: aquela tresloucada da Daiza, que, please, precisa aparecer no próximo encontro de exiladas na Bota, da lucluc, da Carol, que tomou conta do Leguinho no meu primeiro ano aqui.

Não vamos fazer nada de especial, como sempre: almoço de Pasquetta na tia do Mirco, à tarde festinha de batizado do Alessandro na casa do Marco, depois cinema com Gianni, Chiara e Robertinha (que aliás foi contratada pela Ferrero e continua pois vivendo indefinidamente em Torino). E só. Tá bom assim.


Postado por leticia em 11:28

13.04.06

mas vai ser fodida assim no inferno

Não venham me dizer que sorte não existe.

Comprei a lambreta, caí da lambreta.

Peguei a Punto do Mirco, destruí a Punto.

Pego o Volvo do Mirco, fura o pneu do Volvo NO MEIO DA ESTRADA.

Pego a Uno da oficina, toda recauchutada – freios novos, óleo trocado, amortecedor novo, MOTOR novo porque o velho morreu domingo passado, bateria nova – e a Uno falece NO MEIO DA ESTRADA. Mais precisamente em frente à igreja de Rivotorto, no exato lugar onde o pneu do Volvo estourou há duas semanas.

Melhor arranjar um emprego embaixo de casa, sabe. Movimentar-me está ficando perigosamente azarado.

Postado por leticia em 21:42

08.04.06

outra

Eu tenho outra mania: a de não deixar, jamais, que as sobrancelhas se descabelem. Penteio as sobrancelhas antes de sair de casa e até antes de dormir. Talk about paranoia.

Postado por leticia em 09:10

07.04.06

pacamania

A IG pediu, eu respondo.

Eu sou chata, mas não tenho muitas manias bizarras. Deixa eu ver...

1) A de balançar os pés quando estou sentada, como a IG. Mania que muito me irrita mas que não consigo abandonar (senão não seria mania, duh!).

2) A de cutucar os cantos das unhas com as outras unhas, sempre da mesma mão. Isso resulta em i) aumento exponencial da quantidade de cutícula a ser removida e ii) um uso excessivo da musculatura do antebraço, causando dores musculares inclusive. A única vantagem é que o antebraço é a única parte do meu corpo que não tem celulite.

3) Falar sozinha. Em tudo que é língua. Quando dirijo, então...

4) Ler tudo o que é letrinha que eu vejo, automaticamente. É absolutamente inevitável, como quem tem dons matemáticos e tem mania de somar os números das placas dos carros que vê. Eu não posso ver nada escrito; tudo o que é letra que eu vejo, eu leio. Mas é realmente automático: quando me dou conta, já li. Isso inclui tudo, tudo, tudo: adesivo de carro, outdoor, manchetes nos jornais pendurados na banca, livro na mão de uma pessoa distante, letreiro de loja atrás do repórter enviado na televisão, post-its colados no monitor da secretária, a marca gravada nos botões da roupa da chefa. Can't help it.

5) Mania horrível de deixar tudo pra amanhã, que é um dos meus piores defeitos. O Mirco é exatamente o contrário e sei que melhorei muito seguindo o exemplo dele, mas os genes paternos são mais fortes e sei que nunca serei totalmente eficiente por causa disso...

Postado por leticia em 07:43

05.04.06

ela

Lógico que uma terça-feira pós-segunda de onze horas de aula, uma terça-feira que começou com Cascia e terminou com uma hora e meia chatérrima com o Homem Mais Feio do Mundo, não poderia terminar bem. Cheguei em casa com uma das piores crises de enxaqueca que já tive. Tinha tomado o remédio ao meio-dia, quando senti a primeira pontada, e ela ficou dormente o dia inteiro, pra me atacar de surpresa justamente no meio da coisa com o Homem Mais Feio do Mundo. Não sei como cheguei viva em casa, mas voei pra cama chorando de dor. Nessas horas o Mirco fica assustado porque não sabe o que fazer. Consegui me arrastar pra tomar banho e fui direto dormir.

Postado por leticia em 07:44

04.04.06

então...

Então acordei cedo mas não fui caminhar porque estou muito cansada ainda. Acordo sempre cedo, com o sol, mesmo se o quarto estiver totalmente escuro. Dou bom dia pras minhas plantinhas, todas devidamente transferidas do Móvel Hediondo da sala pra varanda ensolarada, faço a cama e normalmente depois vou correr, mas hoje não deu, realmente. Então sentei aqui pra atualizar a paca, porque não quero mais acumular semanas de posts mentais que não vão pro papel. Tive que escolher entre responder a mil e-mails acumulados ou atualizar a paca. A paca venceu. Muito provavelmente não vou conseguir escrever nada a ninguém durante a semana por causa das aulas com o Homem Mais Feio do Mundo, mas no fim de semana juro que vou tentar.

Postado por leticia em 08:01

02.04.06

aria di cultura ;)

Tínhamos um almoço combinado em Gubbio já há quase um mês. Com o pessoal do curso de narração, que se mantém sempre em contato através da mailing list. Então eu acordei cedo, fui caminhar – de camiseta de manga curta! – ouvindo música, tomei meu banhinho, fiz vitamina de banana e laranja pro café da manhã e tocamos pra casa da Arianna. Tivemos que pegar o carro do Ettore, porque o do Mirco tá esperando o pneu novo e a Uno que eu dirijo não chega viva a Gubbio nem rezando. Direto pra estação de Perugia, onde a Laura (a.k.a. Ola’ porque, vocês sabem, apelido aqui é quase sempre a repetição do nome até a sílaba tonica, então o pessoal chama a Laura assim: O La', vieni qua!) já estava esperando. Trinta segundos depois apareceu a outra Laura, a Bortoloni, com o namorado. Os dois têm um estúdio gráfico e ela é a maior fã da Newlands. Muda como um peixe, mas é um amor de menina. Ola' montou no carro com eles e lá fomos nós pra Gubbio.

A estrada é horrível, cheia de curvas e subidas, e fica impraticável quando neva pesado, mas a paisagem é um deslumbre. Aquelas casonas antigas de pedra sentadas sobre as colinas, campos cultivados, bosques de oliveiras, carneirinhos pastando. A Umbria é um desbunde mesmo. E a chegada a Gubbio é sempre triunfal, porque ela fica amontoadinha aos pés do monte cujo nome esqueci, e as torres e construções superantigas são visíveis já de longe; a cidade parece desenhada. Com o céu azul de hoje, então, nem vos digo.

Estacionamos na praça principal e o Matteo veio ao nosso encontro. O resto do pessoal tava esperando à sombra de uma banca de jornais. Matteo é de Veneza, estuda Letras; a namorada, pequeniniiiiiiinha, se chama Virginia e estuda Relações Internacionais em Trento, mas a família é de Terni, aqui na Umbria. Livia é de Riccione, se não me engano, e não me lembro que coisa faz; o namorado tem cara de salame, desses com jaqueta acinturada e colarinho alto, mas não parece ser má pessoa. Arturo é ginecologista, de origem napolitana mas mora em Gubbio há anos e ajudou a parir metade da cidade, então andar com ele pelas ruas é como andar em Ipanema com o Hiro: paradas a cada trinta segundos pra cumprimentar alguém. Sabe O cara legal? É o Arturo. Demos uma volta no centro pra esperar o Maurizio, e fomos batendo papo, falando de livros e filmes (o que mais?) e discutindo menus. O Maurizio trabalha na Coop, o supermercado, e dirige um minicentro cultural de cinema na cidade. Depois de um aperitivo rápido num barzinho quase na praça, fomos pro "restaurante" que o Arturo tinha reservado.

De restaurante não tinha era nada, como muitos bons lugares pra se comer por aqui. Cardápio limitadíssimo, mesas na cantina subterrânea com teto em arcos, salames pendurados no teto no andar térreo. Um lugar típico, em suma. Todos acabamos pedindo a mesma coisa: Piattone del Re (Pratão do Rei), um pratão realmente enorme com as seguintes coisas, a serem comidas nessa ordem, conforme explicou o proprietário quando nos serviu: crostini (pão tostado) de dois tipos, com molho à bolonhesa e com lardo (a parte gorda do porco fatiada. Banha, digamos.), depois feijão manteiga ligeiramente apimentado, comido com um pedaço de torta al testo, que em Gubbio se chama crescia (pronuncia-se crêsha), depois ovos mexidos com lingüiça despedaçada em cima de uma meia fatia de torta, depois lombinho fatiado em uma caminha de rúcola e vinagre balsâmico, depois batata assada e berinjela à milanesa, depois fatias de torta com prosciutto crudo, depois fatias de queijo com trufa negra. Parece um mundo de comida, e é, quando vista toda junta num pratão gigante, mas na verdade cada porção é pequena (MEIA batata assada, UMA fatia de berinjela, UMA fatia de queijo por cabeça) e a gente comeu muito bem, sem se entupir. Mirco até continuou com fome depois (classic...) e ainda comeu uma fatia de torta com lingüiça e verdura. O vinho não era local, e de uma variedade que eu nunca tinha experimentado, mas uma delícia. Estávamos numa ponta da mesa com Maurizio e a mulher, que é enfermeira e chegou depois, direto do turno da noite. Altos papos.

Dali fomos direto a Fossati di Vico, a estação de trem mais próxima a Gubbio, pra deixar a Livia e o namorado. Bortoloti e o namorado também tiveram que ir embora mais cedo. Maurizio e Sonia foram pegar as filhas na sogra e levá-las pra passear no parque. Nós restantes resolvemos ir a Perugia pra Virginia, namorada do Matteo, visitar a avó, e depois fomos ao cinema. Como todo mundo já tinha visto tudo o que tava passando, fomos ver Notte Prima degli Esami, que é MUITO engraçado e nada idiota. Demos muita risada, até eu, que vivi os anos 80 brasileiros e não italianos. Muita coisa em comum, lógico, e muita risada com a moda cafona da época. O elenco é terríiiiiiiiiiiiivel e a atuação da maioria dos jovens e desconhecidos atores é péssima, mas o texto é muito engraçado. Saímos do cinema desopilados e com fome, e fomos ao centro de Perugia comer pizza na Mediterranea, a melhor pizza da cidade. De novo, altos papos. Infelizmente tivemos que nos despedir do Matteo, da Virginia e do Arturo, e fomos levar a Ola' em casa, em Tordandrea, onde mora o tio do Mirco.

Eu tenho muita sorte com esses colegas de turma dos poucos cursos que faço. Esse pessoal é muito legal, muito simpático, aberto, CULTO, divertido. Tipo assim o pessoal do curso de italiano, que são das melhores pessoas que já entraram na minha vida. Lulu, Syrléa, Valéria, Fabiano, Serginho, Leo... Todas pessoas maravilhosas de quem tenho muito orgulho de ser amiga e de quem sinto uma falta imensa. Esse pessoal do curso de narração foi um achado pra mim. São meus primeiros amigos só meus por aqui (a FeRnanda não conta porque já virou irmãzinha), a nossa amizade começou por termos alguma coisa grande em comum e que ainda é o ponto central das nossas conversas, ao vivo ou por mailing list, e a sensação de finalmente ter com quem conversar é absolutamente maravilhosa. Mirco adorou todos e deu muita risada a noite inteira. Ficamos de nos ver de novo em maio, porque no início do mês tem a feira do livro em Torino, e no meio do mês tem a festa dos Ceri em Gubbio, aquela coisa louca que presenciamos no ano passado. Não posso deixar escapar essa gente da minha vida.

Postado por leticia em 23:43

01.04.06

era ora, cazzo!

Primeira saída de lambreta do ano, uhu! Fui a Bastia comprar umas plantinhas e uns fichários bonitos pra organizar a minha papelada da universidade. O dia tava lindo, glorioso, fresco mas com o sol que esquentava a pele, uma diliça. Quase – quase – fiz a faxina com prazer, com as portas das varandas escancaradas. Adoro esse início de primavera. Adoro terminar o dia de trabalho com luz no céu ainda. Me sinto outra.

Postado por leticia em 11:15

31.03.06

gomma bucata

Estava quase na altura da saída pra Rivotorto, ultrapassando um velhinho e ouvindo Green Day nas alturas, quando começo a ouvir um barulho estranho. Putz, o pneu. Bosta. Não tinha onde encostar na estrada, então rodei mais uns cem metros e peguei a saída. Como em Rivotorto nada acontece nunca e ninguém passa, consegui parar o carro em uma espécie de baia lateral, sem incomodar ninguém. Desci e olhei o pneu: completamente estourado, caramba. Liguei pra escola pra avisar pra Simona que eu chegaria atrasada, porque nunca troquei pneu e provavelmente iria demorar. Ela teve a feliz idéia de ligar pro meu aluno engenheiro brilhante, que, morando em Bastia, tinha necessariamente que passar por ali. Cinco minutos depois lá vem ele com o seu Toyota. Trocou o pneu em inglês e lá fui eu, a oitenta por hora como uma velhinha, até a escola. Conversamos por uma hora e nos despedimos. Mas ganhei uma aluna particular, a mulher dele, obá. O resto do dia foi light; sexta-feira é o dia dos alunos educados: um engenheiro, um filho de dentista, um filho de médico, um médico. E que coisa linda sair da escola com um pouquinho de luz ainda no céu! Dilissa!

Postado por leticia em 21:17

23.03.06

i cavalli

Os cavalos me reconheceram hoje :) Quando desci do carro vieram todos na minha direção. Não vi o potrinho, mas tive que entrar correndo no galpão pra dar aula porque cheguei em cima da hora. Quando saí, lá vieram eles de novo pra perto de mim. Estou eu distribuindo as maçãs quando sinto um bafo no meu braço. Era o potrinho, que não sei como tinha conseguido fugir da cerca! Tinha uma feridinha pequena na lateral direita do pescoço, sem dúvida por causa do arame farpado, e me olhava com aqueles olhinhos tristes e assustados de quem não conhece nada de bom nessa vida. Dei-lhe uma maçã pequena que ele pegou com os dentes, mas sem saber bem o que fazer com ela, ficou lá, com a fruta presa na boca, os beiços arreganhados, sem ir nem vir. Acabei cortando a bichinha em pedaços e só assim ele comeu. Depois coçou a coxa no meu carro. Fiz muito carinho nele, que no início se assustou mas depois curtiu.

A cada dia que passa mais eu tenho vontade de virar vegetariana.

Postado por leticia em 22:52

21.03.06

opá

Estou eu indo tranqüilamente pra faculdade, pra assistir à aula de sociologia, quando escuto, já nas redondezas do estacionamento, um ploft. E depois do ploft um barulho de coisa metálica se arrastando no asfalto – namely o meu cano de escapamento. Sorte que deu pra estacionar e assistir à aula normalmente; no intervalo liguei pro Mirco, e depois da aula ele veio com o Moreno e várias ferramentas pra dar uma olhada. O escapamento simplesmente explodiu, o que não é surpreendente, considerando a qualidade do asfalto de todas as estradas de todos os percursos que eu faço rotineiramente. Pra ir a Ponte San Giovanni (à livraria ou ao Ipercoop) todo mundo dirige na esquerda, porque a pista da direita de toda a estradinha que atravessa a cidadezinha de Collestrada é uma sucessão infinita de crateras lunares. Quando vou de scooter pulo feito um cabrito. Pra ir pra Foligno, idem; a superstrada anda detonadíssima na pista da direita, onde rodam os caminhões. As ruazinhas por trás da Coop de Foligno, por onde passo pra evitar dar uma volta enorme no caminho pra escola, são esburacadérrimas e tem um buraco em especial que eu JAMAIS consigo evitar no caminho de volta pra casa, à noite (cês sabem que eu não enxergo nada à noite), e o barulho que o carro faz quando passa por ele é assustador.

Então foi isso, a descarga bateu em alguma coisa e estourou. Mirco desmontou a bichinha e voltou pra casa com o carro fazendo o maior barulhão. Deixou o Volvo comigo e lá fui eu pra Foligno ouvindo Loreena McKennitt :)

Postado por leticia em 23:19

11.03.06

boh!

Passei o dia inteiro em casa sem fazer la-da. Sabe o que é nada? Mirco trabalhou o dia inteiro e eu fiquei em casa rodando pra cima e pra baixo sem fazer nada. Tinha feito faxina ontem à tarde, porque cheguei cedo em casa, e hoje não tinha nada pra fazer. Quer dizer, tinha; passei roupa e dei uma geral na sala, mas depois poderia estudado. Mas não conseguia me concentrar nem pra ler (estou lendo um Roth, The Ghost Writer, que não está me entusiasmando muito não), quanto menos pra escrever, então não fiz nada. Deixei a televisão ligada e fiquei pensando na morte da bezerra, deitada no sofá.

Fazer nada de vez em quando é absolutamente crucial.

Postado por leticia em 22:34

20.02.06

ano novo, casa nova

Então hoje o que aconteceu foi o seguinte:

Mirco comprou apartamento.

Digo Mirco porque eu não tenho um tostão furado, vocês sabem.

O prédio ainda não tá pronto; vai ficar em fevereiro do ano que vem, mas o esqueleto já tá de pé. Lógico que todos os apartamentos já tinham sido vendidos ainda na planta, mas um salame que tinha dado a entrada e ficado na esperança da mãe dar a grana pra pagar o resto acabou voltando aos prontos pedindo a entrada de volta, porque a mãe do pimpolho (de 40 anos – o pimpolho, não a mãe) resolveu não patrocinar mais nada. Ficamos sabendo da construção do prédio porque o Gianni viu um anúncio no mural da piscina de Bastia; ligamos e calhou de ter só esse apartamento que o salame tinha acabado de devolver. Não pensamos muito e compramos (o –amos é metafórico, mas vocês entende).

O apartamento tem três quartos e 100 metros quadrados, mais 32 metros de varandão delicioso. Fizemos algumas modificações na planta pra poder ter uma cozinha com janela; o construtor disse que ninguém mais faz cozinha fechada, mas só angolo cottura (sala e cozinha juntos, como aqui em casa) porque ninguém mais cozinha em casa. Todo mundo explorando a cozinha da mamma, cês sabem. Mas pra certas coisas somos convencionais e não queremos sofá fedendo a molho de cogumelos, então tivemos que inventar umas prosopopéias arquitetônicas pra resolver o problema. Também dividimos um dos banheiros em duas partes, pra poder ter uma mini-área de serviço com tanque e máquina de lavar roupa, e isso por dois motivos: primeiro que eu não consigo conceber casa sem tanque (aqui neguinho lava pano de chão no box ou na banheira, um nojo, pra não falar da dor nas costas), segundo que cansei de congelar minhas mãozinhas tirando roupa da máquina de lavar na varanda, e agora quero a máquina den-tro-de-ca-sa. Como não queremos banheira (e aqui todo mundo fica escandalizado com isso, que nem quando eu saio de casa de cabelo molhado), ganhamos espaço no banheiro e deu pra dividir legal. O outro banheiro vai ser incluído no quarto pra virar suíte, outro conceito desconhecido por aqui. A divisão da sala é meio estúpida mas se eles fizerem do jeito que a gente quer, vai ficar legal.

Agora é apertar o cinto por muitos e muitos anos pra conseguir pagar o apartamento. Eu vou tentar pagar pelo menos a cozinha inteira, mas pra isso os meus caros alunos precisam parar de ficar doentes toda hora e faltar aula...

Postado por leticia em 23:29

17.02.06

socorro

Os patinadores italianos deram um show agora à noite, de verdade. Mas, por favor, ALGUÉM ME EXPLICA ESSAS ROUPAS? Obrigada.

Postado por leticia em 22:24

14.02.06

giochi invernali Torino 2006

Rapaz, cês tão acompanhando as Olimpíadas de Inverno? Diferente dos americanos, que se perguntam "mas por que justamente em TURIM, meus sais?", eu achei a opção bem legal. Não conheço a cidade, mas Robertinha gosta muito, tem a Grazi por lá e a louca da Marina também – aquela biruta que eu e Valeria conhecemos no albergue da juventude em Roma. E todo mundo acha a cidade charmozinha. Fora que, vamos combinar, Roma é tudo na vida mas as outras cidades também merecem participar do circuito pop da Bota, né não. Tipo, aqui na Umbria Perugia concentra TO-DAS as atividades culturais. Tudo que começa em alguma outra cidade acaba fixando raízes em Perugia, e os outros lugares ficam a ver navios. Chato, isso. Porque romaria is money, cês sabem.

Então. Tudo isso só pra falar, pela milésima vez, que eu não faço esporte le-nhum mas amo ver qualquer coisa na televisão. Adoro principalmente a abertura dos jogos, com aqueles nomes de países estranhos. Adoro ver os nomes bizarros dos atletas, adoro ver países desconhecidos ganhando medalhas, adoro o clima multicultural. Mesmo quando se trata de esportes de inverno – porque vocês sabem que eu odeio inverno e tudo relacionado a. A patinação no gelo é uma coisa muito maneira, fico louca assistindo, apesar de achar tudo de uma cafonice ímpar (e completamente desnecessária). Morro de pena do pessoal que cai, fico com vontade de chorar de dó e acabo mudando de canal, às vezes. Mas no geral eu assisto a qualquer coisa, até esqui, que é a coisa mais chata do mundo, junto com o golfe. Pena que com o sono que eu ando sentindo, fica difícil assistir aos replays que passam tarde da noite...

Postado por leticia em 23:10

10.02.06

hohoho

Mirco hoje me contou que na terça, depois do jantar em Scheggino (don’t ask) com Gianni e Chiara, eu, bebinha, tive um longuíssimo ataque de riso antes de dormir. E que antes do ataque de riso falei em inglês, sabe-se lá sobre qual assunto, por meia hora seguida.

Então fica combinado que eu não posso me empolgar com vinho branco.

Postado por leticia em 23:44

03.02.06

coisas inúteis mas úteis

Uma das coisas mais úteis que já me deram de presente nos últimos tempos foi a toalha pra enrolar o cabelo que minha avó me deu. Simplérrimo, mas utilíssimo: tem um botão atrás da cabeça e na parte da frente um elastiquinho; você enrola a toalha estilo turbante, como todo mundo faz, e em fez de ficar com aquilo apoiado precariamente na cabeça, puxa a ponta pra trás e prende o elastiquinho no botão. Uma maravilha, rapaz!

Postado por leticia em 22:25

31.01.06

step by step

Aproveitei a manhã livre, antes da Begonia chegar, pra dar um pulo no Ipercoop e comprar um aparelho de step pra mim. Tava na oferta, lógico - eu só compro coisas na oferta que não sou boba - e é pequeno, enfio debaixo de uma cadeira na sala e ele fica ali quietinho, azul, me esperando. Os amortecedores fazem um certo barulho funf-funf, mas por 38 euros eu queria o quê? De qualquer maneira, vai servir pra eu me mexer um pouquinho durante a metade do ano em que não posso botar o nariz pra fora sem morrer de frio. Dinheirinho bem gasto.

Postado por leticia em 22:10

26.01.06

Aceita o conselho da tia, aceita. Se você trabalha falando não sei quantas horas por dia, não, eu disse NÃO escute Green Day no carro. Porque você vai chegar em casa sem voz.

Postado por leticia em 22:27

23.01.06

saco

O coronel na televisão diz que hoje chega uma frente fria siberiana, que vai ser imediatamente seguida de uma da Groenlândia, e no finzinho do mês outra do mesmo lugar vai emendar com a segunda. Olho pra fora e vejo floquinhos de neve enlouquecidos, voando de lado. Ainda não é neve que cai das nuvens, mas neve que o vento raivoso nos traz do Subasio e das colinas de Bettona. Na estrada pra Foligno, começa a nevar mais seriamente, do céu mesmo, mas nunca chega a acumular no chão. Meu medo é pra mais tarde, porque a neve derretida vira gelo com as temperaturas da noite, e dirigir assim é como patinar no gelo.

Com esse tempo horrível, fazer qualquer tipo de movimento dentro do carro é impossível. Virar o pescoço encachecolado pra fazer uma manobra é um malabarismo irrealizável. O cinto de segurança tem que passar por baixo do cachecol pra não me enforcar. A boina de lã começa a coçar na testa, mas com a luva grossíssima não consigo encontrar o ponto crítico pra me coçar. O carro leva três horas pra esquentar, e até lá o nariz, vermelho, fica escorrendo. Tudo o que eu pego com as mãos enluvadas cai. Abençoado seja o fone de ouvido do celular, porque é impossível apertar um só botão do telefone com os dedões enfiados em luvas de camurça com recheio de pelo...

Eu definitivamente ODEIO frio.

Postado por leticia em 23:15

15.01.06

hospital

A avó do Mirco sofreu uma mini-isquemia na sexta e foi internada pra fazer exames e ficar em observação. Ontem me ofereci pra passar a tarde com ela, porque a coitada da Lucia não é exatamente a rainha do traquejo social, tendo sempre ficado enfurnada em casa cuidando da horta, dos bichos e de um marido rabujento e mandão. Nunca foi a lugar nenhum e a sua primeira experiência realmente divertida e diferente foi a viagem à Holanda em novembro do ano passado, então ficar no hospital, com uma rotina tão diferente da de casa, com companheiras de quarto que ela não conhece e comendo uma comida estranha é muito estressante.

Acabei fazendo uma supersocial com as outras velhinhas, mais faladeiras. Uma estava meio fora do ar, enorme de gorda, com uma pneumonia complicada, máscara de oxigênio no rosto, movimentos difíceis e respiração sofrida. A vizinha da Lucia era a mãe da gerente do banco do Mirco, que eu conheço bem. E a última era uma birutinha agitadíssima que não parava de falar e complementava o rancho do hospital com coisinhas que a família e amigos – porque a cada meia hora vinha alguém visitá-la – traziam de casa.

Eu gosto de velhos. Têm sempre muito a dizer, mesmo os idiotas, e um ponto de vista tão, mas tão abissalmente deslocado por causa do salto tecnológico que passou voando na frente dos olhos deles que eu acabo sempre parando pra pensar. Das quatro, a única que sabia operar um celular era a maluquinha, a única também a tingir os cabelos. Eu tinha levado coisas pra estudar, mas acabei passando cinco horas (o Mirco trabalhou o dia inteiro e só chegou às oito e meia, pra depois irmos jantar com Mario Belli e moglie) batendo altos papos com as velhinhas e dando muita risada com a birutinha. Teve até choro, quando visitas inesperadas apareciam – ou quando emprestei meu celular pra mãe da gerente e me recusei terminantemente a aceitar o pagamento pela ligação. O que, aliás, quer dizer muita coisa: quando uma minigentileza assim bobinha é difícil de compreender, é sinal de que o mundo tá afundando na bosta mesmo.

Postado por leticia em 22:06

14.01.06

Da série coisas que a paca odeia

Na academia:

Mulher que malha maquiada
Mulher que malha com brinco de argolão
Mulher que malha de cabelos soltos
Mulher que malha sem calcinha por baixo do legging
Qualquer um que solte grunhidos quando levanta peso, pra todo mundo ouvir
Gente que sua excessivamente e fica com cheiro de batata doce
Gente que depois de meia série de quatro apoios levanta e vai olhar a bunda no espelho pra ver se o efeito foi imediato
Intimidade total entre funcionários da academia e clientes, "E aí, Robertinha, malhando muito, amor?"
Gente que malha com legging, camiseta, tênis, meia, toalha, faixa na cabeça, tudo com a logomarca da academia

Postado por leticia em 08:56

05.01.06

Hoje o sol saiu. Tava ventando em Foligno, como sempre, mas não estava tão frio. Então aproveitei uma horinha entre uma aula particular e a primeira aula do dia na escola e fui dar um passeio ao longo do rio Topino.

Como as laterais do rio são muito altas (todo o percurso foi alterado ao longo dos séculos, e em certos trechos são muros a delinear a margem), fiquei protegida do vento. E então lá fui eu, descendo as escadinhas até chegar na margem gramada, onde uma trilha estreita de terra/lama, atraversada por pegadas de tênis os mais diversos e marcas de pneus de bicicletas, logo tratou de sujar minhas botas. Muita gente faz cooper ao longo do rio, mas àquela hora (do almoço) não tinha viv'alma.

Eu gosto de água. Não gosto de mar, mas todas as outras águas me estão simpáticas. Nos últimos dias tinha chovido muito e o Topino estava cheio, correndo veloz. É mais um riacho, coitado, no máximo uns 5 metros de largura – muito chutado esse valor; nesse sentido eu sou muito mulherzinha e não tenho a menor noção de unidades de medida – mas é alegre e simpático como todo riacho. Aqui e ali patos e marrecos faziam a digestão, parados contra a corrente, olhinhos fechados aproveitando o sol. O barulho delicioso do rio correndo é muito relaxante e só não sentei no gramado pra ler porque tava tudo muito molhado. Passei por baixo da ponte, não sem suspirar pela felicidade que é poder passar por baixo de uma ponte, num lugar completamente isolado e em um horário em que não passa um cão na rua, sem ter que ficar na paranóia de estar sendo seguida, ou de ver cobertores de mendigos, ou de ter que correr de pivetes. Vi alguns restos de fogos de artifício, porque o italiano médio desconhece a utilidade das latas de lixo públicas, mas nada de especial. Fui andando até o riacho fazer uma curva bem fechada, e na margem interna as águas vão depositando zilhões de pedaços de pau, restos de galhos e ramos que caem das árvores plantadas no calçadão beira-rio. Leguinho ali iria se fartar: pauzinhos infinitos pra brincar, água e um banco de areia. Continuei até a ponte de pedra do século XVI, que eu tinha acabado de atravessar voltando da casa da minha aluna, dei meia-volta e quando já estava de novo na curva dos galhos dei de cara com um cocker preto, com coleira vermelho berrante, fazendo a maior bagunça, se jogando na água, lama pingando dos longos pelos da barriga. Logo depois aparece a dona, com um grande vira-lata preto na coleira. Parei pra cumprimentar os cachorros e ela comentou que era a melhor hora pra levar os meninos pra brincar, porque nunca tinha ninguém, então eles podiam brincar soltos. A alegria de ver um bicho correndo solto e brincando está na mesma categoria do sabor do chocolate meio amargo dissolvendo na boca, do cheiro de livro novo quando enfiamos o nariz entre as páginas, da delícia que é inaugurar uma agenda novinha no começo do ano, na felicidade de ter canetas coloridas, no banho de chuva no verão, em bebê apertando o seu nariz e dando risada. Essas coisas. Subi a ladeira de saída da trilha do rio, sentei num banco de pedra e fiquei de longe vendo os cachorros rolando na grama, se sujando de lama, brincando, fazendo bagunça.

O resto do dia passou rapidinho.

Postado por leticia em 23:04

02.01.06

che si fottano i caraibi

Hm, não sei bem o que dizer.

Natal é um porre e pra mim não tem outro sentido que não o aniversário do meu pai.

Ano Novo é mais porre ainda porque tem aquela alegria forçada estilo Carnaval, detesto. Mirco trabalhou até as dez da noite com o coitado do Stefano na oficina, eu faxinei pesado, passei roupa, traduzi e acabei fazendo um jantar bem light pra nós dois: risoto de camarão com abobrinha e espetinhos de lula e camarão que fiz no forno. Comemos no joguinho americano verde-escuro bordado por vovó, com os talheres de prata de mamãe, e capotamos à meia-noite e seis. Melhor que isso, só dois isso. Juro, meu ideal de réveillon é passá-lo dormindo.

No final de janeiro vamos passar um fim de semana em Rotterdam, com a irmã do Mirco. A avó deles vai também, e vai ficar por lá por algumas semanas, até a Stefania voltar com ela pra Itália pra dar uns rolés e comprar uns quilos de parmesão. Eu queria muito sair ou chegar em Bruxelas, que não conheço, mas fica a 2 horas de viagem de Rotterdam e não vamos forçar a Stefania a dirigir isso tudo pra ir nos pegar ou levar ao aeroporto. Então vai ser um fim de semana suuuuuuuperlegal, no frio, em Rotterdam, comendo batata. Sempre melhor que Bastia, lógico.

E pra Grande Viagem Anual de 2006 Gianni e Chiara me vieram com a maldita idéia do cruzeiro marítimo no Caribe. Vejam bem: eu odeio mar, odeio barco, odeio ilhas, odeio espanhol, odeio lugares exótico-latinos, odeio drinques servidos no abacaxi, e olha aonde querem me levar! Pior: conseguiram convencer o Mirco, que chegou até a desistir do sonhado retorno à Austrália depois de 5 anos sem pôr os pés por lá. Vou levar uma mala extra cheia de livros pra ficar lendo enfurnada na cabine fugindo do sol, mas tudo bem. Vou ter que ceder porque a essa altura do campeonato sou uma contra 3.

Lógico que mesmo que acabar gostando, jamais admitirei. Ja-mé.

Postado por leticia em 10:29

28.12.05

cão literário

Dei um pulo na minha livraria de estimação hoje, pra ver quanto gastei em livros esse ano (nem vou dizer) e de conseqüência quanto tenho de bônus em janeiro (70 euros). Estou eu lá conversando com a caixa, porque é lógico que eu tinha que sair com alguma coisa (no caso, o último livro de Alessandro Baricco), quando entra um cachorro pelas portas automáticas.

Um vira-latão, daqueles cor amarelo-diarréia, pelo curto muito áspero e feio, focinho curto, orelhas tortas, dentes acavalados numa boca que não fecha direito. Não é magro nem tem falhas no pelo; não tem coleira mas não deve ser abandonado porque não é arredio e tem cara de bem tratado, apesar de ser realmente horroroso. Entrou, parou em frente à seção de culinária, deu uma olhada ao redor e foi passear pela livraria, muito calmamente, strolling around, como um aposentado que passeia na Nossa Senhora da Paz. Parei pra falar com ele, lógico, cocei atrás das orelhas e ele em troca entortou a cabeça, fechou aqueles olhinhos gostosos de cachorro sem raça e botou a língua pra fora. A menina da caixa disse que ele volta e meia vem visitar. Entra, dá umas voltinhas, vai lá pro depósito onde é mais quentinho ou pra seção de livros de criança que tem menos movimento, e quando cansa de observar o vai-e-vem das pessoas, vai embora.

É nessas horas que o telefone com máquina fotográfica faz falta.

Postado por leticia em 23:08

03.11.05

aiuto!

Cara, na boa, sou só eu que acha o Benigni um dos idiotas mais idiotas de todos os tempos? QUE CARA CHATO!!! Pula, salta, grita sempre, sempre, sempre, é infantil, ridículo, bobo, hiperativo, e ainda por cima sempre enfia aquela canastrã da mulher dele em tudo quando é filme. Dez minutos de La Vita è Bella na TV me deixaram em um estado de irritação daqueles que só aula de matemática consegue. SOCORRO!

Postado por leticia em 22:59

02.11.05

uia

A enxaqueca começou no sábado, no final da manhã. Tomei logo o remédio, como sempre, mas dessa vez demorou a passar e não consegui nem ajudar a botar a mesa na Arianna; tive que ficar jogada no sofá embaixo do cobertor até passar. A segunda porrada veio lá pras sete, no meio do cinema. Estávamos vendo The Interpreter (gostamos muito, mas no final eu já não estava entendendo mais nada por causa da dor). Tomei outro comprimido e fiquei torcendo pra dor ir embora pra eu não ter que sair no meio do filme, mas não deu. Sou teimosa e fiquei até o final, mas cheguei em casa chorando de dor.

Na segunda acordei a massa falida. Uma náusea horrorosa, a cabeça rodando, o corpo mole. Essa dor me destrói, é uma coisa tão absurdamente intensa que destrói a gente moralmente também, um negócio impressionante. Por sorte as duas escolas estavam fechadas por causa do feriado, que aqui se comemora no dia primeiro de novembro, então pude ficar em casa sem remorso. O dia INTEIRO no sofá de pijama. Não conseguia ver TV porque o barulho incomodava, mas arrisquei umas pagininhas e, vendo que rolava, acabei terminando The Grapes of Wrath (maravilhoso!), devorando The Virgin Suicides (prefiro Middlesex) e começando The Lovely Bones, de Alice Sebold, muito gostosinho. Mirco foi tomar um drink com o Moreno porque eu realmente não tinha condições de sair de casa. Cheguei até a bater um bolo à tarde, não sei como, e ainda embrulhei dois pedaços em papel alumínio e dei de presente pras duas meninas que bateram aqui na porta trick-or-treating. E depois chapei, e mais nada.

Postado por leticia em 23:48

27.10.05

:)))

Às duas da madrugada de hoje nasceu o Alessandro, filho do Marco e da Michela. Depois do trabalho fui ao hospital de Assis conhecer a criança e parabenizar os pais. Marco, que é uma pessoa muito particular, estava todo bobo mas obviamente se cagando de medo. O bebê é uma gracinha, três quilos e meio, cabeludinho mas não muito, as unhas compridas, os dedos ainda enrugados. Mirco comprou uma planta (porque flores morrem logo e não gostamos de ver coisas morrendo) pra eles e uma igual pra nós, e foi de paletó visitar o menino.

Foi interessante pra nós dois, porque eu só vi recém-nascidos no hospital onde estudei; nenhuma amiga minha tem filhos e não acompanhei de perto as gestações das minhas primas mais velhas, de modo que nunca tinha tido a oportunidade de participar assim de tão pertinho de uma nova vida que chega. Mirco, então, que tem família pequena e nunca tinha visto bebê tão pequeno, ficou chocado. Toda hora olhava pra mim e dizia mas é pequeno DEMAIS, como é possível? Michela com aquela cara de mãe, já sabendo instintivamente tudo o que há pra saber, observando as mãozinhas microscópicas que abrem e fecham durante o sono agitado, os minilábios que mamam o vazio, a posição de rã. Aquele cheirinho inconfundível de bebê no quarto, todo mundo sussurrando. Pensei logo na Carola, na mulher do Walterino, na FeRnanda que quer engravidar, na Dani irmã da Mari que já engravidou, na Ane com a linda Isabella, na Christine, na Criss. Beijos a todas!

E quando chegamos em casa nem ligamos a televisão e nem conversamos, touched by the scene; jantei minha sopa de fava com macarrãozinho em silêncio, li meia página e capotei.

Postado por leticia em 23:23

26.10.05

todi, todi, todi vidro... ;)

Então fui fazer a ressonância magnética hoje. Lá em Todi (leia-se casa do chapéu), cidade que eu não conheço – só estive num restaurante na periferia, no ano passado, com aquele imbecil do Leo e a família dos Salames, lembram? O hospital de Todi é um ponto de referência aqui na Umbria e a mulherzinha do centro de reservas de Perugia disse que só eles e o hospital de Marsciano têm a máquina pra fazer o exame que me pediram (ressonância + perfil angiográfico). No hospital de Marsciano, mais fácil pra mim porque ao meio-dia e meia teria aula na zona industrial da cidade, não tinha vaga, e me mandaram pra Todi.

Não é exatamente longíiiiiiissimo, mas é longe, e a estrada é uma bosta, bosta, bosta, toda remendada e irregular. Fui devagarinho, porque além da estrada bosta, meu carro é outra bosta, e ainda por cima tinha muita neblina. Todi fica no alto de uma colina e levei horas pra subir no meio daquela névoa toda, fazendo curvas estranhas atrás de um caminhão que levava traves de cimento. O hospital fica dentro dos antigos muros da cidade, coisa maneiríssima, mas na recepção me mandaram descer uma escada escondida atrás do posto de gasolina e entrar num caminhão branco (!!!). Então tá.

Acontece que o serviço de ressonância do hospital de Todi é uma ressonância magnética móvel, que fica, justamente, nesse caminhão branco. Do lado de fora, um container com aquecedor elétrico e oito cadeiras – a sala de espera. Sem saber pra onde ir nem com quem falar, entrei no container e fiquei batendo papo com um senhor de Marsciano que tinha ido acompanhar o irmão, que no momento estava no caminhão fazendo o exame. Quando o irmão saiu, um cara bem novinho, de brinco, pijama verde de cirurgião e os ridículos tamancos de plástico que todo o pessoal da área de saúde usa veio me chamar.

Eu nunca tinha feito ressonância, e da tomografia do cabeção feita no ano passado, depois do ridículo tombo com a lambreta, não tenho absolutamente nenhuma memória. Eu não sou claustrofóbica nem naturalmente assustada, mas definitivamente ressonância é o exame mais chato do mundo! Você fica ali olhando praquele teto branco (eu nem isso, fechei os olhos torcendo pra dormir um pouquinho) e ouvindo uns barulhos muito estranhos – tlec tlec tlec, truuuuuuuuuuum, truuuuuuuuum, papapapapapa, e mais nada. Posso imaginar o horror que a experiência deve ser pra quem tem claustrofobia ou coisas do gênero. Eu só me entediei, mas minha mãe teria morrido de pânico lá dentro.

Como eu só tinha aula em Marsciano bem mais tarde, e o exame terminou às dez, fui dar uma olhada na cidade, apesar da neblina broxante. Atravessei o arco, uma antiga porta no terceiro círculo de muros, e fui subindo a ladeirona, naturalmente chamada Corso Cavour, até a praça central, naturalmente chamada Piazza del Popolo. Quando cheguei lá em cima e estava entrando no Uffico Informazioni Turistiche pra pegar um mapinha – porque eu adoro um mapinha – me ligam de Marsciano cancelando a aula. Bem, agora foda-se, já estou aqui, vou é rodar. Tudo bem que não dava pra ver la-da por causa da névoa, mas a cidade me pareceu linda, a praça é maravilhosa, e tenho que voltar algum dia. Desci a ladeirona de novo, parei num mercadinho pra comprar pão e presunto pro jantar do Mirco, entrei por uns becos, desci umas escadas, vi anfiteatros romanos de longe, mas fiquei com medo de me perder nas brumas e voltei pro carro, que eu tinha estacionado num buraco ao lado de uma banca de jornais. Dez minutos pra desestacionar, e peguei a estrada de novo. Parei na Libreria Grande pra pegar meus Mankell (dica da Mary) que tinham chegado (eu é que não vou ler thriller ambientado na Suécia traduzido em italiano, tá doido?) e fui pra casa fazer o almoço. E depois pra Foligno, enfrentar a turma da Confartigianato (que é muito legal) e a ferinha da Camila. E depois ainda fui a Perugia, pra antepenúltima aula com o Paulo Cintura. Cheguei em casa acabadona, compreensivelmente.

Postado por leticia em 22:00

22.10.05

expat not always nice

Então hoje a Sabrina finalmente casa com o Bernardo e eu não estou lá :( Meus amigos estão todos casando e se reproduzindo e eu nunca estou lá. Isso é foda.

Postado por leticia em 10:51

21.10.05

balaio de gatos

Estou cada vez me desarrependendo mais de ter escolhido COMINT em vez de literatura estrangeira. Minha turma é bem legal. Claro que só conheço as três fileiras da frente, porque ainda é cedo pra lembrar da cara de todo mundo e eu só consigo ir à faculdade às sextas, mas olha que delícia de melting pot: a Elisa, a Boazinha Branquinha, de Terni; a Ludovica, de Avellino, perto de Nápolis; a menina de Palermo; a Eleonora, de Bolzano, praticamente no Império Áustrio-Húngaro; a Corina, alemã (não descobri de onde ainda); a Susanna, de Ascoli Piceno, lá onde o judas perdeu os suspensórios; a Isis, mexicana; a neguinha idiota e arrogante, que, bem, é de Cuba; a Cristina, de Frosinone, pros lados de Roma; uma rastafari da região de Marche, Onde Nada Acontece Nunca Também; as duas malucas da Calábria; a Flavia, de Spoleto, que tem o sotaque mais engraçado do planeta. Tem uma menina da Etiópia que hoje não veio. Atrás de mim hoje tinha uma albanesa chamada Igla. Sei que tem uma austríaca, uma polonesa e uma russa. O resto da turma deve ser igualmente misturado, ainda não descobri.

O lance é que a minha universidade é a única na Itália a oferecer esse curso, então a galera vem de tudo que é lugar do país pra estudar aqui. E como a universidade se chama Università per Stranieri, bem, é mais que lógico que os estrangeiros também sejam tantos. Muitos vêm estudar italiano, como eu fiz em 2002, e depois engatam um curso universitário normal. Acho muito maneiro isso.

E pra continuar no clima internacional, descobri que há uma coreana dando aulas de inglês na escola de Ponte San Giovanni. Chama-se Lori, é espertérrima, tem inglês impecavelmente americano, é quase bonita (de modo geral não gosto da estética oriental), alta, magra, elegante. Hoje estava com uma jaqueta roxa maravilhosa. Quase quase proponho um escambo coreano-português, que tal?

E pra continuar mais ainda no clima internacional: a faxineira da sede da escola em Madonna Alta é russa. Física e engenheira química. Chama-se Elena e é um amor, fala um italiano terrivelmente carregado mas vê-se que é uma criatura boa, desiludida no amor e no trabalho, e sobretudo muito interessante. Já morou na Hungria, na Ucrânia e na Eslováquia. Hoje abriu um sorrisão quando cheguei, atrasada por causa da bosta da Eurochocolate: pensei que a senhora não vinha mais! Elena, pelamordedeus, dammi del tu, você é mais doutora que eu e me chama de senhora? Sempre puxo papo com ela porque, vocês sabem, adoro conversar com gente diferente, e ainda por cima lembro do nome dela, então já viu, conquistei. Pena que chego lá sempre em cima da hora e mal dá tempo pra gente conversar. Estou doida pra saber como é a vida na Hungria, na Ucrânia, na Eslováquia. O que se come nesses lugares? O que neguinho faz quando tá um frio desgraçado e não dá pra botar o nariz na rua? Como se diz "tá um frio desgraçado hoje" em húngaro, em russo, em eslovaco? So many questions, so little time.

Postado por leticia em 22:49

16.10.05

domenica

Antes do almoço queríamos aproveitar o lindo dia pra levar o Leguinho pra nadar. Como todo bom labrador banana, ele não pode ver uma poça d'água que se joga dentro, amarradão. E desde que veio pra cá nunca mais nadou. Na verdade não acho que ele sinta muita falta porque se diverte de outras maneiras, mas eu sei que ele ama dar umas patadinhas e hoje saímos de casa com esse objetivo. Só que não chove há um certo tempo e não tinha lugar nenhum onde ele pudesse nadar sem perigo – o rio que corta Bastia até que tava razoável, mas tem muitas pequenas quedas onde ele, atolado que é, poderia se embolar e se machucar. Na nossa busca por uma massa d'água decente, passamos por uma parte de Assis onde eu nunca tinha ido, lá pros lados de Ponte San Vetturino. E vimos coisas lindas, tipo essa ponte antiga.


Mas como coisa boa nunca é demais, vamos ao que interessa:


E essa girafa está nessa janela há pelo menos 20 anos, porque desde pequeno o Mirco vê esse bicho nessa casa em Santa Maria. Não temos idéia de quem seja, mas eu adoro a idéia de levantar os olhos e ver uma girafa de pelúcia gigante segurando uma janela. Ainda mais porque coisas insólitas desse tipo não acontecem praticamente nunca em lugares chatos como o interior do Zaire.


Postado por leticia em 21:19

15.10.05

pré

Então já estou toda animadinha com os mil livros, as mil coisas de comer, as bolsas e sapatos que vou trazer do Rio pra cá. E já comecei também a fazer as compras das mil coisas de comer que vou levar pra lá. Porque quem vai da Itália pra qualquer outro lugar do mundo, o que é que leva de presente? Comida, lógico. A minha lista inclui risotos daqueles prontos, de pacote, que por sorte estão em oferta essa semana; macarrão com ovo, porque eu é que não vou ocupar lugar na mala com máquina de fazer macarrão; molhos de bichos estranhos (javali, lebre, cabrito, ganso); torta al testo e piadina; speck e scamorza; salames e prosciutto crudo; vinho, vinsanto e cantucci; bom vinagre balsâmico e bom azeite de oliva; pesto e parmesão. O diabo vai ser arrumar as malas, porque as nossas malas, quando não estamos viajando, ficam na garagem, cheias das roupas da outra estação. Pra levar a minha malona e a minha malinha pro Brasil vou ter que largar as roupas de verão em cima da cama, no lado em que eu durmo, pra não incomodar o Mirco. Porque eu simplesmente não tenho onde botar nada. Odeio essa casa, não tem espaço suficiente pra gente, os móveis são estúpidos, além de hediondos, e toda hora tenho que descer até a garagem pra pegar alguma coisa. No verão nem é um problema, mas no inverno o bicho pega porque lá embaixo é frio bagaray. Pobre tem é que morrer, tem razão a minha tia.

Postado por leticia em 10:07

02.10.05

Da série Coisas que a paca odeia

Na estrada

. Gente que não liga a seta antes de virar, ultrapassar, sair da vaga, etc
. Gente que esquece a seta ligada eternamente
. Gente que começa a gesticular enquanto conversa com o carona, tira as mãos do volante e o carro vai sozinho pra outra pista
. Gente que pisca o farol mesmo quando você está com a seta ligada, ultrapassando um caminhão-jamanta daqueles com três dias de comprimento
. Gente que joga coisas pela janela
. Gente que acha que parar no meio da rua, numa curva, no sopé de um viaduto, sem ligar o pisca-pisca, é supernormal

Postado por leticia em 21:51

30.09.05

êeeeeeeeee!!!

No final de um dia muito, muito difícil e cheio de pequenas frustrações, inclusive a de não conseguir, mais uma vez, falar com a médica pra finalmente pegar os pedidos da ressonância e dos outros exames pra enxaqueca, finalmente uma boa notícia:

A bolsa de estudos saiu! :))))

Claro que já meio que me arrependi de ter escolhido Comunicazione Internazionale. Apesar da maioria das matérias ser muito interessante, meu negócio mesmo é literatura e línguas, e a burra aqui poderia perfeitamente ter escolhido Lingue e Culture Straniere, que tem um monte de coisas maneiras no programa – tipo literatura eslava, língua russa, literatura portuguesa e brasileira e outras coisas legais. Mas vou me contentar.

Só que não vou conseguir acompanhar praticamente matéria nenhuma. Um horário mais ridiculamente pouco prático não poderia existir, e praticamente todas as aulas da universidade batem com as minhas aulas de inglês. Então vou ter que fazer tudo como não-freqüentante, o que é um porre, porque eu nunca fui C.D.F. nem tenho a força de vontade da Ane, e sempre passei de ano na escola e na faculdade porque nunca faltei aula nem um round na enfermaria e sempre prestei muita atenção no que as pessoas dizem ao meu redor, e sempre fui muito perguntadeira também. Agora fodeu, vamos ser eu e os livros, sozinhos. Vai ser duro.

Minhas matérias vão ser: marketing, informática geral, lingüística italiana, política econômica, comunicação política, estudos culturais e organização política européia. Inglês e espanhol só vão começar em novembro, mas se minha mãe achar meu certificado do Proficiency, que sumiu no vácuo, pelo menos inglês vou conseguir pular, já que o objetivo do curso é fazer com que os alunos consigam um diploma de nível C2, de acordo com o European Framework de línguas, e o CPE é exatamente isso. Aliás, só a título informativo, o CELI 5, de italiano, que tirei em junho, é o equivalente italiano e mais bobinho do CPE. A má notícia é que não só vou ter que estudar espanhol, que todo mundo sabe que eu abomino, mas vou ter que tirar o diploma também – o DSE, Diploma Superior de Español.

Aliás, esse negócio de European Framework me deixou me coçando toda de vontade de aprender línguas bizarras e sair me diplomando toda. Já pensaram, um diploma de Gaélico? Até o nome é lindo: Réamhtheastas Gaeilge, no nível mais baixo, e Bunteastas Gaeilge, no nível menos mais baixo (tá bom, Bunteastas não é lindo). E Suomi? Eu não sei que língua é, mas adoraria ter um diploma chamado Suomen kieli, ylin taso 7-8. Tem exames de luxemburguês também, acreditem se quiserem. Tem grego moderno, tem euskara, tem catalão, dinamarquês, holandês, norueguês, sueco, e, lógico, entre as mais difusas línguas ocidentais tem também espaço pro português. Cada vez que eu olho pra essa tabelinha me coço toda de curiosidade de aprender coisas.

Já arrumei meu material escolar todo: uma bolsa de juta escrito "Mi piacciono i libri, ma mi piace di più la gente che li legge" (gosto de livros, mas gosto mais ainda da gente que os lê), caderno novo, bloquinhos veeeeeelhos da época em que eu ainda freqüentava congressos de Medicina, post-it, liquid-paper em caneta e em fita, canetas coloridas (mil), borracha novinha imaculada, carimbos bubus de bichos que compramos em Honfleur em agosto (Newlands, minha filha, tu ia morrer várias vezes naquela loja foférrima) e que não servem pra nada a não ser me deixar contente, minha fiel lapiseira preta da Paper Mate que nunca me deu um desprazer na vida, apesar do uso contínuo por anos a fio, pastinhas com e sem elástico, minigrampeador, enfim, todas essas coisas absolutamente necessárias pro bem-estar de uma pobre paca manca. Estou feliz da vida, e só não estou mais feliz da vida ainda porque não vou conseguir assistir a todas as aulas.

O pepino que vou ter que descascar no ano que vem (esqueci o futuro do verbo dever, alguém me ajuda?) vai ser a provável impossibilidade de renovar a bolsa. Porque fiz um contrato melhor com a escola, sou a professora com mais turmas (e teoricamente com mais renda...), o que vai provavelmente me tirar da camada mais pobre da população. Como já sou formada, não tenho direito a bolsa por mérito, mesmo que conseguir vencer minha tendência à preguiça intelectual e tirar boas notas sem assistir às aulas. Mas como o interesse por cursos universitários anda baixo (nem teve prova de admissão esse ano, apesar da turma com número fechado – normalmente é a maior casa da mãe Joana e qualquer um entra, mas poucos saem...), pode ser que mesmo não sendo mais paupérrima eu consiga alguma coisa. Mas é cedo demais pra me preocupar com esse abacaxi. Segunda-feira acordo cedo pra não pegar trânsito excessivo indo pra Perugia, estaciono perto da casa do Aluno Endocrinologista, ando uns três quilômetros a pé até a faculdade, e se tudo der certo consigo até lugar pra sentar razoavelmente within hearing distance na Aula Magna. Quando estudei italiano na Stranieri nunca tínhamos aula lá, porque éramos poucos, mas entrei uma vez durante um concerto de alunos músicos. O teto é todo pintado com horrendos motivos mussolinescos, que ficaram ali como recordação daquele tenebroso período – que, cá pra nós, muitos não acham tão tenebroso assim. São horrendos por causa da história que têm por trás, não exatamente por motivos estéticos. Achei tudo muito parecido com Portinari, aqueles pezões, a força do peão de obra italiano, essas coisas.

Falei demais, vou dormir.

Postado por leticia em 23:40

29.09.05

Da série coisas que a paca odeia

Na sala de aula

. Gente que simplesmente não consegue escrever pequeno
. Gente que prefere rabiscar em vez de apagar
. Gente que escreve de caneta em livro
. Gente que não anota nada nunca e depois fica repetindo as mesmas perguntas idiotas
. Gente que usa lápis sem apontar nunca, nem mesmo quando nem a própria pessoa consegue ler o que escreveu com aquela ponta de lápis totalmente trolha
. Gente que não consegue copiar mais de uma palavra do quadro-negro de uma vez, tendo que levantar os olhos praticamente a cada sílaba

Postado por leticia em 19:00

15.09.05

tucomel

Recebi o e-mail mais bonito do mundo hoje, do meu irmão.

Mas é só meu.

Postado por leticia em 21:32

29.08.05

demorou, hein, nega?

Era inevitável, não? Acho que demoraram até demais...

Postado por leticia em 15:25

28.08.05

família buscapé

Ontem, que aliás foi aniversário da minha mãe, fomos a Roma buscar Ettore & cia. no aeroporto. Vocês lembram, eles foram à Holanda visitar a irmã do Mirco, que agora mora lá com o namorado.

A coisa linda é que também foi a avó do Mirco, a Lucia, de 84 anos. Nunca tinha sequer ido a Roma. A Perugia, só duas vezes, a pé (são 25 km), quando era jovem, pra entregar peles de coelho a um comprador. Não se sabe como, conseguiram convencer a menina a subir num avião e a ir a um outro país que ela nem sabe onde está. E o mais legal: não só ela gostou da viagem, achou tudo curiosíssimo, e contou todos os detalhes, mas também disse muito blasée que achava que o vôo seria mais assustador, mas acabou que não deu nem um medinho sequer. Viemos no carro ouvindo os relatos da viagem e morrendo de rir com as impressões que eles tiveram. Interessante ver como os pontos de vista mudam dependendo do background que você tem. Eles não têm nenhuma referência da vida no exterior, e acham o fim do mundo, por exemplo, não ter tempo de voltar pra casa pra almoçar e ter que se virar com um lanchinho. Acham engraçado que as casas em Amsterdam não tenham cortinas e ninguém fique olhando lá pra dentro pra curiosar - se fosse aqui na Itália, ia ter gente colado nas janelas o dia inteiro só pra assistir à vida dos outros. Acharam genial a arrumação das flores no mercado, as combinações de cores, etc. Acharam os holandeses muito gentis e simpáticos, opinião com a qual eu não posso discordar porque todos os que eu conheci eram muito legais. Enfim, disseram que valeu a pena e fiquei muito contente por eles por finalmente terem saído da toca e visto não só onde a filha tá morando, mas um outro mundo totalmente diferente do quintal da casa deles.

Postado por leticia em 10:54

24.08.05

uia

O jantar na festa de Rivotorto, melhor sagra da Umbria, teria sido muito melhor se, entre os cannelloni de carne de caça e a torta al testo com lingüiça na brasa a enxaqueca não tivesse atacado.

As crises estão ficando mais freqüentes e o remédio não está mais adiantando tanto. Em Paris acordei uma vez de madrugada com dor. E o último sintoma que faltava, a artéria pulsante na testa, agora não falta mais. O autodiagnóstico é claro: enxaqueca em salvas. A pior, claro. Aquela que dá vontade de dar um tiro na cabeça, porque qualquer coisa, QUALQUER COISA, é melhor do que aquela dor.

p.s.: Não preciso nem dizer que o post não foi escrito no dia da enxaqueca, porque teria sido impossível. É retroativo mesmo.

Postado por leticia em 14:40

01.08.05

cose della moda

Toda hora minha mãe pede pra eu fotografar vitrines ou mandar revistas pra ela ficar sabendo, com antecipação, qual vai ser a moda pra próxima estação. Na verdade nem precisa, porque ela tem um olho clínico pra essas coisas que é realmente invejável.

Ano passado o grande lance foi o rosa. E também as jaquetinhas cinturadas, de preferência brancas, e as microssaias pregueadas. Esse ano custou a aparecer algo de mais sólido nas vitrines, e só agora a coisa pareceu se definir. A cor do ano, parece, é o verde-limão. E o estilo do ano, parece, é o hippie (ou íppi, como se diz aqui), que eu a-bo-mi-no. Vejo túnicas com calças (não gosto, mas é bom pra gordas), batas tipo ciganinha, com elástico abaixo do peito (socorro), saionas disformes, combinações cromáticas escalafobéticas. Mal posso esperar pra festa de Bastia em setembro, quando as bastiolas fashion victims exibem suas figuras na mesquita, os cabelos preto graúna, os óculos de sol que cobrem metade da testa, os saltos que vira e mexe entalam entre os paralelepípidos do centro histórico. Diversão garantida.

Enquanto isso, levo dois minutos pra passar a bata indiana (a nacionalidade, não só o estilo) linda que minha mãe mandou, de algodão finiiiiiiiiiiiiiiiiiiiinho, bordado branco sobre tecido branco. Chique e fresca. E sem o maldito elástico embaixo do peito, nem o decote canoa elasticizado, que toda hora escorrega pelos ombros. Viva mâmi.

Postado por leticia em 17:24

31.07.05

*sigh*

Ontem foi um dia miraculoso. Paulo Cintura cancelou a aula da uma às três, o Salame não pôde alongar a aula de meio-dia à uma, almoçamos em Torgiano e a comida estava ótima, a tradução dos materiais de construção está na metade e revelou ser menos difícil do que eu imaginava (embora não o suficiente pra deixar que eu tirasse uma soneca depois do almoço), jantamos na festa do ganso na bela e fresca Bettona, e fechamos a noite nos perdendo em Spoleto, pro papai ver a Ponte das Duas Torres, construída sobre a antiga estrutra de um aqueduto romano.

Hoje vamos almoçar na Arianna, pra fazer companhia pra avó do Mirco. Ettore e Arianna vão a um encontro de carros de época em Collemancio, perto de Cannara, e vão almoçar por lá mesmo.

E depois tenho que voltar pros malditos tijolos, telhas, portas, traves, calhas. Se arrependimento matasse.

Postado por leticia em 09:26

26.07.05

:)))))))))))))

Vocês estão acompanhando o mundial de esportes aquáticos no Canadá? Eu fico hipnotizada com as imagens. Ando dormindo pouquíssimo porque fico até tarde vendo aquela gente se remexendo na água fresca, enquanto eu morro de calor na cama.

Merecidíssimo o ouro francês no nado sincronizado individual. A francesinha, bonita e elegante, com cara de safada, fez uma coreografia muito legal, ao som de uma música animada. Aliás, já perguntei isso aqui, mas acho que é mais uma daquelas perguntas que permanecerão sem resposta por todo o sempre: por que diabos toda música de patinação, nado sincronizado e outros esportes viados é sempre um porre? Caramba!!! A francesinha não, a música era, hm, estranha, mas fácil de teatralizar, e a atleta é expressiva, recita parágrafos inteiros com um olhar, e ainda por cima nada sem aquele maldito pregador no nariz, ou seja, nada de rosto deformado. Bár-ba-ra. Mereceu de verdade, eu achei.

Maravilhosas as imagens debaixo d’água dos nadadores no início da raia, na partida ou logo depois da virada, quando dão pernadas de golfinho com os braços alongados acima da cabeça. Lindos, sereios, todos, homens e mulheres. As mulheres são interessantes de ver: as japonesas, bronzeadíssimas; as australianas, sorridentes; as americanas, iguais; as chinesas, minúsculas; as alemãs, rígidas; as polonesas, sérias; as canadenses, decepcionantes; as suíças, poucas. Os homens são todos deuses, com aqueles músculos que parecem ter sido desenhados daquele jeito todo natural, que dão vontade de tocar pra ver se são de verdade, de contornos tão suaves e ao mesmo tempo tão claramente definíveis. Os atletas talianos, claro, são os únicos machos da competição com sobrancelhas feitíssimas. Um deles papou uma medalha de ouro, numa prova em que o insosso di Phelps parece que baianizou e chegou entre os últimos. Os ombros são largos, trapézios e dorsais salientes pululam pra fora dos maiôs e macacões estilo tubarão. Onde foram parar as sunguinhas?

Divertidíssimas as imagens debaixo d'água dos jogadores de polo aquático. Na superfície, aquela chatice, bolinha pra cá, bolinha pra cá, aquela touquinha feia. Do peito pra baixo, o pau comendo soltíssimo, um puxa a sunga do outro, cotoveladas a torto e a direito, chutes bem mirados, abraços de tamanduá.

E vou dormir sonhando com os meses em que nadei das cinco e quarenta da manhã às seis e meia, eu e todos os velhinhos da Tijuca.

Postado por leticia em 23:56

23.07.05

babbo

Ontem acordei cansadíssima. Tinha sonhado que estava com algum problema nos meniscos. O sonho era tão real que acordei com os joelhos doendo, e a dor só passou quando entendi que não estava mais dormindo. Que horror.

**

Meu pai deve chegar hoje. Veio de carro de Portugal. Ontem fomos visitar o Leguinho e fiquei imaginando qual vai ser a reação dele quando vir meu pai, que ele não vê há sei lá quanto tempo, uns três anos? Ele sempre adorou papai. Nossa teoria era que ele estava acostumado a viver rodeado de mulheres – eu morei um tempo com a minha avó, e além de nós duas só vinha a Lúcia, a faxineira, lá em casa. Meu pai tem uma voz grossa e rimbombante, e sempre achamos que aquilo devia ter um grande efeito sobre o coitado do cachorro. Estou curiosa, vamos ver a que horas papai vai chegar.

Postado por leticia em 09:04

20.07.05

gente chata é foda

Hoje me estressei com um marroquino nos correios.

Não tinha fila; era aquele horário morto de logo-antes-do-almoço em que, em um país de mangioni como a Itália, ninguém ousa sair de casa pra não perder o rango. Como sou uma menina prática e saio de casa com toda a papelada preenchida e devidamente ordenada, fui direto ao balcão com a minha tralha (uma sacola de compras que não coube no porta-treco do motorino) e meus três conjuntos de coisas a resolver: o papel pra depositar dinheiro na conta, o papel pra depositar dinheiro na poupança, e a conta de água pra pagar. Junto comigo tinham entrado na agência dois marroquinos, que voaram na minha frente pra pedir um carnê em branco pra pagar sei lá o quê. Vejam bem, já começaram mal; eu tenho vários carnês em branco em casa e na oficina, porque se precisar pagar alguma coisa nos correios eu preencho e já chego lá com tudo pronto. But that's just me.

Continuaram mal, porque em vez de ir a uma das mesinhas que estão ali pra isso mesmo, ou seja, pra neguinho preencher coisas, ficaram no balcão ao lado do meu. Enquanto um preenchia, o outro ficava me olhando. Eu lá com a carteira aberta, documentos à vista, dinheiro espalhado nos três montinhos diferentes (o da conta, o da poupança e o da conta de água), e o diabo do marroquino me olhando. Até que não resisti e pedi muito educadamente se ele não podia fazer o favor de ir um pouco mais pro lado.

Pronto! Caiu o céu sobre as nossas cabeças.

- Qual é o problema?

- O problema é que eu não gosto de ver que tem gente pendurada no meu ombro enquanto eu faço as minhas coisas.

- Eu não estou fazendo nada.

- Não importa, não quero ninguém olhando quanto dinheiro eu tenho na carteira.

- Tá me chamando de ladrão?

- [bufando] Olha só, fofo, esse negócio de preconceito comigo não cola, porque eu sou tão imigrante quanto você. A diferença é que eu não incomodo os outros. [E que tenho os dentes, digamos, melhorzinhos. E falo italiano direito. E sou cheirosa. Entre outras coisas.] Você poderia ser qualquer outra pessoa, o papa, o Bono, o Tolkien em pessoa, e eu iria ficar irritada do mesmo jeito. Não quero ninguém respirando na minha nuca enquanto eu cuido da minha vida.

- Tá me chamando de ladrão! Eu não fiz nada! Eu fico onde eu quiser!

- Fica onde quiser coisa nenhuma. Não tá vendo a placa ali no começo da fila? "Por uma questão de privacidade, por favor aguarde sua vez atrás da linha amarela". Tá vendo?

- Eu não sou ladrão! Não me interessa quanto dinheiro você tem!

- Ainda bem, até porque eu não tenho nenhum mesmo. Mas não quero ninguém bafejando no meu cangote. [ainda mais com esses dentes cor de ferrugem].

Antes que ou eu ou ele resolvesse cair na porrada, uma funcionária que estava arrumando elásticos num canto resolveu abrir outra caixa, bem longe de mim, e chamar os marroquinos.

Ora, tenha santa paciência. Depois não sabem por que ninguém os suporta.

Postado por leticia em 15:01

19.07.05

da série pequenas coisas...

Já comentei aqui antes o quanto é uma mão na roda ter um lanterneiro na família.

Meu capacete é daqueles completos, que cobrem também o rosto e a mandíbula, e não só o topo da cabeça. É grande demais pro espaço embaixo do selim, então toda vez que eu saía de casa com o motorino tinha que ficar carregando aquele maldito capacêtchi pratchiádu, como diz o Mirco, pra cima e pra baixo. E poucas coisas na vida são menos portáteis do que um capacete.

Em um fornecedor de peças, procurando sei lá o que pra um caminhão, Mirco bateu os olhos num porta-trecos daqueles que se fixam na traseira das lambretas e das motos. Vagabundo, de plástica tabajara, mas com chave, com alça e removível. Trouxe pra casa e pronto, chego eu tarde em casa, cansada depois da aula com os Salames, o Mirco jantando com Gianni e Chiara, e dou de cara com aquele negócio em cima da mesa da sala, com um bilhetinho.

No dia seguinte aproveitamos que tinha pouco movimento na oficina e bolamos um jeito de fixar o negócio na lambreta, que é modelo velho e não tinha a base metálica que serve justamente pra isso. Mirco inventou um sistema lá maluco, pegou uns restos de chapa de ferro, dobrou, limou, cortou, furou, pintou de preto, aparafusou, e pronto! Ganhei um porta-treco de lambreta. Não posso me empolgar e entupir de compras, senão o peso na traseira fica grande demais e a lambreta não pára de pé. Mas é o suficiente pra botar o capacete. Maravilha :)

Postado por leticia em 23:07

12.07.05

:))))))))

E a boa notícia da semana é que meu pai vem me visitar. Ainda não sei quando, mas vem.

Postado por leticia em 07:26

11.07.05

contact

Sabem quem me cumprimentou, a seu modo, claro, hoje de manhã? Um coelho selvagem. Eu vinha correndo pela via Sofia e quando fiz a curva da pontezinha dei de cara com ele. Ficou parado na beira do campo de girassóis, muito sério, me olhando com os olhinhos piscando. Depois de alguns segundos de contato visual, deu de ombros e sumiu no campo.

Postado por leticia em 22:24

05.07.05

uhuuu

Hoje fiz uma coisa muito maneira, aproveitando que o Aluno Gentil e a Quarentona Estressada cancelaram as aulas: fui ao aeroporto de bicicleta, pegar nossas passagens de agosto pra Parrí. Não é o máximo? Aproveitei que o dia tava nublado e não tava muito calor, tinha um ventinho de chuva esquisito mas não forte o suficiente pra dificultar as pedaladas, e lá fui eu, quinze minutos de ida e quinze de volta entre campos de girassol, milho e linho (que tem a maior pinta de capim vagaba), até o Aeroporto Internazionale dell'Umbria (cof cof). A mocinha extremamente enrolada da Alitalia disse que é quase certo que titio dará as caras por essas bandas, mas não antes de 2006. Mas se for verdade, me aguardem, fofos, porque pior que a gente, só o Tom Jobim que passava o fim de semana em NY: vamos almoçar em Paris e jantar em Londres váaaaaaaaarias vezes... ;)

Postado por leticia em 17:52

30.06.05

japa

E então aproveitei que tem um salão no andar térreo de onde fica a escola em Perugia, e fui ajeitar as madeixas. Andrea, o cabeleireiro-mor, aparentemente é não-viado e nada antipático – antes que venham me encher, não tenho nada contra viados mas vamos combinar que cabeleireiro bicha com complexo de general e que não faz nada do que você pede e toma decisões sozinho é um porre. Ele foi muito simpatiquinho, usou um novo produto americano (deve ser do tipo que alisa os pixains das negonas americanas, aqueles superpower, porque elas ficam todas lindas) que tem cheiro de óleo de fígado de bacalhau, me explicou como fazer a manutenção e coisa e tal e enquanto ele me ajeitava a cabeça terminei um Camilleri (Gli Arancini di Montalbano).

O problema é que eu não tenho cara de lisa. As olheiras árabes não mentem: minha carapinha é genética e tão médio-oriental como os cedros do Líbano. Quando me vejo lisa no espelho tenho vontade de rir. O Mirco acha que fiquei com cara de mulher madura, e que os cachos me rejuvenescem (faz-me rir, eu nasci velha, meu filho), mas querido, repliquei, estou quase nos 30, ridículo seria eu fazer que nem a Regina Duarte, envelhecendo de cabelão e franjinha, FRANJINHA!, por favor! Mas vamos ver até quando vou continuar com essa brincadeira, antes de me render ao maldito crespo outra vez. Ou de raspar a cabeça de vez e encerrar o assunto.

Postado por leticia em 23:18

27.06.05

tutti al mare

Ontem, pela primeira vez na Itália, e pela primeira vez depois de MUITOS anos, fui à praia. A família da Chiara é de Fano, na região de Marche, e eles ainda têm casa lá. Vocês sabem que eu detesto praia com todas as moléculas do meu ser, mas Fano é uma cidade romana antiqüíssima que eu queria conhecer. Também tinha curiosidade de ver como é que se vai à praia na Itália. E a companhia de Gianni e Chiara não é de se jogar fora. Então, meio a contragosto, lá fomos nós.

Eu e Mirco temos sérios problemas de orientação espacial, de modo que pegamos uma estrada muito comprida, passando por Foligno em vez de ir direto por Gubbio, alongando assim a viagem em uns 40 minutos. O calor tava de matar. O Mirco ODEIA dirigir, acha uma perda de tempo ridícula, e não consegue nem aproveitar a paisagem, além de ficar reclamando o tempo todo do calor, da estrada comprida, de não chegar nunca, do velho que anda a 30 por hora à nossa frente, em uma estradinha estreita que não permite ultrapassagens. Mas eu nunca tinha passado por ali, nunca tinha ido a Marche, e estava achando tudo diferentão.

É diferentão mesmo; é uma pena que Foligno não tenha conseguido virar província, porque as cidades ali em torno são muito diferentes do resto da província de Perugia, nem parece a Umbria. Não sei explicar o que é, mas a diferença é visível.

A estrada é terrível, cheia de curvas, viadutos e túneis longuíssimos, e tenho pena dos motoristas de caminhão que têm que enfrentá-la – têm mesmo, porque não há outra estrada ligando a Umbria a Marche. Mas a paisagem é interessantíssima, com formações rochosas estranhas, estilo canyon, a terra é vermelha, as colinas são muito próximas umas das outras, as casas são isoladas, os nomes das cidadezinhas são engraçados. Muitos motoqueiros na estrada.

Quando finalmente chegamos, comecei a ver as muralhas de Fano, o centro histórico, os castelos, as fortalezas. Tudo isso na beira do mar, muito maneiro. Mas claro que não deu pra ver nada direito, porque tava um calor do cacete. Almoçamos na casa da Chiara, macarrão com molho bolognese que a mãe do Gianni mandou por nós, e depois ficamos batendo papo sobre a viagem à Normandia, estudando os guias e propondo roteiros, até o sol baixar um pouco. Depois, cobertos de filtro solar, caminhamos a curta distância até a praia.

Praia aqui é assim: na imensa maioria dos casos, você não pode chegar e jogar a sua canga e deitar pra torrar onde bem entender. Porque as praias são cobertas de cadeiras de praia com guarda-sol, tudo devidamente igualzinho, numerado e administrado por pessoas que só fazem isso da vida, e a quem obviamente você tem que pagar. Não tenho idéia de quanto custe um guarda-sol, porque o pai da Chiara todo ano aluga um, há anos, porque ele tem barco e aproveita muito a casa em Fano, enquanto que Gianni e Chiara quase nunca vão e não sabiam me dizer o preço. Mas você também pode alugar por dia, claro. Sei que é caro porque todo ano neguinho reclama na TV do carospiaggia, aumento nos preços das praias, mas não sei exatamente quanto. A cadeira é uma espreguiçadeira com uma espécie de pára-sol quadrado, acoplado, que você movimenta ao seu bel prazer, pra cobrir os olhos contra os raios do sol. Nada de canga, só toalhas cafonas estendidas por sobre as espreguiçadeiras. O guarda-sol inclui uma minimesinha onde você pode apoiar seus pertences, e levantando o tampo descobre-se uma minilata de lixo, e também há ganchinhos onde você pode pendurar sua bolsa. A convivência entre vizinhos de ombrellone é pacífica, e muitas vezes, vendo que a espreguiçadeira ao lado da sua está vaga, você joga suas tralhas ali e quando o verdadeiro dono aparece, você recolhe seus trapinhos e pronto, nada de confusão. O mar, o Adriático, não parece lá essas coisas. Chiara não cai na água porque não sabe nadar, e eu não caio porque tenho mais o que fazer, mas de modo geral vi pouca gente na água. A maioria vai pra praia pra torrar mesmo, e a maior parte das mulheres não molha o cabelo. Não sei o que europeu tem contra lavar a cabeça, mas a coisa se mantém até na praia.

De vendedor ambulante, só africanos vendendo CDs piratas com os hits mais chatos do verão. Nada de sanduíche natural, picolé, Matte Leão, claro. Pra comer ou beber você traz de casa, ou vai ali no bar, perto de onde se paga a taxa ombrellone, e paga uma fortuna. Tudo muito tranqüilo, muitos sotaques diferentes ao nosso redor, barcos tabajara saindo e entrando na minimarina, crianças tostadas de sol brincando de carrinho na areia.

Enquanto o Gianni pegava sol pra secar a psoríase dos cotovelos, Mirco dormia na sombra, ao meu lado, e eu, de camiseta e short, irritada por causa da dor de cabeça de origem fotofóbica, pegajosa de filtro solar, os pés cheios de areia grudada (filtro solar até no pé por causa da cicatriz do tombo de lambreta), morrendo de calor sem conseguir suar (tenho poucas glândulas sudoríparas), terminei Un Mese con Montalbano (de Camilleri). Quando finalmente a tortura acabou, todo mundo acordou e voltamos pra casa pra tomar banho, o sol já tinha dado uma baixada.

Jantamos uma piadina horrível num lugar tipo Chez Michou ali perto mesmo, tomamos um sorvete horrivelmente pesado e doce sentados de frente pro mar, e depois nos mandamos. Ainda pegamos um trânsito horrível pra voltar, no melhor estilo Região dos Lagos no Carnaval, por causa de desvios na estrada devido a obras mal programadas. E por causa de morrinhas que insistem em viajar a 50 apesar da fila interminável de faróis acesos atrás. Chegamos em casa tarde e cansados, e o dia só valeu pela companhia e pelo sono tranqüilo do Mirco na praia. Essa vida al mare realmente não é pra mim.

Postado por leticia em 23:09

29.05.05

roncadores, beware!

Por causa da sensacional repercussão do assunto spray anti-ronco, vamos desenvolver melhor o argumento.

O ronco é, na maioria dos casos, causado pelo atrito de estruturas das vias respiratórias superior, que resulta em barulho. A causa principal desse atrito anormal é uma lubrificação natural insuficiente. Uma outra causa comum do ronco é a obesidade, que pressiona estas mesmas estruturas, diminuindo o diâmetro das vias aéreas e coisa e tal. Muitas vezes o ronco vem acompanhado de apnéia do sono, ou seja, curtas interrupções da respiração, imediatamente seguidas de um roncão daqueles tão altos que é capaz de um sismógrafo conseguir registrar.

Quando perguntei ao Aluno Endocrinologista onde eu podia levar o Mirco pra ver esse lance do ronco, foi por causa da apnéia também, que eu não tinha certeza que um otorrinolaringologista era capaz de tratar. Aluno disse que sim, que um bom otorrino resolve o ronco, qualquer que seja sua causa. Ele deu três possíveis soluções pro problema, no caso de um ronco normal, sem necessidade de intervenção cirúrgica.

O primeiro é o que eu batizei de Método da Princesa e a Ervilha: consiste simplesmente em costurar algo volumoso pero no mucho, tipo um par de bolas de golfe, nas costas do pijama do roncador. Como a posição de barriga pra cima é a que mais favorece o ronco, as bolinhas fazem o que normalmente os pobres companheiros dos roncadores fazem: impedem o roncador de ficar naquela posição. Em vez de eu acordar com o ronco e cutucar o lanterneiro pra ele virar de lado, a bolinha não deixa ele ficar nem dois segundos de barriga pra cima, porque incomoda. Só que no nosso caso isso não funciona, porque o Mirco não dorme de pijama, mas com a camiseta limpa que vai usar por baixo da camisa no dia seguinte. Costurar e descosturar bolinhas todo santo dia é inviável, e por isso o método foi imediatamente descartado.

O segundo são aqueles adesivos que os atletas agora gostam de colar no nariz. Não tem nenhuma substância química envolvida, a ação é, novamente, puramente mecânica: através da sua estrutura muito bem bolada, o adesivo exerce forças mínimas sobre a cartilagem do nariz, abrindo muuuuuuuito ligeiramente as narinas e facilitando a respiração. Aluno Endocrinologista disse que uma vez experimentou o adesivo, porque achava que era uma coisa miraculosa estilo Facas Ginsu, e ficou impressionado como funciona. Nesse caso, se o roncador tem deficiência na parte alta das vias respiratórias, o adesivo pode ajudar.

O terceiro método é o tal spray, que ele disse que sabia que existia e funcionava mas não conhecia o princípio químico. A mulher da farmácia disse que não tem nada de estranho, simplesmente óleos essenciais que lubrificam as partes que entram em atrito, evitando o rumor. Paguei os 20 euros muito desconfiada e pensando em qual livro poderia comprar com esse dinheiro, mas não é que a coisa funciona? Você dá três borrifadas no fundo e no alto da garganta antes de dormir, depois de ter escovado os dentes e bebido água, espera vinte segundos e depois engole. E voilà, seu roncador parou de roncar. Aluno Endocrinologista ainda me arrumou, dias depois, um vidrinho de outro tipo de produto, que se injeta no nariz e se chama Ronfnyl, produzido ou distribuído, não sei direito, pelo laboratório italiano Geymonat, mas tem o mesmo mecanismo de ação. Funcionou do mesmo jeito, mas é fedido, enquanto que o spray pra garganta, que se chama Snoreeze, do laboratório inglês Passion for Life, tem gostinho de menta.

Lembrem-se de que apnéia do sono é um dos fatores de risco de morte precoce por cardiopatia em homens, e esses produtos não agem contra a apnéia, por isso, se o seu roncador suspende a respiração por breves períodos enquanto dorme, otorrino nele.

Postado por leticia em 13:23

22.05.05

bologna fiere

Acordamos cedo e partimos na direção de Bologna pra tal feira de produtos pra consertar carro, caminhão, essas coisas legais. O dia tava esquisito, abafado, um calor desagradável. A estrada pra Emilia-Romagna, região onde fica Bologna, é TERRÍVEL. Deveria ser linda, porque atravessa vales cobertos de florestas. São quilômetros de estrada alta, como um viaduto longuíssimo, atravessando os Apeninos Tosco-Emilianos (entre a Toscana e a Emilia-Romagna). O visual é deslumbrante, mas a estrada é terrível, terrível, terrível. É o pavor dos caminhoneiros. O asfalto é esburacadíssimo, no melhor estilo Rio-Santos. Tudo está em obras há ANOS, então há milhões de desvios, tratores, luzinhas; zilhões de túneis, lógico, e, sendo domingo, uma infinidade de morrinhas. A coisa mais ridícula é que é uma estrada importantíssima, já que é a principal ligação entre quem está abaixo dos Apeninos e quem está acima. Se quiser evitar essa buracação toda, tem que ir até Florença e dar uma volta do cacete. Cesena, que fica do outro lado dos Apeninos, é um ponto rodoviário estratégico, e pra chegar lá tem que passar por esse viadutão todo. Mas é realmente uma pena, porque é uma área muito bonita. Já falei dela aqui, inclusive, quando fomos visitar a Fran, ainda morando em Faenza na época. Muitas casonas maneiríssimas de pedra, abandonadas no alto das colinas; cidadezinhas de 3 casas, com nomes curiosos; crianças tomando banho de rio. Aliás, falando em rio, ô rio pra dar voltas e mais voltas, esse Tiber! Toda hora a gente passa por cima dele. Vai meandrar assim na China.

A feira foi mais ou menos como no ano passado, embora menos interessante. A coisa legal é que, apesar de ser um assunto tradicionalmente masculino, há muitas mulheres no ramo. E não falo de pin-ups contratadas pra ficar atrás do balcão vendendo ferramentas das quais ela nunca ouviu falar, mas de proprietárias das empresas, ou filhas ou esposas do dono, que entendem muito do riscado e falam de parafusos, filtros de ar, fornos pra pintura de peças e equipamento de soldar com a maior desenvoltura. Legal, isso. Encontramos inclusive um stand de uma empresa brasileira de kit pra consertar pneu. Os meninos, muito simpáticos, confirmaram a nossa teoria de que domingo, sempre o último dia da feira, é o dia dos caçadores de brindes e de gente que leva a família pra olhar os caminhões e comer chocolatinhos de graça. Nós também caçamos brindes: voltei pra casa cheia de sacolas de plástico, que nunca são demais; algumas de pano, ótimas pra fazer compras; chaveiros, bonés, canetas, bloquinhos, pastas de papelão e outras coisas do gênero. Tudo aquilo me fez lembrar do primeiro congresso internacional a que fomos durante a faculdade, um mundial de Cardio no Riocentro que pra nós, pobres segundanistas, só serviu mesmo pra comer de graça e pegar tanto post-it e bloco de papel que até hoje eu escrevo com canetas da Schering-Plough, em folhas timbradas da Pfizer. E olha que eu me formei em 2001 e não cheguei a exercer.

Saímos da feira às três da tarde e fomos passear pela cidade. Só que tava realmente muito calor, e aquela abafação tirou toda a nossa vontade de bancar o turista. Àquela hora não havia um só restaurante aberto, e o que nos salvou foi, shame on us, o McDonald’s da estação. Comi uma saladinha com frango grelhado e molho de iogurte, chá de pêssego e um Chicken McNugget que o Mirco não conseguiu matar. Notei que, por causa dos mochileiros estranhos, dos drogados pseudo-hippies que vivem nas ruas e dos ciganos filhos da puta (ô raça miserável!), os banheiros são trancados, como no Rio, e pra lavar as mãos e fazer xixi tem que pedir a chave pra gordinha que limpa o chão. Mas tudo bem; de estômago cheio, voltamos pro carro e viemos embora.

Ainda tivemos forças pra jantar na festa do santo padroeiro de Castelnuovo, inaugurando assim o circuito das sagras. Gnocchi com molho de ganso e torta al testo com lingüiça, na companhia do Marco e da Michela, que eu pensei que fosse ficar mais chata com a gravidez mas, ao contrário, desenchatizou.

Postado por leticia em 23:09

21.05.05

scrittura creativa

O curso de scrittura creativa foi muito maneiro. O palestrante é um palermitano novinho, careca alopético, com só um resquício de sobrancelhas, que lhe dá uma expressão muito engraçada. E eu adoro os sotaques sicilianos :)

O curso foi sobre autobiografia. Ele deu vários textos de autores que eu não conhecia, todos Ó-TE-MOS. E me diverti muito, apesar da turma ser grande demais.

Engraçado é ver que qualquer bando de gente junta demonstra mais ou menos a mesma estatística: tem sempre um engraçadinho, tem sempre um velho babão, tem sempre a senhora desocupada, tem sempre um deslumbrado, tem sempre um artistinha metido a estrela, tem sempre alguém que não entende nada de coisa nenhuma. Hoje foi assim mesmo: o primeiro exercício foi fazer uma lista de "eu me lembro...", seguindo o exemplo de um pastel que publicou um livro só com essas coisas, estilo 80's revival. O objetivo era misturar memórias coletivas (das quais não participo, lógico) e memórias individuais, e tentar dar um toque de ironia e graça no texto. Em vez de fazer a tal lista, a senhora desocupada escreveu um texto imenso sobre uma única memória, descrevendo com muitos floreios uma situação ridícula que não tinha graça nenhuma, uma coisa chatérrima. E aí fica aquele clima esquisito, todo mundo querendo rir, resmungando, ai que porre, ô, minha filha, se liga, e coisa e tal.

A amiga do meu aluno, que foi com ele, é daquelas chatas que fazem "aham!" ou "isso mesmo..." a cada coisa que o palestrante fala. E quando ele fala "a teoria do fulano é que X quer dizer Y", dez minutos depois ela levanta a mão e fala, "sabe o que eu acho, mas é a minha opinião, tá, eu acho que X quer dizer Y", como se tivesse descoberto a pólvora. Caraca, que coisa chata! Cada vez que a garota abria a boca era pra soltar uma palhaçada dessas, e eu já tava querendo dar um tapa na cara dela. Almoçamos juntos e eu não resisti e perguntei o que ela fazia da vida: atriz. Aaaaaaaaaaaah...

No mais, aprendi muita coisa legal – mais do que escrever, aprendi a ler certas coisas com um outro ponto de vista. Gostei muito, e daqui a alguns dias ou semanas deve chegar o certificado. Legal :)

Postado por leticia em 20:39

20.05.05

Vai por mim, a invenção/descoberta mais totalmente revolucionária dos últimos séculos não foi a penicilina. Nem o motor a jato. Nem o computador, nem a internet, nem os avanços genéticos. A invenção mais espetacular da história da humanidade é o spray anti-ronco.

Postado por leticia em 12:09

13.05.05

o último dos moicanos

Murilo tinha quarenta e poucos anos. Quantos poucos, exatamente, nem ele sabia – aliás, ninguém sabia nem mesmo que ele já passava dos quarenta. Seu cérebro se petrificara aos vinte anos, e ele permaneceu para sempre naquela idade mental. A coisa já durava tanto tempo que nem mesmo sua própria mãe, que ainda lhe pregava os botões e remendava meias, se lembrava de que ele já passava dos quarenta. Ele mesmo acabara se convencendo de que ainda tinha vinte, e comportava-se como tal. Ou vice-versa.

Murilo não trabalhava. Não só porque o conceito de ganhar a vida era algo de desconhecido para ele, mas também porque não sabia fazer nada. Nunca aprendera nada de útil, jamais fizera nada de útil ou interessante, de verdadeiramente interessante, em toda a sua vida. Mas essa era outra coisa que Murilo não sabia: de onde vinha o dinheiro para pagar certas comodidades. Nem ele nem ninguém sabia de onde vinha o dinheiro, mas também não interessava, assim como não interessava o fato dele ter passado dos quarenta. Porque era suficiente saber que Murilo era grisalho, estava sempre de óculos escuros de marca, sapatos pontudos de couro de crocodilo, calça jeans cujo preço exorbitante era justificado somente pelo poder de duas iniciais gravadas no bolso de trás, camisas bem passadas. Ninguém sabia também quem passava as camisas, mas isso também não interessava. O que interessava era que Murilo dirigia um Porsche prateado superhipermegaesportivo, daqueles colados no chão, que zuniriam nos seus ouvidos se pudessem fazer uso de todos os seus cavalos ao mesmo tempo – infelizmente não podem, as leis de trânsito estão aí pra isso mesmo. Murilo vivia em um centro habitado cuja velocidade máxima era limitada em 50 quilômetros por hora, mas mesmo assim nunca tivera poucos cavalos à sua disposição. Mudava de carro como mudava de camisa, mas a imaginação era pouca: já tivera uma BMW Z4, daquelas coladas no chão; Mercedes esportivas, daquelas coladas no chão; uma Ferrari, daquelas... Murilo era assim.

Agüentava as sessões de tiração de sobrancelha com a força e a coragem que só um macho de verdade tem. Horas e horas de bronzeamento artificial. Linha direta com o maior produtor nacional de gel para os cabelos. E, claro, cartas de felicitação da Philip Morris de vez em quando, agradecendo a preferência. Porque, como todos os outros espécimes de Homo sapiens tabacoscrotus, Murilo jamais, jamais saía de casa sem acender imediatamente um cigarro. Gostava particularmente de acender um Marlboro (coisa de cowboy moderno mesmo, coisa de macho que tem carro esportivo conversível e, conseqüentemente, o maior órgão reprodutor masculino da fauna terrestre e marinha) enquanto esperava o elevador. Batia as cinzas no vaso de planta do condomínio, e entrava. Ou então, para ser mais democrático e distribuir de forma mais justa o fedor nicotínico, às vezes usava as escadas, empesteando homogeneamente todos os três andares do pequeno edifício onde vivia com sua fêmea. Quando chegava ao térreo, apagava o cigarro no capacho, acendia outro e entrava no carro, inevitavelmente estacionado de modo a ocupar o máximo de vagas possível. Dirigia sempre assim: bem afastado do painel, para poder esticar o braço direito e dirigir com a palma da mão, o cigarro aceso displicentemente encaixado entre os dedos. O braço esquerdo apoiado na janela aberta, o vento se esforçando para mover os cabelos engomados, os óculos escuros combinando com a pele artificialmente morena, a fumaça se acumulando dentro do carro. Às vezes, esperando o sinal vermelho abrir, mudava o cigarro para a mão esquerda, que pendurava, cheio de charme, do lado de fora do carro. Por sorte jamais queimara nenhuma velhinha que passara ao seu lado de lambreta, mas também, se o tivesse, jamais perceberia. Poucas coisas percebia, o Murilo.

Aonde ia no seu Porsche prateado, nunca ninguém soube. Nem ele mesmo. Tampouco com quem tanto fala em seu celular último tipo, que tira fotos, transmite os melhores momentos de Inter x Juventus, e bate claras em neve ao mesmo tempo. Aquele que um clone de sua fêmea anuncia na TV, de biquini vermelho, com uma praia no fundo e sempre, sempre, o vento nos cabelos.

A maioria das fêmeas da sua espécie eram hipotrofiadas em muitos sentidos. Para não engordar, comiam muito pouco – a espécie ainda não se desenvolvera o suficiente para surgir sem glândulas sudoríparas, e fêmeas de Homo sapiens tabacoscrotum não gostam de suar, não, não, não, e conseqüentemente não se exercitam. Gostam de freqüentar academias, em conjuntos cor-de-rosa da Nike, maquiagem, argolas prateadas e cabelos soltos, mas jamais levantam sequer um polegar. Comendo quase nada, pouco a pouco desenvolveram uma hipotrofia de todo o sistema nervoso central, que quase sempre comanda um corpo miúdo, lordótico, cujo centro gravitacional não funciona na ausência de saltos-agulha. A imensa maioria das fêmeas desta espécie tem cabelos cor de mico-leão dourado, sobrancelhas arqueadas estilo Conde Drácula, a pele sem viço por causa da alimentação carencial (problema facilmente resolvido com cerca de 150 gramas de base e pó-de-arroz). Muito freqüentemente usam, além da maquiagem excessiva, perfumes sufocantemente doces na estação e na quantidade erradas, saltos ortopedicamente não recomendáveis, e, principalmente, lápis para contorno labial, sem batom. Muito freqüentemente também fumam, e obviamente lançam tanto as guimbas quanto os maços vazios pela janela do carro, o que as torna parceiras ideais para os machos de sua espécie. Como eles, também não fazem nada, nem nunca fizeram, além de falar no celular, e, como eles, também são imunes à passagem do tempo – a diferença é que normalmente tendem a se petrificar nos quinze anos.

Murilo era o último de sua espécie. Talvez tenha durado tanto porque fazia parte de uma minoria que preferia estrangeiras exóticas e vulgares em vez dos micos-leão dourados. Mas era o último de sua espécie. Gerações e mais gerações de inatividade cerebral, de bronzealmento artificial, de dores sobrancelhais suprimidas à força de puro poder mental, de conversas vazias sobre carros e louras micos-leão dourados, e principalmente de cigarro em espaços confinados (o carro esportivo de dois lugares, o elevador de pequenos edifícios familiares, o banheiro de restaurantes) esterilizou-os todos. Machos e fêmeas. Os espermatozóides, ocupados demais em ver quem tinha o rabo mais longo, também acabaram por sofrer atrofia, e não mais fecundavam os óvulos, mal nutridos e intoxicados pela tintura cor mico-leão dourado.

É assim que uma espécie entra em auto-extinção.

E todas as pacas mancas do mundo viverão felizes para sempre.

Postado por leticia em 19:26

11.05.05

banana

Eu devo estar ficando muito velha mesmo. Porque ando de uma sentimentalidade ímpar.

Sempre fui chorona – choro de raiva, de tanto rir, de felicidade, de angústia depressiva, de dor, de cansaço – mas ultimamente a coisa anda passando dos limites. Ou então é o mundo que está passando dos limites, já não sei mais.

A história da cadelinha Preta, que não consigo nem reproduzir aqui pra não cair no choro outra vez, me fez, nessa ordem: vomitar, chorar e doar uns merréis pra SUIPA (falando nisso, doem, crianças, e adotem, se possível; sigam o exemplo da querida Marcinha, vejam que maravilhas de canídeos que ela trouxe para o seio de seu lar). Não posso nem imaginar nenhuma cena de bicho ou criança ou velho sofrendo sem chorar ou entrar em taquicardia. Em todo o filme A Queda, em meio a pedaços de corpos, cirurgiões empapados de sangue serrando pernas, e outras coisas deliciosas, a única cena que me fez chorar foi o doutor sei lá o quê entrando num hospital, presumivelmente abandonado, pra pegar remédios, e dando de cara com um quarto cheio de velhinhos doentes, sozinhos, largados, olhando pra ele em silêncio. Lendo Io Non Ho Paura (ainda não consegui ver o filme, caramba) chorava em todas as descrições do menino no poço. E o que me tirou a fome no domingo, coisa que quem me conhece sabe que é praticamente impossível porque eu consegui a proeza de engordar dois quilos no pós-operatório da remoção de um dente do siso – nada abala meu apetite – foi ver, no telejornal, a imagem daquele americano, Rocco não sei o quê, chorando e dizendo "I ain't killed anyone!" com voz embargada enquanto era levado pro corredor da morte. Acusado de matar a ex-namorada, foi condenado por provas de DNA analisadas pelo mesmo laboratório que, descobriu-se, já mandou gente inocente pra morte antes, e fala-se inclusive na possibilidade de tais "erros", se é que erros são, terem sido causados pela "pressão" exercida pelo governador do estado (no caso, a Virginia, e o governador é republicano, só pra constar). Caramba, aquilo acabou comigo. Não sei nada sobre o caso, e pode ser mesmo que o cara seja culpado, mas a mera possibilidade dele ter morrido inocente, ou simplesmente ouvi-lo chorando e dizendo aquela frase com aparente sinceridade, foi o suficiente pra me fazer afastar o prato. Que estava cheio de tagliatelle fatte in casa, diga-se de passagem. Né pouca merda não.

Mas tenho que admitir que sou mais sensível às causas animal, criançal e velhal. Não necessariamente, mas quase certamente, nessa ordem. Até de bicho asqueroso tenho pena, e imploro pra não matarem, se for possível, mas pra jogar pra longe de mim. Ultimamente há muitos, mas muitos gatos atropelados nas ruas, o que me leva a crer que não são bichos tão espertos quanto imaginamos, ou então têm um tesão que move montanhas. Caramba, que nervoso que me dá. Cada vez que vejo uma massa de pêlos achatada na estrada penso no Leguinho e fico com vontade de ir correndo na Arianna dar um abraço naquele monstro bobão. Tem um gato preto e branco que foi atropelado na bifurcação pra Perugia, na superstrada. Não foi achatado, mas deve ter levado uma porrada e caiu no acostamento. Isso foi há semanas. Eu vou a Perugia pelo menos duas vezes por semana, o que significa que venho acompanhando seu processo de decomposição com um misto de interesse e tristeza. Fico pensando se ele era de alguém, se morava na rua, se tinha amigos cachorros tipo o mongo do Leguinho, se estava a fim de alguma gatinha das redondezas (isso supondo que fosse macho), se comia restos de comida que neguinho às vezes deixa nos cantos pros bichanos.

Vou começar a investigar serviços de castração grátis por aqui. Tá na hora de castrar a Priscilla. Seus filhotinhos são uma diliça, mas quem vai garantir a saúde deles enquanto crescerem?

Postado por leticia em 21:43

10.05.05

haja...

Nos últimos dias fiz dois estranhos muito felizes com a minha incomensurável gentileza.

Semana passada, final da tarde, eu na labuta tradutória no computador, toca o telefone da sala. Atendo, uma vozinha educada de homem com língua presa (não esse que vira effe, mas presa que vira pguesa, sabe? Não era a "r moscia" italiana, era defeito mesmo) pedindo um minuto do meu tempo pra responder a algumas perguntas da pesquisa de opinião sobre a Coop, meu supermercado preferido. O tom de voz deixava muito claro que o dia tinha sido improdutivo e cheios de patadas telefônicas, e percebi que ele estava quase implorando pra que eu respondesse. Então resolvi ser boazinha (quando não querem me vender nada eu quase sempre sou) e pedi licença pra abaixar a televisão, que sempre fica ligada enquanto estou sozinha em casa. Ficamos uns bons dez minutos no telefone, ele repetindo aquelas perguntas bobas mecanicamente, de um a dez que nota a senhora dá à arrumação dos produtos no supermercado Coop que a senhora freqüenta, de um a dez que nota a senhora dá à preocupação da Coop com a ecologia, de um a dez que nota a senhora dá à disponibilidade dos funcionários Coop, de um a dez que nota a senhora dá às ofertas semanais dos supermercados Coop, e por aí vai. Respondi tudo rapidinho, com seriedade e sinceridade, ainda fiz umas piadinhas com algumas perguntas particularmente idiotas (quanto à sua atual situação econômica, a senhora acha que nos próximos doze meses vai piorar, se manter estável ou melhorar? Que raio de Vox Populi resolve botar uma pergunta dessas?), e como recompensa ouvi um suspiro de alívio do outro lado e um agradecimento longo e sincero – Lei è stata veramente gentilissima, signora, la ringrazio tantissimo!!! Buona serata e buon fine settimana!

E hoje à tarde, quando estava me preparando pra sair pra dar aula no restaurante, o telefone toca outra vez. Era um motorista de courier, que não conseguia saber onde ficava a minha rua, e precisava fazer uma entrega aqui. Eles fazem assim: se não conseguem descobrir como se chega a um determinado lugar, coisa que às vezes não é fácil porque as numerações são malucas e muitas vezes nem existem, eles catam na lista telefônica o número de alguém que more ali na área e possa dar explicações de como chegar. Calhou que o cara precisava fazer uma entrega exatamente no meu prédio. Tava perdido no centro de Bastia, e não sabia como vir parar aqui – compreensível, visto que Cipresso é uma fração de Bastia, mas sempre Bastia é, e, partindo-se do pressuposto que quem está em Bastia conhece a cidade, senão não teria nada o que fazer aqui, estima-se que sabe também onde fica Cipresso. Ou seja, nada de placas. O coitado do homem tava plantado em frente à Coop, e disse que já tinha dado várias voltas sem entender pra onde tinha que ir. Fui dando as direções enquanto ele ia seguindo adiante e descrevendo o que via: tô passando em frente ao cinema... Ah, tá, tô vendo a placa pros correios... Viro à esquerda, a senhora disse? Sim, tô vendo o edifício romano em restauração à minha esquerda... Padaria Mela, tô vendo, viro à direita... Tá, tô atravessando a ponte... Praticamente guiei o homem até a porta do meu prédio, coitado. Fiquei me achando A escoteira com a minha boa ação. Semana que vem é capaz de rolar uma velhinha pedindo ajuda pra atravessar a rua.

Eu sou paciente com quem merece. Com gente chata ou burra, e principalmente com gente chata E burra ao mesmo tempo, não consigo. Fora isso, eu sou a gentileza em pessoa. Às vezes.

Postado por leticia em 21:15

08.05.05

vovó

Essa é a minha avó. Morreu jovem, quando meu pai era rapazinho, deixando 4 filhos e 1 filha pro meu avô criar. Além de ser linda de morrer, como é claramente visível, era uma mulher educada e requintada, e, sobretudo, modernérrima, muito à frente do seu tempo. Até hoje, em reuniões de família, fala-se muito dela – não só os familiares, mas também amigos e ex-vizinhos, e inevitavelmente todo mundo acaba chorando.

Sempre tive a impressão de que se tivesse vivido mais ela talvez tivesse virado uma grande amiga da minha mãe, que é outra que está muito à frente do seu tempo – e não sou só eu que estou dizendo; outro dia ela recebeu o telefonema de um ex-aluno (ela não dá mais aula há quanto, vinte anos?) que viajou o mundo com a Marinha, viu e compreendeu coisas que minha mãe já havia comentado séculos antes na sala de aula, e resolveu catar o nome dela na lista telefônica e ligar pra dizer o quanto ela tinha sido foda. Também sempre tive a impressão de que nossa família seria muito melhor hoje, em muitos sentidos, se ela não tivesse morrido tão jovem. Minha avó é a pessoa que eu mais gostaria de ter conhecido, no mundo inteiro. Meu avô até hoje só senta à mesa de frente pro quadro dela, na parede oposta da sala. Meu pai e meus tios dizem que ela foi uma mãe muito alegre, com uma intimidade com os filhos que naquela época era unheard of, mas eu vejo no seu olhar uma melancolia que, infelizmente, foi a única coisa que eu herdei dela.


Postado por leticia em 20:40

25.04.05

uia

Feriados são realmente uma invenção maravilhosa. Só é chato quando o tempo não ajuda.

Além de ser feriado, hoje é o aniversário da minha prima dentista, a Erica. E ontem foi o aniversário de uma amiga querida, a Bebel, com quem estudei a vida toda no Andrews. Ontem me peguei pensando nelas enquanto dirigia, e do nada me veio à cabeça uma das muitas musiquinhas que nós, meninas criativas, escrevíamos no colégio. Essa de ontem, a única da qual me lembro do começo ao fim, escrevi com a Bebel e com a maluca da Patricia. A melodia não preciso nem dizer qual é. Vejam que primor.

Penso numa
paisagem muito bela
Abro a janela e dou de cara
com uma favela

Vejo os molequinhos se matando
E vem um logo me assaltando

Meu relógio não estava no seguro
Não recebi outro relógio
no lugar do meeeeeu

Cocaína, traficante, maconheiro
Que interessante

Vejo um assalto a banco,
é tão engraçado
que me faz chorar
de emoção

E todos vão roubar...

Cada moleque
vai se tornar um marginal
E isso aqui já é normal
Você sabe bem

E todos vão roubar...

Postado por leticia em 15:49

19.04.05

papamania

A Cora falou mais ou menos o que eu tava pensando. Ontem, voltando da última aula pouco antes das sete da noite, ouvi no rádio toda a expectativa dos ouvintes e do apresentador do programa daquele horário quanto à fumaça das sete. Assim que cheguei em casa liguei a TV e, batata, às sete e cinco a primeira fumata, preta. A primeira coisa que imaginei foi a seguinte cena: os cardeais todos reunidos, tomando taças de um bom Barolo e beliscando grissini de alecrim, tricotando e dando risada.

- Ih, já são quase sete da noite. Como o tempo voa quando a gente tá se divertindo, né não?

- É mermo... Mas não seria melhor soltar logo uma fumacinha? Coitado daquele povo lá fora, tá frio, vamo mandar neguinho pra casa, pra jantar... Olha que daqui a pouco tem mais gente lá fora do que no show do Vasco Rossi em Catanzaro, grátis, ano passado.

- Melhor esperar até o último minuto, caro cardeal Fulano. Timing is everything. Quando o pessoal já estiver reabsorvendo a adrenalina das sete da noite, no pós-clímax total, a gente solta a fumaça.

- Uns dois ou três minutos depois das sete, você quer dizer?

- Isso. E que não seja muito claro, de imediato, se é branca ou preta. Só pra dar uma confundida. Aí todo mundo vai pra casa jantar e assistir à microssérie Karol, Un Uomo Diventato Papa, que vai ao ar no canal 5 hoje às nove.

- Mas quando é que vamos finalmente revelar a existência do novo papa? Tem que ter cuidado pra não cansar a galera, cardeal Beltrano; não podemos abusar da boa vontade do povo... As novas gerações têm pouca capacidade de concentração, se a gente ficar adiando, adiando, adiando, só pra deixar o pessoal excitado, eles vão acabar cansando.

- Então amanhã às sete da noite. Não, às seis, quando ninguém estiver esperando. Você vai ver que ibope que vai dar. Nem o U2, que esgotou os ingressos pro show em Milão 25 minutos depois do início das vendas online, vai poder competir com a gente.

- Mas não é sacanagem com quem ainda tá trabalhando naquele horário? Talvez seja melhor na hora do jantar...

- Não, não. Pode interromper a digestão. Vocês sabem, carne grelhada, aspargos, pimentão... Melhor fazer antes, assim o pessoal vai parar de trabalhar quando os filhos ligarem pro celular avisando. Toda aquela agitação vai dar até mais fome na galera.

- É verdade. E assim pelo menos os telejornais vão ter tempo de se preparar. Às oito da noite todo mundo vai estar psicologicamente preparado, e vai jantar com os olhos colados na TV. Cês acham que pega mal eu botar meu boné da Nike?

- Não exagera, cardeal Tizio (fulano, em italiano). Bom, então tá combinado. Uma fumata ambígua agora, outras amanhã, e às seis da tarde a fumata branca.

- Beleza. E depois, habemus chester!

- Isso aí.

- Cool.

(uma rodada de high-fives)

- Vambora que eu tô com fome. Esses grissini são ótimos, mas engordam que é uma beleza. E esse azul brilhante do teto do Michelangelo tá me dando dor de cabeça.

Postado por leticia em 18:02

14.04.05

:))))))))))))))

Postado por leticia em 09:48

12.04.05

linques

Cês já leram esses meninos? São bárbaros.

Via Diário de Lisboa, também ótimo.

Postado por leticia em 18:51

uia

Tirou as palavras da minha boca. Dá vontade de imprimir todas as fotos e guardar pra mostrar pra italiano bobo que diz que brasileira é linda. Pobre nunca é lindo. Pobreza, infelicidade, ignorância, dificuldades, doença, tudo isso enfeia. Feio que tem filho com feio acaba perpetuando o feio. E aí resulta na Miss Sergipe.

A Fernanda só não falou dos nomes das meninas, bizarros, cheios de kás, ipsilons, dáblius; nomes inventados, nomes pseudo-estrangeiros, nomes de personagens de novela. Tristeza, viu.

Postado por leticia em 08:55

06.04.05

faz-me rir

No coração da fé católica do mundo, a peregrinação resultou, é lógico, em especulação. Em Roma tem gente vendendo garrafinha de água mineral a € 5,00. O cafezinho dobrou de preço. Os sanduíches estão pela hora da morte.

Isso é que atitude cristã. Gostei de ver.

Postado por leticia em 19:37

08.03.05

que porre

Tem gente que parece que veio ao mundo só pra encher o saco dos outros, ainda que indiretamente.

A Suely Maria nunca me encheu o saco pessoalmente, embora às vezes escute Adriana Calcanhoto nas alturas. Mas o cafet... opa, o companheiro é aquele que fuma no elevador e ocupa duas vagas inteiras quando estaciona. E ontem mais um ser que gravita ao redor dela veio me torrar, pela segunda vez. Uma amiga, nordestina tão baixinha que mal se via na tela do videofone. Eu tava me preparando pra sair de casa pra dar aula, com a cabeça ainda na tradução que fiz durante a tarde, e o téééééém do interfone me deu um susto danado. Como não tava esperando ninguém, porque o hominho da máquina de lavar tinha vindo logo depois do almoço, não respondi, fiquei olhando pra ver se reconhecia. A pessoa tocou de novo, olhei melhor e vi um pedaço de óculos. Pensei que fosse a FeRnanda, embora ela, como pessoa educada, sempre ligue antes de passar aqui. Tirei o interfone do gancho e respondi em italiano: pronto? A criatura respondeu em português: vim visitar uma amiga. Quem é a sua amiga? Suely Maria. Caralhos estrelados, pensei, então por que é que você vem tocar o MEU interfone? Não é aqui não, minha senhora. Então dá pra senhora abrir pra mim por favor? Abri de muita má vontade e bati o interfone no gancho, extremamente irritada. É a segunda vez que essa anta toca aqui em casa. Na próxima vez não vou abrir. Se a Suely Maria até hoje não botou o nomezinho no interfone lá embaixo e se a retardada da amiga é incapaz de decorar em qual posição fica o botão dela, não é culpa minha. Tem cabimento uma coisa dessas?

Agora me diz por que meus vizinhos ou são mortos ou são incomodativos assim. Não podia ser alguém tipo a Vera Lúcia, que mora em Ripa também, e ensina literatura em Lecce e está quase sendo expulsa de casa pelos zilhões de livros que tem e o marido é um amor e fala português direitinho? Não podia ser, sei lá, tipo a Pamela, lá da escola, que embora tenha estudado espanhol na faculdade de Letras é uma menina legal e interessante? Não podia ser, deixa eu ver, um casal de arquitetos gays chiquérrimos e engraçados e gourmets? Não, jacaré. Fui cair no mesmo andar de SUELY MARIA. Como diz a Syrléa, devo ter tomado muita pinga no Santo Graal mesmo pra merecer uma coisa dessas.

Postado por leticia em 07:11

07.03.05

:))))))

Olha que coisa bubú que os Três Mosqueteiros me mandaram por e-mail hoje:

Dear Leticia,

It's a very big pleasure for us to have a teacher, like you, for the second
half of the course. You are a very good teacher but you are a very good
person too.
We sincerely love you.

See you soon,

XXXXX


Vou entupir todo mundo de alfajor quando voltar.

Postado por leticia em 07:14

03.03.05

afe!

Sabe uma coisa que me irrita imensamente? Gente/empresa/qualquer um que disponibiliza e-mail mas não responde.

Mandei um e-mail pro hotel em Foz perguntando se tinha algum problema dar o endereço deles pra entregar umas coisas que pretendo comprar pelo Submarino pra trazer pra cá. Jacaré respondeu? Nem eles. Eu acho muito, mas MUITO grave um HOTEL, of all things, ter um endereço de e-mail disponível no site mas não responder às mensagens que chegam. Sou eu que tô ficando maluca? Eu acho que não.

Postado por leticia em 16:15

02.03.05

basta!

Quando saímos da casa da Roberta, irmã do Gianni, ontem à noite, o termômetro do carro marcava – 4° C. Não aguento mais esse frio chato! Non ce la faccio più! No 'ie la fo' più!

Paramos pra visitar o Leguinho na volta e encontramos o Leo soterrado embaixo de mil cobertores, Demo descoberto porque afinal de contas ele é peludo pra isso mesmo, e Leguinho todo encolhido no seu cantinho. Amarrei um suéter velho de lã no pescoço dele, outro na cintura, pra cobrir as costas, dei boa noite e voltamos pra casa.

Só me restou terminar The Old Man and the Sea, que é uma delícia, e começar The Curious Incident of the Dog in the Night-Time, que é outra delícia. E acordei hoje pensando em quanto fui idiota de não ter botado o ficus pra dentro de casa. Com esse frio, ele morreu, acho. Os cravos estão florescendo numa boa, o cactus vai bem, obrigado, as tulipas devagarzinho vão se manifestando. Mas o ficus morreu, e essa realmente me deixou triste.

Postado por leticia em 07:42

22.02.05

cicogna

Tá uma engravidação generalizada ultimamente. Primeiro foi a Ane, depois a Carola; no fim de semana recebemos a notícia de que Marco e Michela, nossos companheiros de sagra do ganso, da cebola, do aspargo etc, também estão in dolce attesa. Gianni e Chiara andaram jogando um papo pra cima da cegonha e torcem pra serem presenteados esse ano. Só falta a FeRnanda, que acho que só não engravidou ainda porque não consegue pensar em outra coisa além de engravidar.

Falando em FeRnanda, sábado tem festchenha de aniversário dela em Ripa. E ontem, bem no meio do FotR, que passou no Canale 5, ligaram pra nos convidar pra um jantar gay na quinta. Aniversário do Franco Romano, que é uma figuraça. Estranhamente, esse ano o balacobaco não vai ser em restaurante chinês. De qualquer maneira vai ser ótimo; não vemos esse pessoal há muito tempo e eu já tava ficando nostálgica.

Postado por leticia em 08:46

20.02.05

ARGH

Domingo é dia de almoçar na sogra, então lá vamos nos comer pasta fatta in casa e bichos estranhos grelhados na brasa da lareira – hoje eram puntarelle di maiale, costelinham de porco, que eu acho trabalho demais pra pouca carne e sempre ignoro solenemente.

Enquanto estávamos dando uma geral na cozinha, chega o Salame-Mor do tio do Mirco com seu filho (...), o chatinho com cara de albanês. Chatinho é pouco. E além de chatinho é burrinho – tem quase quatro anos e ainda fala numa língua que só ele entende, e não compreende coisas óbvias que a gente lhe repete vinte vezes. Eu com essa idade praticamente já sabia ler, mas tudo bem, eu sou mesmo um fenômeno e estatisticamente não conto. E além de chatinho é mal educado, e eu tenho muito medo desse menino quando crescer. Até porque a mãe é maluca, maluca mesmo, em uso de psicotrópicos, história de internação psiquiátrica, acompanhamento pelo Centro de Saúde Mental da cidade, uso do filho como escudo quando é ameaçada, e outras coisas legais desse tipo.

O problema é que é difícil evitar a falta de educação e a idiotice eterna. Olhem que exemplo brilhante de maravilhosa pedagogia infantil:

Legolas está deitado embaixo da mesa da cozinha, exausto, dormindo e roncando, depois de muita brincadeira nos campos em torno da casa. O Chatinho, sentado numa cadeira, começa a cutucar uma pata do Legolas com o pé. Normal, criança é assim mesmo, mas tem que ser corrigida. Aí vem o Salame-Mor:

- Não faz isso que ele te morde.

Aí a Arianna completa a asneira:

- Cê já viu como os dentes dele são grandes? Ele arranca o teu pé fora, hein?

Aí eu começo a me irritar, e dou uma explicação decente:

- Chatinho, olha só, os cachorros aqui de casa são todos muito bonzinhos e bobocas, e praticamente nunca vão te morder, por mais que você encha o saco deles. Mas se você fizer isso com um cachorro que não te conhece, ele pode se irritar e te machucar, mesmo sem querer.

Arianna repete:

- Pois é, Chatinho, olha só que dentão que ele tem.

Finjo que não ouvi e continuo, quase rosnando:

- Além do mais, Chatinho, se você estivesse dormindo numa boa e alguém viesse cutucar o teu pé, você acharia legal?

Chatinho faz que não com a cabeça.

- Então por que é que você faz isso com o cachorro? Se você não gosta de ter seu pé cutucado enquanto dorme, provavelmente o cachorro também não gosta. Ele tem tanto direito de dormir em paz quando você. Se você se comportar bem com os outros, com os bichos, com as plantas, todo mundo também vai se comportar melhor com você (olha o otimismo da garota).

O Salame-Mor continua:

- Viu, Chatinho, cuidado, hein, senão ele te morde.

Peguei meu casaco e fui esperar o Mirco lá fora, antes que me viessem ganas de matar alguém.

Postado por leticia em 13:37

15.02.05

no comments

O cafet... opa, o companheiro da Suely Maria, vocês sabem, fuma no elevador TODOS OS DIAS. TO-DOS OS DI-AS. Semana passada fiz uma coisa muito legal: escrevi SOU REALMENTE O MAIOR DOS ESCROTOS, PORQUE ALÉM DE FUMAR NO ELEVADOR OCUPO SEMPRE DUAS VAGAS QUANDO ESTACIONO! e colei atrás da Audi TT ridícula dele. Pena que estava muito empoeirada e a fita gomada ficou meio assim assim. Como colei na traseira, perto da placa, ele com certeza não viu logo de cara e deve ter feito alguns quilômetros com aquilo à mostra. Hoje à tarde, quando cheguei da escola, vi a Audi estacionada que nem a cara dele, com a roda anterior esquerda ultrapassando a faixa que delimita as vagas. Parei bem do lado esquerdo, COLADA no carro dele (mas dentro das faixas da MINHA vaga), e conseqüentemente impedindo-o de abrir a porta e obrigando-o a entrar pelo lado do passageiro. Agora há pouco eu estava mandando um fax (o aparelho fica na sala, logo na entrada, ao lado da porta) e ouvi uma porta bater. Olhei pelo olho mágico e não deu outra: o idiota do cara esperando o elevador com o cigarro aceso. Como eu tava de calça de pijama e também porque não gosto muito de rodar baiana, ainda mais com gente desse nível, não saí pra discutir. Assim que ele desceu, corri pra fora, pintei o olho mágico dele com pilot atômico preto, resisti à tentação de entupir a fechadura de SuperBonder, e em vez disso escrevi outro cartaz: ESCROTO QUE FUMA NO ELEVADOR, TOMARA QUE SEU PINTO CAIA, SEU FILHO DA PUTA (em italiano fica lindo, juro). E colei na porta.

Sei que ele não vai parar de fumar no elevador nem de estacionar feito a cara dele, porque quem nasce escroto morre escroto, mas enquanto isso eu vou me divertindo. O próximo passo vai ser, acho, um ovo no pára-brisas dianteiro, já que injeção letal é meio arriscado. Furar os pneus também seria legal, principalmente porque custam os olhos da cara, mas não dá tempo de terminar o selviço antes de alguém ver. Uma bela arranhada com chave na lateral? Manteiga na maçaneta da porta de casa? Aceito sugestões. O escroto merece.

Postado por leticia em 17:06

12.02.05

ai, ai

Decidi que em junho vou fazer o CELI, a prova pro certificado de língua italiana que corresponde aos exames de Cambridge, por exemplo. Primeiro porque quero me testar, segundo porque sinto falta de estudar alguma coisa, mesmo que seja algo que já sei, e terceiro porque a gente nunca sabe, pode vir a servir se eu decidir fazer outra faculdade (já decidi, entende, mas fico hipotizando porque não sei se esse ano vai dar). Ainda não decidi se faço o CELI ou o CIC, de italiano comercial, que corresponde ao BEC do inglês. O site da Università per Stranieri, órgão responsável pela elaboração do exame, além de ser horroroso não é muito atualizado (sites italianos nunca o são) e não há nenhuma prova disponível do CIC pra eu dar uma olhada e sacar que nível de conhecimento técnico é necessário. A prova custa € 78 e eu posso fazer em Perugia mesmo, claro, que é mais perto pra mim. Já baixei o módulo de inscrição e a prova vai ser em junho. Não há mais leituras obrigatórias, apesar d’eu ter lido já os livros recomendados pro ano passado. Como in any case você tem que ler ALGO em italiano pra comentar na prova oral, acho que vou reler Il Deserto dei Tartari, que eu amo, e algo do Camilleri, que eu sei que os professores adoram porque é em siciliano e tem sempre ironias e críticas ao sistema (ou aos sistemas – o oficial governamental e o mafioso).

Ontem maloquei um livro de francês lá da escola e decidi que vou dedicar uns 40 minutos por dia, TODO DIA, a estudar essa língua. Não quero nem saber. Só vou abrir exceção pro fim do mês, que é época de faturar e quando fica tudo muito confuso.

Depois que consegui, finalmente, terminar o Lampedusa, não sei mais o que ler. Peguei Billy Budd, Sailor, do Melville, mas não consigo me concentrar. Pensei em reler Marcovaldo, mas não é o momento. Tem um Lady Chatterley’s Lover ali olhando pra mim, e alguns Brontë, uma Allende, um Sciascia, um Malcolm Lowry, um Joyce, um Camus, todos me mandando mensagens subliminares, leia-me, leia-me. Mas nenhum deles está me inspirando particularmente agora.

Outro dia ouvi no rádio uma entrevista com um historiador que escreveu um livro sobre o mistério do milagre econômico italiano, já que todo mundo sabe, menos os italianos, que a Itália ainda é um país de camponeses desprovidos de qualquer noção básica de cultura ou cidadania, sem capacidade intelectual, incapaz de aprender qualquer língua estrangeira que seja, e cujo governo não estimula, absolutamente, o estudo, básico, universitário ou otherwise. Achei engraçado ouvir esse tipo de coisa no rádio. Imagino quanta gente não deve ter ligado pra RAI, ofendidíssima, dizendo que não lê porque não tem tempo, ou que lê, sim, talvez não jornais ou livros, mas revistas, aquelas de fofocas, sabe, já é alguma coisa, né. Hohoho. Anyway, a locutora mencionou o tal livro desse historiador, e eu anotei num post-it que ficou no pára-sol do carro e agora não lembro. Mas estou morrendo de vontade de ler.

Então agora estou aqui sentada sem saber o que fazer, ouvindo As Bodas de Figaro que o canal 5 tá passando não sei por quê, tentando decidir 1) o que ler depois do Lampedusa, 2) em que ordem realizar as tarefas do dia, que incluem uma ida à farmácia, outra à padaria, uma faxininha básica, estudar francês, lavar o cabelo, agilizar o almoço, ficar sem fazer nada um pouquinho. Provavelmente vou começar pelo ficar sem fazer nada um pouquinho.

Postado por leticia em 09:11

10.02.05

:))))))))))

O-TE-MO. Deve ser mal do nome :)

Postado por leticia em 07:42

07.02.05

arre!

Ando meio com a síndrome da Flabb. Primeiro que não tenho tempo mesmo de ficar sentada ao computador, nem pra escrever, que dirá pra ler. Ganhei uma outra turma, a tal de Petrignano que tinha incompatibilidades de horário que acabaram sendo resolvidas; aulas às terças e quintas, das seis e meia às oito da noite, num agriturismo. É legal porque o livro que eles usam (a professora que dava aula pra eles arrumou outro emprego e saiu da escola, por isso herdei a turma) é específico pra quem trabalha com hotelaria e turismo, superinteressante. Talvez eu herde mais uma turma, em Santa Maria, porque a professora que dava aula por lá, uma americana gordinha e simpática, foi mordida pelo basset da empresa e teve que ir ao hospital, e os médicos são legalmente obrigados a fazer a denúncia contra o proprietário do cão. A gordinha acha que o clima não vai ficar legal entre ela e a empresa e já deu umas indiretas de que não quer mais trabalhar lá. Eu já morei em Santa Maria e toda hora tenho que ir ao banco lá, ou entregar faturas, ou medir a pressão da avó do Mirco, por isso não seria um problema dar aulas lá.. A tal da americana vem de Castiglione del Lago, coitada, longe pra caramba, pra ser mordida pelo basset em Santa Maria degli Angeli. Tá fula da vida. Além disso a Bicha Pedagógica também renunciou, porque está ocupadíssimo com outras coisas business-related (ele é formado em Economia) e não dá mais conta da coordenação pedagógica. A maioria dos cursos dele termina em fevereiro ou março, e ele não sabe se vai continuar na escola e pegar novas classes. Melhor pra mim.

Com isso tudo, o cansaço vai acumulando, e não tenho forças pra fazer nada quando chego em casa além de comer um negocinho qualquer, tomar banho e chapar. Durmo mal, por n motivos, e acabo não descansando nunca. Vamos até cancelar a ADSL ilimitada, porque com todos os impostos e todas as roubadas que a Telecom te impõe, acaba saindo uma fortuna, e se ninguém em casa tem tempo de usufruir, não tem sentido. Como não temos tempo pra fazer todas essas contas, essa decisão também acaba se arrastando. A casa anda imunda, porque dou semi-limpadas nos micro-espaços de tempo que acho. Hoje passo o aspirador de pó voando, amanhã tiro o pó a jato, depois limpo o banheiro meteoricamente. Conseqüentemente, a casa nunca fica toda limpa ao mesmo tempo, porque quando chego no banheiro já tá na hora de limpar os vidros outra vez. Porre.

No meio dessa confusão toda, o único que tem tempo e pique pra organizar a viagem à Argentina é o Gianni, que trabalha longe mas praticamente não faz hora extra no início do ano, período de calmaria no mundo do cashmere. Eu, com a minha animação total e absoluta por essa viagem a esse país dos pampas cuja língua me enche os ouvidos de mel e cujos habitantes considero tão simpáticos, educados e humildes, fico mais que feliz em deixar tudo nas mãos dele. Vai na fé, Gianni. E arranje uns vôos internos bem baratinhos, porque senão com meu salário não consigo pagar tudo, e eu de orgulho ferido fico insuportável.

Postado por leticia em 09:38

19.01.05

toma, papuda

Porque AINDA tem gente que nao acredita que eu seja ex-médica.


Mais tarde boto no ar a resposta ao flame da chata da Irene. Nao posso responder porque o e-mail ainda esta' estranho, por isso vou publicar. Merece.

Postado por leticia em 12:27

14.01.05

hmpf

Concordo pRenamente com a Fernanda. Há poucos dias morreu um piloto italiano que corria no Paris-Dakar de motocicleta. Pronto! Para-se o país, todo mundo só fala dele, como se fosse herói nacional. Entrevistam as velhinhas da cidadezinha dele, Castiglion Fiorentino, e todas dizendo que ele era uma pessoa fenomenal, que a cidade não vai ser a mesma sem ele, que sei lá o quê. Ora, façam-me o favor! A cidade é pequena mas não tanto; querem realmente que eu acredite que todo mundo que foi entrevistado realmente o conhecia a ponto de poder dizer que era uma pessoa maravilhosa? O que que ele fez por Castiglion Fiorentino? O que que ele fez de importante na vida? Ah, peraí, né. Pra começar que eu já não tenho o menor respeito por quem tem família (ele deixou dois filhos pequenos) e se aventura nessas coisas. Quer fazer esporte de risco? Faz enquanto ainda não tem ninguém dependendo de você, meu querido, senão vira egoísmo daqueles brabos. Sei que o cara foi enterrado numa cerimônia cheia de pompas, caixão coberto com a bandeira nacional e tudo. Palhaçada.

Postado por leticia em 08:33

05.01.05

japa girls

Hoje chegou pelo correio um estojinho japonês lindo mandado pela minha amiga Hanae, de Osaka. Como de modo geral toda a Europa, a Itália está eternamente infestada de japoneses. A Università per Stranieri di Perugia, onde estudei em 2002 (que saudade! Que saudade da polacca pazza!), não é exceção. Na nossa turma havia duas que fizeram o curso completo de seis meses, Hanae e Ayako. Moravam juntas mas não conviviam harmoniosamente, coisa que eu obviamente só fiquei sabendo agora porque nenhuma das duas jamais deixou transparecer nada. Dois doces de meninas. Eu normalmente não gosto de gente docinha, e confesso que particularmente da Ayako (depois explico) tinha um pouco de pena, um sentimento que eu desprezo. Mas realmente gostava da companhia delas, de verdade. Meninas calmas, risonhas, esforçadas.

Além do Silvio, que é um santo, só eu tinha paciência com as meninas. Sei que pode parecer estranho, mas eu adoro ensinar, explicar, elucidar, esclarecer. ADORO. E tenho paciência com gente burrinha, afinal de contas a culpa não é deles. Só não tenho paciência com médico que escreve tuberculose à esclarecer, com engenheiro que vai almoçar no restaurante à kilo, com advogado que dá uma telefonema, com arquiteto que escreve se você quizer, com professor que estuda a calda do girino (essa eu vi, ninguém me contou. E adivinha como se chamava? Suely.), com tradutor que escreve encima. Com gente geneticamente burrinha, ou que simplesmente tem talentos diferentes dos meus, eu tenho paciência sim. E adorava explicar gramática italiana pras japinhas. Adorava estudar com elas.

São meninas completamente diferentes uma da outra. Ayako tem vitiligo e usa maquiagem pesada; é claramente envergonhada da sua aparência e é a típica japonesa de excursão na Europa, com cabelos tingidos e permanentados, roupas caras e bonitas quando analisadas separadamente mas um desastre quando combinadas, pernas tortas e passinhos de gueixa. É bobinha, não entende piadas, é infantil e sonhadora, tem bolsinha da Hello Kitty não porque é cool mas porque adora a Hello Kitty, os pais não querem que ela se case, nunca, pra ter alguém que cuide deles na velhice. Hanae é beeeeem mais inteligente e beeeeem mais esperta; menina safa, que mesmo não conseguindo sacar, de ouvido, a diferença entre R e L, é capaz de dar gargalhadas verdadeiras com uma piada engraçada – ainda que leve um tempinho pra registrar a informação em língua estrangeira. Eu adorava as duas. Hanae foi embora assim que terminou o curso mas me escreve sempre, às vezes me manda presentinhos. Trabalhou numa padaria em Osaka e me escrevia reclamando que era muito chato. Agora voltou a estudar italiano. Ayako ainda ficou mais um tempo, refazendo pela terceira vez o curso de italiano no qual sempre levou bomba; trabalhou um tempinho numa agência de turismo em Perugia, namorou um croata que morava na Grécia mas só queria o dinheiro dela, sofreu com a desilusão, culpou o vitiligo, seu visto acabou e ela voltou pra casa. Agora dá aulas de italiano pra crianças. O e-mail que ela me mandou antes da primeira aula dizia que ela estava muito neruvosa mas confiante de que tudo daria certo. Torço muito por ela, de verdade.

As imagens mais significativas que tenho delas ocorreram no jantar brasileiro que fizemos na casa do Silvio. A Hanae raspou até o último grãozinho de farofa da panela. E a Ayako bebeu meio copo de vinho branco e entrou na sala dizendo: mi sento rivera! (mi sento libera), ou seja, me sinto livre – coitada, se embebedou com meio copo de vinho branco vagabundo e já se sentia poderosíssima.

Adoro as duas, e essa semana pensei muito nelas, depois que chegou o cartão de Natal da Ayako. Mais ainda depois que o estojinho lindo da Hanae aterrissou aqui em casa.

Fui correndo enchê-lo de canetas coloridas. Eu tava mesmo precisando de um estojo! Fico que nem criança quando consigo organizar essas coisas: agenda nova, estojo novo, canetas coloridas, borracha nova, branquiiiiinha! Fico toda hora tirando tudo da bolsa, olhando, namorando, depois boto tudo de novo na bolsa.

Postado por leticia em 18:58

29.12.04

hm

Eu fico angustiada com essas catástrofes. Gostaria de ser capaz de fazer alguma coisa pra ajudar, mas não posso fazer nada além de mandar um SMS pra doar um euro. Dificilmente tenho esses arroubos concretos de solidariedade, porque meu instinto de auto-preservação fala mais alto, mas cada vez que vejo novas imagens dos alagamentos e das pessoas sofrendo de um modo que eu não consigo nem imaginar sinto que se eu estivesse lá, não pensaria nem remotamente em voltar pra casa. Ficaria por lá, ajudando, como estão fazendo muitos turistas. Bactérias e vírus não gostam de mim, eu também não gosto deles, e acho que o risco de adoecer diminui quando você não tem tempo pra ficar doente porque a vida de outras pessoas pode depender do seu estado de saúde. E com certeza voltaria pra casa certíssima de ter decidido virar ex-médica. A necessidade faz o ladrão, sim, mas não significa que essa transformação valha pro resto da vida.

Postado por leticia em 11:16

28.12.04

puke

Hoje, na televisão, o repórter pergunta ao padre como é possível continuar sendo cristão depois de uma catástrofe desse nível. Onde está Deus?, perguntam as letras brancas na tela, enquanto no fundo correm as imagens surreais das tsunamis cobrindo tudo. O padre não responde, lógico, que ele não é bobo, e imediatamente puxa o assunto pra outro lado, o lado de sempre: ah, a igreja estará sempre ao lado dos necessitados (engraçado, então o que o senhor ainda está fazendo aqui na Itália? Em vez de ficar dando entrevista, vai pra Tailândia abraçar os órfãos caterrentos, vai!), faremos de tudo pra ajudá-los, e esperamos em breve começar a reconstruir as igrejas.

PÁRA TUDO. Como assim, Bial? Zilhões de mortos, vivos que em breve morrerão esvaindo-se em diarréias coléricas e infecções bizarras e delírios de dengue, gente que não tem água pra beber nem comida pra comer nem casa pra morar nem hospital pra se tratar, e você vem me falar de RECONSTRUIR IGREJAS? Nojo, nojo, nojo, nojo, essa gente me dá vontade de vomitar. Se eu acreditasse em reencarnação, na próxima gostaria de ser uma médica sem fronteiras daquelas fodonas, assexuadas, de olhos azuis e bochechas coradas e dignos pés-de-galinha ao redor dos olhos, e com certeza andaria armada, fuzilando gente que fuma onde não é pra fumar e padres idiotas que fazem declarações desse tipo.

O nojo maior é que aqui tem a história do otto per mille: basicamente uma doação compulsória (e não deixe que o paradoxo dessa expressão lhe escape) de oito milésimos da sua renda anual, que ou vai pro governo (se você não marcar nada) ou vai pra igreja católica (se você marcar o quadradinho indicado). A igreja, aliás, todo ano passa comerciais na TV e no rádio pedindo o seu otto per mille. Se eu fosse o Serjão, diria: otto per mille de cu é rola.

Postado por leticia em 11:11

26.12.04

Eu fico sempre tão impressionada quando vejo essas notícias de tufão, terremoto, ciclone, alagamentos. Tudo isso é tão completamente fora da minha realidade que me assusta de um modo incrível. Não tenho idéia de como reagiria se me encontrasse em uma situação semelhante. A Umbria é zona altamente sujeita a terremotos, o que torna muito caro construir qualquer coisa aqui, já que é obrigatório ter um esquema antisísmico e coisa e tal. Mas eu nunca testemunhei nada, a não ser um ridículo tremor uma vez, enquanto estávamos na fila do cinema. Ninguém mais sentiu e eu nem comentei nada porque achei que fosse impressão minha, mas dias depois vi uma notinha no jornal local mencionando o minitremor.

Nessa época do ano há milhares de italianos passando as férias na parte da Ásia atingida pelo terremoto/maremoto. Roberto, amigo nosso, em teoria partiu hoje pela manhã pra Tailândia, mas a essa altura do campeonato já não sabemos mais se foi ou se está plantado no aeroporto, esperando sabe-se lá o quê. Quando acontecem essas coisas, o Ministério do Exterior se mobiliza rapidinho e é possível saber, se necessário, os nomes de todos os cidadãos italianos que estão no local atingido. Entra-se em contato com as agências de viagens e tour operators, disponibilizam-se números de telefone pra falar diretamente com o Ministério, e quem está por lá e consegue dar notícias de alguma maneira, acaba na TV: acabo de ouvir uma entrevista com um fulano que foi passar a lua-de-mel nas Maldivas e acabou abrigando-se com a jovem esposa no teto de um bungalow, de onde mandava SMS pra assegurar a família de que está bem, apesar do rio de lama que corre lá embaixo. Já pensou que maravilha? Onde você passou a sua lua-de-mel? No teto de um bungalow, nas Maldivas, durante o quinto maior terremoto do planeta. Muito romântico.

Eu tô brincando, mas não consigo nem imaginar o horror de passar por uma situação dessas. Pior ainda é pensar que esse tipo de coisa acontece sempre em lugares miseráveis, como o fodidíssimo Bangladesh.

Postado por leticia em 14:10

24.12.04

sdfa sdvfweoriseo

Como toda pessoa de bom senso, acho Natal um verdadeiro porre. Não só porque pra mim não significa nada, como bem diz o Alexandre (viram como ele não erra mais os porquês? ;), mas porque essa forçação de barra pra dar presente pros outros é incrivelmente estressante, cara e hipócrita. Detesto dar presentes só porque tenho que. Quando vejo uma coisa legal que me lembra alguém querido, compro e dou, na medida do financeiramente possível, claro. Perguntem pra Newlands que ela sabe bem como é: vivo mandando-lhe coisas bubus pelo correio, coisas idiotas que não servem pra nada, mas eu tenho certeza de que ela vai gostar porque têm cores bonitas, ou uma textura maneira, ou uma ilustração gostosinha, ou porque lembra alguma coisa engraçada que nos aconteceu em um determinado momento. Em contrapartida, meu quadro magnético está coberto de desenhos dela, tenho vários marcadores de livros desenhados por ela, e a bolsinha que abriga o kit de sobrevivência pacamanca elástico pro cabelo + batom + manteiga de cacau, que eu levo sempre comigo, é uma coisinha deliciosamente esdrúxula de paetês rosa-choque, presente dela. Minha escrivaninha é coberta de pequenas pilhas de coisas que eu vou juntando aos poucos, até que virem uma quantidade decente pra ser mandada pelo correio. Minilivros, comidinhas, receitas, cartões-postais, fotos, panfletos bonitos, brinquedinhos de ovo Kinder, adesivos, cartões de visita extravagantes, tudo isso vai sendo distribuído conforme eu vou descobrindo a quem vai agradar. Já esse perrengue de ter que comprar presente de Natal, vou te dizer...

Pra cunhada eu trouxe do Brasil uma bolsa artesanal toda cheia de bordados bizarros; juntei um marcador de livros interessante e pronto. Pro namorado dela, um cinzeiro comprado na feira hippie da General Osório. Pra malinha do Francesco, o filho b. do tio banana do Mirco, que é uma criança cha-tér-ri-ma e bur-ré-si-ma, que os pais (...) e o resto da família entopem de brinquedos caríssimos e de roupas que daqui a dois meses não vão mais caber nele, comprei um livro daqueles duros, cheio de bichos, buracos nas páginas, jogos de palavras. Pra avó do Mirco, que é a coisa mais fofa desse mundo, um pijama de flanela comprado na feirinha de Bastia, hoje de manhã. Pro Ettore comprei uma garrafa de grappa, que é o meu presente anual, já que ele não gosta nem se interessa de coisa nenhuma. Pro azar dele, a garrafa quebrou assim que cheguei em casa com as compras. Pra Arianna, brincos de ouro branco e zircone que depois me arrependi de ter comprado porque foram caríssimos e ela realmente não entende a diferença entre um metal e outro, entre um design bonito e um não, mas agora Inês é morta. Pra Marta trouxe um porta-niqueis de casca de coco, também da feira hippie, que sei que ela vai odiar porque é bastiola fashion e bastiola fashion só gosta de coisas da moda, mas não tô nem aí, um choque cultural de vez em quando é bão, e fiz também uma latona de cookies com chocolate chips e amêndoas. E aí fiquei sem saber o que dar pro Mirco, que infelizmente tem gostos refinados muito fora do meu alcance econômico, e além do mais compra e fatura as coisas das quais precisa (e gosta), como máquinas fotográficas, celulares, material de escritório. Acabei comprando um livro pra criança que me fez dar uma gargalhada gigante na livraria de Santa Maria degli Angeli: La Storia della Cacca – A História do Cocô. O dono da livraria, um grisalho que destila charme pelos poros do nariz, deu outra risada quando cheguei com aquilo na caixa, e disse que o livro é maravilhoso. Quando estava saindo da livraria bati o olho numa máquina fotográfica descartável com flash colorido, quer dizer, as fotos saem no tom que você escolher. Peguei uma verde. Claro que as esverdeadas fotos eventualmente irão parar aqui.

E aí assim, como quem não quer nada, toca o videofone: era o hominho da SDA, pra entregar um pacote. Fiquei toda boba achando que era o pacote que a minha mãe mandou há séculos, com o livro de Português do meu aluno bicha e mais outras coisas pra mim, um pacote que se perdeu no buraco negro dos correios italianos. Mas qual não foi minha surpresa ao ver que era uma caixa elorme vinda diretamente de Ottawa! Eowynzinha, amiga, não tenho palavras! Tô doida pra provar esse icewine, comé que toma isso? E os livros todos? E o Calvin? E o salmão, que eu amo? E o cartão de Natal, lindo? E as meias de dedinhos do Piu-Piu, ridículas como eu gosto?

:)))))))))))))))

**

Pra quem acredita nessas coisas natalinas, bom natal, tá? E brigada a quem me escreveu dando votos de boas festas. Sei que não parece, mas dou muito valor a essas coisas. Valeu mesmo. Porque foda-se o Natal, mas é o pensamento que conta, né não?

Postado por leticia em 13:31

15.12.04

uia

A neblina pesada não vai embora há 48 horas. O dia INTEIROOOO perdidos no meio da névoa.

Já falei aqui que o único fenômeno meteorológico que eu abomino é o vento. A neblina não me incomoda; fora um pouquinho de melancolia, não me irrita nem me dá medo. As roupas secam numa boa – é só botar o varal pra dentro à noite, quando ligamos o aquecimento. Também não sou sensível à umidade, por isso não reclamo. Mas esses últimos dias realmente têm sido de matar. Não dá pra ver NADA lá fora! Nem os pinheiros imensos que crescem nos jardins aqui atrás, nada. Só os globos de luz dos postes, que parecem flutuar num mar de gotículas de água gelada.

Pra dirigir à noite é um parto. De dia ainda dou um jeito, porque bem ou mal dá pra ver pelo menos um pouco pra que lado a estrada curva, e além disso todo mundo está com a mesma deficiência visual que eu. À noite a coisa muda de figura: eu já sou naturalmente fotofóbica, e odeio dirigir à noite porque não vejo bulhufas. Com névoa, então, fico mais cega que uma toupeira, e sou obrigada a dirigir em velocidade velhinho-em-calhambeque porque realmente não sou capaz de distinguir nem mesmo se estou na pista certa. A sinalização horizontal nessas estradas di campagna recebe pouca manutenção e a maior parte já se apagou com o tempo. Sem as faixas no asfalto, não sei se estou indo na direção certa, ou na pista certa, ou se estou pra cair no barranco ou se estou entrando no quintal de alguém em vez de estar virando na rua onde eu tenho que virar. Cada carro que passa com os faróis acesos me cega momentaneamente, e reduzo a marcha, com medo de ir parar sei lá onde. Levei meia hora pra voltar pra casa da escola hoje – o dobro do tempo regulamentar. Vim em terceira marcha, como uma velha gagá cuja carteira de habilitação não poderá mais ser renovada porque os reflexos já perderam a validade. Mesmo o percurso mais conhecido, que já virou instintivo, torna-se difícil nessas condições. Os faróis dos carros que passam na superstrada, paralela a essa estrada por onde passo sempre, não ajudam. Não sei onde estou nem quanto falta pra chegar em casa. Depois da Metro, última grande construção iluminada antes de chegar aqui, é escuridão total. Que parto!

Cheguei em casa com o coração batendo forte e a testa franzida de tanto me concentrar pra não voar pra fora da estrada.

E agora é sopinha de legumes e toca pra estrada de novo, pro cinema em Perugia, ver Closer (já me disseram que é uma merda, mas o Moreno cismou que quer ver, e ele está de tornozelo torcido, coitado, vamos fazer a vontade do menino).

Postado por leticia em 20:31

07.12.04

tipo assim...

Alguém explica pra titia aqui o que leva um ser humano a comprar flores de plástico? Hein?

Postado por leticia em 21:48

06.12.04

viu?

Depois neguinho vem me chamar de preconceituosa quando eu toco no assunto caça-gringo, Suely Maria, etc.

Estatística, amores, estatística. Sejamos realistas, né.

Postado por leticia em 14:35

04.12.04

eita queijão

Tiramos a tarde pra fazer compras, como quase sempre fazemos nos fins de semana – é a nossa terapia de casal, digamos. Fomos à Metro, que é como o Makro no Brasil, ou seja, vende no atacado pra quem tem partita IVA (o equivalente ao velho CGC). Claro que só quem tem partita IVA de hotelaria, restaurantes etc é que pode comprar por lá, mas em novembro e dezembro qualquer um que tenha uma empresa pode entrar, pra fazer as compras de Natal, cestos pros funcionários e clientes, etc. Nós sempre morremos de curiosidade de ver como era a Metro por dentro, ver latonas gigantes de molho de tomate, pacotes imensos de macarrão, lagostas congeladas inteiras. Fomos, e gastamos uma grana considerável, mas todos os preços foram muito pesquisados antes e por isso economizamos bastante, em relação ao que teríamos gasto comprando as mesmas coisas em outros supermercados. Compramos, entre outras coisas, uma forma inteira de parmesão – TRINTA E DOIS QUILOS. Eles não tinham o equipamento de fio de aço que corta o queijo, mas um dos funcionários cortou a forma a mão em quatro imensos pedaços, e a Arianna vai se encarregar de cortar esses quatro monstros em pedaços mais, digamos, manuseáveis, e embalá-los a vácuo (sim, ela tem a maquinha de embalar a vácuo). Uma parte vai pros cestos de Natal, mas a maioria do queijo vai é parar nos nossos estômagos mesmo.


Postado por leticia em 14:11

03.12.04

oh vida, oh céus

Estranhamente, nao me sinto melhor em saber que nao é so' o casal Inho que anda de quatro e relincha (creationists are dumb, oh yes they are).

Postado por leticia em 12:57

18.11.04

ora, pois

Vocês já devem ter lido o Alexandre. E, se não leram, não sabem o que estão perdendo. Ele erra um pouco nos porquês, mas é autor de alguns dos textos mais racionais e sensatos que eu já li na minha vida.

Pois esse post aqui é sobre tratar cachorro como gente. Se tem um coisa da qual me orgulho é de tratar meu cachorro como cachorro. Um cachorro espetacular, é claro, que usa gorro, capacete e anda de caminhão, mas um cachorro. Leguinho NUNCA subiu em sofá nem cama, nunca dormiu comigo, não lambe a minha cara, quando lhe dou um olhar 43 ele entende e fica quietinho no canto dele, pára de apitar os brinquedinhos e de encher o saco. Veja bem, em momento nenhum eu disse que ele é SÓ um cachorro. Um animal é um animal, não é SÓ um animal – quem me conhece sabe que eu não pensaria duas vezes antes de salvar uma borboleta em vez de um ser humano que me enche o saco continuamente, por exemplo. Mas o fato é que o bicho continua sendo bicho, e não gente.

Tenho absoluto pavor de quem trata bicho como gente. De gente que se deixa tiranizar pelo bicho de estimação. É como quem se deixa tiranizar pelos filhos pequenos. Quequeísso, minha gente? Cada macaco no seu galho, né. Se eu sou gente grande e, pelo menos teoricamente, já que idade não é necessariamente sinônimo de sapiência, entendo mais da vida do que meus filhos e meu cachorro, é mais do que óbvio que quem manda no galinheiro sou eu. Uma vez tive uma longa discussão com a Carmen, a menina que trabalhava comigo na loja do Fabrizio, o Louco, sobre esse assunto. Ela tem uma fêmea de pastor alemão que fica presa num espaço minúsculo do quintal, mas sai bastante pra passear. É compreensível que a cachorra se assanhe toda quando sai de casa, mas é absolutamente inaceitável que ela arraste os donos pela rua e a única coisa que eles saibam dizer a respeito seja "mas é que ela fica puxando com força...". É a mesma coisa com meus sogros, que são dois amores mas completamente retardadados, e os quatro cachorros. Virgola, a aleijadinha, é gorda feito um boi, e mesmo assim Ettore continua a dar-lhe toucinho, doces, salame. Quando eu digo que ela não deveria estar comendo essas coisas, ele responde: ah, mas ela pede...! Cacetes estrelados, mas se você não tem autoridade* nem com o seu próprio cachorro, a coisa tá feia pro seu lado. Tenho uma profunda falta de respeito por esse tipo de gente. E olha que eu adoro bicho, sofri pra burro durante aquele período em que fiquei aqui sem o Leguinho, gastei uma grana pagando a Carol enquanto ela tomou conta dele e outra grana preta pra trazê-lo pra cá. Fiquei torcendo pra acharem a coitada da Pipoca, gata que eu cansei de ver quando descia a Gastão pra correr na Lagoa quando ainda morava no Rio. Não aguento ver bicho sofrendo nem em filme sem começar a chorar. Mas tudo tem limite nessa vida, né, gente. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Please.

* Quando digo autoridade, não estou falando de gritar REX! como um sargento alemão e ver seu cachorro sentar, rolar, fingir de morto, chupar cana e assobiar, como um robô programado. Estou falando de não permitir que o bicho assuma o controle da sua vida. Ter um animal de estimação muda a sua vida, e como, mas não há que se perder o controle, jamé. Estou falando da autoridade que não é aquela do pai severo, mas a do pai que se faz respeitar pelas atitudes sensatas, racionais, quando possível, equilibradas. Entendem o que eu quero dizer?

Postado por leticia em 08:18

04.11.04

potocas

Então.

A Itália não vê um outubro tão quente há 150 anos. Trinta graus em Palermo ontem. Em torno dos 20 aqui. Neblina de manhã, mormaço ao meio-dia, abafação à tarde. O único inconveniente são moscas, mosquitos e percevejos suicidas. Quem dera fosse assim o ano todo...

Ontem fui a uma entrevista de emprego. Começo a dar aulas de Inglês e Português semana que vem. Ficaram impressionadíssimos com o meu currículo, com o meu B no Proficiency, com o meu italiano flawless. O aluno de Inglês é um médico de Perugia.

Pra comemorar, fomos jantar no Bistrot. Não íamos lá há muito tempo; mudou tudo, da decoração ao menu. Nossos pratos preferidos sumiram e o menu ficou menos fácil de entender e menos agradável ao olhar, mas há novidades interessantes. Eu aceitei a sugestão do dia do garçom e de antipasto caldo fui de strudel de brócolis com cebola de Cannara caramelizada, numa poça de fondue de parmesão com pimenta-do-reino moída na hora. Mirco foi de tortellini com recheio de hortelã e molho de tomates-cereja frescos e manjericão. Depois atacamos o já nosso velho conhecido filé de Angus (boa carne argentina), acompanhado de uma ma-ra-vi-lho-sa tortinha de batata. Pãezinhos massudos deliciosos. Vinho do Alto Adige anêmico, não valeu os 14 euros. Os garçons de rabo-de-cavalo sumiram. E nós que brincávamos que era pré-requisito ter rabo-de-cavalo pra trabalhar lá. Vi minha ex-professora de step jantando com uma amiga. A dona do restaurante é meio maluca e SEMPRE sugere tartar aos clientes conhecidos porque ela prepara na hora, numa mesinha ao lado da tua, e faz um barulho danado batendo a carne crua com os temperos na tigela de vidro. Vai gostar de aparecer assim na China.

Esse post ficou bem no estilo Marina W. Cujo livro, aliás, eu gostaria muito de ler. Hint hint.

Hoje tem Fratellão aqui em casa. FeRnanda, Fabião e a prima da FeRnanda, Valéria, que é uma gracinha.

Grandes possibilidades de uma viagem à Austrália ano que vem, via Dubai. Sugestões?

Postado por leticia em 06:54

31.10.04

da série piccole bellissime cosette

brigada :))))))))

Postado por leticia em 16:30

20.10.04

Faça o que eu digo...

O Papa hoje falou sobre como é horrível ser rico, como os ricos não vão pro céu, que é melhor ser pobre e coisa e tal. Quer dizer que o filho da puta pobre vai pro céu, e o rico legal não vai? Legal essa filosofia. Por essas e outras é que eu agradeço aos meus pais todos os dias por não terem me batizado.


Postado por leticia em 13:54

14.09.04

momentos pré-viagem

Então agora o assunto vai ser Rio. A minha lista de coisas a comprar/trazer/fazer só aumenta. Aceito sugestões.


Livros a comprar

O Vendedor de Passados (José Eduardo Agualusa)
Uma Vida Entre Livros (Mindlin)
Manual Pratico do Ódio (Férrez)
Dentes Guardados (Daniel Galera)
A Louca da Casa (Rosa Monteiro)
O Amor Companheiro (com ilustras da Newlands)
Dois Irmãos (Milton Haoum)
Todas as Festas Felizes Demais (Fabio Danesi)
Update: Memórias de um Diabo de Garrafa (Alexandre Raposo)

Verissimo (não tenho nada dele, acreditam?)
Update: série Literatura ou Morte, Cia. das Letras

Que mais...

***

Coisas a fazer/resolver

Manicure!!!
Ginecologista
Dentista
Itaú pra desbloquear o cartão
CREMERJ pra atualizar a minha situation
Trocar bateria dos relógios, na Cidade (programa pra fazer com Vovó)
Ver se o meu nome saiu mesmo como tradutora daquele livro médico chato pra burro
Antonio Pedro pra pegar o certificado de estágio no PS
Pedro II, idem
Levar tudo pro tradutor juramentado antes que ele morra (é um velhinho de 248 anos)

***

Comidas e bizarrices a trazer

. feijão preto, feijão manteiga
. farinha de mandioca
. Catupiry
. doce de leite
. Bis
. suco de maracujá
. geléia de mocotó
. gelatina Royal
. guaraná
. pipoca de microondas (muita)
. cachaça
. adoçante em gotas
. pão de queijo
. creme de leite, leite condensado
. pão árabe
. milho verde não-doce
. sementes de couve e maracujá, mas não espalha, que é proibido


Comidas a levar
. torta al testo, piadina
. salame, capocollo, speck
. scamorza, mozzarella di bufala
. macchinetta per pasta, farina di grano duro per la pasta fatta in casa
. sughi di cacciagione
. funghi porcini
. risotti pronti
. riso per risotto
. lenticchie piccoline
. parmigiano
. olio
. vino
. vinsanto e cantucci


***

Coisitchas a pegar/comprar

. pegar os ímãs de geladeira que estão na casa da Vovó
. esmalte
. brinquedos pro Leguinho, anti-pulgas e anti-carrapatos
. calcinhas e sutiãs
. roupas de ginástica
. caneca Pingù, caneca ameba
. perfumes
. pasta e escova de dentes
. shampoo e cremes
. hidratante
. sabão de côco
. coisas Avon e Natura
. CDs
. livros (haja espaço na mala)

Também preciso de um bom dermatologista pra dar uma olhada nos pés do Mirco, que são os mais feios do mundo.


Postado por leticia em 18:07

09.09.04

cabeluda

Cansada do cabelo ruim? Não tem saco pra fazer escova ou touca? Seus problemas acabaram! Com o novo e revolucionário método de alisamento temporário pacamanca Inc. você não vai ter mais motivo pra reclamar!

Lave o cabelo normalmente. Seque normalmente com a toalha enrolada na cabeça por alguns minutos, aplique seus 1.937,48 cremes leave-in anti-frizz como de costume, e desça correndo à garagem, sempre evitando rajadas de vento, onde você deixou sua lambreta ontem à tarde. Bote logo o capacete na cabeça e vá dar uns rolés. Para obter melhores resultados, certifique-se de que toda a cabeleira esteja adequadamente dentro do ambiente capacetal.

Passadas algumas horas, volte pra casa e tire o capacete. Voilà! Seus cabelos estarão lisos como seda! A cabeça vai ficar doendo depois de horas com aquele peso (meu capacete prateado pesa 1,8 kg), mas enfim.

Postado por leticia em 18:03

06.09.04

hm

Sabe uma coisa que eu morro de vontade de ver? A Catherine Zeta-Jones sem lápis no olho. Tem horas que eu a acho l-i-n-d-a de morrer, tem horas que ela é anos 80 demais pro meu gosto. E tem alguma coisa errada com o espaço entre o lábio superior e o nariz. A pele é ligeiramente mais escura e dependendo da luz parece que ela tem bigode.

Postado por leticia em 22:44

02.09.04

pocotó

Eu adoro cavalo. Está no meu top três bichos preferidos, junto com o cachorro e o elefante. Gosto de ver provas de equitação na TV, e acho muito engraçado quando o cavalo empaca. Não sei se alguém aí viu, mas aqui passaram as provas do pentatlon, que aliás eu nem sabia que era disciplina olímpica, e eu me diverti. Porque os cavalos pra prova de equitação sao sorteados na hora, ou seja, o cavaleiro não tem a menor intimidade com a cavalgadura, é tipo um blind date. E quando não tem esse feeling, se o bicho não estiver com vontade de saltar, ele não salta. Não só não salta como também faz aquela cara de não quero, porra, me deixa em paz!, a mesma cara que o Legolas faz quando a gente dá a ele alguma coisa que normalmente ele adora comer, mas naquele momento não está com vontade. Ele vira a cara! Juro! Vira a cabeça de lado, faz cara de enfado, e nessas horas eu só imagino uma nuvenzinha flutuando em cima da cabeça dele escrito “que porre essa gente, não tão vendo que eu não tô com vontade?” É exatamente essa cara que os cavalos do pentatlon fizeram. Fiquei rindo sozinha no sofá, feito uma monga, brincando de adivinhar qual cavalo pulava e qual empacava. Ih, olha esse, todo agitadinho, correndo de lado, balançando a cabeça. Aposto que não pula. Tóim, empacava. Ih, alá, tá dando pulinhos antes da hora, arreganhando os dentes, vai empacar. Tum, empacava. Olha esse, derrubando tudo que é obstáculo, tenho certeza que daqui a pouco ele cansa dessa palhaçada e se recusa a pular. E lá vai o cavalo dar uma megafrenada no último segundo, e lá vai o cavaleiro tentar dar um pouco de dignidade ao tombo inevitável, apoiando um pé precariamente no chão.

Postado por leticia em 22:37

31.08.04

Detalhes açougueiros, não leia se não for chegado a um sanguinho básico

Passamos da fase da dor intensa à fase do prurido insuportável. Essa noite acordei desesperada de tanta vontade de me coçar. Não há creme Nivea que dê jeito na pele toda esticada ao redor da ferida. E a cada dez passos que eu dava ou a cada cinco minutos em pé, começava a sair sangue da ferida outra vez.

Fui levar o almoço do Mirco e de mais três operários a Cannara, onde eles estão pintando a escadaria de uma fábrica de roupas, e quando voltei vi que saía sangue diluído em linfa de um furinho bem no meio da crosta. Tive uns cinco minutos de irritação e resolvi me operar.

Me armei de tesourinha, pinça e lente de aumento e fui pra minha sala de cirurgia, ou seja, a borda da banheira. Dei umas batidinhas com a pinça na crosta e ouvi um tum tum surdo, sinal de espaço vazio por baixo. Fui cortando as bordas da crosta com a tesourinha e não sentia resistência nem dor intensa, sinal que as traves de tecido conjuntivo tinham sumido, ou melhor, tinham sido reabsorvidas. Fui cortando, cortando, cortando, até que só ficou um pedacinho pequeno da crosta, bem grudado à pele. Em torno da cratera em carne viva que sobrou, muito sangue coagulado, testemunha da porrada com o pedal da semana passada. Com a lente de aumento examinei bem a ferida: carne viva sim, sangue vivo sim, muita linfa, mas felizmente nada de pus. Olha o sistema imunológico da Leticia aí gente! Seguuuuuuura leucóooooocito! Lavei com água corrente, lavei com desinfetante e nem ardeu. Sequei bem ao redor, mas não tinha a menor possibilidade de cobrir com gaze. Qualquer coisa que encoste em qualquer ponto do pé causa muita dor, porque tá tudo sensibilizado. Então pensei num velho truque que usávamos às vezes em feridas cirúrgicas na enfermaria: açúcar. Como açúcar dá cárie, hohoho, joguei um pouquinho de mel na ferida. Teoricamente os microorganismos não seguram a onda de tanta saturação, perdem líquido e puf, morrem. O mel é um conservante natural e praticamente não estraga nunca. De qualquer maneira, mal nao faz, e como o ambiente aqui na oficina é absolutamente insalubre, com uma concentração de poeira e elementos em suspensão que chega a dar nos nervos, e como eu não quero toda essa poeira nojenta grudando na minha ferida aberta, o mel pelo menos forma uma película protetora que impede o contato direto com as coisas nojentas. Agora está doendo um pouco, mas pelo menos não coça mais, a pele não está mais toda esticada e torta ao redor da ferida, e o líquido que quiser sair sai numa boa, sem ficar empacado com aquela bosta de crosta. Tá feio pra caramba e tenho medo de assustar as pessoas quando sair de casa, mas foda-se. O alívio é impressionante, a sensação de liberdade é maravilhosa. Adeus, crosta maldita.

Agora é só tomar muito cuidado com o sol, pra não ficar com o pé marcado pra sempre. E parar de saracotear, porque quanto mais eu ficar quieta no meu canto, mais rápido acaba essa chatice.

Postado por leticia em 21:36

30.08.04

:)

Linda a partida Brasil x Itália de ontem, no vôlei masculino. Eu não sou a rainha do patriotismo mas é sempre legal ver o país da gente vencer, ainda mais depois das meninas terem perdido praquelas cubanas pra lá de escrotas. O hominho da RAI que comentava o jogo falou incrivelmente bem do Bernardinho, que segundo ele é um mito do vôlei mundial; falou muito bem do Mauricio, um levantador histórico e figura importantíssima do vôlei brasileiro e mundial; falou muito bem do Gustavo, do Anderson e dos Andrés* durante a partida. Hoje vi uma entrevista com os jogadores italianos, e eles disseram que são o único time capaz de vencer o Brasil, mas que o nosso time tem um ataque muito rápido e consequentemente difícil de defender, um ritmo de jogo alucinante, e que enquanto o nosso time for assim e o deles cometer os erros bobos que cometeu, os italianos vão perder sempre. Muito sensato, quérido.

Já o italiano asqueroso que venceu a maratona disse em entrevista que teria chegado em primeiro lugar de qualquer jeito, que correu de um modo que o brasileiro jamais o poderia alcançar, com louco ou sem louco de saias. Pode até ter sido assim, não sei, não vi a maratona, mas o ar de desdém dele quando falou essa frase me deixou nauseada.

Os italianos estão rindo à toa porque ficaram bem no quadro de medalhas, em oitavo lugar, se não me engano. Estão se achando AAAA nação esportiva. Mal sabem eles que nos próximos Jogos a China vai papar tudo e não vai sobrar nada pra ninguém.


* O que é que leva um jornalista a ser incapaz de ler um nome direito? Não espero que ele saiba que o G do Giba se fale como J e não como o som Dj italiano, não espero que ele saiba que SC tenha som de SS em vez de CH como em italiano. Mas dizer Nachimiento já é um pouco demais. Onde foi que você viu esse i, meu querido? O nome ali, escrito na tela, escrito numa folha de papel na frente dele, sem a porra do i, e o cara vai e me diz "miento"? Que ódio.

Ele fez o mesmo com a grega que ganhou a maratona feminina. A mulher se chamava Athanasia ou coisa do gênero. Ele passou a corrida INTEIRA chamando a mulher de Anastácia. Acho o fim da picada, de verdade.

Postado por leticia em 09:02

26.08.04

meu pé direito

Isso já tá virando telenovela.

Saí de manhã direto pra casa da Arianna, pra visitar meu cachorro e pegar o número PIN do celular do Ettore, que enxerga mal e vive desligando o celular porque erra o botão, e depois pra ligar de novo precisa do PIN. Aproveitei pra colher uns pepinos, uns tomates e umas abobrinhas na horta e parti pra oficina, onde deveria dar uma ajudada no escritório, já que a secretária está de férias até semana que vem. De repente o scooter começa a cuspir e resmungar. Pensei logo na gasolina, porque desde o tombo a luzinha da gasolina fica acesa direto e por isso perco a noção da quantidade de combustível que me resta, mas era impossível que já tivesse acabado: o Mirco encheu o tanque no sábado antes de viajarmos, e essa semana eu só fui a Torgiano, que fica a 7 minutos daqui, uma vez por dia, e só. A monga aqui esqueceu de um pequeno detalhe: na segunda levei o scooter pra fazer a revisão obrigatória, e enquanto o cara faz o "diagnóstico", fica acelerando forte uns bons 10 minutos, pelo menos. E nessa lá se foi minha gasolina. Encosto na praça de S. Maria, bem onde fica a lojinha de fruta e verdura da Rita, bem em tempo de não atrapalhar o trânsito, pois o motor morreu imediatamente. Numa última tentativa de pelo menos chegar até o posto de gasolina mais próximo, que ficava a 200 metros, desci e comecei a pisar na manivela (ou seria pedivela? Hoho) lateral, já que desde o tombo o motor não liga mais só com o botão de start. Pisei com o pé direito, lógico, porque o pedal fica no lado esquerdo do scooter e porque eu sou destra. Só que o pedal escapou e quando subiu de volta bateu com toda a força no meu pé direito. O ferido.

Vocês não podem imaginar nem remotamente a dor que eu senti. Não podem. Acho que dor de parto é pinto depois da dor de pedal de scooter arrancando só parcialmente um crosta de ferida. Uma crosta tão alta e tão espessa e que repuxava tanto a pele ao redor que eu venho acordando à noite com dor no pé há tempos. Tava tudo tão feio que hoje quando acordei estava resolvida a escrever pra Bia perguntando o que fazer com a minha crosta. Pra não falar do pesadelo que tive na noite de terça pra quarta, coisa que aliás vem se repetindo estranhamente ultimamente: sonhei com a médica loura que me atendeu na terça quando fui fazer o requerimento de consulta especialista pra alguém dar uma olhada no meu pé. No sonho ela arrancava a crosta da ferida a sangue frio, e eu urrava de dor e saía muito, muito sangue. Acordei angustiada mas não lembrava do sonho, só fui lembrar mais tarde, já na hora do jantar, sabe-se lá por quê.

Então eu fiquei lá, com o pé escorrendo sangue e uma crosta incrivelmente espessa levantada só até a metade, com um scooter sem uma gota de gasolina e um céu preto sobre a minha cabeça. Liguei pro Mirco, com quem eu tinha falado meia hora antes, e que teoricamente estava ali perto, num cliente. Ele já tava na oficina de novo mas tava vindo pra S. Maria outra vez. Fiquei lá parada feito um dois de paus, apoiada no scooter esperando a dor melhorar um pouquinho. Começou a chover. Forte. Fui me arrastando até a banca de jornal vizinha da Rita, pra me esconder debaixo do toldo. Mirco chegou, trazendo material de primeiros-socorros, mas não dava nem pra tocar no pé, em nenhuma parte dele, nem pra limpar em volta, porque a dor era insuportável. A pele tá toda sensibilizada e nem calça comprida eu consigo usar, porque a barra da calça batendo no peito do pé já é suficiente pra fazer doer o pé inteiro. Fomos pegar gasolina num posto, em garrafas de água mineral, e como a chuva logo passou, voltei pra casa. Vim a 30/h porque o vento batendo no pé me fazia ver estrelinhas de dor. Sentei na borda da banheira e com a ajuda de um espelhinho consegui olhar por baixo da crosta levantada, e vi que ela ainda estava grudada ao meu pé por duas traves de pele/tecido conjuntivo, ou seja, não dava nem pra arrancar tudo logo de uma vez. Cortei as partes livres, espalhando migalhas de casca de ferida pelo banheiro inteiro, joguei um desinfetante abundante na ferida, mordendo os dedos pra aguentar a onda de ardor, limpei a sujeirada toda de sangue, pedaços de crosta e gotas de desinfetante, e fui mancando pra cozinha.

Pior: eu tinha me programado pra fazer filé de frango na wok e legumes grelhados, um menu que requer atenção da cozinheira. Cozinhei com o pé direito apoiado sobre o joelho esquerdo, como um flamingo. Pelo menos o almoço não desandou: comemos muito bem, obrigada, e à tarde fui pra oficina ajeitar umas coisas no computador. Mirco cismou de jantar comida chinesa, mas o pior do dia ainda estava por vir: estando de dieta, abri mão dos ravioli cozidos no vapor, do arroz cantonês e do frango com amêndoas e fui de sopa aguada de frango com milho. Só.

Merda de vida.

Postado por leticia em 22:11

24.08.04

blergh

Por que será que as jogadoras da seleção cubana de vôlei são tão, mas tão asquerosas e arrogantes? Os outros atletas cubanos não são assim, pelo menos pelo que eu andei observando. Mas essas meninas do vôlei são O-DI-O-SAS! As gerações mudam, mas parece que pra entrar na seleção cubana é pré-requisito ser detestável, porque esse nojo é uma característica do time desde que eu me entendo por gente. Conseguem irritar simplesmente TODOS os times que jogam contra elas! Jogam muitíssimo bem, per carità, mas acho que grande parte da vantagem que elas têm sobre as adversárias, principalmente as mais esquentadas como as italianas, vem do fato que a irritação que elas causam no outro time é tão desconcertante que acaba ficando difícil jogar direito. A adrenalina vence.

Que coisa feia.

Postado por leticia em 20:14

23.08.04

Breves considerações olímpicas:

. Alguém sabe onde eu posso achar vídeos das apresentações da Daiane? Por aqui acho que não passou, e se na França passou, eu tava fazendo coisa melhor do que assistir à TV, né.

. Quanto atleta brasileiro desconhecido pra mim! Gostei daquele menino do salto do trampolim, Cesar sei lá o quê. Foi muito elogiado pelo narrador da RAI, pela sua elegância. Acho que é a primeira vez que eu vejo "brasileiro" e "elegante" juntos, e fazendo sentido. Porque, convenhamos, a Luiza Brunet é elegante, mas quando abre a boca o mundo cai sobre as nossas cabeças.

. Adoro esgrima.

. O que era aquela japonesa que quase ganhou a maratona, que correu o tempo todo abanando os bracinhos?

Postado por leticia em 17:40

14.08.04

jogos

Eu sempre adorei Olimpíadas. Não porque sou suuuuper fã de esportes ou suuuuuper nacionalista – muito pelo contrário, em ambos os casos. Não sou uma pessoa competitiva e fico sempre contente por quem ganhou e, ao mesmo tempo, triste por quem perdeu (mesmo que quem tenha perdido tenham sido os argentinos ;) Gosto dos Jogos Olímpicos pela estética. Começa pela logomarca. A da Grécia esse ano eu achei tão bonitinha! Simples, clean, clássica. Gosto da abertura, mas ontem eu não vi porque saímos pra jantar em Sant’Egidio com FeRnanda, Fabião e os pais da FeRnanda e voltamos tarde. Gosto de ver caras tão diferentes, gosto de ler nomes tão estranhos, países dos quais normalmente não ouvimos falar, bandeiras desconhecidas. Gosto de ver os corpos modelados, os movimentos fluidos, as cores dos uniformes, as expressões nos rostos.

É a primeira vez que vejo os Jogos de um outro país. É muito estranho, primeiro porque quase não se falou das Olimpíadas aqui. Eu nem sabia direito quando começava, e não sei quando termina. E olha que os italianos participam de zilhões de esportes dos quais nunca ouvimos falar ou pelo menos não nos interessamos. E esse é o segundo motivo da estranheza: além das clássicas competições às quais todo mundo assiste, como as de atletismo, futebol e ginástica olímpica, aqui também mostram outras coisas "estranhas" nas quais a Itália tem atletas participando: esgrima (que eu acho lindo. Há uma atleta "azzurra" que é aaaaaaa fodona); carabina, cuja final feminina em ar comprimido eu acabei de ver, enquanto passava roupa sentada, e não entendi NADA, só sei que foi a primeira medalha dos Jogos e a de ouro foi pra uma chinesa; remo, que eu gosto à beça de ver, até porque fiz alguns meses de remo ali no Botafogo, na curva do Calombo, na Lagoa, e adorava, apesar de ter quase levado umas peixadas assassinas mais de uma vez; entre outras coisas.

Também mostram muito a natação, que pra mim é o mais lindo de se ver. Adoro ginástica olímpica, acho lindo, mas as meninas são deformadinhas, admitamos. Os nadadores são divinos, altos, lisos, corpos perfeitos. Os italianos são lindos e sempre com algum tchan ridículo: cabelos descolorados, cavanhaques bobos, penteados absurdos moldados com muitos quilos de gel, ali mesmo à beira da piscina. As meninas também são interessantes, fora as de borboleta, que têm ombros assustadores. Os uniformes são fabulosos. As tomadas dos movimentos dentro d'água quase fazem chorar de tão belas.

Pra não falar na vontade de pular numa piscina fresquinha, em vez de ficar passando roupa nesse calor que tá rolando hoje.

Postado por leticia em 10:40

13.08.04

o tombo

Quarta-feira de manhã cedo fui dar minha corrida habitual de meia hora, tomei meu banhinho, troquei de roupa e sentei no sofá pra ver Everybody Loves Raymond, que acaba mais ou menos às nove e dez. Quando terminou, enfiei os pés nos sapatos e saí. A programação era: Assis, ao albergue da juventude pra fazer a carteirinha, porque vamos dormir em albergue em Paris, depois passaria na casa da Arianna pra mostrar a ela o novo scooter e pra dar de presente ao Leguinho uma bolinha tabajara que encontramos no chão do estacionamento da festa de Colcaprile, em Santa Maria, onde jantamos na terça, e por fim o correio de Bastia, pra pegar o pacote que minha mãe mandou e chegou na terça, mas como eu não estava em casa o carteiro deixou um recibo dos correios com o qual eu deveria ir à agência no dia seguinte e retirar o pacote.

Minha primeira memória depois da minha partida foi: eu no chão, toda ralada, ainda de capacete, chorando de ódio por ter levado um tombo tão idiota. Eu dizendo a alguém que eu tinha me assustado com o carro dele, que foi muito à frente no cruzamento, e eu achei que ele fosse passar direto, sem parar, e me atropelar. Por isso meti a mão no freio e caí, feito um saco de batatas. Lembro que o carro era uma SUV Mercedes preta e que o motorista era homem. Não lembro do rosto de nenhuma das muitas pessoas que me socorreram. Lembro que me perguntaram de onde eu era, lembro de ter pensado “eu devo estar falando em Português, por isso estão perguntando de onde eu sou” e de ter respondido “abito a Cipresso”, lembro de alguém perguntando se eu conseguia mover o ombro e eu respondi que sim.

Minha próxima memória sou eu na garagem do meu prédio, estacionando o scooter e dando bom dia a um vizinho que saía com o seu próprio scooter.

Subi, lavei a perna ralada com o chuveirinho na banheira, sentei no sofá e fiquei pensando, tentando descobrir por que é que eu tinha saído de casa. Finalmente desisti e resolvi abrir a bolsa pra ver se descolava uma pista. Vi o recibo dos correios e lembrei. Desci de novo, peguei o carro e fui aos correios, ao albergue em Assis e à casa da Arianna, que estava no quintal podando a cerca-viva e quis me levar ao hospital. Falei que estava bem e voltei pra casa. Liguei pro Mirco, que ficou furioso por eu não ter telefonado antes pra ele, e me perguntou onde tinha acontecido. Eu não lembrava (e ainda não lembro). Como foi? Contei que me assustei com o carro e coisa e tal, mas não sabia de onde o carro estava vindo. Ele me ordenou de ir ao hospital com a Arianna. Ligou a Arianna dizendo que estava saindo de casa, eu disse pra ela sossegar o facho que já era quase hora do almoço, iríamos à tarde. Mirco chegou, almoçamos, ele brigou com a Arianna no telefone e me levou ao hospital – ele ODEIA hospital, doença, ferida; fica nervoso e com vontade de vomitar e desmaiar.

Perugia tem dois hospitais: o Monteluce, que fica no centro e tem consequentemente um acesso infernal, e é onde vamos doar sangue, e o Silvestrini, que fica fora da cidade, na zona industrial, e é super bem equipado e moderno. Em algum momento no futuro vão juntar os dois hospitais na estrutura do Silvestrini, que está sendo ampliada. Fomos ao Silvestrini. Duas da tarde, ninguém na fila de espera. Fui atendida por um médico ruivo muito antipático que depois de apalpar minha perna inteira e me fazer morrer de dor, me mandou à Radiologia. Fiz radiografias do tornozelo direito, muito machucado, e da mão esquerda, que doía muito na parte carnosa logo abaixo do polegar. Nenhuma fratura. O médico mandou um enfermeiro botar uma tala no meu polegar. Achei meio estranho, porque a dor era muscular e não articular e por isso a imobilizaçao não tinha sentido, mas fiquei quieta. Ele perguntou se eu lembrava onde tinha sido o acidente, como tinha sido e coisa e tal, respondi que não. Não tinha nenhum sintoma de traumatismo craniano: nem tontura, nem vômitos, nem escotomas luminosos (leia-se luzinhas coloridas que dançam na sua frente), nem confusão mental, só essa amnésia relativa ao acidente. Ele resolveu me internar e nos mandou a uma sala de espera, pra aguardar a ambulância. Era uma espécie de depósito de macas. Mirco começou a ficar nervoso e o mandei embora, e ele foi, muito aliviado. Logo depois chegou um outro paciente, um rapaz novinho, bonitinho mas algo afeminado, braço direito todo tatuado, de camiseta regata, bermuda e chinelo, coisa que achei muito estranha, porque italiano nenhum do mundo desfila por aí nesse nível de molambice. No braço esquerdo, um algodãozinho estancando um buraquinho de injeção. Entrou um enfermeiro e o rapaz perguntou se podia dirigir; o enfermeiro disse que não, porque a medicaçao dá um pouco de sonolência. Pensei logo: tomou anti-histamínico. Perguntei se era crise alérgica, ele respondeu que foi uma picada de abelha e que uma vez ele quase morreu de choque anafilático pelo mesmo motivo, por isso agora ficou esperto e basta uma picadinha de nada pra ele correr pro hospital. Estava na piscina e a abelha, moribunda, estava numa dobra da toalha. Sentou em cima e o ferrão entrou. Ah, pensei, tá explicada a molambice. Ele perguntou o que tinha me acontecido, contei rapidamente, ele contou um acidente de moto que teve há anos e que o fez vender a moto, perguntou se eu estava correndo quando caí, falei que não, começamos a falar de acidentes e contei a história do Mario, que trabalhou comigo no escritório do Chefe Idiota e uma vez, depois de uma batida aparentemente boba, teve que ser operado às pressas de uma fratura de cervical que por um milímetro não o deixou aleijado, e ainda por cima passou 3 meses com imobilizador externo na cabeça. Contei que ele passou tanto tempo em casa mofando que assistia a toda a horripilante programação televisiva da tarde, inclusive o Al Posto Tuo, uma coisa hedionda estilo Jerry Springer que todo mundo sabe que é armado mas assiste mesmo assim.

Pronto! Lá vem ele dizer que foi convidado pra fazer um dos episódios, que é tudo armado mesmo, mas que não tem um roteiro fixo; eles só te dão uma idéia do papel que você tem que representar. Contou que foi uma atriz de Carabinieri que deu a dica, contou como a conheceu, contou fofocas do elenco da série (que eu adoro), contou quem cheira cocaína e quem não cheira, quem é piranha/viado e quem não é, falou sem parar até que o enfermeiro voltou pra me chamar, pois a ambulância tinha chegado. Me despedi e fui mancando atrás do enfermeiro.

Subi na ambulância, onde já estava, numa maca, um gordo muito simpático que tinha se envolvido num acidente de 4 carros e quebrado o úmero em 8 pedaços e o fêmur em 3. Todo enfaixado, volta e meia ele fazia uma careta de dor. Com a gente, lá atrás, uma enfermeira simpática e brincalhona; ao lado do motorista, uma amiga do gordo. Partimos pro Monteluce. O percurso é horrível, cheio de sinais de trânsito e com asfalto esburacado, e a cada sacolejada o gordo gemia e chamava o motorista: O’ Marioooooooo! Va’ piano, cazzo! A enfermeira ria, a amiga dele ria, eu ria também. O gordo sacaneava a enfermeira, que depois descobriram que era amiga da família, a enfermeira sacaneava o motorista, o motorista sacaneava o gordo, e eu ria, ria, ria.

Chegamos ao Monteluce e descarregaram o gordo. Depois foi a minha vez: fui direto à entrada do PS, onde felizmente não havia ninguém esperando. Com as radiografias e o pedido de internação na mão, fui mandada direto pra Astenteria, que é uma enfermaria provisória dentro do PS onde ficam internados os pacientes à espera de novos exames ou de novos sintomas. Meu quarto tinha três camas, uma desocupada e outra ocupada por uma cinqüentona loura muito tagarela que me disse estar lá desde sábado, pelo mesmo motivo que eu: tinha caído no chão dentro de casa, batido a cabeça, e não lembrava de nada. Chegou um médico manco muito antipático e me mandou fazer uma tomografia. A essa altura meu calcanhar direito já estava muito inchado e eu não conseguia caminhar. Um enfermeiro veio me pegar de cadeira de rodas e lá fui eu de ambulância pra um outro setor do hospital pra fazer a bendita tomo. O enfermeiro-motorista era um grisalho gatíssimo e muito simpático que fez mil perguntas sobre a minha vida e mil piadas sobre a vida dele. A enfermeira que ficava lá atrás comigo era meio mulher-macho e muito séria e depois que o grisalho me descarregou ela me largou no meio de um corredor, meio que virada pra parede. O grisalho chegou e perguntou se ela tinha me deixado daquele jeito sem nenhuma explicação; respondi que sim e ele comentou que “há enfermeiros e enfermeiros”. O radiologista me chamou, era um moreno alto e corpulento todo sorridente. Deitei na máquina e fiquei lá ouvindo aquele vruuuum, vruuuum, vruuuuuuum, quietinha, quase dormindo. O exame acabou e o radiologista veio dizer que “nella cabeza non hai niente”. O grisalho gatíssimo me empurrou pra ambulância de novo e voltamos à Astenteria. Mais tarde o Mirco chegou com a tralha: talheres (os do hospital são de plástico), água mineral, suco de laranja, tijolinhos de suco de banana com maçã, barrinhas de Muesli, xícara, copo, guardanapo, adoçante, pijama, necessaire, toalha, livros. Minha vizinha de leito recebeu a visita dos dois filhos e saiu pra tomar um café no bar com eles. Mirco disse que refez o trajeto que eu fiz naquela manhã mas não viu nenhuma marca de borracha queimada no chão. Ficamos batendo papo um tempo e ele foi embora. Eu descobri que a TV funciona a moedas. Cada moeda de 50 centavos dá direito a uma hora e meia de TV. Enfiei uma moedinha e fiquei vendo telejornal e documentários. Minha vizinha loura voltou do passeio e logo depois chegou o jantar: sopinha de macarrão estrelinha (sem sal), depois peito de peru grelhado com jardineira de batata, ervilha e cenoura. Batemos um pouco de papo, viramos pro lado e dormimos.

Dormi muito mal. Minhas pernas são tortas, sou completamente dez pras duas, e quando durmo elas também continuam tortas, obviamente. Como eu me ralei na lateral da perna direita, cada vez que relaxava as pernas elas giravam lentamente pra fora e pronto, os ralados encostavam no lençol e eu sentia dor. O tornozelo também latejava. Acho que tive febre, ou então sonhei que tive. Sei que acordei muito cansada. Comi uma barrinha de muesli e tomei um tijolinho de suco e logo depois passou o enfermeiro com o café da manhã: leite quente, café com leite ou chá. Não gosto de nada disso e dispensei. Depois veio a Claudia, enfermeira gordinha de olhos doces que veio tirar sangue e me pediu uma amostra de urina. Minha vizinha de leito tinha ido tomar café no bar e quando voltou a Claudia tirou sangue dela também. Troquei de roupa, lavei o rosto (não tinha chuveiro no nosso banheiro) e logo depois voltou o enfermeiro do café, um napolitano engraçado que veio me chamar pra fazer um ECG e um eletroencefalograma. A Claudia fez o ECG ali mesmo no PS, e depois o napolitano me levou de cadeira de rodas até um outro prédio pra fazer o EEG. Esse quem fez foi uma médica ou técnica, não sei, meio masculina, muito atenciosa. O exame é bobo, bobo: ela bota aqueles trequinhos no couro cabeludo, presos àquela rede de borracha, depois fica lá da outra sala falando fecha os olhos, abre os olhos, uma respiraçao profunda, pronto, tá ótimo. Meia hora disso e eu quase dormi. Ela ligou pro PS e o napolitano veio me buscar.

Voltei pro quarto e minha vizinha não estava. Tinha ido fazer um Doppler das carótidas no Silvestrini. Abri meu Roald Dahl mas depois de dois contos já tava caindo de sono e dormi. Acordei com duas meninas entrando no quarto, acompanhadas de uma enfermeira loura. Uma era de Hong Kong e a outra da Tunísia. Ambas estudavam na Università per Stranieri em Perugia. A de Hong Kong tinha úlcera gástrica e depois de ter vomitado sangue no meio da aula perdeu a consciência. A enfermeira loura botou a menina no soro e sumiu. Chegou meu almoço: sopa de arroz com molho de tomate e ervilha, depois bife com espinafre no alho (tudo completamente sem sal, mas encarei assim mesmo) e uma maçã. Transferiram a menina pra Gastro e fiquei sozinha de novo. Chegaram o marido e a cunhada da minha vizinha, que aparentemente já estavam esperando há séculos, mas desistiram e foram embora, deixando recado comigo. Lá pra uma da tarde voltou a minha vizinha, traçou o almoço frio, eu disse que tinham vindo visitá-la. Ela ligou pra cunhada, depois virou pro lado e dormiu. Mais tarde entraram duas lourinhas falando Inglês. Uma era inglesa mesmo, a outra, muito bonita mas baixinha demais, tinha um sotaque estranho e era muito antipática. Também estudavam em Perugia. A inglesa estava com dor de barriga há dias, teve diarréia mas não sabia dizer se tinha tido febre também. Será apendicite, pensei. Chegou um médico feio e antipático e disse que os exames de sangue preliminares mostravam leucocitose. Provavelmente era apendicite, mas ainda em estágio inicial. Dava pra ela ir pra casa pegar umas coisas, se quisesse, e voltar depois ao hospital pra aguardar o momento da cirurgia. A coitada da garota começou a chorar, não entendia direito o que acontecia, eu traduzia e a coisa só ia piorando, eu me sentindo mal por ela, a vizinha loura perguntando se a garota não falava Italiano, uma confusão danada. No final ela foi pra casa pegar suas coisas e depois iria diretamente à Gastro. Tadinha, se despediu com as lágrimas escorrendo.

Mirco ligou dizendo que tinha feito o trajeto outra vez de manhã, parando pra perguntar se alguém tinha visto o acidente. Acabou descobrindo onde foi: na saída Bastia-Torgiano da SS 75, direção Foligno – Perugia. Disse que os operários do prédio em construção bem em frente, as velhinhas da casa ao lado desse prédio e o motorista do carro pararam pra me socorrer, mas eu, que sou chata e teimosa até quando estou em estado confusional, recusei terminantemente qualquer tipo de ajuda, do copo d’água à ambulância, e cismei de voltar pra casa sozinha. Anta.

Mudou o turno dos enfermeiros. Entrou um magrelo, de pálpebras caídas, cheio de colares e pulseiras rastafari. Minha vizinha loura já o conhecia. Ele foi ler meu prontuário e voltou mais tarde, quando a vizinha tinha ido dar umas voltas com o irmão, todo animado porque eu era brasileira. Ele trabalha pra uma ONG que atua na África, em Moçambique e em Angola. Começou a contar todas as suas aventuras em Maputo e em Luanda, a descrever as cidades, eu já não entendia mais de qual delas ele estava falando. Contou o episódio do roubo do carro, dos porteiros dos prédios que andam armados, dos guardas corruptos, da comida, do mercado na rua. Depois perguntou se eu não faria uma tradução pra ele. Toda vez que algum amigo ia a Luanda ele mandava uma graninha às freiras que ajudavam nessa ONG dele e dessa vez queria mandar um cartão escrito em Português. Eu fiquei lendo e mais tarde ele voltou com a mensagem pra eu traduzir. Me mostrou também uma foto das crianças e das freiras, e me deu um jornalzinho anti-Berlusconi. Voltei pro meu livro e comecei a ficar inquieta. Mais tarde o médico feio e antipático voltou com nossos prontuários e dispensou a loura e depois a mim. Liguei pra Arianna, que uma hora depois veio me buscar com a Stefania. Assim que cheguei em casa tomei um banho tabajara de chuveirinho na banheira do banheiro grande, botei água no fogo pro macarrão, sentei no sofá com o pé pra cima e fiquei vendo TV. Mirco chegou, jantamos macarrão com gorgonzola, ficamos vendo TV e depois chapamos.

Dormi melhor essa noite, mas o tornozelo ainda dói e ainda está inchado (na verdade dói porque está inchado). De manhã dirigi até Perugia pra pegar umas tintas no fornecedor do Mirco, mas depois do almoço não saí mais de casa. Não tenho força no pé pra pisar no freio de repente, se necessário, nem força no braço direito pra engatar a ré, por causa da dor no ombro.

Resumindo as consequências diretas da compra do scooter:

1 – Mirco aprendeu a falar “capacêtchi pratchiado”
2 – Estou com a marca da sandália de dedo nos pés, depois de só 15 minutos de scooter na terça-feira, debaixo do sol das 5 da tarde
3 – Meu trapézio dói, meu ombro direito dói e está ralado, minha mão direita não tem força porque o ombro dói, tenho dois hematomas na lateral da coxa direita, uma escoriação horrível por todo o comprimento da batata da perna direita, um ralado HORRÍVEL no maléolo lateral direito, outro horrível no peito do pé direito, tornozelo inchado com movimentação reduzida, e um capacete levemente arranhado no lado direito. E amnésia relativa ao acidente.

Hoje vamos jantar na Sagra della Torta al Testo em S. Egidio, não muito longe da casa da FeRnanda. Os pais dela ainda estão aqui e já foram comer na festa do javali de Petrignano e adoraram a caipirice.

Postado por leticia em 19:01

07.08.04

faz-me rir

O Instituto Márcia Aguiar de Expat-Pampering me enviou, diretamente da sua Biblioteca de Assuntos Sérios e Profundos, um exemplar da revista Claudia de julho, que lerei com avidez. Chegou hoje.

Uhuuuuuuuu! :)

**

Depois de "se você não gostou de Berlim, deve ser uma neguinha da Rocinha que comprou o diploma"...

Depois de "o vizinho coreano da Hunka quando cozinhava empesteava o prédio", logo "você não é polida, faz chacota e desmereceu a cozinha de uma nação inteira"...

Vem aí, diretamente da comunidade Brasil do Iogurte...

...o mais novo membro da Coleção Imperial pacamanca de Silogismos de Quem Não Tem o Que Fazer e Adora Distorcer o Que os Outros Dizem:

..."eu não moro mais no Brasil", logo "sou indigente e desertora, e não tenho mais o direito de dar pitaco no que acontece lá!"

Quando você acha que já ouviu de tudo nessa vida...

Postado por leticia em 13:25

05.08.04

aulinha

Lição de hoje: diferenças óbvias entre termos obviamente diferentes, mas que mesmo assim neguinho confunde e com isso ESTÃO TORRANDO A MINHA JÁ POUCA PACIÊNCIA.


Preconceito e pós-conceito. Se eu já vi vários filmes de um determinado diretor e achei todos um porre, é provável que eu não vá gostar do próximo que sair. Prefiro nem assistir, porque a possibilidade de não gostar e gastar dinheiro de ingresso à toa é grande. É preconceito, porque julguei antes de ver, mas baseando-me em experiências passadas. Na minha opinião, a imensa maioria dos preconceitos é desse tipo, ou seja, baseado em estatística. Não é nem certo nem errado, nem bonito nem feio: é inevitável, e é um mecanismo de proteção muito eficaz também.

Por outro lado, se eu vi um filme qualquer e achei uma merda, tenho o direito de dizer "achei uma merda". Atualmente, porém, se o diretor for negro, mulher, homossexual ou pobre, dizer "achei uma merda" imediatamente me transformará em racista, preconceituosa (veja bem, mesmo eu tendo formado o meu conceito DEPOIS de ter visto o filme), e/ou invejosa.


Objetivo e subjetivo. Azul é azul, uma maçã é uma maçã, um pé direito é um pé direito e não um esquerdo, uma mulher promíscua é uma mulher promíscua (doravante chamada piranha). Todos esses conceitos são OBJETIVOS. Feio é subjetivo, chato é subjetivo, gostoso é subjetivo, fedorento um pouco menos subjetivo.

O adjetivo/substantivo piranha não é, nunca foi e jamais vai ser subjetivo. Assim como azul, maçã e pé direito também não o são. Piranha só vai ser usado preconceituosamente quando eu chamar de piranha uma mulher cujos hábitos sexuais não conheço e cuja atitude e postura não dão indicações de comportamento promíscuo.

p.s.: Não vou ficar aqui discutindo quantos parceiros uma pessoa deve ter pra ser considerada promíscua. A OMS determinou 2 parceiros diferentes por ano, o que me parece às vezes razoável, às vezes ridículo. O número exato de parceiros que transforma uma pessoa em piranha é subjetivo até um certo ponto; "um monte de parceiros" não precisa se referir a um número exato pra permitir a compreensão do conceito de piranha. Tenho certeza de que qualquer pessoa equilibradazinha entende o que eu quero dizer.


Relatar e criticar/achincalhar.

Bom, se eu precisar explicar esse tipo de diferença aos meus ótimos leitores, melhor fechar o blog.

O pior cego é o que não quer ver.
E não adianta tapar o sol com a peneira.

Postado por leticia em 17:04

31.07.04

Fomos a Certaldo, na Toscana, pro casamento da Renata, irmã da FeRnanda, com o Stefano. Eles já tinham se casado no civil, no Brasil, e sábado fizeram a cerimônia religiosa e a festa. Foi tudo na casa de um primo do Stefano, em uma colina chamada Vico d'Elsa, e foi tudo lindo. Me diverti horrores, apesar do discman não ler os CDs que eu levei meses gravando. Se a Renata deixar eu boto umas fotos aqui.

Postado por leticia em 09:39

28.07.04

hihihi

Tô atrasada com os e-mails, foi mal. Pior é que não posso nem inventar desculpa nenhuma, porque vocês tão carecas de saber que eu não tenho nada pra fazer da vida.

**

Pfaender, amigão de faculdade, futuro superurologista, que usou bigode falso de português na colação de grau e que ano que vem casa com a bendita Raquel, futura superginecologista, me mandou essa piada besta que eu adorei, exatamente porque é besta:

O cara se sentia muito sozinho e foi a um pet shop comprar um bichinho de estimação. Mas ele queria uma coisa diferente, original, em vez do beagle nosso de cada dia. Então ele vai e compra uma centopéia. Leva a centopéia pra casa na sua caixinha, felizão, e fica tão contente de ter uma nova amiga que resolve dar um pulo no bar pra tomar um choppinho básico. Claro que, sendo muito bem educado, ele convida a centopéia pra dar uns rolés com ele.

- Centopéia, quer ir tomar um choppinho comigo?

A centopéia nada.

- Ô Centopéia, vamo dar um pulo ali no boteco pra tomar um chopp, jogar uma conversa fora, hein?

A centopéia nem tchum.

- Centopéia, na boa, vamo, cara! Ô CENTOPÉIA! VAMO LÁ!

A centopéia responde, muito pau da vida:

- Eu já ouvi, porra, tô calçando os sapatos!

Postado por leticia em 18:59

27.07.04

nao consigo mudar de assunto

Uma leitora gentil me mandou um e-mail graciosamente entitulado "telhado de vidro", onde apontava dois erros meus: o uso de tráfico em vez de tráfego, e um superagressivo em vez de super-agressivo.

Eu gosto de me explicar, então vamos lá:

Em primeiro lugar, esse negócio de telhado de vidro sempre foi uma balela, na minha opinião. TODO MUNDO tem telhado de vidro; todos nós somos infalíveis, ninguém é perfeito. Qual é o escritor que não submete seus textos a um revisor, antes de publicar? Isso não significa que seja proibido criticar.

Em segundo lugar, PRECISO DE UM DICIONÁRIO DE PORTUGUÊS!!! Os dicionários online que eu costumava usar hoje requerem cadastro e pagamento (leia-se "não rola"). Já está na minha lista de livros a comprar quando for ao Rio.

Em terceiro lugar, essa é a coisa chata de falar uma língua estrangeira que é ridiculamente parecida com a sua. Perdi a conta de quantas vezes escrevi "orrível", "lavorei muito hoje", "consulência", "próssimo", porque em Italiano se diz orribile, trabalhar se diz lavorare, consultoria se diz consulenza, próximo se diz prossimo. Se procurarem aqui no blog vão achar dúzias de erros idiotas desse tipo. Pra não falar dos acentos desaparecidos. Lembrem-se de que eu não tenho corretor ortográfico no Word, e acentuo tudo na mão, depois de terminado o texto. Haja saco.

O blog da Ane, jornalista que no seu trabalho escreve sempre em Italiano (e muito bem, por sinal), anda cheio dessas maluquices linguísticas. Quem entende italiano morre de rir com as expressões italianas estranhamente traduzidas pro Português. Acho que ela tem menos saco (e sobretudo menos tempo!!!) de revisar do que eu. Mas minhas conversas com a FeRnanda são exatamente iguais ao blog da Ane, totalmente sem pé nem cabeça. As pausas pra procurar palavras são inúmeras. Quando duas palavras são parecidas nas duas línguas, mudando só um sufixo ou prefixo ou um pedacinho de nada, como no caso de consulenza e consultoria, ficamos horas tentando descobrir qual é a versão correta. Foi o que aconteceu comigo no caso do tráfico em vez de tráfego. Traffico, em italiano, serve pra falar tanto de comércio ilegal quanto de fluxo de automóveis. Em italiano não há hifen, alguém me corrija se eu estiver errada, e super, hiper (iper, em italiano, como o Ipercoop) e ultra vão todos colados à palavra que vem depois, sem tracinho nenhum. Outro dia fiz o Mirco ter um ataque de riso quando ele me pegou falando sozinha "Capítolo? Ou capítulo?", tentando lembrar o que era Português e o que era Italiano. É fácil se confundir, putz. Ainda mais porque há mais de dois anos não leio nenhum livro em Português. Que orror. ;)

Como eu disse, se forem procurar com afinco vão achar mil errinhos nesse blog. Mas não vão encontrar coisas do tipo "cafézinho", "agente vai à festa hoje", "por causa que", "espero que seje legal", "estou na Itália fazem dois anos" ou "estou na Itália a dois anos", etc.

**

Baixei "Como uma Deusa" ontem. Aquela da Rosana.

Postado por leticia em 07:43

26.07.04

ainda a patrulha gramatical

Um novo leitor, simpático e educado como a maioria de vocês, me escreveu perguntando por que eu levo tanto a sério esse lance do Português correto. Comentou que essas corruptelas do tipo "nada haver" provavelmente um dia serão o modo correto de escrever, como voismecê virou você etc.

Eu respondi que a minha pinimba é seletiva. Se o porteiro do meu prédio escreve "nada haver" eu nem reviro os olhinhos. Mas não admito que um jornalista escreva "fui à Londres". Que um advogado escreva "desculpe encomodar". Que um médico escreva "tuberculose à esclarecer", como cansei de corrigir nos prontuários da minha saudosa oitava enfermaria do Gaffrée. Que um engenheiro escreva "dois kilos". NÃO PODE. Quem teve a oportunidade de estudar, de comprar livros, de viajar, de se aprimorar, NÃO PODE botar crase antes de verbo. Não pode. E como a gente sabe que no Brasil quem tem acesso à internet é a classe média-alta, a maioria com acesso à universidade, fico chocada quando vejo esses erros online. ADVOGADO NÃO PODE ESCREVER "ENCOMODAR". Não pode, é proibido. Porque se escreve coisas desse tipo é porque não lê um livro, ou jornal, ou revista, ou quadrinhos, há séculos. Ou, pior, se leu não prestou atenção.

Vou dar um exemplo radical, de uma colega de turma que era de uma imbecilidade ímpar – e felizmente era a única, porque os meus colegas de classe eram todos feras, e tenho certeza de que hoje são ótimos profissionais. Ela se chama Patricia (nome absolutamente não-fictício), e era completamente idiota. Um dia, numa aula de Gineco, a professora fazia comentários sobre o que mudou nas fichas do ambulatório, que as pacientes têm que preencher antes da primeira consulta. Hoje tem escrito "idade da primeira relação sexual", mas antigamente lia-se um pudico "idade da mulher ao casar".

Eu estava sentada atrás da Patricia e meus olhos de lince captaram a seguinte anotação:

IDADE DA MULHER ALCAZAR

Agora me respondam se vocês gostariam de ser operados por uma médica desse nível. Eu não. Uma pessoa que escreve uma coisa desse tipo não processou a informação de jeito nenhum. Aliás, nem era pra anotar nada sobre esse assunto, era uma curiosidade que a professora falou pra relaxar o papo, mais nada, e o fato dela não conseguir nem entender o que é importante e o que não é já teria sido suficientemente grave. É como se eu começasse uma aula de Inglês falando, putz, que calor que tá hoje, e o aluno escrevesse "está calor hoje". Quequeísso! Voltamos sempre àquele velho assunto da atenção, da observação, do pensar antes de falar/escrever, de extrapolar e comparar.

Desnecessário dizer que ela ficou conhecida para todo o sempre como Patricia Alcazar. E também é desnecessário dizer que ela anda solta por aí, responsável pela saúde dos outros. Virou ginecologista. É de dar medo ou não?

Postado por leticia em 19:50

23.07.04

putz

Surreal é entrar na comunidade Orkut do seu colégio e lembrar dos professores bizarros, das lendas absurdas sobre o homem do canivete da Macedo Sobrinho, do campão, da musiquinha que a Salvadora cantava (uma pulga na balança/deu um pulo, foi à França/os cavalos a correr, as crianças a brincar/vamos ver quem vai sobrar), do caderno Caderflex que a Orchidea obrigava a gente a usar, do Luis Eugênio que andava de lambreta prateada e dizia "Cabeças vão rolar!".

E além disso tudo descobrir gente que você não vê há séculos e que estudou com você desde o Jardim 11 até o primeiro científico, ver as fotos e pensar CARACA como elas tão diferentes! E entender que você também está diferente. Mais diferente ainda, provavelmente.

Postado por leticia em 08:40

22.07.04

the abyss

Lendo o último post da Mary, mais precisamente a expressão "experiências geracionais", lembrei de uma coisa que aconteceu ontem e de outra que aconteceu hoje.

Ontem fomos jantar frutos do mar com Fabião e FeRnanda. Eu e ela engatamos numa conversa sobre escola, faculdade, cola, prova, seminário, DP, professor filho da puta, e os meninos ficaram putos porque os deixamos sozinhos enquanto fofocávamos. Mas essas coisas em comum, esse passado em comum, por mais que a minha vida tenha sido diferente da da FeRnanda (porque ela é do interior e porque a família dela é muito diferente da minha), dão uma sensação de segurança muito grande. Os valores básicos são os mesmos, entendemos sem problemas o que a outra está pensando ou o que acha disso ou daquilo. Esse tipo de intimidade, de compreensão automática, é difícil de atingir num relacionamento internacional. Eu não tenho NADA em comum com o Mirco, em termos de infância. Pra vocês terem uma idéia, o único desenho animado que temos em comum nos nossos passados é Os Smurfs, que vimos hoje de manhã, tomando café. Só que aqui se chamam Puffi, o Gargamel tem outro nome que eu esqueci, o gato aqui é uma gata e se chama Birba (não lembro o nome em Português). Não temos mais NADA em comum. Nossas infâncias foram completamente diferentes. Os modelos de escola são completamente diferentes; ele não entende as nossas técnicas de cola porque aqui as provas são todas orais, e eu não entendo o nervoso antes de uma prova oral com a turma inteira e os parentes assistindo porque não temos nada disso no Brasil. Não há vestibular e quase ninguém faz faculdade. Eles não têm festa de formatura, as festas de casamento são chatíssimas, não há festa de 15 anos. Os adolescentes italianos vão à praia em Rimini no verão, viram a noite em discotecas e voltam pra casa dirigindo numa boa, mesmo que tenham acabado de tirar a carteira. As crianças não têm o habito de ir dormir na casa dos amiguinhos. Ninguém vai pros EUA em intercâmbio pra estudar Inglês. Aliás, ninguém estuda nada. Ninguém tem TV a cabo e séries da Sony não são conhecidas aqui. Ninguém nunca viu Curtindo a Vida Adoidado nem A Noviça Rebelde.

Assim fica muito mais difícil ter uma conversa engraçada. Private jokes são coisas raras. Eu e Mirco rimos muito juntos porque eu, modéstia à parte, sou engraçada pra cacete, e ele também adora um besteirol, mas se fôssemos um pouquinho mais normais não haveria nada de engraçado pra comentar. Dificilmente ele acha graça das minhas histórias de infância (e vice-versa), porque os referenciais são totalmente diferentes. Esse abismo pode ser muito estimulante, na maior parte do tempo, mas às vezes é muito, muito cansativo.

Postado por leticia em 19:51

19.07.04

Só deu Brasil na parte de esportes dos telejornais de hoje (boto no plural porque TODOS os telejornais de todos os canais usam as mesmas filmagens e os mesmos textos, só mudam os apresentadores. O que vi no Studio Aperto Sport com certeza vai aparecer mais tarde nos outros telejornais esportivos). Falaram bem da seleção de vôlei, “favorita per i prossimi giochi olimpici”, dos gols do goleiro do São Paulo, fizeram entrevista com Kaká (que é amadíssimo aqui), falaram dos resultados da Copa América e da rivalidade Brasil x Argentina, falaram do Wanderley Luxemburgo.

Tamos na moda, tamos na moda.

**

Enquanto isso...

A sessão “ignorance-related misunderstandings” continua no Orkut. A última novidade foi ser acusada de ter feito “chacota” e de não ter sido “polida” quando falei que o vizinho coreano da Hunka cozinhava algo que fedia muito. Igualzinho à história de Berlim. O vizinho coreano da Hunka cozinhava algo que fedia muito, leia-se eu odeio todos os coreanos, quero que eles morram, são todos fedorentos, a cozinha coreana é uma merda.

Depois dizem que eu sou intolerante. Não dá vontade de jogar uns napalmzinhos aqui e ali, de vez em quando? Pelo menos pra exterminar os assassinos de espaço depois da vírgula, os adeptos da vírgula entre sujeito e predicado, os conclusion-jumpers, os mal-humorados crônicos, os generalizadores em estado terminal que pululam na internet?

Aguardem o próximo insulto original e criativo. Ali do lado de Odiei Berlim, logo meu diploma foi comprado já já vai aparecer outra frase de impacto. Tipo, o vizinho coreano da Hunka cozinhava algo fedido, logo não sou polida.

Postado por leticia em 13:44

13.07.04

...

O assunto é velhinho, mas parece que só eu não comentei, então aproveito os últimos acontecimentos pra meter o meu bedelho também.

Depois das novelas do crucifixo na sala de aula e da proibição do véu pras alunas muçulmanas, uma escola do norte da Itália, Padova, se não me engano, propôs abrir uma turma só pra imigrantes muçulmanos. Os radicais de direita começaram logo a vociferar, protestar, se indignar. Eu acho a história toda um absurdo, mas não pelos mesmos motivos da Lega Nord, da Forza Italia e da Alleanza Nazionale, os radicais de direita que simplesmente não querem imigrantes e ponto final. Pra mim o absurdo-mor dessa farofada toda é o fato de haver diferenciação religosa dentro da escola. Escola é lugar de estudar, não de rezar. Educação e religião não têm NADAAAAAAAAAA a ver uma com a outra – e não digo isso porque sinto asco total e absoluto por qualquer tipo de religião, mas porque são coisas claramente distintas e que não podem caminhar de mãos dadas. Não importa se a religião oficial da Itália é o Catolicismo; acho o cúmulo escola pública ter aula de religião. Não tem que ter nada! Se você quer uma escola católica pro seu filho, coitado, que vá procurar uma – e pagar por ela, obviamente, porque todo mundo sabe que a Igreja não dá nada de graça pra ninguém. Religião não é disciplina escolar, é opção (ou, na maior parte dos casos, imposição) espiritual, ou o que quer que vocês resolvam usar como descrição. De qualquer forma, deve ser desvinculada da educação. DEVE. SEMPRE.

O segundo absurdo dessa história é a cara-de-pau dos imigrantes, querendo mudar o país onde vieram viver. Eu sou imigrante e, embora as diferenças culturais Brasil-Itália não sejam exatamente abissais, obviamente sinto as diferenças do estilo de vida no dia-a-dia. E não tenho a MENOR intenção de mudar nada por aqui. As minhas indignações são as de qualquer pessoa racional: fila tem que ser única senão não anda, e aqui ninguém sabe fazer fila; a televisão é uma merda, tão merda que saiu até comentário num jornal Inglês há pouco tempo; ninguém lê nada nem estuda línguas estrangeiras e quase ninguém faz faculdade, e isso é estatisticamente comprovado; o governo Berlusconi é uma piada de mau gosto, e isso todo o planeta sabe. Mas seria ridículo eu me indignar porque aqui eles não comem arroz com feijão. Ou porque comem primo, secondo e contorno em pratos separados. Ou porque não tem ralo – bom, isso é motivo de chateação mas eu não vou pra rua protestar pra que as empreiteiras passem a construir casas e apartamentos com ralo, nem acharia justo que elas o fizessem só pra agradar uma minoria imigrante (e limpinha). Eu vim morar aqui, não interessa o motivo, e é mais do que justo que eu me adapte – obviamente sem perder, jamais, a capacidade de criticar, porque é criticando e comparando que as coisas melhoram. É absorvendo as coisas boas que pessoas diferentes nos ensinam que a gente vai dando upgrade na gente mesma e no mundo. Se o idiota que monta as multi-filas no cinema de Perugia já tivesse ido à Disney, certamente teria montado uma fila única, porque saberia que não existe outro jeito de fazer a coisa funcionar. Se os italianos soubessem o quanto é gostoso o suco de maracujá, ele estaria em todas as prateleiras de todos os supermercados – coisa que ainda tenho esperança que irá acontecer, como foi com o abacaxi. O Mirco adora, mas se ele não estivesse comigo a probabilidade dele morrer sem nem ouvir falar no maracujá seria imensa. Se os americanos já tivessem adotado o sistema eletrônico de eleição como nós já fazemos, talvez o Bush... Hm, estou fugindo do assunto.

E se toda minoria quisesse ter turmas separadas, seria engraçado. Uma turma pra muçulmanos, uma turma pra protestantes, uma pra orientais, uma pra quem tem cabelo ruim, uma pros míopes... Que catástrofe, que pequenez de mentalidade seria.

E o terceiro absurdo é a segregação maior ainda que uma coisa dessas causaria. Se já é difícil pro pessoal de outros hemisférios se adaptar normalmente, imagina mantendo o povo separado! Pois se crianças, normalmente menos preconceituosas (ou desconceituosas, já que não entendem nada da vida ainda), brincam todas juntas sem esquentar a mufa se o amiguinho é isso ou aquilo, e são, na minha opinião, o melhor modo de integrar culturas, o que aconteceria se nem elas tivessem a oportunidade de se conhecer melhor, sem preconceitos?

A coisa toda é uma perda de tempo tão grande que eu fico até sem palavras. É o tipo de idéia que nem deveria passar pela cabeça de uma criatura, nunca – como a idéia de jogar lixo no chão. É tão óbvio, tão claro, que não há razão pra discutir. Não há razão pra discutir assuntos religiosos dentro da escola. NADA justifica religião dentro da escola, a não ser que seja um escola religiosa, mas aí é uma escolha tua.

Acho que foi esse o verdadeiro problema do véu dentro das escolas. Não vejo o menor problema no uso do véu nas escolas, tipo, não acho que seja uma ofensa pessoal a ninguém. Trabalhar com gente que tem crucifixo pendurado no pescoço também não é ofensivo pra mim – levemente ridículo, mas não ofensivo, não tô nem aí. Só acho que uma religião que decide tudo na sua vida, desde o modo de pensar até o de comer e se vestir, merece o máaaaaaaaaaximoooooooooooo do meu desprezo. Pensando bem, toda religião merece o meu máximo desprezo, mas quando começa a interferir nas coisas mais bobas do seu dia-a-dia, a coisa fica séria. Chegar a ter protesto na rua e gente perdendo tempo e dinheiro na TV por causa de um véu é um pouco demais pra mim. Tanto problema mais sério pra resolver, tanta coisa mais interessante pra fazer da vida, e neguinho vai ficar discutindo véu, crucifixo? Ai, por favor, né.

E no entanto, até eu tô perdendo meu tempo falando desse assunto, vejam só. Bobeira é uma coisa contagiosa, aparentemente. Embora no meu caso eu acho que a falta do que fazer tenha muito a ver com a história.

Postado por leticia em 14:26

09.07.04

ira

Quando eu estou assim irritada, e não estou falando da irritação de um sapato que machuca, ou de um mosquito no ouvido, mas de irritação séria como essa de hoje, fico intratável. E não tem nada nem ninguém no mundo que ajude a melhorar. Tenho que esperar passar mesmo, porque não tem nem Leguinho que dê jeito. Anzi, tudo que acontece ao meu redor é motivo pra me irritar mais ainda e é mais seguro pro mundo que eu fique isolada, totalmente longe do contato com outros seres animados.

Por isso, crianças, cuidado a quem resolver me escrever e-mail hoje. Porque uma simples mas absurda crase antes de verbo (ou, como aconteceu ontem, um estudante de Direito que me escreveu dizendo que esperava não estar encomodando e perguntando se na primeira vez que eu vim à Itália eu já tinha pretenção de ficar) vai ser o suficiente pra desencadear um macabro episódio de Móveis Hediondos Que Voam Janela Afora.

Postado por leticia em 16:54

anta

O dia em que eu aprender a mentir ao telefone eu vou ser uma pessoa mais feliz.

Ligaram-me de uma agência de tradução em Milão, uma das mil às quais mandei meu currículo. Diziam que estavam me mandando um fax, em casa, com um questionário que eu deveria preencher, assinar e devolver via fax. Depois do almoço ligaram de novo, dizendo que nem todas as páginas da minha resposta chegaram direito mas a pergunta importante era uma só: eu tenho corretor ortográfico de Português no Word? E o que a idiota aqui responde, sem nem piscar, num primor de sinceridade? Não. O suspiro de decepção do outro lado foi tão nítido que me deu até dor no coração.

E assim eu me fodi e perdi uma talvez bela oportunidade de trabalho.

E o mais legal é que não foi, nem de longe, a primeira vez.

Postado por leticia em 16:41

17.06.04

nhoque

Ontem fomos jantar na Sagra degli Gnocchi em um subúrbio de Perugia. Ano passado também fomos, mas não lembro o menu. Esse ano tinha, novamente, muita gente. O sistema deles é diferente do clássico esquema das sagras: você vai numa casinha chamada Segreteria (secreteria, mas me digam o que esse nome tem a ver com a sua real função) e pega um menu como esse abaixo, que tem um número pré-impresso na capa. Como sempre, marca-se a quantidade desejada ao lado do nome do prato disponível e depois vai-se a outra casinha onde meninas bonitinhas estão sentadas ao computador pra inserir os pedidos. Pendurado no teto da casinha, um mostrador digital diz em que número a fila está. Quando chega a sua vez basta ditar o pedido, dar um nome (o nome-código do Mirco nessas sagras virou Gino), pagar e ir procurar lugar numa mesa. Logo logo um dos velhinhos encarregados de pegar os pedidos vê você sentado lá sem nada na tua frente, à mesa, e vem pegar uma cópia do pedido (te dão duas cópias quando você vai pagar). Crianças e adolescentes da comunidade são encarregados de botar a mesa, e o fazem com muita dedicação e seriedade, é muito engraçado. Mesa posta, logo chega o jantar.

Tinha música programada praquela noite, mas o Perugia tava jogando contra o Fiorentina na disputa por uma vaga na série A. Perdeu. Antes ele do que eu.

**

Chegando em casa, em menos de 5 minutos o Mirco já tinha ativado o seu Super Roncator Plus Tabajara, e eu fiquei vendo Portugal x Rússia. Peguei-me torcendo pelos portugueses. Tenho que admitir que ultimamente venho me interessando mais por Portugal, e não é só porque meu pai tá morando lá. Sempre tive um grande desdém por Portugal, por vários motivos. Primeiro pela inércia de um país que já fez grandes coisas e hoje não produz mais nada de interessante. Aqui na Itália ninguém nem sabe que Portugal existe, o que tem pra se ver lá, que tipo de vida eles levam, o que eles comem. Durante a nossa viagem pela Itália, eu e Valéria não encontramos NENHUM português. E o meu desprezo por gente que não viaja só não é maior do que o que eu sinto pelas religiões em geral. E olhem, vejam só, Portugal é super católico (muito mais do que a Itália, tenho certeza, porque a Itália é falsa católica).

A família da minha mãe é portuguesa, eles têm vários amigos portugueses, e cresci observando, porque sou observadoríssima, e discordando plenamente, do modo de pensar e viver deles. O exagerado valor dado ao trabalho, a incapacidade de se divertir, a necessidade de sofrer pra dar valor às coisas boas, tudo isso me dá uma irritação impressionante. E não vou falar da famosa burrice, porque generalizar é feio, embora eu conheça de perto alguns exemplos que corroboram perfeitamente essa teoria. Hoje creio que eles sejam simplesmente muito infantis, bobinhos – o que não se pode chamar de burrice, acho.

A verdade é que só não fui a Portugal ainda porque as companhias low-fare não vão a Portugal, e, quando vão, só a Faro, que fica longe da casa do meu pai, e ainda por cima com a Ryan eu teria que sair daqui de Roma, ir a Londres, dali a Dublin, pra só depois chegar em Faro. Nem fo*endo. Mas tenho vontade. Tenho lido coisas interessantes sobre Portugal na internet, visto belas fotos, e fiquei feliz desse campeonato europeu estar sendo realizado lá. Quem sabe assim o país não acorda pra vida – e consequentemente o mundo não percebe que Portugal existe de verdade e vale a pena conhecer...

**

Ah, nem comentei porque me pareceu irrelevante: nada de Rio em julho ou agosto. Passagens completamente esgotadas, ou então com preços desumanos.

Postado por leticia em 09:23

12.06.04

Por que as pessoas insistem em usar crase antes de substantivo masculino? Antes de verbo? Por que tanta dificuldade em distinguir a, à e há? Por que, céus, POR QUÊ???

Postado por leticia em 08:18

23.05.04

A criatura mais graciosa da Terra não é o gato, nem a borboleta, nem a garça, nem a cheetah. A criatura mais graciosa do universo é a bailarina clássica.

p.s.: Notaram a frustração?

Postado por leticia em 23:40

17.05.04

procura-se sponsor

Estamos à procura de um patrocinador para um revolucionário produto que com certeza vai mudar, para melhor, a vida de milhões de pessoas em todo o planeta. Trata-se do Super Hiper Mega Decapitador de Fumantes de Elevador, copyright pacamanca Inc. O funcionamento é simples, rápido, e infelizmente indolor: um sensor ultra-eficaz posicionado no teto do elevador* ativa, ao menor sinal de fumaça de cigarro, um jato de água direcionado a laser que apaga o cigarro imediatamente. Mas não é só isso! O sistema também ativa, imediatamente depois da apagação do cigarro, um machado afiadíssimo que cortará, com precisão cirúrgica, a cabeça do idiota. E na versão 2.0 Deluxe a lâmina já vem automaticamente coberta com um potente coagulante, que impede assim quaisquer jorros de sangue e consequentemente elimina o incômodo da limpeza pós-decapitação.

Também estamos tentando um acordo com o cadastro de cidadãos para eliminar possíveis cônjuges do idiota decapitado, para evitar assim a transmissão dos cromossomos da falta de educação às futuras gerações.


*O sensor, naturalmente, é invulnerável a qualquer tipo de agressão, seja ela de natureza química ou física.

Postado por leticia em 13:04

14.05.04

vai uma massaje aí?

Pois é, então, nem contei do maluco-beleza que está fazendo minhas massagens shiatsu. O cara é uma figuraça, todo descabelado, mas competente, pois já estou me sentindo melhor. Ontem foi a primeira sessão, e logo de cara ele sacou qual era o problema: ao sentir a rigidez do músculo, perguntou na cara dura se eu estava contente no meu emprego. Dei uma risada e deixei por isso mesmo. Ele respondeu com outra risada de quem entendeu tudo muito bem.

Hoje, durante a segunda sessão, botei meu bedelho pra funcionar e perguntei há quanto tempo ele faz massagem, e principalmente como foi parar nesse tipo de atividade. Resposta: desde 89. Antes disso ele administrava discotecas e pubs (tuuudo a ver), até que uma amiga a quem ele deve ter administrado uma bela massagenzinha erotico-básica disse que ele tinha "energia nas mãos", coisa que eu considero uma balela ímpar, que seria melhor traduzível em "mãos boas pra massagem". Ele resolveu ir adiante, e, não achando na Itália nenhuma escola séria de shiatsu, foi parar na Suíça, onde estudou por 3 anos (e eu que achava que era uma coisa simples...). Voltou à Itália, continuou sempre os estudos, acompanhou de perto um médico "alternativo" por 15 anos (esse guru dele hoje tem quase 90 anos), e resolveu abrir seu próprio consultoriozinho de massagem.

Perguntei tudo isso não só porque sou irremediavelmente curiosa, mas por um motivo muito down-to-earth: ele cobra 20 euros por cada sessão de 40 minutos. Eu levo 15 horas e meia como estagiária pra juntar 20 euros. Sacaram?

**

A coisa curiosa nessa história toda é que ele pegou, compreensivelmente, o mesmo vício de todas as manicures que já fizeram minhas unhas: o de me dar tapas pra me fazer relaxar. Eu não consigo relaxar. Não tenho nenhum prazer particular com massagem, não me dá sono nem me tranquiliza, e eu fico rígida O TEMPO TODO. Detesto ter gente mexendo no meu corpo sem que eu saiba exatamente o que estão fazendo. Então volta e meia ele pergunta, beliscando meu ombro: "Por que você não está morta? Quero você morta, relaxada". Ao que eu respondo: "Eu estou morta... só que em rigor mortis". Que infame que sou.

**

Segunda-feira, sempre às oito, a terceira e, espero, pro bem do meu bolso, última sessão. Mas sei que enquanto minha vida não se ajeitar por aqui e eu não me divertir mais um pouquinho vou continuar com o ombro duro, e todos os habitantes de Hokkaido podem vir massagear shiatsudamente meu músculo trapézio que o bicho vai continuar emperrado.

Postado por leticia em 14:52

10.05.04

grr.

Estou devendo 300.000 emails, mas hoje estou irritada demais pra escrever. A minha incapacidade total e absoluta de ganhar dinheiro me deixa num estado de ódio tamanho que não consigo nem respirar sem sentir raiva. Esperemos que passe.

Postado por leticia em 20:33

07.05.04

que droga

Então eu já tô de saco cheio dessa história do Maradona, e quero fazer uma pergunta – aliás, várias: por que é que ainda dão espaço na mídia pra esse idiota? Um cara que é A imagem da decadência, da auto-destruição, da imbecilidade, da fraqueza de espírito? Por que é que ainda se fala dele? Que tipo de exemplo esse idiota pode dar aos outros idiotas que precisam de ídolos? Por que é que há tantos idiotas que precisam de ídolos? Por que esse mundo é tão ridículo?

Quando eu vejo gente embaixo de janela de hotel esperando que o cantor ou ator famoso apareça na janela, quando eu vejo gente na porta do hospital onde essa mula do Maradona está internado, com vela e santinho na mão, rezando por um idiota, quando eu vejo gente que chora quando vê o ídolo na televisão, eu sinto um desconforto tão forte que chega a incomodar fisicamente. Que poço de ignorância uma pessoa tem que ser pra idolatrar gente da qual só se conhece uma faceta! O que se sabe do Maradona, além dele ter sido um estupendo jogador de futebol? O que que esse cara acrescentou ao mundo? O que ele tem que poderia me fazer gostar dele? De maneira geral eu não gosto de artistas nem de esportistas; gosto do que eles fazem, o que é IMENSAMENTE diferente. Não posso gostar deles, porque não os conheço. A não ser que seja uma coisa muito gritante, tipo, eu não gostava nem das músicas da Cassia Eller, nem da sua voz, nem da sua aparência física que sempre considerei esculachada ao ponto de ofender terceiros. Também não gostava dela porque detesto gente vulgar e mal educada. Gostei menos ainda da novela que se criou em torno da morte dela, e gostei ainda menos da idolatria que se criou em torno dela. Porra, a mulher era mal educada pra caramba, morreu drogada e neguinho ainda tem admiração por ela? On the other hand, gosto do Oscar, do basquete. Gosto porque me parece ser um cara sensato, normal, não-estrelinha – leiam bem, PARECE, não sei, não o conheço. Pensando bem, em vez de dizer “gosto do Oscar”, talvez seja mais seguro dizer “tenho simpatia pelo Oscar”. O resto é perfumaria.

Sou eu que estou ficando maluca ?

**

E aí, falando no Maradona, entramos no assunto droga. Vocês, leitores espertos que são, devem ter lido a sensatíssima coluna da Cora falando da sua opinião sobre o assunto. Concordo em parte. Tenho certeza de que a predisposição à dependência é uma coisa biológica, genética, e, até o momento, "incurável". Eu também sou viciada em chocolate e eu, como a Cora, não hesitaria em vender o videocassete pra comprá-lo de um traficante, se o chocolate fosse declarado droga ilegal. A diferença, no entanto, é que a droga te destrói muito rapidamente e é bem mais viciante, enquanto que o chocolate só faz engordar mesmo. E, sabendo o que a droga pesada faz com o seu corpo, e a dependência quase imediata que ela te causa, e os problemas que resultam do seu uso, porque é ilegal, só entra nessa quem é muito idiota. Como só quem é muito idiota começa a fumar. Vejam bem, o problema está no primeiro passo. Só dá o primeiro passo na direção do abismo, sabendo que ali está o abismo, quem é muito idiota. A fraqueza está no vício, porque quimicamente a nicotina, assim como a heroína e o chocolate, é viciante, e o cabo-de-guerra entre força de vontade e dependência química é meio complicado. Mas o primeiro passo é burrice mesmo, e é só por esse pequeno detalhe que eu não acho tão boa a idéia de legalizar a droga. Como também não acho legal o fato do cigarro ser considerado legal. Sou completamente contra oficializar a idiotice, e por mim o tabaco seria exterminado da face da terra. Abaixo o fedor e os dentes amarelos.

p.s.: leiam também os argumentos do Tom Taborda sobre o assunto. Interessante.

Postado por leticia em 10:20

02.05.04

hm

Empatado em primeiro lugar com fotógrafo da National Geographic, na minha lista de melhores empregos do planeta, está o de cenógrafo/figurinista do Cirque du Soleil. Quequeísso, minha gente.

Alinhás, o Cirque está na Itália pela primeira vez esse ano. No momento estão em Milão (Simone, franjuda linda do meu coração, que que cê tá esperando pra ir lá ver?), ou seja, completamente fora de mão, mas li numa entrevista com o italo-belga que comanda o batatal que em setembro chegam a Roma. Jacaré vai? O jacaré não sei, mas eu vou.

Vou também a Torino no próximo fim de semana, pra feira do livro lá deles. Pelo menos é o que estamos programando, mas como o futuro ao acaso pertence... ;)

Postado por leticia em 17:20

07.04.04

tolinhos!

Berlusconi anda contando vantagem por conta dos acidentes estradais, cujo número caiu muito depois da introdução do sistema de pontos pra carteira de motorista. Aí eu fiquei pensando numa coisa que de vez em quanto me fustiga o céLebro: por que é tão difícil pra maioria das pessoas fazer as coisas pelos motivos certos? Eu, hein!

O lance é que aparentemente não interessa a causa mas sim o efeito: se neguinho bota o cinto de segurança, aparentemente não faz diferença se bota porque se não botar e o guarda vir ele leva multa ou então se ele bota porque sabe que tem que botar, por motivos de segurança. Mas eu acho que faz toda a diferença do mundo. A diferença é a seguinte: eu, por exemplo, uso cinto desde pequena, o que quer dizer MUITO antes do cinto virar obrigatório no Brasil. Minha mãe não gosta, acha desconfortável, mas pra essas coisinhas técnicas da vida papai é rei e nos acostumou desde cedo. Hoje eu boto o cinto assim que entro no carro, não tiro nem pra manobrar, nem se tenho que ficar esperando no carro. Esqueço que o cinto existe, não me incomoda de jeito nenhum, nem no calor – pelo contrário, se esqueço de botar (e só esqueço quando estou usando bolsa a tiracolo, porque a alça da bolsa atravessando o peito dá a sensação de que estou de cinto) sinto que fica faltando alguma coisa. Ou seja, eu não uso porque tenho medo de levar multa, mas porque SEI que, pra minha própria segurança, é melhor usá-lo.

Meu tutor, que como a maioria dos italianos tolinhos acha que é invencível e invulnerável, acha o cinto uma bobeira e só usa porque tem medo de levar multa. A diferença entre nós dois é que, se por acaso a lei do cinto terminasse, ele pararia de usar, e eu não.

Por isso insisto no fazer as coisas pelo motivo certo – porque senão quando a motivação errada acaba, a gente pára de fazer. É como se eu só limpasse a casa quando tivesse visita. O resto do tempo a casa ficaria imunda. É claro que isso não acontece, porque eu sei que tenho que limpar a casa, por ene motivos óbvios. Não paro na faixa de pedestres pra velhinha atravessar só porque tem uma placa, ou porque tem um guarda parado a 50 metros de distância, ou porque senão a velhinha me xinga. Paro porque quando sou eu que estou atravessando também fico com raiva de quem não pára. Pago meu aluguel em dia não porque se eu não pagar o Stefano pode me mandar embora de casa, mas porque simplesmente tenho que pagar, se fosse eu a proprietária também ia ficar irritada se meu inquilino não pagasse. Posso ainda dar o exemplo da mãe idiota que diz pro filho parar de surrar o irmãozinho porque senão ela vai chamar o papai. Que ódio que essa frase me dá! O dia em que o pai morrer o filho vai achar que pode surrar quem quiser, porque a mãe não vai ter ninguém pra chamar.

Acho tão mais válido viver assim, sacando sozinho por qual motivo precisa fazer isso e não aquilo. Tão mais fácil ser capaz, mais ou menos, de distinguir o certo do errado, sem precisar ser condicionado pavlovianamente com multas, ameaças, leis. Na verdade só precisa de bom senso mesmo. O problema é que anda em falta no mercado...

Postado por leticia em 08:16

sonhos sonhos são

Acordei hoje e vi na minha caixa postal um e-mail de uma amiga de faculdade muito querida, a Super Pediatra Sabrina, com quem há muito eu não falava. Fiquei muito feliz, não só por ter reativado esse contato, mas também por causa das boas notícias que ela deu. O engraçado é que eu sonhei com ela essa noite. Foi um sonho muito bizarro, cheio de casamentos simultâneos e amigos em comum correndo pra lá e pra cá pra assistir a todos. E aí a Sabrina hoje me escreve dizendo que tá pra casar. Transmimento de pensação :)

Postado por leticia em 07:51

05.04.04

ai meus sais

Uma das muitas diferenças entre o lanterneiro e eu é o fato de que ele, pra relaxar, gosta de sair de casa. Quando eu estou cansada ou irritada só quero ficar quieta, não quero ver ninguém, não quero conversar, não quero me arrumar, não quero sair de casa. Quero dormir e pronto. Outra coisa: ele consegue "desligar" a consciência de um ambiente desagradável, se a companhia for boa. Eu não.

Quinta-feira passada fomos a Assis encontrar Fabião e FeRnanda na Piazza del Comune (ali mesmo, onde eu trabalhava, na loja do Fabrizio, o Louco). Tava rolando um show com uns cantores que fizeram sucesso no último Festival di Musica di Sanremo (uma das coisas mais chatas que eu já vi na vida). Gente, eu ODEIO música italiana. Odeio. E não consigo simplesmente fingir que não tá acontecendo nada e curtir a boa companhia. A música fica martelando no meu ouvido, me irritando, me irritando, até que eu chego ao ponto no qual se alguém me perguntar as horas eu respondo rosnando. O Mirco bocejando, morto de cansaço depois de um dia de trabalho que começou às seis da manhã e terminou às oito da noite (pra mim também, porque tenho ficado direto na oficina substituindo a Elisabetta, a secretária, que só volta das férias amanhã), mas queria ficar lá, ouvindo aquela porcaria, vendo gente feia em pé na praça. Socorro!

Único ponto positivo da noite: conheci a Lisa, uma italiana da outra província da Umbria que fala Português perfeito e canta música brasileira. A FeRnanda nos apresentou e achei a garota muito gente boa.

Nem acreditei quando finalmente deitei na minha caminha e consegui fechar os zoinho.

Postado por leticia em 19:17

04.04.04

nega do cabelo duro

Ontem fui relaxar os cabelos em Perugia. Aproveitei pra cortar também. Agora a casa inteira tá fedendo a soda cáustica.

Aqui os salões de beleza são completamente diferentes dos nossos. Não tem essa de cada cliente ser seguida por um profissional: todo mundo faz tudo. Hoje quatro pessoas diferentes mexeram no meu cabelo. Ninguém se veste de branco nem usa avental. As duas sócias desse salão dividem o tempo entre varrer o cabelo do chão, atender o telefone, cortar cabelo e fazer escova nas clientes, fumar, trazer salgadinho da padaria da esquina pras ajudantes. Não há manicures nem depiladoras especializadas e essas atividades são as menos populares do salão. Ninguém te traz água mineral nem cafezinho.

Essa minha cabeleireira, a Giuliana, foi uma descoberta e tanto, por dois motivos: ela não enche meu saco perguntando coisas da minha vida e contando coisas da vida dos outros, e faz exatamente e exclusivamente o que eu digo a ela pra fazer. Se eu digo que não é pra fazer assim mas assado, ela faz assado, sem lenga-lenga. E ainda por cima lembra do meu nome e do corte que eu gosto. E olha que eu só vou lá de três em três meses – tem quase dois anos, tudo bem, mas elas têm tanta cliente que eu fico admirada dela lembrar de mim. A mulher é profissional pra caramba. É a Madonna dos salões de beleza.

Saio sempre satisfeita depois de pagar os 36 euros de sempre, pelo relaxamento, bálsamo e corte. O fedor de soda cáustica vem de brinde.

Postado por leticia em 15:20

01.04.04

cigarra

Eu ODEIO trabalhar. O-D-E-I-O. Detesto. Tenho pavor. Alergia, coceira, comichao, pesadelos. ODEIOOOOOOOOOOOOOO.

(e devo ter algum cromossomo alemao em algum lugar que nao se manifestou, digamos, capilarmente, mas me deixou completamente desprovida de qualquer coisa que lembre jogo de cintura e capacidade de improvisaçao.)

Mudando de assunto pra eu nao me irritar mais ainda, porque hoje FeRnanda e Fabiao vem jantar e nao quero estar de mau humor: vou fazer a receita de torta de frango da Marcinha, pao de queijo, pizza de cebola com salvia e de alecrim com azeite, e de sobremesa tabajara uns cookies de café com gotinhas de chocolate que se ficarem bons eu boto aqui. (se nao ficarem eu nao toco mais no assunto, e todo mundo vai fingir que esse assunto nem rolou, tah? ;)

Postado por leticia em 18:47

11.03.04

E hoje o Mirco foi fazer a artroscopia do joelho. Foi uma experiência reveladora em muitos sentidos, mas agora estou muito cansada e amanhã escrevo com calma.

Postado por leticia em 22:11

01.03.04

Cineminha

Ontem à tardinha fomos ver The Butterfly Effect. Apesar do protagonista ser o namorado da papa-anjo Demi Moore e da direção deixar um pouco a desejar, o conceito geral do filme é bem interessante. The Butterfly Effect é aquela história da borboleta que bate asas no México e pode causar um tornado do outro lado do mundo, através de uma série de eventos aparentemente não relacionados entre si.

O personagem do bobão do That 70’s Show é um garoto que volta e meia tem blackouts de memória que resolve escrever diários pra tentar tapar os buracos. Só que ele descobre que relendo esses diários, em particular os trechos não terminados, porque relativos a pedaços perdidos de memória, ele consegue voltar ao passado. Como a história toda é cheia de pequenas tragédias, ele resolve mudar o passado pra tentar evitá-las, bastando pra isso pequenos atos, como uma frase, um objeto dado a um amigo. Voltando ao presente, que obviamente muda de acordo com o passado que ele alterou, ele descobre que esses mesmos pequenos atos são capazes de mudar totalmente a vida das pessoas. Ele acaba ficando num vai-e-vem passado/presente, achando que consertou coisas no passado mas caindo em presentes horrorosos, até resolver parar com a brincadeira, do melhor jeito possível.

Bom, no final das contas gostamos do filme. E voltamos no carro conjecturando sobre as nossas vidas ultimamente. É meio apavorante pensar que, se o telefone do Mirco tivesse tocado quando ele estava pra sair de casa naquele dia de novembro em 2001, e ele tivesse voltado pra responder, provavelmente não teríamos nos conhecido, porque ele teria passado na estrada quando eu e Valéria já teríamos chegado ao albergue. Ou se a gente tivesse pego o trem pra Assis que tinha acabado de sair da estação de Perugia; eu e Valéria teríamos chegado em Assis uma hora antes e assim eu e o lanternerio não teríamos nos conhecido. Ou se a Valéria não tivesse me convencido a passar em Assis – eu só sabia que era cidade de santo, e como não gosto de santo não queria vir. Lembro perfeitamente de nós duas debruçadas sobre um mapão da Itália na sala de paredes cor de pêssego da Valéria, no Leblon. Ela insistindo em Assis e eu não, não, santo não, por favor! Ou então se meu amigo Guido não tivesse me convencido a estudar italiano em vez de francês. Ou então se eu nem tivesse conhecido o Guido naquele MUSH, onde eu só entrei porque tive um febrão uma noite, não conseguia dormir e acabei entrando no tal MUSH, indicação de um amigo da Newlands.

A vida é muito estranha, crianças.

Postado por leticia em 09:32

11.02.04

assassina, mas limpinha

Sim, eu sou o tipo que extermina insetos por afogamento em DDT. Incapaz de chineladas, eu sou.

Postado por leticia em 17:23

19.12.03

famiglia

Hoje de manhã cedo, dormindo, morreu o pai do Chefe. Não era um exemplo de honestidade ou de educação, e todo mundo aqui dentro em algum momento já pensou seriamente em sair da empresa por causa da chatura dele, mas no bojo sempre nos tratou bem (principalmente depois do almoço – leia-se vinho tinto) e a morte dele abalou todo mundo. Estamos aqui no escritório ligando pra clientes e fornecedores pra comunicar o ocorrido, e depois fechamos.

Nunca tive, felizmente, um contato íntimo com a morte dentro da minha família. A única vez em que fui a um funeral foi o da minha amiga e vizinha Bruna, que morava no prédio da minha prima Erica. Morreu num acidente de carro idiota, na Gávea. Lembro que a ficha demorou muito a cair quando a Erica me ligou pra dar a notícia, e foi a mesma coisa hoje: Martinha me liga logo cedo, eu ainda de pijama, fazendo a cama, e eu achei que ela estivesse ligando pra avisar que não vinha trabalhar por causa da enxaqueca. Quando ela disse o que tinha acontecido, caí sentada na cama e fiquei repetindo feito uma idiota: mas como assim, morreu? Ahn?

A família do meu pai é formada por Matusaléns que não morrem nunca. Do lado da minha mãe é uma tumoração só, neguinho morre de tudo que é tumor que você puder imaginar (então já sei o que me espera...), mas nós temos muito menos contato com essa parte da família, então nem lembro quem foi o último que morreu. Meu avô, pai da minha mãe, morreu há muitos anos (sempre câncer, claro). Eu era pequena e lembro só de uma tristeza danada em casa, e de ver meu pai chorando, como também chorou quando morreu a Tia Maroca, irmã da minha avó, também quando eu era pequena. Tenho muitas boas memórias dos dois, mas eu era pequena demais pra entender direito o que estava acontecendo.

Então, eu nunca tinha visto de perto a coisa como ela é. Fomos direto pra casa do Chefe; a irmã, que estava pra casar (e o pai não aprovava a coisa porque o noivo é do norte da Itália, tem uma agência de turismo e vive viajando, não pára em casa. A opinião nossa aqui no escritório é que agora o casamento não sai mais), completamente desolada; o Chefe, um homão alto e grande, chorando feito uma criança, e é isso o que mais sacode a gente. Anzi: o que mais sacode é a burocracia envolvida. O cara da agência funerária (aliás, que emprego é esse, hein? Socorro...) já estava lá, escrevendo o texto dos cartazes de anúncio de óbito e marcando com uma cruzinha num formulário as cidadezinhas onde os cartazes vão ser colados. Uma coisa muito estranha; todo mundo devastado de dor mas mesmo assim um vira pro outro pra perguntar, mas ele conhecia alguém em Palazzo? Não? Então em Palazzo não precisa botar cartaz. Mas em Viole sim? Viole sim. Rivotorto com certeza, né, tio?

E aí vem o padre.

Eu só digo uma coisa: o idiota que mandar um padre pro meu futuro funeral, ou mandar rezar qualquer coisa, ou puser uma cruz ou um anjo ou uma N. Senhora no meu túmulo, ou distribuir santinhos com o meu nome escrito atrás, mas esse idiota vai ter as pernas puxadas de noite pela minha fantasmagórica e esbelta figura até o fim dos dias.

**

Há muito tempo eu quero colocar aqui uma foto da minha avó, mãe do meu pai, que morreu quando ele tinha 13 anos. É a pessoa que eu mais gostaria de ter conhecido em todo o mundo. Era muito bonita, culta e refinada, era professora de piano, e pelo que dizem também era uma mulher “prafrentex”, e acho que nossa família talvez tivesse tomado outro rumo se ela não tivesse morrido tão cedo, deixando meu soturno avô com 5 filhos pra criar. Oficialmente morreu de câncer de mama (opa!), mas eu acho que a melancolia teve muito a ver com a história. A teoria da minha mãe é que eu herdei da minha avó Dirce (QUE NOME É ESSEEEEEEEEEEEEE), além do sorriso que eu nunca vi porque não há nenhuma foto dela sorrindo, essa tendência à depressão. Pode ser, pode ser.

Quando o meu pai fizer o favor de escanear a foto dela que há ANOS ele promete e não escaneia, eu boto aqui, e vocês vão ver que avó danada de chique que eu (não) tive...

Meu avo é apaixonado por ela até hoje. Na sala do apartamento dele, na Tijuca, onde ele mora com a minha tia que nunca casou (e que tem também o sorriso da Vovó; meus tios me chamam de Ilsinha porque quando sorrimos eu e T. Ilse nos parecemos muito), há na parede um quadro do meu bisavô sírio, vestido a caráter e muito sério e macho, e um da minha avó. Vovô só se senta à mesa numa posição em que ele possa ver o quadro.

Minha outra avó, com quem morei no final da faculdade, não tem nada de chique, mas é a clássica avó hipocondríaca, totalmente saudável e boa de cozinha e de garfo. Mês passado deu um susto na gente com uma hérnia intestinal maluca que precisou ser operada – e olha que maravilha, quem operou foi uma feladaputa que foi minha professora de Cirurgia na faculdade, e que me deu um esporro homérico uma vez porque apresentei um seminário sentada na escrivaninha dela hohoho... Até onde eu sei ela é uma boa profissional, mas a fama de sapatona antipática que ela tinha no hospital era bem, digamos, intensa. Não entendo essa gente que prefere se impor pelo ódio/medo em vez de pelo respeito adquirido. Deve dar tanto trabalho ser filha da puta e antipática o tempo todo!

Postado por leticia em 10:53

12.12.03

hm...

Sim, sou possessiva – só com coisas materiais, bem entendido. Não significa que eu seja fútil ou frívola, ou menos humana do que a média das pessoas; simplesmente me apego demais a coisas, objetos. Tenho particular problema com comida e livros. Tenho pena da comida não comida e de livros não lidos; me irrito se perco tempo que poderia ter sido empregado em comer ou ler. Tipo, vou a um restaurante, peço um risoto de açafrão, mas sinto pena da massa com salmão, coitadinha, ficou ali, abandonada! Arrependo-me de não ter pedido os ravioli com trufas brancas, de não ter experimentado, sei lá, uma outra coisa gostosa que vi no cardápio ou na mesa de alguém mas acabei não pedindo.

Hoje me irritei, como acontece muito frequentemente, depois do almoço. Antes de virmos ao escritório, eu e Marta passamos no banco, pelo menos duas vezes por semana. Sempre pergunto, quando estou descendo do carro pra entrar em casa antes do almoço, se hoje rola banco; quando rola, levo o livro que eu estiver lendo pra passar o tempo enquanto espero, no carro, a Marta resolver o que tem que resolver no banco. Hoje deixei o quarto Harry Potter em casa, e mofei dentro do carro por quase quinze minutos ouvindo a temível música italiana no rádio, em vez de estar lendo alguma coisa de produtivo e/ou interessante. Isso vai me dando uma certa irritação, e fico o resto do dia pensando em como fui burra em ter deixado o pobre livro em cima da mesa. Como se fosse uma coisa gravíssima, entende? (detalhe que essa deve ser a quinta vez que eu leio os livros, entre Inglês e Italiano, tipo, não estou perdendo nada de novo).

Maluquice?

Postado por leticia em 15:56

11.12.03

roupitchas novas

E então desde ontem à noite sou a feliz proprietária de:

n. 1 casaco de lã Valentino Jeans, preto, divino
n. 1 par de calças pretas Valentino Jeans, maravilhosas
n. 1 blusa vermelho-bordô com detalhes nas mangas e na cintura e amarração no pescoço, Valentino Jeans, espetacular.

O mais lindo é que tudo isso junto só me custou 200 euros! Culpa da Marta, que me levou à Hemmond, malharia meio falida que produz (ou produzia, já não entendo mais nada) pro país inteiro, incluindo alguns grandes nomes da alta costura.

Postado por leticia em 10:19

03.12.03

deslumbramento

Mas como os meus leitores são interesseiros! A quantidade de gente que disse pra eu casar porque senão eu voltaria pra casa e pararia de escrever sobre a Itália foi impressionante! Dei muita risada com os e-mails ;) Mas, como eu disse, não respondi nem sim, nem não. Por enquanto vou ficando, e depois vou ver que bicho que dá. E chega desse assunto que essa história já deu tema pra muita novela das oito, e até eu já enjoei. Vamos falar de outra coisa.

Que o meu chefe não é uma pessoa particularmente admirável, e por motivos váaaarios, não é novidade pra quem lê o blog. Mas tem um aspecto dele que às vezes me irrita e às vezes me faz dar risada: o deslumbramento. Coisa de pobre de espírito mesmo, sabe? Novo rico? Agora pegou a mania de pedir a mim ou à Martinha pra ligar pra fulano e depois passar a ligação pra ele. Como se custasse muito ele abrir a bosta da agenda telefônica, digitar o número e dizer fulano está?. A mania começou há alguns meses, mas piorou agora que estamos em um escritório decente, com cara de sério (lá em Assis a gaveta da minha velhíssima escrivaninha era forrada com papel de presente do Snoopy, e o cachorro do escritório babava todos os clientes, e nossos produtos eram enviados em caixotes de papelão cobertos de pegadas de cachorro e com penas de galinha presas nos cantos). O menino anda se achando oooooooooo C.E.O. de multinacional. A coisa mais engraçada (leia-se é rir pra não chorar) é que ele não entende nada de nada. Não entende nada de computador, não sabe nem mexer no telefone super modernoso dele, não sabe onde está nada, e tudo tem que perguntar a mim, à Martinha, ao segundo chefe, à Miss Almoxarifado e ao Chato Workaholic Assobiador Bafo-de-Onça (doravante chamado C.H.A.B.O.) que agora faz consultoria pra gente. Uma das piores partes desse meu emprego, além do fato de ser um trabalho relativamente chato e difícil de organizar porque eu faço um pouco de tudo, é ter que obedecer a um chefe que não entende nada de coisa nenhuma. Sempre fui da opinião que pra comandar a gente tem que saber do que está falando. Bem fez o pai de um amigo* triliardário do Mirco, que tem uma fábrica de galpões aqui com sede aqui e mais umas 3 filiais no resto da Itália: antes de botar o filho engravatado no escritório, fez o garoto ralar nos canteiros de obra, observando os peões e mestres-de-obra.

* (e se tivéssemos feito o nosso novo escritório com eles, com certeza não teria sido a novela que foi esse aqui – novela que não acabou, visto que já há paredes rachando, privadas vazando e chuva chovendo dentro do banheiro).

Jamais conseguiria viver assim, tendo gente pra fazer tudo pra mim, entendendo mais da minha vida do que eu mesma. Tenho horror a depender dos outros. Nao gosto nem que façam meu prato na hora do almoço. E pra mim é essencial entender o contexto onde estou pra poder funcionar. Tipo, eu não tenho nada a ver com a produção dos cartuchos, mas sempre fui curiosa de saber como funcionava a coisa, e volta e meia apareço no laboratório pra perguntar por que não imprime direito, por que esse modelo de cartucho dá tanto problema, por que esse cartucho não é compatível com a impressora x, se parece ser idêntico ao que é compatível. Não conseguiria me mover aqui dentro sem saber essas coisas. Um cliente liga reclamando de um cartucho que não imprime direito; se eu não sei o que pode ter dado errado, como faço pra dar uma resposta decente? Fora que é feio não entender nada do mestiere. E fora que aprender nunca é demais. Pode parecer um tipo de aprendizado idiota, tipo, ooooh, que coisa importante pra minh’alma, conhecer modelos de cartuchos, mas hoje ninguém me enrola mais nesse assunto, e o dia em que resolver comprar uma nova impressora vou olhar pra cara do cartucho antes e saber imediatamente se dá pra regenerar (leia-se economizar) ou não, se é fácil de achar ou não, se o custo-benefício é legal ou ridículo, se a assistência técnica do fabricante funciona; vou saber o que fazer se o cartucho não imprimir direito, vou saber onde olhar pra ver o que está errado, enfim, hoje sei um monte de coisas que um dia poderão ser-me úteis. Conhecimento é sempre valioso, darlings, não interessa se sobre física quântica ou o crescimento dos repolhos na horta.

(ou não – a cada dia que passa mais acredito que ignorance is bliss. Muito bliss.)

Postado por leticia em 17:04

19.11.03

hmpf

Minha resposta? Foi a unica possivel: piano piano, cuore mio (que eu traduzo livremente como devagar com o andor, meu querido.)

Postado por leticia em 09:55

13.11.03

...

Preciso dizer que meus planos furaram de novo? Essa merda de 2003, quando termina, hein?

Meu pai, que tinha grandes probabilidades de passar Natal e reveillon sozinho em Vila Real, la no c* do judas em Portugal, porque o visto nao saia, agora sabe que pode ir ao Rio porque o visto tah pra sair, etc etc. Eu, que planejava ir pra lah passar as festas com ele e ter alguém pra me levar pro aeroporto, planejava deixar minha tralha na casa dele, planejava partir de Lisboa direto pro Rio, planejava achar passagem sem grandes problemas depois do reveillon, me fodi.

Nossa, realmente fiquei muito animada. Esse ano tah ficando melhor a cada dia que passa. Vai ser otimo ir sozinha ao aeroporto cheia de malas e com cachorro. Alias, vai ser muito facil arrumar um taxi grande o suficiente pra tudo isso. E vai custar pouco também, sair de Vila Real pra Lisboa de taxi... Que beleza.

Mais facil ainda vai ser arrumar passagem antes do Natal - sim, porque eu nao vou passar o Natal sozinha em VILA REAL, sozinha no apartamento do meu pai, né.

E o mais legal ainda é que eu TENHO que ir a Portugal deixar as minhas coisas, porque nao tenho dinheiro pra mandar pro Brasil. Fora que saindo de Lisboa o voo é direto pro Rio, enquanto que saindo de Roma o aviao ainda para em Milao, ou seja, a viagem acaba sendo mais longa, e pro Legolas é mais conveniente um voo direto, obviamente. Muito legal mesmo que tudo esteja dando certo exatamente do jeito que eu, mais do que queria, PRECISAVA. To adorando 2003, realmente. Jah to quase mandando tudo e todo mundo ir tomar no cu e indo morar numa ilha deserta com meus livros e meu cachorro, que essa tomaçao no rabo o tempo todo jah tah me enchendo.

Nao, nao consegui encontrar o meu contato em Roma porque, apesar de ter tido um pouco mais de tempo livre no sabado do que eu esperava, meu telefone arriou a bateria e oh! surpresa! nem a Ane nem o marido dela tem Nokia e nao pude recarregar, e o numero dela tava na memoria.

Feliz ano novo é o caralho.

Postado por leticia em 15:47

12.11.03

Então hoje Martinha me conta

Então hoje Martinha me conta que o Chefe pediu a ela, pelo telefone (hoje está fora, em Turim), que ligasse pro commercialista (que seria assim o contador) da empresa pra saber que tipo de providência tomar pra me botar in regola, ou seja, pra passar a assinar minha carteira. Ah, too late, Marlene. Agora também não quero mais. Vai ser linda a cena:
- Então, vamos assinar o contrato?
- Não, estou indo embora.
- COMO, INDO EMBORA?
- Estou indo embora. Voltando pra casa.
- E comé que eu vou achar outra pessoa pra ficar no seu lugar? (leia-se tô fodido, ninguém na Umbria fala Inglês, comé que eu vou comprar cartuchos vazios a preço de banana de fornitores que só falam Inglês?)
- Só lamento. Culpa do seu amiguinho lanterneiro.
Segue risada maléfica.

Amanhã começamos a mudança do escritório. Vamos pra uma cidadezinha aqui perto, pra um galpão novo. Vai dificultar mais ainda a minha vida porque, se a Marta adoece, coisa que acontece com frequência, eu não posso pegar a bicicleta e vir trabalhar, ou pedir uma caroninha, porque o novo escritório é longinho da minha casa – aliás, longinho de tudo. Ainda bem que essa lamúria está pra terminar.

**

Cena italiana:
17:15, banheiro da estação Termini, Roma. Uma mulher entra esbaforida, após inserir os 0,60 na roleta. Abre a pequena mala em cima da bancada da pia, saca uma saiona e uma camisa, se despe da roupa do corpo e começa a vestir a saia, coisa que, levando-se em conta o design da mesma, levou um bom tempo. Passa a “tia” do banheiro e vê a mulher em pé no meio do banheiro, de sutiã cor de vinho, tentando abotoar a lateral da saia.

TIA: Nossa, que saia linda!
MULHER DE SUTIÃ: Brigada!
TIA: Bom, também, quando se é magrinha assim*, qualquer coisa fica bem, né...
MULHER DE SUTIÃ: ... (sorriso satisfeito)
TIA: Eu nunca fui magra. Um horror pra comprar roupa!
MULHER DE SUTIÃ: Imagino...
TIA: Mas que que eu posso fazer, adoro comer!
Segue-se uma longa gargalhada. A mulher de sutiã termina de se vestir, dá boa tarde e vai embora. A tia do banheiro grita de longe um outro boa tarde e um boa viagem.

* Pra quem está aprendendo italiano: quando se usa um verbo impessoal, ou seja, com pronome si, o adjetivo vai pro plural. Essa frase em italiano fica assim:
- Quando si è magre, tutto ti sta bene...
Outro exemplo?
- Quando si è giovani, tutto sembra possibile.

**

Mental note: meia xícara de arroz + 1 brocolão e meio + 2 cenouronas = almoço pra uma semana inteira.

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Acho que não enxaguei direito o Legolas anteontem. Ele tá todo cinza...

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Quero ir ao cinema hoje. Quero ver Kill Bill.

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Run to the water
and find me there
Burnt to the core but not broken
We’ll come through the madness
of these streets below the moon
with a nuclear fire of love in hearts

I can see it now, Lord
Out beyond all the breaking of waves
and the tribulation
It’s the place and the home of ascended souls
Who swam out there in love

Nuclear fire of love in our hearts é MUITO bonito.

(Run to the Water, Live, do CD The Distance to Here, que é FE-NO-ME-NAL.)

Postado por leticia em 16:37

ociosa

Binão, o cobra da Ferro Italia que perdeu o emprego quando a empresa fechou e agora trabalha aqui fazendo consultoria, é completamente workaholic e fica nervoso quando não tem muito trabalho. Quando tem zilhões de coisas pra fazer, ele fica todo feliz e passa o dia assobiando (hábito abominável, aliás).

Como eu gostaria de ter essa vocação pro trabalho! Mas não tenho. ODEIO trabalho de qualquer natureza. Aqui no escritório esse ódio é muito maior, claro, porque o trabalho é particularmente chato, porque meu chefe é um imbecil, porque ganho pouco, porque moro sozinha, porque está frio, porque está tudo uma merda, etc. Mas o conceito de trabalho, de forma geral, já me dá urticaria.

Tipo, eu adoro traduzir. Tem vezes que me dá a louca e eu pego um pedaço de um livro que eu particularmente gosto e saio traduzindo. Mas só de saber que tem alguém esperando aquilo dentro de um prazo, ou que dessa atividade dependa a saúde da minha conta corrente, já me vêm os calafrios. Realmente nasci pra ser madame.

Sim, sou preguiçosa, mas isso não me impede de fazer as coisas, significa só que tenho que reunir mais forças pra fazê-las. Minha casa é muito limpinha, cozinho e lavo louça todo dia, não deixo acumular nada (só roupa pra passar, mas é até melhor, em termos de economia de energia) pra fazer dentro de casa, faço compras com uma certa frequência, já que vou a pé ao supermercado e não consigo comprar mais de uma certa quantidade de coisas porque depois como faço pra carregar tudo pra casa?. Saio de manhã às seis e meia pra correr, vou a pé a tudo que é lugar sem reclamar, sou rapidinha em tudo que faço, até no que não gosto de fazer. Mas também adoro ficar sem fazer nada, coçando o saco. E essa coçação so o não-emprego pode te dar.

Meu problema é que as coisas que eu gosto de fazer não são atividades assim digamos empenhativas nem de muita responsabilidade: ler, escrever, ler, cozinhar, ler, bater papo, ler, escrever, fazer compras, cuidar da casa, ler, brincar com meu cachorro espetacular, ler, comer, ler, etc. E agora? Agora não sei.

O lance da responsabilidade é forte comigo. Odeio ter mil coisas ou pessoas dependendo de mim – claro que tem a ver com insegurança, mas também tem muito a ver com preguiça. De qualquer maneira, prefiro trabalhar em equipe, o que não significa que eu jogue tudo pra cima dos outros, muito pelo contrário: normalmente acabo comandando o batatal, mas no final das contas o trabalho é feito por todo mundo junto.

Mas o mais grave dessa história é que a satisfação do trabalho feito, ou bem-feito, eu não tenho. Executar ordens de terceiros não me dá nenhum tipo de alegria. Alias, nem executar ordens de mim mesma: adoro fazer listas e gosto de riscar o que já foi feito, mas depois acabo perdendo a lista e deixando tudo pela metade. Não tenho todo esse estímulo de melhorar sempre, de dar o melhor de mim, de superar limites. Tenho muitao preguiça de superar limites. Acho um saco superar limites. Meu prazer jamais vem de uma coisa bem feita ou de um projeto realizado ou do fato de ter conseguido alguma coisa que eu sempre quis, mas de coisas simples e pequenas, como todas aquelas coisas ali que eu falei que gosto de fazer. Se escrevo um texto bom, do tipo que depois eu fico relendo e pensando putz, mandei benzão, fico contente, mas não saio corrigindo nada nem melhorando nada, escrevo e pronto. Sempre tive problemas com rascunhos; jamais em toda a minha vida escrevi um rascunho que depois, corrigido, virou texto. Escrevia um rascunho pra acontentar professores chatos que exigiam a coisa, mas o texto final era sempre outra coisa completamente diferente, sobre outro tema, escrito em modo diferente, de tamanho diferente, enfim. Voltar atrás e corrigir é muito doloroso pra mim.

Sei lá, sou meio folgada sim, mas tento compensar oferecendo em troca a minha brilhante e solar companhia hohoho Mas falando sério, eu não me incomodo de dar carona a, de cozinhar para, de ajudar a arrumar a casa de, de pagar cinema para, de levar pra passear cachorro/filhos de, de ajudar a estudar pra prova pessoas cuja companhia me é particularmente agradável. Acho uma troca normal: você me faz dar umas risadas, eu lavo a louça depois do jantar. Você me faz companhia pra ir ao cinema, eu dirijo. Você me dá algumas horas de papo interessante, eu pago o chopp (pra mim vinho tinto, por favor). Você me faz companhia na discoteca quando me bate aquela vontade de dançar, eu te hospedo na minha casa. Você me ensina, mesmo sem saber, alguma coisa de útil/interessante/curioso, eu te trago um brigadeiro, te dou um abraço. Acho naturalíssimo, balanceado e super válido, não só quando EU estou fazendo companhia, dando horas de papo, fazendo os outros rirem, mas também quando estou lavando a louça, dirigindo, pagando o chopp. (mas admito que me encontro mais frequentemente na posição de quem faz rir, de quem oferece um ombro amigo, de quem ensina alguma coisa, de quem dá horas de papo interessante). Troca, escâmbio, dar-e-receber, é disso que é feita a vida, né nao?

Postado por leticia em 12:58

27.10.03

Senta que o post é longo

O fim de semana foi OK. Sexta-feira o Ralph, o cão corso aqui do escritório, mordeu a batina de um padre que veio comprar cartuchos. Cachorro esperto! À noite fui jantar com o Samuele, que não conseguiu convencer a Carmen de nos acompanhar. Eu tava exausta e concordei em comer uma pizza, uma coisa rapidinha, mas o menino me chega de gravata pra me buscar! Eu semi-molamba, com jeans novos e suéter de lã normalzinho, mas não tive saco de mudar de roupa. Acabamos indo pro Bistrot, aquele do risoto ão (camarão, salmão e açafrão). Ainda comemos um secondo e a sobremesa, um tiramisù com creme de gianduia em vez de mascarpone. Nada de vinho porque ele é abstêmio. Conversamos, ele me explicou os detalhes da caça ao javali, eu falei pouco porque estava muito cansada e já sentia os primeiros sintomas do resfriado que agora chegou pra valer.

Sábado Martinha não trabalhou; vim pro escritório com o Stefano, que faz os cartuchos inkjet, e voltei com outro Stefano, o marido da microsarda. Só que em vez do horário costumeiro de sábado, das 9 ao meio-dia, trabalhamos das oito e meia à uma. E todo esse tempo passamos, todos nós, em pé, limpando, etiquetando, ensacando, encaixotando cartuchos. Minha hiperlordose agradece. Em casa almocei correndo, fui ao supermercado comprar a base da minha alimentação ultimamente (água mineral e leite desnatado), deixei o Legolas em casa e fui a pé até S. Maria pegar o ônibus pra Assis. No meio da tarde me liga a Ane, que estava comemorando um ano de casamento na Umbria, em Trevi, não muito longe daqui. Acabou vindo com o Alfredo me visitar na loja. Conheceu a figura que é o Fabrizio, viu a mostra do fotógrafo sem mão, batemos muito papo, compraram um molho de trufas e cogumelos, foi ótimo! É tão bom reencontrar gente legal e querida. Levantou meu astral. Depois trabalhei sozinha com o louco do Fabrizio das quatro às oito, fui pra casa, levei o Leguinho na rua, tomei banho e fui dormir.

Dormir uma vírgula! Passei a noite inteira no banheiro, vomitando sabe-se lá o quê, já que não tinha comido nada além do almoço (frango grelhado com abobrinha e cenoura) o dia inteiro. Uma dor de cabeça avassaladora, enjôo, dor nas costas, frio, tudo junto. Uma clássica noite de merda. E no domingo acordei, levei o Legolas no parquinho, botei roupa pra lavar, tomei banho e lavei os cabelinhos, varri a casa, liguei pro Ettore, que não podia vir pegar o Legolas porque ia colher cogumelos sabe-se lá onde, troquei de roupa e saímos, eu e Leguinho, em direção a S. Maria. Deixei-o na casa do Ettore com os outros cachorros, voltei pra Basilica pra pegar lugar pra sentar no ônibus e lá fui eu pra Assis de novo.

[Pausa para reflexão: na meia hora em que fiquei sentadinha no banco da praça esperando o buzão, contei cinco exemplares diferentes de Jaguar, 12 de Audi, 23 de BMW, 20 de Mercedes, vários modelos novos da Lancia. Entre outros.]

O problema é que as pessoas nao lêem, não olham, não observam, foi o que eu falei no post filosófico-cachorral. Se você quer ir pra estação e tem escrito outra coisa no ônibus, você não pega, certo? Pega o ônibus onde tem escrito “Stazione”, ou não? Não. Aí neguinho chega no meio do percurso, vê que o ônibus não está descendo o morro mas subindo, e entra em pânico pedindo pra descer porque senão perde o trem. Aí o motorista fica puto e pede pelamordedeus pro pessoal OLHAAAAAAARRRRRRRR as placas dos pontos de ônibus, e olhar o destino da linha, que fica piscando no alto do ônibus. O pessoal ainda erra o jeito de botar o bilhete na máquina pra “obliterar”. Tipo, se a maquininha tem que carimbar uma data e um horário no seu bilhete, e a maquininha engole o bilhete de todo mundo, faz trrrr-trrrr, depois cospe o bilhete com um beep!, e você bota o bilhete, a maquininha chupa o bichinho e o cospe com um biiiruuuubiiiruuuu, será que não dá pra perceber que você botou o bilhete do jeito errado? Não. E lá vai o motorista explicar pros passageiros mongos que o biiiiruuuuubiiiruuuu significa que a maquininha não carimbou o bilhete (coisa que dá pra saber simplesmente olhando o bilhete, lógico. Mas só vê quem olha, e a maioria não olha). Ontem o trânsito estava horrível, e o motorista estava particularmente irritado. Já chegou na Basilica di S. Maria com quase meia hora de atraso, de forma que quando chegou na parada principal, a de S. Francesco, já em Assis, o ônibus que vinha meia hora depois dele chegou praticamente junto. Aí dá-se a seguinte cena, impensável em qualquer outro pais mais sério e consequentemente menos divertido (leia-se Alemanha): o motorista desce do ônibus, e grita pro motorista do ônibus que vinha atrás:
- Andrea!!! Você tá subindo?
Deduz-se que o Andrea disse que sim, porque o nosso motorista subiu de novo no ônibus e gritou pra galera:
- Quem quiser ir pro ponto final desce e pega o outro ônibus, que esse aqui mudou de itinerário e vamos voltar pra estação!

Desce todo mundo do ônibus, um bando de senhoras inglesas distintíssimas que não estavam entendendo nada mas davam muita gargalhada, um outro bando de napolitanos mal educadíssimos, um monte de adolescentes, um punhado de freiras. Subimos no ônibus do Andrea, que aliás era um pedaço de mau caminho, e pronto, tutto a posto. No final das contas levei 50 minutos pra chegar em Assis, ao invés dos 15 minutos habituais. Chego na loja e tá rolando um furdúncio como nunca se viu! Claudia e Fabrizio desesperados fazendo uma média de 57,6 sanduíches por minuto, e ao mesmo tempo explicando pros clientes que o nosso molho de trufas é melhor porque no supermercado é misturado com pasta de anchova e de azeitona preta pra parecer que é trufa e o nosso é só trufa, e explicando que o salame coglione di mulo não é feito de colhão de mulo e sim de suíno, mas tem esse nome por causa do formato, e fazendo contas, e fazendo notas fiscais, e por aí vai. Resultado: trabalhamos feito loucas (porque depois o Fabrizio foi pra casa e nos deixou sozinhas, eu, Claudia e a louca da Bettina) até umas cinco, quando não havia mais uma migalha de pão de qualquer espécie, e eu e Claudinha almoçamos pão de hot-dog, que só sobrou porque eu separei, senão nem esse tinha sobrado, com capocollo e queijo – tuuuudo a ver. Capocollo, como todos os frios umbros, é muito temperado, e é mais gostoso com um pão mais simples, como o clássico pão umbro sem sal. Eu fui de presunto cozido mesmo e um queijinho básico, esquentei na chapa, virou um misto quente em pão fofinho, fiquei toda feliz.

E aí chegamos no ponto crucial: a louca da Bettina. Bettina é uma alemoa, que pra não fugir à regra é imensa, feia e super mal vestida, e graciosíssima como ela só, e só não é ranzinza porque é completamente biruta, e passa o tempo todo rindo sem motivo, como uma japonesa. É meio freira, tipo, não fez os votos mas os cumpre anyway, e vive em meio a rosários, beatificações e aparições de santos. E queria botar música religiosa no rádio da loja, a Claudia quase infartou quando soube, e cortou logo as asinhas da alemoa. Mas coitada, é biruta mas é um amor, muito bem intencionada, toda simpatiquinha. Largou um vida de pecado, segundo ela mesma diz, pra esposar-se com Jesus. Eu acho esse termo horrível, ser “noiva de Jesus”.

A coisa mais chata de gente que tem religião é a mania de catequisar. Essa é a diferença principal entre ateus e fiéis: ateu não perde tempo tentando convencer os outros de que Deus não existe, até porque, se pra ele não existe, qual é o sentido de discutir esse assunto? Mas os cristãos, nãaaaao, esses são todos meio jesuítas, uma encheção de saco. Bettina é assim; deve ter sido uma garota super interessante quando era pecadora, mas agora é só uma quarentona muito da chatinha. Ficou a tarde toda nos contando histórias da Bíblia, no seu jeito particular de falar, como se a história tivesse acontecido com amigos dela, ou como se fosse um filme muito maneiro ao qual ela tivesse assistido. E quando a história acabava, invariavelmente com final feliz, ela ficava toda empolgada, dando mil risadas, felicíssima. Deve ser ótimo ser bitolada assim. Pelo menos ela come de graça em tudo que é convento – e todo mundo sabe que em convento se come muitíssimo bem, primo, secondo, contorno, pane, dolce, frutta e caffè todo dia. Depois a Claudia foi embora e a Bettina ficou tentando me convencer a fazer um curso sobre amor humano (?!?!), ou então a ir à Iugoslávia (nesse frio!) num tal monte famoso onde N. Senhora teoricamente aparece todas as noites. Tô mais pra Paris, Bettina, respondi. É mole?

Cheguei em casa destruída. Passei uma outra noite do cão, aliás, sem cão, porque o Ettore só me trouxe o Leguinho de volta hoje de manhã. Passei a manhã toda ensacando cartuchos no almoxarifado, mas agora realmente não estou me aguentando em pé; já caminhei até a agência dos Correios pra depositar meu salário e pra mandar meus currículos, mal deu tempo de comer, tá um frio do cacete. Precisaria de uma semana de coma induzido pra descansar direito, sem falar língua nenhuma, sem falar com ninguém, sem mastigar, sem pensar, sem cachorro, sem influências externas, nada. Assim pra zerar totalmente o céLebro.

**

Quarta-feira, jantar brasileiro em casa. Fiquei com pena da Bettina e chamei-a também. Vêm os castelanos (o engravatado Samuele já me trouxe o feijão preto e os limões verdes), Carmen, que acaba de terminar com o namorado e já está fazendo sua carteirinha do Clube das Infelizes no Amor, Claudia, vice-presidente do Clube. Menu: pão de queijo, arroz com feijão preto e farofa, nada de carne porque senão neguinho vai morrer de tanto comer. E de sobremesa a torta de limão da vovó. Os meninos estao curiosíssimos pra saber se além de linda e interessante, eu também sei cozinhar bem (palavras deles. Não tenho culpa de ser interessantíssima, o que me torna automaticamente bonita, mesmo que eu não seja bonita de verdade). Na geladeira tem duas cervejas que o finado lanterneiro deixou e eles vão ter que me ajudar a desencalhar, porque estão me incomodando ali, ocupando espaço. O Massimo me emprestou um aparelho de som, assim pelo menos tenho companhia durante o almoço, e vamos ouvir muita Marisa Monte e Rita Lee no jantar de quarta. Mas ele me fez um super favorzão: escuto meus CDs velhos que há séculos não ouvia, e escuto com calma os dois CDs que a Marcinha me mandou, eras atrás. Considerando a qualidade da TV italiana, acho que estou melhor com a música do que com a TV...

Postado por leticia em 17:38

17.10.03

aham...

Ih, olha, eu hoje bem ia falar da minha teoria de que é a raiva que move o mundo, e a Bia jah falou tudo. Vao lah ler, vao.

p.s.: aquele lance da preguiça parece escrito pra mim.... meus genes de Itabuna nao sao faceis de combater, vou te dizer.

Postado por leticia em 18:01

15.10.03

repito:

Preciso do carro do atum...

Postado por leticia em 10:06

modéstia à parte - mesmo.

E já que estamos nos assuntos polêmicos, e respondendo a um e-mail muito legal da Julie, vamos falar de modéstia hoje.

Em vez de fazer aqueles adesivos “a inveja é uma merda”, eu faria um escrito “a modéstia é uma merda”. Modéstia é um daqueles sentimentos que, como a piedade, não serve pra coisa nenhuma. Quem tem pena fica depenado, e ter pena mas não tomar uma atitude não adianta nada, entao é melhor poupar seu sistema límbico e nem sentir essas coisas. Na minha opinião, acontece o mesmo com a modéstia, que não serve pra bissolutamente nada. Se você nao tem nem o direito de curtir um talento especial, ou o resultado de um esforço hercúleo, qual é a graça da coisa?

Sempre achei que quem é bom em alguma coisa tem mais é que se achar bom mesmo. Acho que o Romário tem todo o direito do mundo de dizer “eu sou foda”, porque ele é mesmo, oras. Acho a arrogância um defeito super light, desde que justificado. Há defeitos piores, muito piores.

Claro que não ser modesto não significa achar que não se pode melhorar. Perfeição não existe, e sempre há espaço pra melhoras. Saber que você é ótimo em alguma coisa e ao mesmo tempo saber que pode ser ainda melhor não é modéstia, nem humildade. É coerência. Admitir que não sabe uma coisa nao é humildade, é sinceridade. Humildade é outra coisa que eu detesto. É coisa de pobre, seja de bolso que de espírito, e a pobreza é sempre, sempre uma coisa ruim, limitante. A humildade é limitante. Dizer “pô, cara, não sei, não entendo nada disso” não é humildade, é honestidade. Assim como admitir que se é bom em alguma coisa também é um sinal de honestidade.

Eu sou honesta comigo mesma. Sou ótima em um monte de coisas, e horripilante em milhões de outras. Quando me perguntam alguma coisa que não sei, primeiro penso bem, porque pode ser que eu saiba mas ache que não sei, e se não sei mesmo digo que não sei e pronto (ficou meio Rolando Lero essa frase, mas é isso).

Pior que a modéstia é a falsa modéstia. Essa, então, é de lascar! Você sabe que o sujeito se acha o ó do borogodó, você elogia, e ele fala, “aaah, mas são seus olhos...” Seus olhos o escambau! É como dizer a uma modelo lindíssima (estou falando de bonita mesmo, não esses varapaus de rosto horroroso que vemos nos desfiles famosos, mulheres que só desfilam porque são secas de corpo, mas têm orelhas de abano, pouco cabelo, cara de cavalo, dentes tortos, enfim. Feias.), você se acha bonita? E ela dizer, não, não me acho bonita. Ora, faça-me o favor! Tá querendo enganar quem, jacaré? Claro que ninguém se acha linda todo dia, o tempo todo; todo mundo tem dias em que acorda com cara de sei lá, mas sejamos coerentes, né. Ou então uma magricela, como a menina da calça dourada, que de repente diz “estou tão inchada hoje”! Eu agora aprendi a responder “é, tá mesmo”.

É como quando entram americanos na loja do Fabrizio o Louco e perguntam de qual parte dos EUA eu venho. Quando respondo que sou do Brasil, a reação é invariavelmente a mesma: nooooooooossa, mas seu ingles é óooooootimo! Vou responder o quê? Ah, não, impressão sua, depois que eu começo a falar mais se percebe que não sou americana? Eu falo, falo, falo e ninguém percebe coisa nenhuma, então eu respondo “brigada” e já tá muito bom. Só me faltava ter que ficar arrumando desculpas por ser boa em alguma coisa! E não faz diferença nenhuma o fato de que eu ter jeito pra línguas é independente do meu esforço, porque eu realmente não me esforço nada, tenho facilidade e pronto, assim como escrevo bem sem fazer esforço; me vem naturalmente. Deveria me sentir culpada por isso? Eu não, acho é muito bom, detesto estudar e sempre tive uma enorme vantagem sobre meus colegas de escola que era não precisar estudar nem português, nem inglês, nem literatura, nem redação. Sobrava mais tempo pra ler Tolkien e outras coisas.

Já pra outras coisas sou uma negação total. Dê-me seu ano de nascimento e eu levarei no mínimo 5 minutos pra calcular quantos anos você tem. Retardada numérica total e absoluta. E não tenho a menorrrrrrr intenção de mudar isso, porque detesto calcular, detesto fazer continhas, meu modo de pensar é totalmente anti-matemático.

E pra fazer esportes? Nossa, eu sou AAAAA prega. Fora que não tenho o menor espírito competitivo, e mesmo quando ganho fico com pena de quem perdeu e não consigo nem curtir a vitória. E quando perco fico com pena de mim mesma, então não é legal. A única coisa que eu gosto de jogar é conversa fora...

Postado por leticia em 10:00

14.10.03

conceitos

Ontem escrevi à Criss contando as minhas atuais intenções, que são 1) voltar pro Rio e 2) depois não sei bem o que fazer. Ela me respondeu mais ou menos assim: que tem raiva da bagunça, do descaso, do falso moralismo, do modo nojento dos italianos de falar mal de estrangeiros e acrescentar “mas com você é diferente”. Bom, pra começar, acho a bagunça deles muito parecida com a nossa. O descaso idem. Falso moralismo também não é exclusividade deles. E quanto ao modo de falar mal dos estrangeiros, vou dar o meu pitaco. Precisava mesmo de um gancho pra falar de preconceito...

Não acho que o preconceito seja uma coisa necessariamente horripilante ou abominável. E acho que vai existir sempre, porque é uma forma de defesa, baseada predominantemente em estatística. Por exemplo: se TODOS os marroquinos que eu já vi, e todos os que eu vi foram aqui na Itália, são filhos da puta, a próxima vez que eu vir um, ainda que em outro contexto, vou ficar de pezinho atrás que eu nao sou boba. Se quase 100% das brasileiras encontradas num vôo Rio/SP/Roma são mulatinhas caça-gringo, que falam alto, se vestem como as prostitutas que são, jamais aprendem a língua e vêm pra Italia pra virar um misto de escrava sexual e doméstica, é ÓBVIO que quem pega um vôo desses e não conhece a realidade da classe média alta das grandes cidades brasileiras vai ficar achando que todas as brasileiras são assim. E quer saber? Não estão errados não. Ontem mesmo vi uma caça-gringos, nos correios em Bastia. Chamava-se Rosemeire (meus olhos mais afiados do que o Hubble conseguiram ler de longe os endereços nos caixotes que ela queria enviar à Freguesia do Ó, a uma pessoa chamada Maria Pureza. Ui.). Vestida como uma piranha, parada em pé na fila emanando aquela vulgaridade que só as mulheres latino-americanas têm, os olhos lançando aquela pobre arrogância sem sentido que só os brasileiros furrecas que vão morar fora adquirem (lembrem-se dos patetinhas brasileiros que se acham oooooooos germânicos. Aqueles do forum. Aqueles que me acusaram de ter comprado o diploma porque não gostei de Berlim. Hohoho). Podemos realmente culpar os europeus por ter essa imagem horrível de nós, mulheres brasileiras? Eu acho sinceramente que não. Acho que é só estatistica mesmo, é defesa; eu também não gostaria de ver esse tipo de gente desfilando pelas ruas da minha pacata cidade, se eu fosse nativa de uma pacata cidade. Não tenho raiva nem de quem acha que eu sou ou fui prostituta, nem raiva dessas pobres mulheres, que OBVIAMENTE não se submeteriam a sair do conforto de seus lares pra virar escravas sexuais se houvessem um lar confortável, um emprego legal, famílias normais, um mínimo de grana pra se divertir. Tenho raiva de nós, que escolhemos mal nossos governantes; tenho raiva dos nossos governantes de merda, que com seu descaso e filha-da-putice criam uma massa de gente sem perspectiva, que acaba tendo que se submeter a tudo pra ter o que comer, pra ter um mínimo de conforto; tenho raiva dos nossos órgãos de divulgação, que só vendem bundas, bundas, sempre essas MERDAS de bundas, como se no país todo não houvesse nada de mais interessante; tenho raiva de quem deveria coibir o turismo sexual mas fica de bico calado; tenho raiva dos hotéis que admitem prostitutas, de luxo ou não, quando há turistas estrangeiros; tenho raiva de todos os homens idiotas do mundo que têm que pagar por um buraco pra enfiar o dito cujo.

O dia em que eu encontrar um marroquino, ou cigano, ou albanês, que não seja filho da puta, eu também vou pensar “mas você é diferente”. A amostra pode ser pequena, afinal tive contato com muito poucos aqui, mas se 100% dessa amostra é filha da puta, alguém pode querer que eu tenha uma boa opinião sobre eles? Levanta a mão quem, mesmo depois de ser assaltado cem vezes por gente de cor (e não vou entrar no mérito disso agora, não venham me chamar de racista porque todo mundo sabe que quem assalta é pobre, fora os retardados drogadinhos filhinhos de papai, e os pobres são negros, e os negros são pobres porque foram escravos, e etc etc etc. Mais uma vez, é pura estatística.), não fica com medo quando vê um negão suspeito na rua, no ônibus, na porta de casa. Levanta a mãozinha, quero ver.

O que quero dizer é que preconceito não é ódio gratuito, e não é uma coisa contra a qual se deve lutar cegamente. Não adianta nada eu sair por aí dizendo que nem toda brasileira é caça-gringo, se na TV as propagandas que se referem ao Brasil só mostram bundas, se os vouchers de companhias de turismo que voam para o Brasil só mostram bundas, se a imensa maioria das brasileiras no exterior é caça-gringo mesmo. O que adiantaria seria, e aqui sou muito hipotética porque não creio absolutamente que o Brasil tenha jeito, a gente ter um país melhor, com oportunidades mais justas, de modo que ninguém precisasse sair caçando gringo por aí.

Estou indo embora. Não sei quando, preciso me livrar do apartamento, mas vou embora. Não porque aqui tem preconceito, porque aqui tem bagunça, porque isso ou aquilo. Vou embora porque sair de casa, ainda mais pro brasileiro, e mais ainda pro carioca, é muito difícil, um sacrifício muito grande. Sacrifícios valem a pena se há um objetivo, uma compensação. Senão deixa de ser sacrifício pra virar desperdício, e pra mim desperdcio é sinônimo de imbecilidade. Como estou longe de ser imbecil, vou-me embora. Vim, como muitas outras brasileiras educadíssimas, pra curtir uma história de amor. A minha história acabou, e com isso acabaram também as minhas razões pra ficar nesse fim de mundo. A Umbria é pequena demais pra mim, não tem mais nada a me oferecer. Vou ficar fazendo o que aqui, jogando fora a minha juventude, a educação que meus pais me deram, meu céLebro brilhante, vou jogar fora tudo isso numa cidadezinha onde nada acontece, em um emprego chatíssimo, com um chefe que eu desprezo profundamente? Se eu ainda estivesse em Roma, ou Firenze, ou Bologna, ou qualquer outra cidade animada, cheia de gente diferente na rua, cheia de opções de lazer ou cultura, se eu tivesse um emprego muito legal, um chefe super interessante que me ensinasse taaaaaantas coisas, provavelmente não pensaria em voltar. Mas não é absolutamente o caso. Regredi. Saí do conforto do meu lar pra ir parar num buraco onde nada acontece, onde vivo sozinha e faço sozinha todas as refeições, a menos que chame alguém pra jantar em casa, não tenho carro, a bicicleta que uso não é minha, nao tenho TV nem telefone fixo nem computador nem internet. Regredi! Então chega, chega de andar pra trás! É hora de cortar o cabelo e voltar correndo pra casa. Assim que encontrar alguém pra ficar com o apartamento, é claro – o aviso prévio é de seis meses...

Eu gosto da Itália, e acho que um dia vou acabar voltando. Acho um país muito divertido, cheio de pessoas divertidas. Só sair na rua e ver aqueles italianos todos vaidosíssimos, montadíssimos, cheios de gel, de óculos abelhão, de calça justa, de olhar Cepacol, sempre gesticulando muito, batendo papo até enquanto dirigem lambreta, a gente já tem vontade de rir. Eles sabem se divertir, mas, ao contrário dos espanhóis, que segundo testemunho de amigos que moram na Espanha não querem saber de dureza, os italianos trabalham muito. Mas brincam, sacaneiam uns aos outros, cantam, comem bem, bebem idem. Claro que ainda são terceiro mundo em muitos aspectos – nos banheiros sem ralo e na frequência com a qual se lavam, no serviço bancário que é neanderthalesco, no quesito atendimento ao cliente em qualquer loja/banco/agência dos correios, nos correios que funcionam malíssimo; claro que há muitos defeitos – as cenouras que são nojentamente adocicadas, o limão que não é verde mas aquele abominável amarelo, o pão sem sal de todo o centro da Itália, a mania de comer lentilhas com molho de tomate, a mania de fumar em tudo que é lugar, enfim. Mas pombas, o paraíso nao existe, e home is where the heart is. Ou não?

Postado por leticia em 18:18

10.10.03

Post cachorro-filosófico

A única parte da minha vida que não mudou nada aqui na Italia é o Legolas. Mesmo depois de tanto tempo na casa da Carol, lá no Rio, e depois de todos esses meses na casa da Arianna, aqui na roça em Santa Maria degli Angeli, ele não perdeu nenhuma das suas manias. Me acorda em torno das seis e meia sempre do mesmo jeito: senta ao lado da cama e fica me encarando. Eu me finjo de morta; ele começa a respirar forte, fazendo barulho. Eu continuo de olhos fechados, morrendo de vontade de rir, e ele começa a abanar o rabo. Continuo quieta, e ele finalmente me dá uma nada sutil patada no braço, e aí não tem jeito, tenho que levantar.

Nada mudou na nossa rotina, mas mesmo assim ainda me espanto com a facilidade com a qual ele entende as coisas, memoriza percursos, assimila hábitos. Depois de um aquecimento rápido vamos caminhando através do parque, pegamos a rua Vietnam, e é só a gente virar na estrada transversal por onde corremos sempre, e ele já começa a acelerar, olhando pra minha cara, as orelhas saltitando. Quando nos aproximamos de casa ele começa a se agitar; quando chegamos se deita no capacho do lado de fora e fica quietinho lá no sol, enquanto eu dou uma varrida na casa. Quando volto do trabalho, na hora do almoço, ele vem com a cara toda amassada de sono e um tênis na boca (nem sapato nem chinelo, sempre tênis, sabe-se lá por quê). Quando cruzo os talheres ele sabe que eu acabei de comer e logo vou levá-lo pra sair, então é só ouvir o barulho do garfo e da faca sobre o prato que ele levanta todo animadinho, doido pra dar uma volta. Ou então se estou no telefone, é só ele ouvir um “então, tá...”, ou então “um beijo!”, ou ainda “allora ci sentiamo dopo”, que sabe que acabei a conversa e posso voltar a dar-lhe atenção, e já começa a se agitar.

A infantilidade dos cachorros me encanta : )

Mas aí entramos na questã principal dessa história: é impressionante a capacidade que algumas pessoas têm de passar batido pela vida, sem olhar pros lados, sem observar, sem aprender nada. Outro dia estava com Leguinho no parque em frente de casa quando passa a minha vizinha de cima, a que tem o jardim no final do edifício (o apartamento dela equivale a dois apartamentos do andar térreo, onde eu moro, e ela ainda tem o jardim no térreo ao final do lado esquerdo). Ela vai caminhar todo dia de manhã com a Nina, insuportável basset velha e chatíssima, infernal latidora que faz um escândalo quando passo com o Legolas em frente à grade do jardim. Leguinho foi lá cheirar a cachorra – normal, cachorros se saúdam. A mulher não só não me reconheceu (nem a mim, nem ao Legolas, e olha que nem eu nem ele costumamos passar inobservados em terras italianas), como ainda botou a cachorra, que a essas alturas já estava latindo como uma doida e avançando no Legolas com a petulância que só os microcães têm, protetivamente no colo. Isso porque o Legolas nem encostou nela; cachorros pequenos são, pra ele, mera curiosidade e pouco dignos de interesse. A vizinha pediu pra eu afastá-lo porque a Nina estava com medo dele. Tipo, hello? Você tem cachorro há anos (a Nina é bem velhinha) e mesmo assim não entende NADA do assunto? Não sabe que macho e fêmea não brigam, e quando brigam é a fêmea que bota o macho pra correr? Não conhece nada de raças, não sabe que labrador, depois do tatu-bola, é o bicho mais bobão do mundo? Nunca viu meu cachorro na rua comigo, brincando com as crianças que saem da creche na hora do almoço, com velhinhos que passam de bengala e param pra dar bom dia bem embaixo da janela dela?

Imediatamente lembrei de uma coisa que muito me surpreendeu, ano passado. Tudo bem, eu sempre fui espertinha, além da média; sempre tive o hábito de reparar em tudo, perguntar tudo, querer entender tudo, de ler tudo, de fazer comparações com coisas já vistas ou ouvidas, de extrapolar, de aprender. Mas hoje em dia entendo que eu não sou tãaaao acima da média assim, ou melhor, não sou tão fenomenal assim – é a média é que é baixa. Porque as pessoas simplesmente NÃO OLHAM o que há ao redor. São incapazes de assimilar, de comparar, de aprender. Ano passado, antes de voltar pra Itália, dei aula de Inglês pra uma turma muito, digamos, complicada. Todos adolescentes, sem saber uma palavra de Inglês (o que, sejamos sinceros, já é muito estranho. Não saber NENHUMA palavra de Inglês, nos dias de hoje? Meninos e meninas da classe média baixa? Mas nenhuminha mesmo, nem good morning?). Um dia boto no quadro, como introdução a vocabulário novo, a palavra hard. Entre os alunos, dois com camiseta do Hard Rock Cafe. Pois não é que me olharam TODOS como se nunca tivessem visto a palavra na vida? Ainda perguntei, mas vocês realmente nunca viram essa palavra escrita em lugar nenhum? Não. Fiquei chocada. Como é possível um ser humano passar tão incólume pela vida? Como é possivel ignorar coisas que nos são bombardeadas todo dia, o tempo todo? Como é possivel uma pessoa ter um cachorro e não entender NADA de cachorro? Como é possível uma pessoa ter um videocassete em casa e não saber nem ligá-lo? Como é possivel alguém comer um prato particularmente gostoso e não querer saber que ingredientes leva? Como é possivel alguém usar uma camiseta e não ter a mais longínqua idéia do que está escrito nela?

Sou eu que sou maluca?

**

Coisas a incluir na lista de coisas que deveriam ser proibidas, junto com dente de ouro: malhar/correr/caminhar com tênis sem meia (sinto o chulé fúngico só de pensar, as micoses borbulhantes, todos os funguinhos fazendo festa no suor, aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaah), malhar de cabelo solto, malhar maquiada, malhar de argolona nas orelhas. Muito dedo no olho pra essas criaturas.

Postado por leticia em 10:24

10.09.03

Eu juro que eu quero parar, mas nao consigo! Olha o quanto sao brilhantes no Portugues, e olha que lisonja eles acharem que eu devo ser velha por ser tao cheia de qualidades e experiencias:

eMail von Eu (eu@tepego.com) Inviato: 10/09/2003 10:02




kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

URL zum Thema: http://www.kippenhan.net/cgi-bin/dcforum/dcboard.cgi?az=show_thread&om=528&forum=DCForumID14
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Nachricht: #0
Titel: Paula,NAO È CERTO
Geschrieben von Valeria am 10-Sep-03 at 00:47 Uhr

Oi,Paula tudo bem que voce tomou essa atitude mais eu acho que nao é certo ,eu sei que essa discursao pode demorar,voce viu o exemplo dos politicos falando em relacao as ferias dos alemaes na Italia ,houve uma desculpa dipomatrica e a repercursao foi mundial.Nao quero dizer que uma Maria ninguem tenha este mesmo exito,mas como ela apareceu aqui e esta se sentindo tao superior e com nojo de todos nós brasileiros que moramos na Alemanha temos o direito de nós defender.Ela tem que entender uma coisa se nao é a Alemanha dar uma forma de viver aos italianos do Sul que sao chamados por eles de TERRONES oque seria da Italia já que terrones sao tambem pessoas nascidas no territorio italiano.Isso tudo dessa senhora é inveja ,ela ela deve ter pensado como a Alemanha dar ha essa pessoas a possibilidade de progredir já que eles mesmo sao racistas com a sua propria raca BAIXO ITALIA SAO TERRONES só prestam os italianos do NORD.Eles falao que eles pagao taxas paa as pessoas do sul viverem !
é aqui que pagamos para eles tambem e nao deixamos de comer pizza e ajudar os patriotas que eles rejeitao.
Alemao é Alemao do sul ao norte,e eles sao os primeiros a ajudar outros paíse em caso de emergencia
Um abraco
VL

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Nachricht: #1
Titel: RE: Paula,NAO È CERTO
Geschrieben von VL am 10-Sep-03 at 01:03 Uhr
In response to message #0


AHH!! Esqueci uma coisa visitei amigos em Rimini,eles pagao aluguel lá em uma casa com 3 quartos com jardim oque se paga aqui numa com 50 metros sem balcao .Eminha amiga nao acredita que o aluguel aqui e tao caro
VL

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Nachricht: #2
Titel: RE: Paula,NAO È CERTO
Geschrieben von Carol am 10-Sep-03 at 09:59 Uhr
In response to message #0

Eu acho que a Paula agil correto, essa moca aí já é uma berracao no Brasil (imagina só que até os outros estados do Brasil ela odeia), entao para que continuar colocando lenha no Fogo? Ela gostou da discussao voces nao perceberam que assim ela tinha o que fazer.

Além do que quem quer perder seu tempo para responder as mensagens absurdas dela que envie um email a ela oras bolas.

Se fossemos contar as experiencias dela, tipo : estudou medicina, deu aula de ingles por 2 anos, trabalhou como tradutora por 8 anos, vive na Italia a nao sei quanto tempo, mas isso e mais aquilo, a coitada deve ser uma velhota que está com falta né gente. Imaginem só solterona, feia, neurótica, etc. Tenhamos respeito perante seus Hormonios!!!!!!! }>

Acho que por aqui está faltando uns temas legais.

Ah so, wie gesagt, eu concordo com a decisao da Paula, acho até que demorou demais.
Ok. Fuiiiiiii


Ou seja, eu sou um fenomeno! Aos 26 anos tenho tantas qualidades e tanta experiencia acumulada que ninguém acredita que eu soh tenho 26 anos! Gente, eu sou foda. Ainda bem que esses pseudo-alemaes me alertaram, senao eu ia morrer sem saber!

***

Nada de post pra abalar as estruturas da sociedade burguesa hoje. Patrulha anti-internética intensa aqui no escritorio, e muito o que fazer também. A dopo.

Postado por leticia em 12:37

09.09.03

Prometo que é meu ultimo post sobre a feiura dos alemaes (a menos que um outro pateta nao volte a me encher o saco):

Recapitulando... Agora, por conta de nao ter gostado de Berlim:

- sou neguinha
- morei na Rocinha
- sou doméstica na Italia (engraçado que quando eu respondi que trabalhava num escritorio fazendo a parte de marketing internacional e ecologia em toda a Italia, ninguém me respondeu)
- deveria fazer um curso de italiano na Università per Stranieri di Perugia pra "aperfeiçoar a minha deficiencia intercultural" (engraçado que quando respondi no forum ao idiota que me falou essa besteira, dizendo "entao quer dizer que o diploma de 100% de aproveitamento que eu tirei por essa mesma universidade, no nivel mais avançado, vale muito! que bom, assim fico mais tranquila!" ninguém me respondeu)
- sou subdesenvolvida porque nao entendo que punk quer dizer liberdade e politica social
- comprei meu diploma (engraçado que quando respondi no forum ao idiota que veio perguntar ironicamente se eu sabia o nome dessa tal faculdade conceituada, dei o nome da universidade e o ano de formatura, ninguém me respondeu)
- tenho moveis feios (quando perguntei se isso tornava Berlim mais bonita, ninguém me respondeu)
- nao sei vender javali direito, por isso meu patrao me mandou embora
- sou horrorosa e brega
- o Mirco se chama Mico (quando perguntei se isso tornava os alemaes mais bem vestidos, ninguém me respondeu)
- moro no bairro pobre de Assis (engraçado que quando eu respondi que Assis nao tinha bairro pobre, ninguém me respondeu)
- o Mirco nao quer nada comigo porque até agora nao quis casar
- sou superficial e deveria ver o lado bom das coisas
- tenho qualidades demais, sou um personagem inventado por alguém que nao tem o que fazer nem tem amigos
- sou analfabeta porque escrevo sem acentos no blog e escrevo Berlim com M no final (engraçado que quando respondi no forum que escrevia sem acentos porque meu teclado é italiano e que Berlim em portugues tem M no final, ninguém respondeu)
- soh a minha mae me acha legal, ninguém mais no mundo
- sou da roça, por isso nao entendi direito o metro de Hamburgo e Berlim (engraçado que quando eu disse que era do Rio, ninguém me respondeu. Ou melhor, responderam que eu era da Rocinha. Reparem que morar na Rocinha nao significa absolutamente nao saber pegar metro.)
- nao tenho competencia pra conseguir um visto de estudo ou trabalho, por isso meu permesso di soggiorno é de doméstica (engraçado que quando eu respondi que vim com visto de estudo, que foi transformado em visto de trabalho, ninguém me respondeu)
- nao sei falar ingles direito, por isso ninguém me entendia na Alemanha (engraçado que quando eu respondi que dei aula de ingles por 2 anos e trabalho como tradutora hah 8 anos, ninguém me respondeu)
- sou pobre, por isso fiquei em albergue da juventude na Alemanha; se tivesse dinheiro pra ficar em hotel, teria adorado o pais, a gente, a comida, etc. (engraçado que quando eu respondi que o que mais tinha nos albergues era alemao, nao soh na propria Alemanha mas em toda a Italia, e que isso nunca impediu ninguém de curtir uma viagem, ninguém me respondeu)
- odeio os alemaes (quando perguntei se achar feio significa odiar em alemao, ninguém me respondeu)
- sou racista porque digo "neguinho vem me encher o saco" (engraçado que foram eles que me acusaram de ser neguinha, no modo mais pejorativo possivel)
- sou preconceituosa, porque achei os alemaes feios, mesmo tendo na verdade sido um pos-conceito, jah que estive lah e vi com meus proprios olhos
- moro num pais de garçons e funcionarios antipaticos (é verdade, mas quando perguntei o que isso tinha a ver com a feiura dos alemaes, ninguém me respondeu. Também comentei que mesmo assim a Italia é um dos paises mais visitados do mundo, se nao o mais; Roma soh perde pra Paris em numero de turistas por ano, e Paris também é famosa pela antipatia de seus habitantes. Perguntei por que a Alemanha entao nao é um pais tao procurado pelos turistas, jah que os alemaes sao tao lindos, limpos, corteses, angloparlantes e simpaticos quanto eles diziam. Ninguém me respondeu.)
- frequento o Burger King (engraçado que quando perguntei se na lingua dos patetas do forum, ou seja, o alemao, "comemos no Burger King" quer dizer "frequento o Burger King", ninguém respondeu).


Essa vida é muito engraçada... ;)

p.s.: Me acusaram também de nao ser modesta. Isso renderah um longo post amanha, se tiver tempo. Amanha falarei de modéstia; depois de amanha, de preconceito. Abalarei as estruturas da sociedade burguesa. Preparem-se.

Postado por leticia em 16:37

08.09.03

Finalmente encerraram o assunto da feiura dos alemaes no tal forum dos patetas, que nao soh insistem no fato de que eu sou neguinha, morei na Rocinha, comprei meu diploma e atualmente moro no bairro pobre de Assis, mas também ainda nao entenderam que escrevo sem acento porque meu teclado nao os tem, e quando boto acentos é porque tenho tempo pra ficar acentuando na mao, no Word. To cagando e andando: nasci em Botafogo, morei na Lagoa desde que nasci, sou branca feito vela, Assis nao tem bairro pobre porque é um comune riquissimo (Bastia idem), meu diploma continua sendo foda, e o idiota que "corrigiu" minha falta de acentos cometeu um erro horrendo de concordancia verbal. Entao ficamos combinados: eu continuarei achando Berlim e os alemaes horrorosos, e esses ultimos, além de antipaticos, mal-vestidos, molambentos, e nao falam ingles. Pronto.

(Dos alemaes tenho pena porque sao feios, molambentos, sisudos e nao falam Ingles, mas desses brasileiros que se acham OOOOOS germanicos porque estao morando lah eu tenho é nojo mermo.)

Postado por leticia em 17:21

...

Então vamos ao exercício de hoje:

Relacionar as colunas, onde a primeira coluna representa mais ou menos (não tô com saco de procurar no post e copiar igualzinho) o que eu disse nos posts sobre a feiura dos alemães, e a segunda coluna representa o que os patetas do forum de brasileiros na Alemanha interpretaram:

(a) Como os alemães são feios!
(b) Tenho horror a brasileira caça-gringo
(c) Almoçamos no Burger King...
(d) Ninguém fala Inglês em lugar nenhum!

( ) Odeio os alemães
( ) Freqüento o Burger King
( ) Falo Inglês tão mal que ninguém me entende
( ) Toda brasileira é caça-gringo

Outro exercício, dessa vez relacionando os contra-argumentos dos patetas com os meus comentários:

(a) Como os alemães são feios!
(b) Como os alemães se vestem mal!
(c) Berlim é feia, suja e cheia de punks esquisitos
(d) Os alemães não sorriem jamais

( ) Os italianos têm pernas tortas
( ) Os italianos são filhinhos de mamãe
( ) Por que tantos travestis brasileiros vão trabalhar na Itália?
( ) O trânsito nas cidades italianas é louco por causa das lambretas, enquanto que na Alemanha o trânsito é super
organizado


Agora analisem comigo: mesmo que os argumentos da segunda coluna forem verdadeiros, Berlim torna-se, aos meus olhos, mais bonita, os alemães mais belos, simpáticos e bem-vestidos? Não, né. Então tá.

**

Ontem eu e Claudia trabalhamos na loja desde as onze da manhã. Só nós duas, sem o louco do Fabrizio, que é super gente boa mas absolutamente biruta e cansativo. Super light, poucos e bons clientes, gente disposta a pagar € 8,50 por um pacote de biscoitos de amêndoas, € 25 por uma garrafa de bom vinho umbro, € 28/kg de presunto de javali. No meio da tarde, quando o movimento tinha caído bastante, aparece uma americana meio mendigona, amiga do Fabrizio (ele é amigo de tudo que é maluco em Assis. Acho que ele se sente culpado porque nos paga mal e não nos dá presente nem bônus de Natal, nem adicional por trabalhar no feriado, e porque acha ruim que nós comamos na loja, então faz caridade pra quem não faz nada da vida. Bem do jeito que eu gosto.). Perguntei como é que ela foi parar em Assis, vindo da Pensilvânia, e ela começou a contar toda a história da sua vida, sua vocação para o claustro, suas duas expulsões de dois conventos das Clarissas, o tempo passado colhendo algodão no Novo México, entre outras coisas. Isso tudo bebendo uma cervejinha Moretti, que ninguém é de ferro (eu não, ela; não bebo cerveja). Quando viu uma procissão passando pela praça, indo na direção da Basilica di S. Francesco, foi pra porta da loja se benzer e pensar se deveria ir atrás ou não. Resolveu que não, porque o pessoal andava rápido demais, e suas pernas velhas não aguentavam. Então deu um longo suspiro e me perguntou se eu rezava. Respondi que não. Ela perguntou se eu sentia a presença de demônios. Levantei uma sobrancelha e disse que não só não sentia nada, como não acreditava em demônios. Então ela deu a sentença final: então, minha filha, você está de bem com Deus, e não precisa nem de reza, nem de psicólogo.

Mesmo ela tendo botado Deus no meio, adorei a velha.

**

Estou no pior dos humores hoje. Esse tempo nublado ACABA comigo. Acho que vou fazer uma sopinha de ervilha básica pra ver se eu melhoro, jah que nao posso contar com o lanterneiro, que estah de cama com febre alta e amigdalite.

Postado por leticia em 11:23

ainda!

Olha que essa historia dos alemaes tah é rendendo. A coisa mais legal que jah saiu disso tudo foi o fato de que eles acham impossivel uma pessoa ter todas aquelas qualidades que eu listei ali no final do mes passado, quando conseguiram me irritar realmente. Sabendo que eu tenho realmente todas essas qualidades, me senti AAAAAAAAA poderosaaaaaaaaaaaaaaa... Just too good to be true! E' ou nao é uma suuuper massagem no ego? Hm, agora fiquei me achando.

Ainda nao encerrei o assunto Alemanha. Mais tarde escrevo mais. Estou me sentindo ludica e gostaria de propor um exercicio simples aos meus leitores.

Postado por leticia em 08:59

05.09.03

peixe

Deu a louca no lanterneiro e demos uma de paraibas italianos, indo ao lago pra comer peixe: jantamos no Da Massimo ontem, famoso restaurante de frutos do mar no Lago Trasimeno. O lugar fica lá na casa do chapéu, mas vive entupido de gente, e sem reserva não tem jeito, não se acha lugar, e o maître exige pontualidade, além de se irritar se você não gostar do que ele te sugerir. Entao às oito e meia da noite lá estávamos nós sentadinhos à mesa, num cantinho perto de uma das janelas do restaurante. Menu da noite:

Antipasto frio:
- Mariscos refogados com farinha de rosca dentro de uma concha tipo aquela da Shell.
- Salada de lula, polvo e camarão com repolho roxo. A lula e o camarão eu tracei, mas meu relacionamento com o polvo é como meu relacionamento com Berlim: vi, provei, não gostei, e não pretendo voltar.
- Camarões em molho rosé, dentro de outra concha tipo Shell.
- Mariscos esquisitos, de concha retangular e comprida, refogados com farinha de rosca e servidos dentro da própria concha. Deliciosos.
- Uma salada de feijão branco e camarão, DIVINA.

Antipasto quente:
- Mariscos, de diversos tipos (eu prefiro os pequenininhos), em água e sal e com salsinha picada.
- Novamente mariscos de diversos tipos, refogados em molho de tomate. Ótimos!

Primo piatto:
- Gnocchi ao molho de lagostim. Cada gnocchinho pequenininho, redondinho, lindinho! E deliciosos, levíssimos, o molho é delicadíssimo! A porção pra dois é enorme, então levei pra casa uma quentinha sem o menor pudor, e hoje meu almoço será chiquerricamente gnocchetti de lagostim. Uhu!

Secondo piatto:
- Grigliata di crustacei. Camarões enormes e uns primos dos camarões, também enormes, na grelha.

Dispensei a sobremesa porque não tinha espaço pra mais nada, mas o Mirco ainda tomou um sorbetto al limone, e eu tomei uma meletta (mela = maçã), que é uma grappa aromatizada com uma maçãzinha amarela e pequenininha, do tamanho de uma cereja. O copinho é pequeninho também; você vê o copo chegando com aquela micro-maçã nadando em grappa, o perfume da maçã é delicioso!

Tudo isso, obviamente, regado a vinho branco gelado (esqueci o nome), DELICIOSO.

Mas, darlings, sinceramente... Give me a steak any time. Pode ser o marisco mais lindo e delicioso do mundo, o Mister Universo dos camarões, mas naaaada substitui a boa e velha carne de vaca no meu não tão delicado paladar...

***

Atenção: estamos todos terminantemente proibidos de não gostar de Berlim. Porque senão neguinho que não tem o que fazer começa a afirmar que você:
1) é negra (hahahahaha)
2) morava na Rocinha e agora mora no bairro pobre de Assis (mal sabem eles que nao ha bairro pobre em Assis... Hohoho)
3) comprou o diploma (quaquaraquaqua!)
4) é subdesenvolvida e não entende que punk significa liberdade, política social (mas hein?)
Entre outras coisas.

Então ficamos combinados: é proibido não gostar de Berlim. Entendidos?

Postado por leticia em 11:11

02.09.03

madrugar é bom e eu gosto

Jamais entendi esse lance de “não conseguir acordar”. Como todo mundo lá em casa já acorda acordado, só fui conhecer esse lado da humanidade, essa parcela da população que não funciona de manhã cedo, quando fui estudar em Valença, onde dividi quarto com a que hoje é a doutoríssima Hunka. A Hunka acorda mas não desperta, fica lá sentada na cama piscando, esfregando os olhos, meio apoplética, e leva um bom tempo pra recobrar a consciência. Como ela, milhões de amigos meus. Eu jamais consegui entender. Quer dizer, entendo que provavelmente é uma coisa constitucional, que você nasce com tendências matutinas ou não, mas caramba, deve ser muito ruim levar esse tempo todo pra despertar! O dia rende tanto quando você acorda cedo; é impressionante. Eu, por genética ou por hábito familiar, acordo já acordada e não preciso nem de tempo pra me ambientar, nem de café, nem de banho frio pra começar a funcionar. Acordo sabendo onde eu estou, onde está a porta, o que tenho que fazer; não fico me espreguiçando na cama, tenho pavor de ficar mofando na cama antes de levantar: acordo e levanto logo. Meu dia começa cedo; minhas manhãs são produtivas. Em compensação, depois do almoço minhas habituais rapidez e eficiência caem notavelmente. Depois que o sol se põe eu já fico meio depressiva. E não me chame pra nada depois das dez da noite, que meu sono vem cedo, e nada me destrói mais do que não dormir quando sinto sono! Até porque não consigo acordar tarde pra compensar, e se durmo depois do almoço me sinto O bagaço da laranja depois. Sou vampira ao contrário, completamente alérgica à noite...

Postado por leticia em 11:31

26.08.03

Sabe a coisa mais engraçada dessa polemica sobre a feiura dos alemaes? Alias, sao duas coisas engraçadas:

1. Neguinho anda me escrevendo atacando os italianos. Hello, McFly, eu NAO sou italiana, nao tenho nem um cromossominho italiano, e to cagando e andando pro que neguinho acha dos italianos. Que, alias, sao muito mais bonitos e se vestem muito melhor, sao muito mais simpaticos e comem muito melhor do que os alemaes.

2. Neguinho nao sabe o significado das palavras e acaba falando besteira. Me chamaram de preconceituosa. Até onde eu sei, preconceito é julgar antes de saber os detalhes, de ver, de conhecer. Eu ESTIVE em Berlim, eu VI os punks, eu VI o pessoal na rua bebendo cerveja às 8 da manha, eu VI a sujeira na rua, eu VI a horrenda Aleksanderplatz. Portanto nao pre-julguei nada, alias, nem julguei nada: um punk é um punk, um bebado é um bebado, nao tem o que julgar. Se ele tah ali, vou dar uma de maluca e dizer que nao tah?

E agora realmente encerrou essa palhaçada de Alemanha que eu jah to de saco cheio. As unicas coisas que eu trouxe de lah, além da torradeira que pula (as torradeiras italianas nao fazem o pao pular) e do ferro de passar tabajara e da panela de aspargos que eu uso pra fazer macarrao, foram balinhas de menta que comprei no departamento de turismo em Lubeck (vem numa latinha liiiinda) e umas coisas da Maggi pra fazer molho pra peixe e medalhao de carne. Aqui na Italia eles sao assim, digamos, muito conservadores em termos de comida, e nao chegam nem perto dessas coisas super artificiais. Mas eu adoro, e mesmo nao entendendo nada das instruçoes, vou tentar fazer. Depois digo se ficou bom e de que coisa tem gosto.

Postado por leticia em 12:40

25.08.03

cansei

Eu acho que jah comentei aqui, mas repito: na minha opiniao, um dos maiores males do mundo é que as pessoas levam tudo muito a sério. Ou melhor, levam a sério coisas erradas e se esquecem de se preocupar com coisas que deveriam ser sérias. Por exemplo: uma pessoa que perde tempo tentando interpretar um comentario que nao vai além disso - de ser um comentario, uma opiniao pessoal absolutamente nao interpretavel - , se ofendendo sem motivo e usando comentarios brilhantes como "meu marido é alemao e é lindo" soh foi capaz de ser bobinha assim porque tem tempo e energia sobrando. Porque quem se preocupa em fechar a torneira quando escova os dentes, em nao jogar lixo na rua, em parar o carro pro pedestre atravessar, em comer verdura e fruta todo dia, em juntar um monte de roupa pra passar pra gastar menos eletricidade com o ferro, em ajudar turistas perdidos na rua, em dar atençao ao velhinho que puxa papo no metro, em recolher o coco do cachorro, em usar camisinha, em andar a pé ou de bicicleta quando for possivel evitar o carro, em nao deixar o ar condicionado pingar no do vizinho de baixo, em sorrir pro vizinho no elevador, em lembrar o nome das pessoas às quais é apresentado, em ler muito, em aprender sempre, em escutar os outros e em falar o que sente, em dar risada pra desopilar o figado, em nao criar filhos monstrinhos tiranicos, em nao sujar a praia, em usar o fio dental depois de comer e lavar as maos depois de fazer xixi, enfim, quem se preocupa em ser civilizado nao tem tempo pra encher o saco dos outros por motivos ridiculos. Sou humana e tenho o direito de achar feio, chato e bobo quem eu bem entender, assim como qualquer um tem o direito de me achar feia, gorda, chata. Soh nao tem o direito de vir me encher o saco.

E se tem neguinho achando que me chamando de feia vai me ofender, espera sentado. Jah passei da fase de me incomodar com o que os outros acham. Incomodada ficava a sua avoh. Sou feia? Gorda? Tenho cabelo ruim? Pois pra compensar sou interessantérrima, engraçada, esperta, safa, inteligentissima, tenho um diploma foda, falo duas linguas fluentemente e sem sotaque, cozinho bem, nao sou alérgica a nada, faço os outros rirem e rio muito também, nao tenho carie nem espinha, leio 2 livros por semana, quase nunca fico doente, adoro cinema, tenho um cachorro espetacular, tenho uma familia barbara, sou carioca, estou sempre cheirosa, tenho maos lindas, escrevo bem, nao fumo, bebo com moderaçao, sou pontual, sou amiga da Hunka, do Hiro, da Newlands, do Pfaender, da Maria Marta, do Telmo, sou rapida e eficiente em tudo o que faço, entendo de computador e soh nao entendo mais de internet porque nao tenho saco, faço minhas proprias unhas muito bem, nao levo horas pra me arrumar pra sair, fecho os olhos quando como chocolate, as crianças me dao tchau na rua, adoro caminhar, nunca joguei lixo pela janela do carro, adoro escrever cartas, digito com os dez dedos, sou comunicativa, sou observadora, aprendo qualquer coisa na velocidade da luz, passo roupa direitinho, tenho memoria fotografica, nao tenho caspa, hah dois anos nao como manteiga, vendo salame de javali como ninguém, sou alta, adoro bicho, nao acredito em caridade, soh tomo e prescrevo remédio quando nao tem outro jeito, como com os talheres na posiçao certa, lavo minhas proprias calcinhas. Entre outras qualidades. Entao que nao venham me torrar o saco me chamando de futil sem nem me conhecer. Nao tenho nada a dizer a gente que responde a um comentario simples com um inflamado "voce sabia que Berlim é uma das cidades mais importantes da Europa"? E daih? A rainha da Inglaterra é a rainha da Inglaterra e nem por isso os chapéus dela sao menos ridiculos.

Meu post sobre a feiura dos alemaes foi aparentemente numa mailing list qualquer, obviamente sem autorizaçao minha. Nao sei quem foi que fez essa gracinha, esse primor da falta de educaçao, mas sei que praga de brasileira morando em Bastia pega, e pega pra valer. Entao, pra voce que me fez essa cachorrada, pra voce, coitadinha de nome brega que tem marido alemao lindo, pra voce que me fez a gentileza de esclarecer que Berlim é uma das cidades mais importantes da Europa, pra todo mundo que leva a sério observaçoes pessoais sobre a feiura dos alemaes: desejo a voces muita alergia a camarao e a chocolate, filhos asmaticos, verrugas na ponta do nariz, gengivite, chulé, queda de cabelo, mau halito, perda de memoria bem quando quiser lembrar o nome daquele ator que fez aquele filme. Vao achar coisa melhor da vida pra fazer, vao. E se nao gostaram do que escrevo, a porta da rua é serventia da casa.

Eu, hein.

p.s.: Berlim e os berlinenses continuam feios, voces sabem, né.

***

Mudando radicalmente de assunto, que esse jah me encheu: jah me mudei. Passei uma semana de tédio no apartamento novo em Bastia. Tédio porque muita gente ainda tava de férias, a cidade tava vazia, e nao trabalhamos, entao passei os dias arrumando a casa em camera lenta pro tempo passar mais rapido, e caminhando com o Legolas quando nao tava muito quente na rua. Trabalhei na loja do Fabrizio o Louco alguns dias; a praça andou animada, shows os mais variados (incluindo o de uma banda de rock cristao brasileira, a Oficina G3, que eu obviamente nao conhecia, coisa que deixou o pessoal da organizaçao muito decepcionado), vendi altos vinhos, uhuu. Hoje retornamos ao trabalho, mas ainda nao tem muito o que fazer, como voces podem notar.

A Telecom prometeu o modem pra hoje; vamos ver. Tenho fotos germanicas pra acompanhar os posts detalhados sobre a viagem. Ainda nao tirei fotos da casa nova, mas virao, virao. Se a Telecom deixar.

(aposto que a Telekom alema jamais deixaria um cliente dois meses sem modem. Mas em compensaçao seus funcionarios com certeza sao mais feios e nao tao simpaticos...)

Postado por leticia em 09:20

20.08.03

falta do que fazer é f*...

Impressionante a quantidade de gente que me escreveu enchendo o saco porque eu nao gostei da Alemanha. Ninguem nunca ouviu falar que gosto nao se discute? Porra, achei Berlim uma droga sim, é problema meu, por que toda essa encheçao de saco? Nao tenho o direito de achar uma cidade horrorosa, suja, fedorenta, e as pessoas igualmente horrorosas, sujas e fedorentas? Cade a liberdade de expressao? Eu, hein...

Pode ser que eu tenha ido aos lugares errados. Tipo, Lubeck é linda. Dizem que Munich é linda. Nao deu tempo pra ir, e também nao teria dinheiro, porque as passagens de onibus e trem custam uma fortuna, praticamente tres vezes os preços das passagens aqui na Italia. Pode ser que tenha me faltado alguém que morasse em Berlim pra me mostrar as coisas bonitas de lah. Mas posso dizer que rodei bastante, fomos em praticamente tudo que é lugar que o guia turistico indicava, e achamos TUDO uma merda, fora o Tiergarten, que é bonito, mas é soh um parque, nada mais. Alias, nao foi soh opiniao nossa, mas de mais um bando de gente que estava no mesmo albergue - gente de tudo que é lugar do mundo, diga-se de passagem, e que achou Berlim uma droga. Varias pessoas inclusive foram embora mais cedo do que tinham programado, indo pra fora de Berlim, ou continuando o tour da Europa que muitos estavam fazendo.

Neguinho pode espernear, me encher o saco, me mandar spam, me telefonar torrando a paciencia, me chamar de futil (quer dizer que ter uma opiniao ruim sobre um lugar significa ser futil?), achar erro de Portugues que eu nao cometi, dizer que eu sou feia, que eu tenho cara de peixe morto, que as lambretas italianas sao muito piores do que o metro alemao, pode dizer o que quiser. Continuo achando Berlim uma merda, e nao tenho a menor intençao de voltar.

E, na boa: prefiro mil vezes viver numa cidade de transito confuso e lambretas assassinas mas onde pelo menos as pessoas sorriem pra voce, puxam conversa, gesticulam se nao conseguem se fazer entender, comem muito bem, cantam enquanto trabalham ou caminham na rua, onde as crianças de colo nao franzem a testa pra voce (como nos vimos umas quatro vezes na rua e no metro, em Hamburgo e em Berlim: crianças DE COLO ou no carrinho FRANZINDO A TESTA e encarando sério. Medo.), onde a mulherzinha do metro diz "next stop, Barberini" pros turistas entenderem, prefiro tudo isso do que a organizaçao do metro alemao. Um pouco de caos às vezes é bom; pelo menos é mais divertido, e se a gente nao se diverte, entao tah vivendo errado.

Postado por leticia em 15:05