Ontem li rapidinho o último Camiller, Vampa d'Agosto. Os meninos do curso de narração tinham avisado que o final era decepcionante, mas eles não tinham gostado muito do livro propriamente dito. Eu gostei. Achei engraçado e bem amarradinho. Como sempre, o que menos me interessa é a história; os personagens e sobretudo o ambiente siciliano são tão surreais e hilários que nem me importa o que está acontecendo, e me perco em meio aos nomes e sobrenomes dos personagens com prazer. Ótima leitura.
E então voltei a ler Mankell, que eu tinha parado porque faltava o quarto livro. Finalmente chegou, então comecei de onde tinha interrompido: The Man Who Smiled. A impressão que eu tenho é que o sueco é uma língua simples, com poucas frases subordinadas, períodos curtos e poucas metáforas. Foi a mesma impressão que tive lendo The Bookseller of Kabul. Alguém me corrija se eu estiver errada.
E durma-se com essa merda de festa...
O tal Il Cammello e la Corda é um livro meio estranho, porque faz um vai-e-vem cronológico entre a Sicília romana dos primeiros anos de Cristianismo e a época atual. O autor, Seminerio, não tem o mesmo charme do Camilleri, mas as descrições são interessantes, e os personagens idem. Saldo positivo, mas não é um livro assim ooooooooooh. Pra passar o tempo.
A editora é a Sallerio, de Palermo, que também publica os livros do Camilleri e vários outros autores sicilianos, então a sensação é a de estar em casa, mesmo mudando de autor. Interessante ver que o ponto de vista não muda muito – aparentemente o povo siciliano, independentemente da província que se está levando em consideração, é muito homogêneo como personalidade, e muito consciente disso. É sempre muito interessante ler autores sicilianos, de Sciascia a Camilleri a outros que provavelmente ainda vão cruzar o meu caminho.
E comecei Life & Times of Michael K, do Coetzee. Já tinha lido o seu Disgrace, que me fez chorar porque tem muitas cenas de sofrimento animal, mas tinham me falado tanto desse que resolvi dar uma outra chance. É estranho, mas estou gostando. Parece com outra coisa que eu já li mas não me lembro direito o que é.
Comecei ontem a ler Equador, do Miguel Sousa Tavares. Uma delíiiiiiicia de livro! Trouxe o menino comigo em novembro passado, mas só lembrei que ele existia quando fui à livraria semana passada, comprar um guia de Hong Kong pro Homem Mais Feio do Mundo, e vi o livro na seção "altamente recomendados". A versão italiana tem a mesma capa da Nova Fronteira, que acredito seja a mesma original portuguesa, não sei e não me interessa, mas foi por isso que bati logo o olho e imediatamente me deu coceira de vontade de ler. Não me arrependi: hoje dois alunos faltaram e devorei metade do livro nessas duas horas de folga forçada. Os personagens são deliciosos, vivos, interessantes, as florestas tropicais parece que estão aqui do lado, sinto o cheiro da clorofila, a umidade sufocante, o cecê dos angolanos que trabalham na colheita do cacau, Wagner tocando no gramofone do Luís Bernardo. Estou amando.
Terminei Ask the Dust, do John Fante, mas, quer saber?, não me impressionou muito não. DETESTO personagens que fazem tudo errado sempre. Vou ficando irritada e não consigo ver mais nada no livro além de uma grande irritação. Também não sou muito chegada em malucos, então já viu. Mas enfim, é um livro que TEM que ler, então li. Missão cumprida.
Hoje de manhã li rapidinho o tal Tre Cavalli, de de Luca, que peguei na biblioteca. Achei chatão. Não gosto de frases curtas jogadas ali pra dar efeito. Não gosto de flashbacks desorganizados que você demora pra botar em ordem. Não gosto de personagens bizarros como esse jardineiro de 50 anos que se envolve com uma prostituta de 30 (estou sendo muito sintética, a história é estranha pacas). Não gostei de quase nada no livro; há alguns trechos brilhantes como conteúdo, mas não gostei da forma. Então não vou ler mais nada dele, já que a própria Bibliotecária Loura disse que todos os seus livros são estilisticamente parecidíssimos e ou você gosta ou não gosta (pelo grunhido que fez quando pedi o livro, ela está na segunda categoria).
Terminei de ler o livro correndo e parti pra faxina. Eu, hein.
Semana passada li Swallowing Grandma, um livro esquisito que comprei porque gostei do nome e da capa. Não sei nada da autora e a sinopse atrás não explica muito bem do que se trata. Ou melhor, até explica, mas a história é confusa e cheia de reviravoltas inesperadas. Não é dicotômica, os bons são maus e os maus também são bons, a personagem principal vira bulímica durante a história e esse conflito não se resolve, enfim, é meio estranho, mas passa o tempo. Não é pra comprar, mas se tiver dando sopa na biblioteca, pelo menos ajuda a distrair enquanto a fila do correio não anda.
Na mailing list do curso de narrativa que fiz em novembro está rolando uma discussão séria sobre Raymond Carver. Ele foi muito falado durante o curso, e lemos em aula um conto seu muito interessante, mas eu nunca tinha lido nada dele e fiquei me achando um cocô por causa dessa terrível lacuna intelectual. No fim de semana em Rotterdam, esperando no aeroporto e matando o tempo no avião, li Cathedral, uma sua coletânea de contos.
Quer saber? Achei um belo nada.
Os defensores de Carver na lista argumentam que a simplicidade com a qual ele descreve atos quotidianos é envolvente. Sinceramente, uma frase do tipo "ele passou a manteiga no pão, depois a geléia, e levou o sanduíche pra mulher" não me diz la-da. Eu até agüento conteúdo zero se a forma é maravilhosa, mas se não tem nem conteúdo e nem forma, ora, me poupe. Se a geléia ainda fosse, sei lá, envenenada, ou então uma receita de família que morreu com a falecida avó que teve um repentino piripaque numa casinha na beira de um lago isolado na Dinamarca, ou se o homem tivesse pela primeira vez conseguido passar geléia no pão depois de uma longa fisioterapia pós-acidente, talvez a coisa ficasse mais interessante. Mas manteiga comum com geléia comum num pão comum pra uma esposa comum é comum DEMAIS. E como se não bastasse a exagerada banalidade da forma e do assunto, os contos terminam no ar, suspensos. Não têm final. São literalmente contos onde não acontece nada. Parece até que ele mora aqui na Umbria... ;)
Finalmente consegui terminar La Guerra degli Antò. Tem algumas tiradas geniais, mas é muito confuso e esburacado pro meu gosto. Mas deu pra dar umas risadas e isso é sempre bom. E agora vou parar de ler literatura porque tenho que estudar pras provas de fevereiro. Bosta de vida, se não precisasse trabalhar e pudesse assistir a todas as aulas, não precisaria perder tempo estudando...
Depois do Camilleri li Pecore Nere ("Ovelhas Negras"), uma série de contos escritos por quatro mulheres imigrantes ou filhas de imigrantes. Eu já tinha visto as meninas na televisão há alguns meses, e resolvi comprar o livro. O que eu achei delas na TV bateu perfeitamente com a minha impressão ao ler o livro. A garota que eu tive certeza que escreveria de um jeito que eu odeio realmente escreve de um jeito que eu odeio; as duas que me pareceram mais inteligentes escreveram os melhores contos. Gosto de literatura de imigração; lógico, é o que eu faço aqui toda vez que escrevo, é o que faz o povo do Mundo Pequeno – mas acho que a coletânea teria sido ainda mais interessante se tivessem chamado autores de outras origens. Porque todas as quatro têm alguma coisa de indiano e/ou muçulmano, então no final das contas cai-se sempre nos assuntos carne de porco, véu, Meca. Mas é interessante. E de leitura fácil e rápida.
Depois engatei logo Tutti Giù Per Terra ("Todo Mundo no Chão"), de Giuseppe Culicchia, um livro que foi sugerido na lista dos participantes do tal curso de narração que fiz em Perugia logo que cheguei do Rio. Achei divertidíssimo! A capa é broxante, mas o livro é muito engraçado. Dei muita risada, muita mesmo, e só fui dormir quando terminei, às duas da manhã (comecei à meia-noite, quando chegamos do jantar na casa do Gianni e da Chiara). Ótima dica.
E aí comecei La Guerra degli Antò (A Guerra dos Antò - Antò é apelido de Antonio; os personagens são quatro Antonios, amigos, punks, de Pescara), esqueci o nome da autora. Não está me entusiasmando muito; quando terminar digo o que achei.
Vimos Memórias de uma Geisha semana passada com Robertinha. Estava meio desconfiada porque o livro é muito interessante, mas sabe como é, neguinho adora inventar e fazer filmes de merda baseados em livros bons.
Acabou que todos adoramos. Visualmente é um desbunde; aqueles tecidos magavilhosos, a estética japonesa da qual eu gosto só até um certo ponto, paisagens bonitas. Foram bem fiéis ao livro, na medida do possível. O roteiro é meio estranho mas o livro também é, então tudo bem. Gostei, gostei. Vale a pena ver.
King Kong vimos num DVD piratão daqueles filmados dentro do cinema, um horror. Rimos mais das distorções das imagens do que do filme, que deve ser até passável no cinema.
Vimos Ti Amo in Tutte le Lingue del Mondo, do Pieraccioni, humorista toscano muito simpático. Clássico filme italiano idiota, comédia romântica imbecil, mas tem seus momentos.
Vimos Le Croniche di Narnia – eu tinha acabado de ler o livro e achei o filme bem legal, mas semana passada, quando finalmente terminei todos os livros, achei uma BOSTA. Vai ser catequisador assim na casa do chapéu! Socorro! Os dois primeiros são interessantes, mas depois vai tudo descambando numa alegoria tão descarada da Bíblia que eu já tava quase jogando o livro pela janela. Só terminei porque sou MUITO teimosa quando o assunto é livro. Terminei até The Da Vinci Code, vejam só.
E o primeiro livro do ano foi Coraline, do Neil Gaiman (sim, aquele de Sandman). É curtinho, simples, mas bem legal. Interessante pra quem quer começar a ler em inglês, porque é bem facinho mesmo. As ilustrações de McKean também são tenebrosinhas no ponto justo. Gostei.
E logo comecei um Camilleri, Un Filo di Fumo, que não está conseguindo me entreter muito, embora eu saiba que não é culpa sua. E depois que acabar esse vou ter que dar uma parada na leitura (aham...) e enfiar a cara nos livros da faculdade, porque em fevereiro começam as famosas provas das matérias que eu não freqüento. Vai ser mole não.
Muito devagar, vou voltando. Achei que teria tempo pra escrever essa semana, mas qual o quê: entre uma tradução sobre guindastes, o cabelo pra ajeitar, roupa acumulada pra passar, coisas da faculdade pra estudar e jantar pra organizar, não vai dar - mas viram que rima que eu fiz pra compensar? ;)
Acabei de atualizar a lista dos livros lidos esse ano. Adicionei comentários curtos e grossos, bem no meu estilo. É pra mim mesma o post, como sempre, mas eu sei que pelo menos a Julie se interessa (aliás, o livro da tua pimpolha tá aqui... Vamo esperar passar essa tristeza invernal que eu dou um pulo aí pra ver vocês).
Matilda (Roald Dahl) – façam um favor a vocês mesmos e leiam tudo o que esse homem escreveu
Kingdoms of the Celts (John King) – porque eu adoro esse assunto
The Great Gatsby (Fitzgerald) – honestamente? Meio mais ou menos
Great Expectations (Dickens) - adorei
I Racconti (Lampedusa) – muito bonito
The Da Vinci Code (...) – vômito total
Lady Chatterley's Lover (D. H. Lawrence) - belíssimo
The BFG (Roald Dahl) - :)))))))))))
The Old Man and the Sea (Hemingway) – um livro que é um quadro
The Curious Incident of the Dog in the Night-Time (Mark Haddon) - DELICIOSO
La Voce del Violino (Camilleri) – bom, bom
La Stagione della Caccia (Camilleri) – bom, bom
The Importance of Being Earnest (Wilde) – divertido
Bartleby (Melville) – a must read
Salem's Lot (Stephen King) – gosto e não nego. Mas esse é uma bosta
Boy (Roald Dahl) - :)))))))))))))))))))))))))))))))))))
La Gita a Tindari (Camilleri) – bom, bom
L'Odore della Notte (Camilleri) – bom, bom
Il Giro di Boa (Camilleri) – bom, bom
Todas as Festas Felizes Demais (Fabio Danesi) – Eu adoro o Fabio :)
Io Non Ho Paura (Niccolò Ammaniti) – uma das melhores coisas que já li
L'Impero dei Draghi (Manfredi) – Nunca mais compro livro de homem com franjinha
The House of Mirth (Wharton) - AMEI
The Kite Runner (Khaled Hosseini) – liiiiiiiiiiiindo, tristíiiiiiiiiiiiiissimo
Breakfast at Tiffany's (Truman Capote) – muito estranho mas legal
Middlesex (Jeffrey Eugenides) - EXCELENTE
Fight Club (Palahniuk) – gosto de tudo dele
The Bookseller of Kabul (Åsne Seierstad) – bem interessante
The No. 1 Ladies' Detective Agency (McCall Smith)
The Godfather (Mario Puzo) – recheado de chavões e estereótipos. Veja o filme que é melhor
The Hitchhiker's Guide to the Galaxy (Douglas Adams) – coisa mais chata do mundo
In Patagonia (Bruce Chatwin) – não terminado, chato demais
Un Mese con Montalbano (Camilleri)
Gli Arancini di Montalbano (Camilleri)
Henderson the Rain King (Saul Bellow) – não consegui terminar
Morality for Beautiful Girls (McCall Smith)
The Full Cupboard of Life (McCall Smith)
In the Company of Cheerful Ladies (McCall Smith) – delícia, toda a série
Nicolas Heyerich, l'Inquisitore (Valerio Evangelisti) – horrível, idiota, mal escrito
La Paura di Montalbano (Camilleri) – não gosto de compilations de contos
Don Casmurro (Machado de Assis) – amo Machadão :)
Harry Potter and the Half-Blood Prince (Rowling) – ;)
The Year 1000 (Lacey & Danziger) - interessante
Guns, Germs and Steel (Jared Diamond) - food for thought
La Testa Perduta di Damasceno Monteiro (A. Tabucchi) – AMO Tabucchi
La Luna di Carta (Camilleri) – meio decepcionante
A Moveable Feast (Hemingway) – Paris é sempre Paris, né
Oracle Night (Paul Auster) – às vezes interessante, às vezes não
The Man Who Fell in Love with His Wife (Paul Burke) - dispensável
The Mistress of Spices (Chitra Banerjee Divakaruni) - weird
To Kill a Mockingbird (Harper Lee) – a must read
Stupeur et Tremblement (Amélie Nothomb) – legal
Il Principe (Machiavelli) – leeeento…
A Metamorfose (Kafka) - weird
The Grapes of Wrath (John Steinbeck) - magavilhoso
The Virgin Suicides (Jeffrey Eugenides) – Middlesex é melhor
The Lovely Bones (Alice Sebold) – um amor :)))))
O Processo (Kafka) - angustiante
Crônicos (Daniela Abade) – alguns erros de português dispensáveis
1st to Die (James Patterson) – SOCORRO! Tava dando sopa lá em casa (é de um amigo do meu irmão), peguei, li e odiei
As Brasas (Sándor Márai) - tem tudo pra ser lento, mas não é
Faceless Killers (Henning Mankell) – bom mas não empolgante. Só que uma vez começada a série...
The Dogs of Riga (Henning Mankell)
The White Lioness (Henning Mankell)
Timbuktu (Paul Auster) – assim assim. O protagonista é um cachorro, conta pontos a favor
Bartleby y Compañia (Enrique Vila-Matas) – um porre, mas acho que é culpa da língua
The Chronicles of Narnia (C. S. Lewis) - comecei gostando, agora estou achando de uma pobreza ímpar. Custando pra acabar. Aparentemente vai ser o último do ano.
A enxaqueca começou no sábado, no final da manhã. Tomei logo o remédio, como sempre, mas dessa vez demorou a passar e não consegui nem ajudar a botar a mesa na Arianna; tive que ficar jogada no sofá embaixo do cobertor até passar. A segunda porrada veio lá pras sete, no meio do cinema. Estávamos vendo The Interpreter (gostamos muito, mas no final eu já não estava entendendo mais nada por causa da dor). Tomei outro comprimido e fiquei torcendo pra dor ir embora pra eu não ter que sair no meio do filme, mas não deu. Sou teimosa e fiquei até o final, mas cheguei em casa chorando de dor.
Na segunda acordei a massa falida. Uma náusea horrorosa, a cabeça rodando, o corpo mole. Essa dor me destrói, é uma coisa tão absurdamente intensa que destrói a gente moralmente também, um negócio impressionante. Por sorte as duas escolas estavam fechadas por causa do feriado, que aqui se comemora no dia primeiro de novembro, então pude ficar em casa sem remorso. O dia INTEIRO no sofá de pijama. Não conseguia ver TV porque o barulho incomodava, mas arrisquei umas pagininhas e, vendo que rolava, acabei terminando The Grapes of Wrath (maravilhoso!), devorando The Virgin Suicides (prefiro Middlesex) e começando The Lovely Bones, de Alice Sebold, muito gostosinho. Mirco foi tomar um drink com o Moreno porque eu realmente não tinha condições de sair de casa. Cheguei até a bater um bolo à tarde, não sei como, e ainda embrulhei dois pedaços em papel alumínio e dei de presente pras duas meninas que bateram aqui na porta trick-or-treating. E depois chapei, e mais nada.
Visto que não consigo engrenar com o coitado do Maquiavel, comecei a ler The Grapes of Wrath. Não gosto muito de livros escritos em linguagem regional, e essa do sul dos EUA é particularmente irritante, mas a história é interessante. Quando conseguir ler mais um pouquinho e criar uma opinião melhor digo o que achei.
Então eu estou aaaaa mais feliz do mundo porque li Amélie Nothomb sem grandes dificuldades. Eu sou foda.
Na verdade sou é sortuda também porque francês e italiano são idênticos na gramática, o que ajuda na compreensão do texto, mesmo com aqueles verbos loucos. Mas não conta pra ninguém não.
Nessa última semana li The Mistress of Spices, de Chitra Banerjee Divakaruni. É um livro... é um livro muito estranho, mas gostosinho de ler. Esse foi um dos clássicos casos de livro comprado pela capa bonitinha – e porque eu adoro temperos especiarias pozinhos coloridos plantas estranhas. Não recomendo, mas também não desrecomendo, se é que vocês entendem.
E amanhã devo terminar To Kill a Mocking-bird, que é uma diliiiiiiça. Eu tenho que aprender a ter sempre aqueles post-its coloridos pequenininhos pra marcar parágrafos interessantes, porque queria botar umas partes legais aqui. Mas agora não tô com paciência pra catar nada.
Pois então. Grande decepção, o Paul Burke. Muito assim mais ou menos. Não sei bem o que eu esperava, talvez um livro que realmente me fizesse gargalhar, mas longe disso. Tá mais praquele horror do Hitchhiker's etc. Tô gostando não, mas agora já comecei e vou teimar até acabar.
Então eu li Oracle Night, do Paul Auster, e achei que ficou faltando alguma coisa.
A história é interessante mas há alguns elementos que se perdem no caminho e ficam sem muita função. Mas o problema nem é esse, o problema é a falta de estilo, a graça, os jogos de palavras, a invenção. Todos os escritores americanos da atualidade que eu já li soam exatamente iguais. TO-DOS. Pular de Hemingway (mesmo sendo A Moveable Feast, que não é um romance) pra qualquer outro pode ser altamente traumatizante.
Vamos ver se o outro Paul, o Burke, se sai melhor.
Tabucchi foi uma das melhores coisas que já me indicaram pra ler.
Se vocês não lembram, foi o professor de literatura italiana na Stranieri (aquele que a Polacca Pazza acusou de ser chato pra caramba e de ser péssimo professor). No último dia de aula, depois de entender que só eu e o Silvio compreendíamos alguma coisa da aula dele, porque só nós conseguíamos ler direito em italiano, me chamou num canto e perguntou se, visto que eu entrava com um livro diferente na mão a cada dia, eu não estaria interessada em sugestões de leitura. Só se for agora, exclamei, e ganhei uma lista de livros. Li todos, e adorei todos.
Um desses foi Sostiene Pereira, que depois a Sabine, canadense-francesa que estudou comigo na Stranieri e ainda é uma boa amiga, me deu de presente de despedida. O livro é uma delícia, de verdade. Tudo é tenro, delicado, doce, faz sorrir. Até o que é triste, amargo, sério, politicamente engajado disfarçado de boa literatura. Esse ano li de novo e gostei mais ainda. E acabei comprando outro dele: La Testa Perduta di Damasceno Monteiro. A delícia já começa do título, pelo menos pra expatriados, com esse tão familiar Monteiro no título. A história é simples, e não é exatamente a trama que é envolvente, mas os personagens. Fiquei amiga de todos. E com mais vontade ainda de conhecer o Porto (que em italiano, não chorem, se chama Oporto. Giustamente.).
E esse mês saiu o último Camilleri com o Commissario Montalbano. Lógico que já comprei e já estou na metade. Comprei outras coisas também porque sabem como é, um livro chama outro, é que nem sequilho. Comprei The Mistress of Spices, de Chitra Banerjee Divakaruni, um Hemingway (Moveable Feast, porque afinal Paris é Paris), um Paul Auster (Oracle Night), um Paul Burke (the Man Who Fell in Love With His Wife), e Nicholas, de Goscinny e Sempé, infelizmente só disponível em inglês, e que acabei comprando assim mesmo porque a edição é de-li-ci-o-sa. A Amazon me mandou o terceiro livro da série The Hinges of History do Thomas Cahill (o primeiro é How The Irish Saved Civilization, um dos meus preferidos ever), Desire of the Everlasting Hills – The World Before and After Jesus. Ainda não comecei porque estou esperando o segundo volume, que deve chegar mês que vem: The Gifts of the Jews, que estou doida pra ler. Pena que a edição que me mandaram é feinha e diferente da dos irlandeses, que é linda. Mas enfim, não se pode querer tudo.
Também estou com um monte de coisas pra ler em francês e espanhol, mas não estou com tempo pra ler com dicionário. Também tem Il Gattopardo me esperando – só li uma vez, há muito tempo, em português.
The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy é uma das coisas mais chatas que eu já li em toda a minha vida.
Besides justifying the transfer of wealth to kleptocrats, institutionalized religion brings two other important benefits to centralized societies. First, shared ideology or religion helps solve the problem of how unrelated individuals are to live together withoug killing each other - by providing them with a bond not based on kinship. Second, it gives people a motive, other than genetic self-interest, for sacrificing their lives on behalf of others. At the cost of a few society members who die in battle as soldiers, the whole society becomes much more effective at conquering other societies or resisting attacks.
Guns, Germs and Steel - a Short History of Everybody For The Last 13,000 Years (Jared Diamond)
"The prudence, fortitude, military discipline, labors, perilous navigations, and battles of the Spaniards - vassals of the most invincible Emperor of the Romam Catholic Empire, our natural King and Lord - will cause joy to the faithful and terror to the infidels. For this reason, and for the glory of God our Lord and for the service of the Catholic Imperial Majesty, it has seemed good to me to write this narrative, and to send it to Your Majesty, that all may have a knowledge of what is here related. It will be to the glory of God, because they have conquered and brought to our holy Catholic Faith so vast a number of heathens, aided by his Holy guidance. It will be to the honor of our Emperor because, by reason of his great power and good fortune, such events happened in his time. It will give joy to the faithful that such battles have been won, such provinces discovered and conquered, such riches brought home for the King and for themselves; and that such terror has been spread among the infidels, such admiration excited in all mankind."
Trecho dos relatos dos companheiros de Pizarro, que com meia dúzia de gatos-pingados (168 soldados, nem todos a cavalo) capturaram (e mataram) Atahuallpa, imperador inca, protegido por 80.000 soldados.
Guns, Germs and Steel (Jared Diamond)
Caramba, que facada no peito abrir um Tabucchi, que escreve em italiano mas sempre histórias que se passam em Portugal, e ler logo na primeira página:
Science fiction
O marciano encontrou-me na rua e teve mêdo de minha impossibilidade humana. Como pode existir, pensou consigo, um ser que no existir põe tamanha anulação de existência?
Carlos Drummond de Andrade
Por favor, autores estrangeiros, avisem com antecedência quando puserem trechos em português no meio de seus livros. Expatriado não lida bem com essas coisas não.
E olha que eu nem gosto tanto de Drummond.
Tem horas que não é fácil, viu. Eu nunca fui particularmente grudadíssima na minha família e sempre imaginei que um dia fosse morar fora. Tenho meus momentos de reclusão e intolerância à raça humana, inclusive meus parentes, e gosto da minha própria companhia. Do mesmo modo, apesar de ter um orgulho danado do Rio, que realmente é A cidade (não digo agora, nesse momento, porque agora o Rio é O QUE HÁ DE PIOR NO MUNDO, ao que parece; digo o Rio onde eu nasci e cresci, o astral, as pessoas, a paisagem, a floresta, a Lagoa, quequeísso, gente, a Lagoa, cês sabem do que eu tô falando), nunca fui carioca "da gema", freqüentadora de praia e curtidora da night. O meu Rio sempre foi diferente dos clichês, mas não por isso menos interessante. Sinto falta não fisicamente da cidade, mas da vida cultural e intelectual que eu tinha - e olha que não era láaaaaaaa essas coisas, mais por falta de grana que por qualquer outro motivo.
Mas experimenta abrir um guia turístico do Brasil em uma livraria no exterior. Experimenta catar o Rio, catar um mapa do teu bairro e achar a tua rua. Quero ver se você não cair no choro e se todo mundo não vai achar que você é maluco. Duvide-o-dó.
August was the month when flies started to become a problem, buzzing round the dung heaps in the corner of every farmyard and hovering over the open cesspits of human refuse that were located outside every house. If the late twentieth century is scented with gasolene vapour and exhaust fumes, the year 1000 was perfumed with shit. Cow dung, horse manure, pig and sheep droppings, chicken shit - each variety of excrement had its own characteristic bouquet, from the sweet smell of the vegetable eater to the acrid edge of gut-processed meat, requiring the human nose of the year 1000 to function as a considerably less prissy organ than ours today.
There are modern archaeological experts who study excreta intensively, rummaging through the latrine pits of ancient settlements to discover such fundamental details as the fact that the toilet paper of the year 1000 was moss.
(...)
The modern remedy for fleas and grubbiness - a good scrub of the body crevices - did not accord with the medieval mentality. The regulations of one tenth-century European monastery prescribed five baths for every month per year, but that was fanaticism by Anglo-Saxon standards of personal hygiene. One later commentator derided the Danish practice of bathing and combing the hair every Saturday, but did admit that this seemed to improve Danish chances with the womenfolk.
The Year 1000 - What Life Was Like at the Turn of the First Millennium (An Englishman's World), de Robert Lacey & Danny Danziger
Que preguiça que esse tempo dá! Cadê a vontade de sair de casa, com a chuva caindo lá fora, alternando-se com o vento leve e fresco?
Terminei meus Roald Dahl pra crianças, terminei o chato do Valerio Evangelisti, terminei mais um do Camilleri (acho que não sobrou nada do Commissario Montalbano pra eu ler) e engatei um Machado porque, acreditem se quiserem, nunca tinha lido Dom Casmurro. De Machadão, na escola, lemos outras coisas. Aqui ainda tenho O Cortiço, do Azevedo, que é um dos meus livros preferidos EVER, e, sempre do Machadão, Negrinha, que minha mãe me deu há anos com uma dedicatória bonita mas alguns contos eram muito tristes e nunca mais reli.
Na verdade estou cheia de coisas pra ler, e pretendo dar uma parada nas compras literárias, pelo menos em euros (pelo Submarino ainda dá), porque tá feia a $ituation. Mas tenho algumas coisas pra comprar em francês, além das ótimas dicas da Mary. Depois da viagem prometo que vou passar alg... vou tentar passar alguns meses sem visitar a Libreria Grande. Pra saúde da minha conta corrente botense.
Esse calor me cansa. Parece que vai melhorar nos próximos dias, mas por enquanto ainda é um parto sentar aqui e traduzir do italiano pro inglês um relatório cheio de estranhos materiais de construção, quando poderia estar deitada na cama, o ventilador na cara, lendo Nicolas Eymerich, Inquisitore, de Valerio Evangelisti, que é interessante pelo assunto mas estilisticamente pouco atraente. O diabo é que é o primeiro de uma série. Malditos autores de séries.
Meu pai trouxe com ele uma bolsona de coisas que minha mãe mandou por ele quando esteve no Rio, mês passado. Então ganhei sapatos, camisas escandalosamente bonitas, banana passa, gelatina Royal, bijuterias lindas, e os livros que comprei pelo Submarino: Equador (Miguel Sousa Tavares), dica da paratyfílica Newlands, A Língua Exilada (Imre Kertész), se não me engano dica da Cora, e alguns clássicos russos e da literatura brasileira.
O problema é que também comprei coisas em francês mês passado, mas preciso de tempo, paciência e dicionário pra dissecar esses livros, já que ainda titubeio um pouco quando leio o Le Figaro. Mas o tempo, cadê, cadê?
Meu Harry Potter finalmente chegou, maldita Amazon e malditos correios italianos. Mas preciso de calma pra ler, e com todo esse calor e com meu pai meio que por aqui e com o fim do mês chegando e trazendo consigo as faturas de julho pra resolver, joguei pra escanteio. Li as primeiras páginas e notei que não lembro mais de coisa nenhuma. Talvez seja melhor recomeçar do início da série, só pra dar uma refrescada na memória. Sacrifício... ;)
até o presente momento:
Matilda (Roald Dahl)
Kingdoms of the Celts (John King)
The Great Gatsby (Fitzgerald)
Great Expectations (Dickens)
I Racconti (Tommaso di Lampedusa)
The Da Vinci Code (...)
Lady Chatterley’s Lover (D. H. Lawrence)
The BFG (Roald Dahl)
The Old Man and the Sea (Hemingway)
The Curious Incident of the Dog in the Night-Time (Mark Haddon)
La Voce del Violino (Andrea Camilleri)
La Stagione della Caccia (Andrea Camilleri)
The Importance of Being Earnest (Oscar Wilde)
Bartleby (Herman Melville)
Salem's Lot (Stephen King)
Boy (Roald Dahl)
La Gita a Tindari (Andrea Camilleri)
L'Odore della Notte (Andrea Camilleri)
Il Giro di Boa (Andrea Camilleri)
Todas as Festas Felizes Demais (Fabio Danesi)
Io Non Ho Paura (Niccolò Ammaniti)
L'Impero dei Draghi (Manfredi)
The House of Mirth (Edith Wharton)
The Kite Runner (Khaled Hosseini)
Breakfast at Tiffany's (Truman Capote)
Middlesex (Jeffrey Eugenides)
Fight Club (Chuck Palahniuk)
The Bookseller of Kabul (Åsne Seierstad)
The No. 1 Ladies' Detective Agency (Alexander McCall Smith)
The Godfather (Mario Puzo)
The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy (Douglas Adams)
In Patagonia (Bruce Chatwin) – não terminado, chato demais
Un Mese con Montalbano (Andrea Camilleri)
Gli Arancini di Montalbano (Andrea Camilleri)
Henderson the Rain King (Saul Bellow)
Depois de The No. 1 Ladies' Detective Agency, ataquei de The Godfather (Mario Puzo). Mas o que é que há com os escritores americanos modernos que não têm a menor intimidade com a língua? A trama é interessante, os personagens são claramente definidos, mas caramba, estilo literário zero. Que porre. Fora que tudo parece ter sido escrito já tendo em mente o futuro filme-baseado-no-livro. Não gosto de livros obviamente cinematográficos. Acho a maior forçação de barra. Vou terminar de ler, mas não estou feliz da vida não. Decepções literárias me irritam deveras.
Now constipation was quite a different matter. It would be dreadful for the whole world to know about troubles of that nature. She felt terribly sorry for people who suffered from constipation, and she knew that there were many who did. There were probably enough of them to form a political party – with a chance of government perhaps – but what would such a party do if it was in power? Nothing, she imagined. It would try to pass legislation, but would fail.
The No. 1 Ladies’ Detective Agency, Alexander McCall Smith
Por motivos puramente ilustrativos, vamos fingir que os três volumes do Gibbon, que eu queria ler há aaaaaaaaanos, desde que li How the Irish Saved Civilization pela primeira vez, se materializaram do nada aqui na minha estante. Vamos fingir que The Bookseller of Kabul veio parar aqui por vontade própria. Assim como The Godfather. Vamos fingir que segunda-feira eu não gastei nenhum euro na minha livraria preferida – fui lá só pra dar uma bizoiada rotineira na seção de livros em língua original.
A seção de livros em língua original é uma espécie de ilhota, uma pequena estante não mais alta que meus olhos, alojada em um tipo de beco sem saída que abriga nas prateleiras de suas três paredes dicionários e livros didáticos para aprender outras línguas. Essa ilhota também tem três lados – o quarto virou uma espécie de balcão, onde ficam expostas as últimas novidades no setor de aprendizado lingüístico. Dois lados da ilhota são ocupados por livros em inglês; o outro é um mix de francês, espanhol e alemão. Há algumas poucas obras em russo, e é triste notar que Paulo Coelho faz parte de todas essas seções.
Eu estava ali olhando os Stephen Kings e os Douglas Adams, alguns Penguin Classics que pretendo comprar no Rio a 5 reau (ainda custa isso? Non credo), uma prateleira inteira muito chata sobre o Da Vinci Code, e outras coisinhas. Minha bolsa estava no chão, minha agendinha Moleskine estava aberta na página onde anoto os nomes dos livros que me atraem mas que não tenho dinheiro pra comprar agora mas um dia quem sabe. Ouço vozes, e noto que não estou sozinha. Freqüento a livraria há muito tempo, mas nunca tinha encontrado ninguém na ilha da língua original. Sei que alguém mais além de mim compra livros em língua original, porque noto que à distância de semanas muitos (tá bom, alguns) desaparecem, mas nunca tinha visto com meus próprios olhos nenhum outro companheiro leitor de língua original. Era um casalzinho jovem, os dois muito bonitinhos, roupas despojadas – nada de lápis de contorno labial sem batom, cabelo entupido de cera, saltos destruidores de vértebras, óculos de sol gigantes. SENTARAM NO CHÃO – sentaram no chão, olha que intimidade com o bookselling environment, sentaram no chão e ficaram discutindo livros em voz baixa. A menina queria levar o Silmarillion (quase enfartei), o menino um Chuck Palahniuk (quase morri). Puxavam outros livros da estante, um Harry Potter, um Hobbit, um Lovecraft, e acabei não me contendo.
- Palahniuk é muito bom, caramba. Mas o Silmarillion é um livro que não acaba nunca.
Os olhos do menino se acendem.
- Você leu Fight Club?
- Tenho em casa, mas queria esperar passar mais tempo desde que vi o filme pela última vez, pra não ler o livro imaginando o Brad Pitt.
- O filme é bem diferentinho do livro, pode ler sem medo.
- Beleza, vou ler mesmo! [estou lendo, mas não tenho tempo de entrar no ritmo]
A menina pergunta se o Silmarillion é mesmo chato.
- Não é que é chato, é difícil, pesado, mesmo traduzido.
- O LoTR eu li, mas o Silmarillion eu nunca terminei nem em italiano, que dirá em inglês – responde o garoto.
- O LoTR eu já li umas treze vezes e não me canso nunca.
- Eu não passei das cinco vezes – ele ri.
Puxo dois livros da minha prateleira.
- Olha, esse aqui é muito gostosinho [é The Curious Incident of the Dog in the Night-Time]. E esse aqui é interessante, não tanto pelo hermafroditismo [aqui a emoção de estar conversando com gente que actually reads enrolou a minha língua e saiu algo tipo hermafodritismo] do personagem principal, mas a história da família grega é bem interessante [estava falando de Middlesex]. É o mesmo autor de Virgin Suicides, que infelizmente nunca vi aqui.
A garota descartou The Silmarillion. Leram as contracapas juntos, o garoto distribuiu os livros na mão como se estivesse jogando pôquer, e eu fui embora sorrindo antes de ver o que ela escolheu.
Eles agradeceram, mas em vez de se despedir com ciao disseram arrivederLa. Caraca, tô ficando velha mesmo.
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Vamos combinar que Bruce Chatwin foi uma das maiores decepções literárias da minha vida. In Patagonia é UM PORRE. Nunca vi livro sobre viagem que descreve praticamente só pessoas, e só conta história idiota. Pode até ser que tudo aquilo tenha um sentido, mas se tem, é só pro autor mesmo. Parei no meio, vejam só de que nível de chatice estamos falando. Me agarrei no Fight Club, que não tenho tempo de ler enquanto não terminar a tradução que tenho que entregar até amanhã.
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Quarta-feira dei a primeira aula de português pro Valerio. Ontem ele deveria ter me dado a primeira de francês, mas houve um contratempo e não rolou. Fiquei irritadinha. Vamos compensar na segunda, ele disse. Hmpf.
Aliás, falando em livro.
Consegui terminar Middlesex, de Jeffrey Eugenides (autor de Virgin Suicides), à custa de muito esperar aluno atrasado e fila no banco e nos correios. Gostei MUITO, não tanto da problemática hermafrodita do personagem principal, mas da história da família de origem grega que migra pra Detroit. Desdemona é um personagem fenomenal e me fez abrir largos sorrisos. Gostei, gostei.
Agora estou com esse In Patagonia, de Chatwin, que não sei quando vou conseguir curtir, porque tenho milhões de páginas (algumas chatas, outras legais) pra traduzir com urgência, turmas novas pintando em horários surreais (sábado de uma e meia a três e meia, sexta das oito às dez da noite!), e na próxima semana um zilhão de faturas pra fazer.
Hoje acordei ainda com dor de cabeça e zonza depois de tanta música chata ontem à noite. Perambulei pela casa, inútil, até as nove, quando finalmente me convenci de que não tinha condições de sair pra correr debaixo do sol forte, com essa dor de cabeça. Dei uma mini-geral na casa e sentei pra escrever. E agora tenho que ir pra cozinha bater um bolo bem gostoso pro Ettore, que foi operado no ombro ontem à tarde e em teoria volta pra casa hoje. Mas cadê a vontade? Cadê a vontade de fazer faxina também? E a vontade de traduzir as coisas chatas? E de lavar o cabelo? E de dar aula até as três e meia da tarde? E de depois ir direto pra casa do Moreno, pra ajudar a mãe dele, que é uma simpatia, com os preparativos do jantar de hoje – finalmente as lesmas vão pra panela, e parece que a coisa vai ser trabalhosa.
Que vontade de passar alguns dias em animação suspensa, quase comatosa, pra descansar os neurônios.
Holly lifted her martini. "Let’s wish the Doc luck, too," she said, touching her glass against mine. "Good luck: and believe me, dearest Doc – it’s better to look at the sky than live there. Such an empty place; so vague. Just a country where the thunder goes and things disappear."
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The instant she saw the letter she squinted her eyes and bent her lips in a tough tiny smile that advanced her age immeasurably. "Darling," she instructed me, "would you reach in the drawer there and give me my purse. A girl doesn’t read this sort of thing without her lipstick."
Breakfast at Tiffany's, Truman Capote
He caught her hand, and she felt in his the vibration of feeling that had not yet risen to his lips. "Lily – can't I help you?" he exclaimed.
She looked at him gently. "Do you remember what you said to me once? That you could help me only by loving me? Well – you did love me for a moment; and it helped me. It has always helped me. But the moment is gone – it was I who let it go. And one must go on living. Goodbye."
She laid her other hand on his, and they looked at each other with a kind of solemnity, as though they stood in the presence of death. Something in truth lay dead between them – the love she had killed in him and could no longer call to life. But something lived between them also, and leaped up in her like an imperishable flame: it was the love his love had kindled, the passion of her soul for his.
The House of Mirth, by Edith Wharton
Lindo, lindo, lindo. Os últimos três capítulos são absolutamente deslumbrantes. Mas preparem os lencinhos, porque rapadura é doce mas né mole não.
Semana passada terminei L’Impero dei Draghi, de Manfredi, o mesmo autor da série Alexandros.
Cacete, que livro chato! QUE LIVRO CHATO! Penei feito uma mula pra terminar. Ô coisa mal escrita! Ô coisa cheia de chavões ridículos! Imaginava que não era uma Brastemp, mas o assunto era interessante – a suposta presença de soldados romanos na China láaaaa nos tempos de D. João Charuto, com todo o choque cultural que isso implicaria – e resolvi arriscar. O cara é professor de arqueologia, conceituado na área, e coisa e tal, fui na fé, achando que pelo menos aprenderia alguma coisa. Péssima idéia. Péssima, péssima, péssima. O livro se arrasta, acontece sempre alguma coisa mas é tudo tão ridiculamente descrito, pontuado com algumas frases de pseudo-filosofia chinesa aqui e ali, que às vezes eu sentia vergonha pelo autor. Tem que ter muita coragem pra publicar um negócio desses, com seu nome na capa. Pensando bem, olhando a cara do sujeito na foto que ocupa toda a traseira do livro, dá pra entender muitas coisas. A barbicha e a franjinha grisalha explicam tu-do.
Pra compensar e esquecer o trauma, comecei The House of Mirth. Só li algumas páginas e já estou adorando. Enquanto isso, Mrs Dalloway está ali quietinha me olhando com ar de reprovação. Comecei, mas não tive paciência de continuar. Juro. Vai ver que não é o momento.
Já agora, deixem-me assinalar aqui uma coisa que pode ter escapado ao pessoal no meio deste entusiasmo todo. Para a esquerda ateia e libertária Ratzinger não faz mossa absolutamente nenhuma. Bem pelo contrário, é uma escolha divertidíssima. Até já voltaram as missas em latim que George Brassens reclamava ("sans le latin, sans le latin / la messe nous emmerde")! Para quem Ratzinger é a pior de todas as escolhas é para os católicos moderados e reformistas. E não estou só a falar dos católicos de esquerda, mas dos próprios católicos liberais de direita: Pedro Mexia ou Andrew Sullivan compreenderam-no bem. E não é por serem menos liberais nem menos católicos. Mas claro que não é Mexia nem Sullivan quem quer: é preciso prezar mais o raciocínio do que o desdém pela esquerda, tarefa manifestamente esgotante.
Rui Tavares, aqui.
Tem mais. Leiam, por favor; eles são ó-te-mos.
Em duas manhãs de fila no banco, fila nos correios, fila no supermercado, sala de espera do contador, sala de aula esperando aluno, comecei e terminei Io Non Ho Paura (Não Tenho Medo), de Niccolò Ammaniti. Virou filme, que eu não vi, mas quero ver. Amei o livro, mas não sei explicar por quê. O estilo é firme, seco e direto, sem nove-horas nem metáforas malucas nem verbos fora de moda (minha irritação com essas coisas deve ser por causa de uma coisa estranha que andei traduzindo ultimamente e me deu um trabalho danado). O cenário é envolvente, embora geograficamente indefinido. A descrição não é excessivamente descritiva, mas eu vi os campos de trigo, senti o cheiro dos porcos malvados, sei como é a panela com maçãs pintadas em vermelho, sei que gosto tinha o macarrão com molho de tomate que o Michele jantou. Os personagens são fortes, os temores são reais, as dúvidas são coerentes, a solução é a única possível.
Pra quem não viu o filme, que se não me engano saiu no Brasil, é a história de Michele, um menino do paupérrimo sul da Itália nos anos 80, que acidentalmente descobre, lá na casa do chapéu, um buraco na terra, com um menino dentro. Mais não digo. Hoje não vamos pegar o DVD do filme porque tem Grissom no canal 6, e amanhã provavelmente rola cinema, mas espero vê-lo em breve, e digo se vale a pena.
Eu acabei não comentando, mas comprei e li vários livros durante a viagem. Vários mesmo. Em Foz comprei Água Viva, da Clarice, que é simplesmente uma das coisas mais chatas, chatas, chatas, chatas que eu já li na minha vida, e tive que me esforçar mooooito pra terminar. Li Bartleby (Melville) no avião de Ushuaia pra Buenos Aires, mas a monga aqui esqueceu o livro no avião. Pelo menos eu já tinha terminado a história. Na livraria ABC, na Florida, em Buenos Aires, comprei Mrs Dalloway, que acreditem ou não eu nunca tinha lido, e um livro novinho mas que estava na seção dos usados porque tinha um furo atrás, Boy – Tales of Childhood, autobiografia da infância do Roald Dahl, por ridículos 14 pesos. Na El Ateneo, maior livraria de Buenos Aires e simplesmente escandalosa de tão grande e well-supplied, comprei vários dicionários, e ainda por cima sorri várias vezes ao dar de cara com clássicos como A Bolsa Amarela e Raul da Ferrugem Azul traduzidos pro espanhol. Numa outra livraria cujo nome esqueci comprei um Stephen King ('Salem's Lot) em língua original por um preço ótimo, a edição do IV centenário de Don Quijote, um livro do Borges, um da Allende e o Bartleby y Compañia que o Alexandre tanto comentou que me deixou curiosa.
Mas isso tudo porque hoje o Papa tá assim digamos a ponto de subir no telhado, e honestamente não dou a mínima, e enquanto hoje eu tomava meu café da manhã li o seguinte capítulo, que transcrevo integralmente:
"The Headmaster, while I was at Repton, struck me as being a rather shoddy bandy-legged little fellow with a big bald head and lots of energy but not much charm. Mind you, I never did know him well because in all those months and years I was at the school, I doubt whether he addressed more than six sentences to me altogether. So perhaps it was wrong of me to form a judgement like that.
What is so interesting about this Headmaster is that he became a famous person later on. At the end of my third year, he was suddenly appointed Bishop of Chester and off he went to live in a palace by the River Dee. I remember at the time trying to puzzle out how on earth a person could suddenly leap from being a schoolmaster to becoming a Bishop all in one jump, but there were bigger puzzles to come.
From Chester, he was soon promoted again to become Bishop of London, and from there, after not all that many years, he bounced up the ladder once more to get the top job of them all, Archbishop of Canterbury! And not long after that it was he himself who had the task of crowning our present Queen in Westminster Abbey with half the world watching him on television. Well, well, well! And this was the man who used to deliver the most vicious beatings to the boys under his care!
By now I am sure you will be wondering why I lay so much emphasis upon school beatings in these pages. The answer is that I cannot help it. All through my school life I was appalled by the fact that masters and senior boys were allowed literally to wound other boys, and sometimes quite severely. I couldn’t get over it. I never have got over it. It would, of course, be unfair to suggest that all masters were constantly beating the daylights out of all the boys in those days. They weren’t. Only a few did so, but that was quite enough to leave a lasting impression of horror upon me. It left another more physical impression upon me as well. Even today, whenever I have to sit for any length of time on a hard bench or chair, I begin to feel my heart beating along the old lines that the cane made on my bottom some fifty-five years ago.
There is nothing wrong with a few quick sharp tickles on the rump. They probably do a naughty boy a lot of good. But this Headmaster we were talking about wasn’t just tickling you when he took out his cane to deliver a flogging. He never flogged me, thank goodness, but I was given a vivid description of one of these ceremonies by my best friend at Repton, whose name was Michael. Michael was ordered to take down his trousers and kneel on the Headmaster’s sofa with the top half of his body hanging over one end of the sofa. The great man then gave him one terrific crack. After that, there was a pause. The cane was put down and the Headmaster began filling his pipe from a tin of tobacco. He also started to lecture the kneeling boy about sin and wrongdoing. Soon, the cane was picked up again and a second tremendous crack was administered upon the trembling buttocks. Then the pipe-filling business an the lecture went on for maybe another thirty seconds. Then came the third crack of the cane. Then the instrument of torture was put once more upon the table and a box of matches was produced. A match was struck and applied to the pipe. The pipe failed to light properly. A fourth stroke was delivered, with the lecture continuing. This slow and fearsome process went on until ten terrible strokes had been delivered, and all the time, over the pipe-lighting and the match-striking, the lecture on evil and wrongdoing and sinning and misdeeds and malpractice went on without a stop. It even went on as the strokes were being administered. At the end of it all, a basin, a sponge and a small clean towel were produced by the Headmaster, and the victim was told to wash away the blood before pulling up his trousers.
Do you wonder then that this man’s behaviour used to puzzle me tremendously? He was an ordinary clergyman at that time as well as being Headmaster, and I would sit in the dim light of the school chapel and listen to him preaching about the Lamb of God and about Mercy and Forgiveness and all the rest of it and my young mind would become totally confused. I knew very well that only the night before this preacher had shown neither Forgiveness nor Mercy in flogging some small boy who had broken the rules.
So what was it all about? I used to ask myself.
Did they preach one thing and practise another, these men of God?
And if someone had told me at the time that this flogging clergyman was one day to become the Archbishop of Canterbury, I would never have believed it.
It was all this, I think, that made me begin to have doubts about religion and even about God. If this person, I kept telling myself, was one of God’s chosen salesmen on earth, then there must be something very wrong about the whole business."
Boy – Tales of Childhood (Roald Dahl)
Por tudo o que já li dele, sempre soube que foi uma pessoa extraordinária. Essa biografia revela que não só ele, mas sua família e sua vida também foram extraordinárias. Logo depois desse capítulo vem um chamado "Chocolate". Por isso tudo e pelas fotos e por tantas outras coisas, recomendo ardentemente que vocês leiam Boy. E tudo o mais que esse homem escreveu.
E essa transcrição dedico humildemente (ma non troppo) ao Cris Dias, pra ver se ele acorda pra vida e volta a escrever os ótimos posts polêmicos que sumiram do blog por razões perfeitamente compreensíveis, mas que fazem falta, ah, fazem!
Anna Tropeano se n’era appena andata via che la porta della càmmara del commissario si spalancò battendo contro la parete e Catarella trasì a palla allazzata.
"La prossima volta che entri così, ti sparo. E tu lo sai che parlo sul serio" fece calmissimo Montalbano.
Catarella però era troppo eccitato per darsene pinsèro.
"Dottori, ci voleva dire che mi hanno acchiamato dalla Quistura di Montilusa. S'arricorda che le dissi di quel concorso d'informaticcia? Accomincia lunedì matino e io mi devo apprisintari. Come farete senza di mia al tilifono?"
"Sopravviveremo, Cataré."
"A dottori dottori! Lei mi disse di non distrupparlo a mentre che parlava con la signora e io obbediente fui! Ma arrivò uno sdilluvio di tilifonate! Tutte le scrissi a sopra di questo pizzino."
"Dammelo e vattene."
Su una pagina di quaderno malamente strappata c’era scritto: "Ano tilifonato Vizzallo Guito Sera falle Losconte suo amicco Zito Rotonò Totano Ficuccio Cangialosi novamente di novo Sera falle di bolonia Cipollina Pinissi Cacomo".
Montalbano cominciò a grattarsi in tutto il corpo. Doveva trattarsi di una misteriosa forma d'allergia, ma ogni volta ch'era costretto a leggere uno scritto di Catarella lo pigliava un prurito irresistibile. Con santa pazienza decrittò:
Vassallo, Guido Serravalle l'amante bolognese di Michela, Loconte che vendeva stoffe per tende, il suo amico Nicolò Zito, Rotondo il mobiliere, Todaro quello delle piante e giardini, Riguccio l’elettricista, Cangelosi che aveva invitado a cena Michela, di nuovo Serravalle. Cipollina, Pinissi e Cacomo, ammesso e non concesso che si chiamassero così, non sapeva chi fossero, ma era facile supporre che avessero telefonato perché amici o conoscenti della vittima.
La Voce del Violino, Andrea Camilleri.
In-tra-du-zí-vel.
Domingo de manhã, enquanto o Mirco não acordava, li The BFG, de Roald Dahl, que é muito divertido. Imagino que traduzir aquilo deve ser um castigo dos infernos, porque os neologismos e jogos de palavra são numerosíssimos, e interessantíssimos. Concordo pRenamente com o Alexandre: se você não fala Inglês, está morto para o mundo, meu amor. Sorry.
Depois do almoço na Arianna passamos no Gianni pra acertar umas contas, e depois fomos pra casa. Fiquei passando roupa até a hora do jantar, e chapamos vendo 12 Monkeys. Nunca consegui ver esse filme inteiro, impressionante.
E comecei The Old Man And The Sea, de Hemingway, que estou custando a ler por falta de capacidade de concentração. Minhas mãos ainda estão doendo, mesmo depois do fim de semana sem nem tocar no computador, mas vou ter que agüentar a onda porque tenho 40 páginas pra entregar antes de partir pra Argentina. Ui.
"Posso permettermi di farle una domanda?... Poi gliene farò altre, di altra natura... Nei componimento d'italiano lei mi assegnava sempre un tre, perché copiavo. Ma una volta mi ha dato un cinque: perché?"
"Perché aveva copiato da un autore più inteligente".
Il magistrato scoppiò a ridere. "L'italiano: ero piuttosto debole in italiano. Ma, come vede, non è poi stato un gran guaio: sono qui, procuratore della Repubblica..."
"L'italiano non è l'italiano: è il ragionare" disse il professore. "Con meno italiano, lei sarebbe forse ancora più in alto".
La battuta era feroce. Il magistrato impallidì. E passò a un duro interrogatorio.
**
- Posso permitir-me de fazer-lhe uma pergunta?... Depois lhe farei outras perguntas, de outra natureza... Nas redações de italiano o senhor me dava sempre nota três, porque eu copiava um texto já publicado. Mas uma vez o senhor me deu um cinco. Por quê?
- Porque aquela vez o senhor tinha copiado de um autor mais inteligente.
O juiz começou a rir. – Italiano... Eu era bem fraquinho em italiano. Mas, como o senhor pode ver, no final das contas não foi um grande problema: cá estou eu, procurador da República...
- O italiano não é o italiano: é o raciocínio – disse o professor. – Com menos italiano, o senhor talvez tivesse ido até mais longe.
O gracejo fora feroz. O juiz empalideceu. E passou a um duro interrogatório.
Una Storia Semplice, Leonardo Sciascia.
Falando em ler, semana passada terminei Great Expectations, que recomendo com fervor. Comecei os contos de Lampedusa, mas não consigo ler mais que meia página sem ter que levantar pra fazer alguma coisa importante ou sem cair no sono (não porque é chato, mas porque estou exausta mesmo). Estou gostando, mas ainda não identifiquei nenhum trecho particularmente brilhante pra compartilhar. Só que fiquei com vontade de reler Il Gattopardo, que eu li em Português há muito tempo. Lembro de ter absolutamente adorado, e imagino que vá adorar ainda mais, lendo em língua original e entendendo um pouco mais da realidade do livro, já que hoje sei mais sobre a Sicília e a história da Itália do que quando o li pela primeira vez. Vou ter que comprar, porque não tenho.
Também fiquei com vontade de ler outras coisas do Roald Dhal. Como meus alunos Três Mosqueteiros são muito legais (todos os três usam agendas Moleskine, aaaaah!) e têm um gosto literário bem parecido com o meu, decidi ler com eles um conto do Roald Dhal em aula hoje. Escolhi The Way Up To Heaven, que eu amo. Compartilho: (não é uma delícia a cafonice dessa palavra, "compartilhar"?)
"All her life Mrs Foster had had an almost pathological fear of missing a train, a plane, a boat, or even a theatre curtain. In other respects, she was not a particularly nervous woman, but the mere thought of being late on occasions like these would throw her into such a state of nerves that she would begin to twitch. It was nothing much: just a tiny vellicating muscle in the corner of the left eye, like a secret wink, but the annoying thing was that it refused to disappear until an hour or so after the train or plane or whatever it was had been safely caught.
It was really extraordinary how in certain people a simple apprehension about a thing like catching a train can grow into a serious obsession. At least half an hour before it was time to leave the house for the station, Mrs Foster would step out of the elevator all ready to go, with hat and coat and gloves, and then, being quite unable to sit down, she would flutter and fidget about from room to room until her husband, who must have been well aware of her state, finally emerged from his privacy and suggested in a cool dry voice that perhaps they had better get going now, had they not?
Mr Foster may possibly have had a right to be irritated by this foolishness of his wife's, but he could have had no excuse for increasing her misery by keeping her waiting unnecessarily. Mind you, it is by no means certain that this is what he did, yet whenever they were to go somewhere, his timing was so accurate just a minute or two late, you understand and his manner so bland that it was hard to believe he wasn't purposely inflicting a nasty private little torture of his own on the unhappy lady."
The Way Up To Heaven, by Roald Dahl
Façam um favor a vocês mesmos e vão comprar um livro de contos (o meu é Completely Unexpected Tales) dele ou vão catar o conto na internet. Não vou dar o final do conto aqui pra não estragar a surpresa. Vale a pena.
Quinta passada terminei The Great Gatsby, várias vezes começado e só agora terminado. Sinceramente, não achei nenhuma Brastemp. E logo depois, porque eu sou chain-reader e quando vejo que o que eu estou lendo está terminando pego logo outro, pra não entrar em abstinência, comecei Great Expectations. Confesso, não sem um tico de vergonha, que nunca tinha lido Dickens. Como esse ano estou num período de amores pelos clássicos, e como trouxe do Rio um monte de Penguin Popular Classics daqueles comprados a 5 reau nas feirinhas de livro da Nossa Senhora da Paz e na Afonso Pena, onde mora minha avó, pelo menos o primeiro semestre vai ser mesmo de ataque aos clássicos. Depois veremos.
"That was a memorable day to me, for it made great changes in me. But it is the same with any life. Imagine one selected day struck out of it, and think how different its course would have been. Pause you who read this, and think for a moment of the long chain of iron or gold, of thorns or flowers, that would never have bound you, but for the formation of the first link on one memorable day."
Great Expectations, Charles Dickens
The Invasion Myths
Eire, or Ireland, is named after the Celtic goddess, Eriu. Irish mythology describes a series of invasions which led to the establishment of Celtic Ireland, summarized in the mediaevel Lebor Gabala Erenn ("Book of Invasions of Ireland"). The invading tribes were, in succession, the Cessair, the Partholon, the Nemed, the Fir Bolg, the Tuatha de Danann and, lastly, the sons of Mil Espane, or Milesians. Eriu was a goddess of the divine race of the Tuatha de Danann, or People of the Goddess Danu. She and two other goddesses, Banbha and Fodla, each extracted a promise from the conquering Milesians that Ireland would henceforth take its name from her and her alone. The fili ("poet" or "visionary") Amhairghin (Amergin) reassured Eriu that Ireland would be named after her; in return, she promised that the sons of Mil Espane would rule Ireland for all time. The Tuatha de Danann retreated to the dark and secret places, caves, forests, burial chambers, under the waves of the sea, beneath the hillsides, under the streams, where they still live to this day as faery folk.
(...)
The Cessair were a tribe of Amazons, or goddess-women, who invaded Ireland before the time of the Great Flood. Their leader was Cessair, supposedly a great-granddaughter of the Biblical Noah. When the Flood came, the only member of the Cessair to survive was a male god, Fintan, who was Cessair's consort. He survived because he had the power of shape-shifting: he became a salmon, an eagle and a hawk; he spent the first year of the Flood living under the waters in a cave called "Fintan's Grave". He lived to Christian times, was a witness to all the succeeding invasions, and was therefore the supreme authority for all questions of history or tradition.
After the Cessair came the Partholon, also named after an individual. (...) Nemed was the leader of the next group of invaders, the Nemed. After internal disputes, they abandoned the country. (...) The Fir Bolg (men of the Belgae) were descendants of the Nemed. They were still in possession of the land when the next wave, the Tuatha de Danann, arrived. The Fir Bolg were defeated at the First Battle of Mag Tuired and forced to flee to the islands, notably Islay, Arran, Man and Rathlin. During this battle, Nuadu, king of the Tuatha, had his arm severed. The blemish meant that he could no longer be king, and a prolonged contention over rights of sovereignty ensued.
The Tuatha de Danann were wizards and magicians who had learned their arts by living in the remotest northern islands of the world. They had four inestimable treasures: the Great Fal was a prophetic stone, which uttered a cry when, and only when, it was touched by the future king of Ireland (cf. the Arthurian legend of the sword in the stone); the spear of Lugh guaranteed victory to whoever held it; the sword of Nuadu could not be escaped, once it had been drawn from its scabbard; and the cauldron of the Dagda ("good god") was inexhaustible, so that no company could ever leave a feast unsatisfied. All the other invasions had been sea-borne, but the Tuatha de Danann, using their magic, flew to Ireland in dark rain clouds and were literally rained on to the mountain of Conmaicne Rein in Connaught, where their falling obscured the sun for three full days. The greatest of the Tuatha de Danann became Ireland's gods and goddesses: Danann herself, mother of the gods, and Lugh, Nuada and the Dagda, already mentioned; the Morrigan ("Great Queen"), goddess of battle and the Dagda's consort; Brigit, goddess of light and fire, daughter of the Dagda; Manannan Mac Lir ("son of the sea"), who gave his name to the Isle of Man; Dian Cecht, the "sage of leechcraft" and god of healing; and many others.
The Second Battle of Mag Tuired was fought by the Tuatha de Danann against the Fomoire or Fomori, a race of grotesque giants. They were led by Cichol Gricenchos Mac Goll, whose mother, Lot, had lips in her single breast and four eyes in the back of her head.
(...)
While the Tuatha de Danann and the Fomori were still at war, the last invasion came. This was led by Mil Espane (Milesius of Spain), so that the tribe he led is called either Sons of Mil Espane or, more simply, Milesians. The legends give the date of this invasion as a thousand years before Christ. It seems strange to think of most modern Irish people as being descended from Spaniards - we are reminded of Tacitus's geographical error in placing Spain to the west of Ireland. However, the legendary accounts all agree that the Milesians were, indeed, the last race to conquer Ireland. Moreover, they were a mortal race, whereas the Tuatha de Danann and the Fomori, who were never entirely banished from the island, were gods and magicians.
Kingdoms of the Celts - a History and Guide, John King
Os negritos e sublinhados são meus. Não é uma coisa linda de morrer?
Eu juro que comecei a ler Delitto e Castigo, pra acompanhar o clube de leituras do maldito Alexandre, que fica botando minhocas literárias na minha cabeça. Mas não estou com muito saco pra ler em italiano ultimamente. Talvez porque eu esteja entrando em uma nova fase Irlanda da minha vida (já passei por várias). Desencavei uns livros que eu trouxe do Rio e que nem lembrava mais que tinha, e no momento estou lendo Kingdoms of the Celts – A History and Guide, de John King. Não tenho a menor idéia de quem é John King, se tem cacife pra falar desse assunto, se o livro pode ser levado a sério, mas eu realmente adoro esse assunto e gosto muito desse livro. Em breve contarei a história de Queen Medb e King Ailil, uma das minhas preferidas. E esse ano pretendo, de verdade, ir à Irlanda.
E o livro do dia, e primeiro do ano, foi Matilda, de Roald Dahl. Já devo ter falado aqui de Roald Dahl umas trezentas vezes; adoro tudo o que ele escreve. Pena que só fui descobri-lo quando já era adolescente e estudava no Britannia. Não há livros melhores pra crianças espertas do que os seus. Um humor negro, uma sinceridade, umas analogias simplesmente geniais. Compartilho:
Capítulo 1 – The Reader of Books
It's a funny thing about mothers and fathers. Even when their own child is the most disgusting little blister you could ever imagine, they still think that he or she is wonderful.
Some parents go further. They become so blinded by adoration they manage to convince themselves their child has qualities of genius.
Well, there is nothing very wrong with all this. It's the way of the world. It is only when the parents begin telling us about the brilliance of their own revolting offspring, that we start shouting, 'Bring us a basin! We’re going to be sick!'
School teachers suffer a good deal from having to listen to this sort of twaddle from proud parents, but they usually get their own back when the time comes to write the end-of-term reports. If I were a teacher I would cook up some real scorchers for the children of doting parents. 'Your son Maximilian,' I would write, 'is a total wash-out. I hope you have a family business you can push him into when he leaves school because he sure as heck won't get a job anywhere else.' Or if I were feeling lyrical that day, I might write, 'It is a curious truth that grasshopers have their hearing-organs in the sides of the abdomen. Your daughter Vanessa, judging by what she's learnt this year, has no hearing-organs at all.'
I might even delve deeper into natural history and say, 'The periodical cicada spends six years as a grub underground, and no more than six days as a free creature of sunlight and air. Your son Wilfred has spent six years as a grub in this school and we are still waiting for him to emerge from the chrysalis.' A particularly poisonous little girl might sting me into saying, 'Fiona has the same glacial beauty as an iceberg, but unlike the iceberg she has absolutely nothing below the surface.' I think I might enjoy writing end-of-term reports for the stinkers in my class. But enough of that. We have to get on.
Matilda (Roald Dahl)
We know, again from the Gospels, the hatred of the Jews of the first century for the Roman tax collectors. By the time of Ausonius [sec. IV] that hatred was universal. But now I must ask a great concession of my readers: to pity the poor tax man, whose life was far more miserable than the lives of those who suffered his exactions. The tax man, or curialis, was born that way: Can you imagine the dawning horror on realizing that you were born into a class of worms who were expected to spend their entire adult life spans collecting taxes from their immediate neighbors - and that there was no way out?
But this was only the beginning of the horror. Whatever the curiales were unable to collect they had to make good out of their own resources! Who were these wretches, and how were they assigned their doom?
***
E agora fiquei com vontade de ler os outros livros da série Hinges of History. E esse também, que não faz parte da série mas tem cara de ser bom.
Vejam bem, não são tratados de História; são introduções, pontos de partida pra quem não sabe nada do assunto e quer saber mais. A narrativa é deliciosa, as curiosidades são muitas, a ironia é tanta. A-DO-RO.
I - The End of the World
How Rome Fell -
and Why
On the last, cold day of December in the dying year we count as 406, the river Rhine froze solid, providing the natural bridge that hundreds of thousands of hungry men, women, and children had been waiting for. They were the barbari - to the Romans an undistinguished, matted mass of Others, not terrifying, just troublemakers, annoyances, things one would rather not have to deal with - non-Romans. To themselves they were, presumably, something more, but as the illiterate leave few records, we can only surmise their opinion of themselves.
...
Inspecting the Roman soldiers now, we note the quiet authority of their presence, the polish of their person, the appropriateness of their stance - they are spiffy. More than this, there is an esthetic to each gesture and accountrement. All details have been considered - ad unguem, as they would say, to the fingertip, as a sculptor tests the smoothness and perfection of this finished marble. Their hair is cut with a thought to the shape of the head, they are clean-shaven to show off the resoluteness of the jawline, their dress - from their impregnable but shapely breastplates to their easy-movement skirts - is designed with the form and movement of the body in mind, and their hard physiques recall the proportions of Greek statuary. Even the food in the mess is prepared to be not only savory to the taste but attractive to the eye. Just now the architriclinus - the chef - is beginning to prepare the carrots: he slices each piece lengthwise, then lengthwise again, to achieve slender, elongated triangles.
We look out across the river to the barbarian hosts, who in the slanting, gray light of winter mass like figures in a nightmare. Their hair (both of head and face) is uncut, vilely dressed with oil, braided into abhorrent shapes. Their bodies are distorted by ornament and discolored by paint. Some of the men are huge and muscular to the point of deformity, their legs wrapped comically in the garments called braccae - breeches. There is no discipline among them: they bellow at each other and race about in chaos. They are dirty, and they stink. A crone in a filthy blanket stirs a cauldron, slicing roots and bits of rancid meat into the concoction from time to time. She slices a carrot crosswise up its shaft, so that the circular pieces she cuts off float like foolish yellow eyes on the surface of her brew.
How the Irish Saved Civilization, Thomas Cahill
***
O que eu não daria pra ver esse evento ao vivo!
XV
O rapaz acordou muito bem disposto no outro dia, estava, ou pelo menos parecia, restabelecido completamente. Os ares tonificantes de Santa Teresa produziram-lhe efeitos miraculosos.
- Até que enfim podia mandar ao diabo os xaropes e as tisanas que, de tempos a essa parte, lhe melancolizavam a vida e relaxavam o estômago. E, ainda metido entre os lençóis, na matinal preguiça das sete e meia, dispunha-se a filosofar sobre o ridículo episódio da véspera, quando um leve rumor na porta do quarto lhe desviou o curso das idéias. Era a menina que trazia o café.
Viu-lhe a pálida mãozinha medrosamente sordir por entre a fisga da porta mal cerrada, para depôr no chão, como era de costume, a chávena de porcelana. Amâncio, porém, desta vez saltou da cama e, correndo de gatinhas, a empolgou nas suas.
A mãozinha quis fugir, ele não consentiu, e com ela veio um braço que as folhas da porta arremangavam.
Começou a beijá-lo sofregamente, desde a ponta dos dedos até os biceps; enquanto Amélia, sempre escondida ia consentindo, toda ela arrepiada em cócegas.
- Um beijinho... pediu ele, mostrando o rosto.
- Logo!
- Com certeza?...
- Com certeza!
E a pequena desapareceu muito ligeira, - tique, tique, tique, pela escada.
Pouco depois combinaram a primeira entrevista. Ela subiria ao sótão, logo que a casa estivesse completamente recolhida. Amâncio que a esperasse no escuro e com a porta do quarto apenas cerrada.
O rapaz não pôde ficar tranqüilo nem mais um instante.
As horas nunca lhe pareceram tão longas e as conversas tão intermináveis. Um sobressalto feliz perturbava-o todo, tirava-lhe o apetite e não lhe permitia um pensamento que não fosse cair aos pés de Amélia.
Por maior caiporismo, o Dr. Tavares tinha essa noite uma visita que parecia disposta a não largá-lo. Era um velho de sua província, muito falador de política, apaixonado pelas eleições, pelos conservadores, mas que, nem à mão de Deus Padre, pronunciava os rr e os ss e dizia: "Os partido liberá, os senadô", e outras barbaridades.
- Quando se irá este cacete?... pensava Amâncio, trêmulo de impaciência.
E o Tavares a puxar pelo demônio do homem, a fazer-lhe perguntas sobre perguntas e a despejar contra ele a sua retórica inexaurível.
Até o guarda-livros que às vezes passava dias e dias sem dar uma palavra, estava essa noite disposto a falar pelos cotovelos. Ainda pilhara o chá e, repimpado na cadeira, com um brilhante a luzir num dedo, o ar satisfeito, os punhos bem engomados, taramelava a respeito dos seus projetos de casamento. "Sim, que ele, havia coisa de ano e meio, estava para desposar uma linda menina e de educação esmeradíssima. Já há que tempos a pedira!... Só esperava que a casa, onde trabalhava desde os seus quinze anos, lhe desse sociedade, como aliás, havia já prometido. – Ah! Toda a sua ambição era fazer família! Que vidinha melhor que a do casado?... o matrimônio era um complemento do homem... A gente enquanto moça não sentia a falta da esposa, mas depois?... quando chegasse a velhice?... Aí é que seriam elas! Não! não podia admitir um eterno celibato!... A vida do solteiro tinha seus encantos, tinha, para que negar?... os espinhos, porém, eram em maior número; se eram!..."
E citava os casos.
Amâncio retirou-se da varanda, sufocado de raiva. Preferia esperar no quarto.
Deram onze horas. Amelinha pediu licença e também se recolheu. Mme. Brizard, à cabeceira da mesa, já bocejava, entretendo os dedos a fazer pílulas das migalhas de pão que ficaram do chá; o marido, ao lado dela, estudava mecânica racional.
Veio finalmente o copeiro levantar a mesa e buscar o César para a cama. O guarda-livros apertou as mãos de todos e sumiu-se; o sujeito dos partido liberá, a despeito das insistências do amigo, despediu-se igualmente e, quando o advogado, que o fora acompanhar até o portão da chácara voltou à varanda, já não encontrou ninguém.
Em pouco a casa era toda silêncio e trevas. Então, Amelinha, deixou o quarto sorrateiramente, tirou as botinas, apanhou as saias e galgou a escada do sótão.
Amâncio, que a esperava na porta, logo que a teve ao alcance da mão, puxou-a para dentro, e deu uma volta à fechadura.
Casa de Pensão, Aluísio Azevedo
Editora Ática, 2a edição
A merda do Alexandre é que ele fica falando desses livros malditos e eu fico com vontade de não fazer mais coisa nenhuma da vida a não ser ler. Miserável.
Terminei How To Be Good, de Nick Hornby – o mesmo de High Fidelity, aquele que é uma das coisas mais engraçadas que eu já li na vida e me fez gargalhar sozinha em plena Piazza della Cisterna em San Gimignano. Não é uma Brastemp, esse último livro. Tem seus momentos, mas não é lá essas coisas. Agora queria ler About a Boy, sempre dele, do qual já ouvi falar muito bem. Aliás, queria ler várias outras coisas – não sei se vocês repararam, mas clicando ali em cima no "read" de "will read for food" vocês vão parar numa longuíssima wishlist da Amazon inglesa.
Hint hint.
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Falando em livrinhos, há coisas boas pintando, muito boas. Aguardem e confiem.
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O trabalho vai bem, obrigada. Dou aulas de Português pra uma bichinha simpática que comprou casa em Natal, e de Inglês pra um endocrinologista em Perugia e pra um médico do trabalho e sua filha pequena que faz bico pra falar Inglês e me faz morrer de rir. A coisa importante é que eu me divirto dando aula. O endocrinologista é meio cri-cri, mas os outros alunos são engraçados e damos muita risada nas aulas. Agora parece que vou ter que fazer ditado (don't ask.) pra uma estudante de Letras Português-Italiano que estudou em Portugal e no começo não queria nada comigo, porque precisava de um lusitano de verdade, mas visto que a oferta de portugueses aqui na área é escassa, pra não dizer ausente, vai acabar me encarando. A tese dela é sobre literatura portuguesa (ou de língua portuguesa, não sei direito porque a outra bichinha simpática, o coordenador pedagógico do curso, não me deu detalhes), não sei exatamente de qual período. Aqui comigo tenho O Cortiço, Casa de Pensão e uns contos do Machado. Vamos ver o que vai rolar.
Dali a dois dias o satélite espião subiu, parou sobre a Amazônia, e, com os cheiros de Edmundo, Bolachão, Berenice, Pituca e Hugo Ciência computados no cérebro eletrônico, começou a cheirar.
O primeiro cheiro que chegou foi o do Redimir, dez dias sem tomar banho e cortando cebola: o satélite vomitou.
O cheiro de um prefeito, gesticulante, fazendo discurso num palanque, em Alagoas, foi descomputado, mas fez o satélite ter engulho.
"Como fede esse Brasil" – pensou o satélite espião.
***
O gordo tirou o tênis do pé direito e colocou na cabeça.
Ninguém queira saber o que é chulé de pé de gordo, entranhado num tênis que levou suor de pé de gordo durante 27 dias, na floresta mais quente do mundo. Edmundo, Berenice, Pituca e Hugo Ciência taparam o nariz, saíram correndo, dois gambás desmaiaram, uma jaguatirica teve um troço. Para o coitado do satélite cheirador, de centros olfativos supra-sensíveis, foi um fuá: a catinga do chulé do pé do gordo queimou os transistores, queimou as resistências, queimou os fusíveis, queimou os sensores, o chulé entrando lá dentro, o chulé chulezando tudo, o chulé esculhambando tudo, o satélite começou a fungar, o satélite começou a tossir, começou a sair uma fumacinha – o satélite explodiu.
***
- Você é muito bonita, minha paulista. Qual destes heróis é teu namorado?
- É o gordo.
- Ah! Este gordo é um corisco – disse o frade. – Explode satélites, conquista mulheres, o único defeito é que demora muito pra tomar banho.
***
O frade chegou na margem, e Tum-Tum, era braçadada de cruz em cada lancha, as lanchas quebravam ao meio, pulavam baços, rins, fígados, olhos, dentes, maxilares, omoplatas, pâncreas, orelhas, joelhos, bexigas, dedos do pé, dedos da mão, pomos de Adão, artelhos, aortas. Michael Pat se atirou n'água, quando fez que ia nadar, reparou que estava sem pulmão, afundou e morreu.
Sangue Fresco, João Carlos Marinho.
- Eu disse.
- Senhor gerente – interrompeu o Mister. – Mim ser um homem muitíssimo do calmo, mim só perder o meu paciência uma vez no vida com uma bandida espanhol que amarrar mim numa cadeira me dar um tiro no meu barriga e depois jogar um balde de água fervendo no meu cabeça. Mas a senhor estar muito chato, senhor gerente, se a senhor repetir mais uma vez "eu disse" mim dar um tapa no seu cara.
- Estou apenas lembrando que tinha razão quando adverti sobre o perigo de meter crianças com bandidos. O senhor está procurando me intimidar com a violência e eu estou argumentando com a razão. A lógica do meu raciocínio é perfeita, só mesmo um louco não entende a verdade do que eu disse: criança em investigação é perigoso, seu Tomé não tinha o direito de deixar, e tanto estava errado que foi tudo escondido dos pais. E os fatos comprovam meu pensamento; o gordo pode até escapar mas corre perigo e não temos direito de pôr os filhos dos outros em risco. Eu argumento com razão, seu Mister.
- Senhor gerente, a história do mundo mostrar que os chatos ser bichos muito lógicos e ter sempre razon. Mas a problema fundamental do vida non ser ter razon, a problema fundamental do vida ser non ser chata.
O Gênio do Crime, João Carlos Marinho
Ando lendo muito ultimamente, embora o tempo disponível seja pouco, com todo o trabalho na oficina e coisa e tal.
No Rio comprei váaaaarios livros mas esqueci de ir anotando o que ia lendo, como costumo fazer. Na Primavera dos Livros comprei Três Contos, de Flaubert, por indicação da mãe da Newlands; gostei. Sempre por indicação dela comprei Baú de Ossos, de Pedro Nava, que ainda não comecei. Comprei Bibliofilia, sempre um continho do Flaubert – o primeiro. Gostei. Comprei um outro cujo nome esqueci, de contos sobre a paixão pelos livros, e que inclui uma outra tradução desse Bibliofilia. Na Travessa, comprei Dois Irmãos, de Milton Hotoum, interessante. Comprei O Vendedor de Passados, do badaladíssimo Agualusa, e não achei nada de especial. Li uma compilação de velhos contos do Stephen King que achei embaixo do piano. Uma merda! A tradução não parecia ser muito ruim, mas os contos velhos dele incluem sempre uma criatura estranha, uma coisa meio Lovecraft amadora, não gostei não. Comprei e li A Louca da Casa, de Rosa Montero, muito, muito legal.
Dos muitos livros que eu trouxe pra cá, reli Belgarath the Sorcerer, e estou relendo o segundo livro da série The Belgariad, sempre de David Eddings. Gosto muito dessa série (são 5 livros), mas todas as outras sagas desse autor são exatamente iguais e patéticas, e Polgara the Sorceress é uma cópia chata do Belgarath. Trouxe O Cortiço, que eu amo e já li vinte mil vezes. Trouxe algumas coisas de Tolkien, que esse ano ainda não reli. Trouxe vários Penguin Classics, aqueles de cinco reau, ótimos. Trouxe Sostiene Pereira, de Antonio Tabucchi, um livro ó-te-mo recomendado pelo professor de literatura da Università per Stranieri. Trouxe e já reli compilações de contos de Asimov. Trouxe e quero reler logo The Fionavar Tapestry, trilogia de Guy Gavriel Kay, e How the Irish Saved Civilization, um dos livros mais interessantes que já li. Trouxe vários livros da Sark. Trouxe Negrinha, do Monteiro Lobato, presente sentimental da minha mãe quando eu era adolescente. Trouxe O Gênio do Crime, de João Carlos Marinho, divertidíssimo – até hoje. Trouxe La Vita Quotidiana nel Medioevo, de Delort, interessantíssimo retrato do dia-a-dia na Idade Média. Trouxe Marcovaldo, do Calvino, o livro mais delicioso do mundo. Trouxe uns do Sciascia que quero reler, porque quando li a primeira vez meu italiano era árido e não me permitia entender o siciliano, que aprendi com Camilleri. Trouxe uns contos do Machado. Uns Asterix em italiano. Um livro com fotos de filhotes de cachorros, What Puppies Do. Tem uma foto pra cada verbo, e é uma gostosura.
Trouxe minha amada coleção de marcadores de livros. Eu fico tirando fotos da minha coleção de meias coloridas, mas esqueci o monte de marcadores de livros que eu tenho. Amo! Em todo lugar que eu vou sempre compro cartões-postais, principalmente porque minhas fotos são tão ridículas que vale mais a pena comprá-las prontas, e marcadores de livros. Canetas coloridas também make my day.
Eu sou chata, mas é tão fácil me agradar que às vezes até eu me espanto. Basta uma barrinha de cereais Trio brigadeiro pra eu ficar contente pelo resto do dia.
Como prometido, falo rapidinho sobre o Autograph Man, que a Flabb me deu de presente. Não gostei. Ela mesmo me disse que leu esse antes e o White Teeth depois, e achou o White Teeth infinitamente melhor. Concordo pRenamente: White Teeth é uma das melhores coisas que eu já li na vida. Mas no Autograph Man a mocinha errou a mão. O livro é completamente sem pé nem cabeça e as personagens não têm carisma nenhum – nem pro bem e nem pro mal. E a fórmula de mistureba étnica já anda repetitiva. Chinês judeu e preto judeu juntos num livro inteiro não têm graça nenhuma.
Ontem terminei What it means to be 98% chimpanzee. Achei tão arrogante! Tão cheio de lugares-comuns! Mas também tem pontos de vista interessantes, e algumas boas tiradas, que eu, burra que sou, esqueci de marcar pra colocar aqui e agora não consigo mais achar.
E hoje acordei cedo, li metade de Survivor (Chuck Palahniuk), fui fazer faxina enquanto o Mirco foi pra oficina inventar um bebedouro pra adaptar ao garrafão de 5 litros de água mineral que eu descobri na Coop por € 0,60, tomei banho, corri pra varanda pra tirar as flores da chuva fortíssima, e aproveitei que o almoço era ridículo (pappardelle all’uovo com molho pronto de faisão) pra continuar lendo. No final da tarde Mirco partiu pra Milão pra fazer outro curso como o do ano passado, quando eu o acompanhei e aproveitei pra conhecer a Simone. FeRnanda e Fabião passaram aqui pra checar e-mail, já que em Ripa ainda não há ADSL e de qualquer forma o computador deles ainda não foi ligado por falta de espaço. Agora há pouco, lá pras nove, terminei Survivor. Sabe que eu gosto do estilo desse cara? Tudo muito absurdo, meio realismo fantástico, mas nessa ele acaba mandando muito bem. A paginação do livro é toda ao contrário, a numeração dos capítulos idem. Achei o livro muito legal.
The Prayer for a Parking Space
Oh, divine and merciful God,
History is without equal for how much I will adore
You, when You give me today, a place to park.
For You are the provider.
And You are the source.
From You all good is delivered.
Within You all is found.
In Your care will I find respite. With Your
Guidance, I will find peace.
To stop, to rest, to idle, to park.
These are Yours to give me. This is what I ask.
Amen.
You realize there’s no point in doing anything if nobody’s watching.
You wonder, if there had been a low turnout at the crucifixion, would they have rescheduled?
You realize the agent was right. You’ve never seen a crucifix with a Jesus who wasn’t almost naked. You’ve never seen a fat Jesus. Or a Jesus with body hair. Every crucifix you’ve ever seen, the Jesus could be shirtless and modeling designer jeans or men’s cologne.
(...)
Because the only difference between a suicide and a martyrdom really is the amount of press coverage.
If a tree falls in the forest and nobody is there to hear it, doesn’t it just lie there and rot?
And if Christ had died from a barbiturate overdose, alone on the bathroom floor, would He be in Heaven?
Li Dracula (o original de Bram Stocker) há alguns anos e, honestamente, é um dos melhores livros que eu já li na minha vida. Tem muito pouco a ver com o que estamos acostumados a assistir no cinema – dá muito, MUITO mais medo. Bem escrito pra caramba, tenso, descritivo na medida justa. LEIAM.
Então, eu nem falei nada, mas sexta-feira chegaram meus livros da wishlist da Amazon, presente de aniversário do Mirco pra mim. Ontem mesmo comecei Choke, de Chuck Palahniuk (o autor de Fight Club) e já estou quase no fim. Estranho, mas interessante, tem algumas tiradas ó-te-mas. No pacote veio um outro dele, "Survivor", Under the Volcano (Malcolm Lowry), Last Bus to Woodstock (Colin Dexter), What It Means To Be 98% Chimpanzee (Jonathan Marks), e dois básicos do Stephen Hawking que admito nunca ter lido antes: A Brief History of Time e The Universe in a Nutshell.
1. Pegue o livro mais próximo de você;
2. Abra o livro na página 23;
3. Ache a quinta frase;
4. Poste o texto em seu blog junto com estas instruções.
"Now, Michael!" his wife said. "Keep calm now, Michael, dear! Keep calm!"
Do conto "Taste", do livro Completely Unexpected Tales, Roald Dahl.
Não lembro mais qual foi o primeiro blog onde eu vi isso.
E fiquem com um pedaço de La Forma dell’Acqua que, como previsto, não está me decepcionando nadinha... Tradução amanhã ou depois. Os negritos são meus.
Il signorino Giacomo è il classico esempio di figlio di papà, aderentissimo al modello, senza uno scarto di fantasia. Il padre è notoriamente un galantuomo, fatta eccezione di una pecca di cui dirò in seguito, l’opposto della bonarma Luparello. Giacomino abita con la seconda moglie, Ingrid Sjostrom, le cui qualità ti ho già a voce illustrate (...). Ti faccio l’elenco delle sue benemerenze, almeno quelle che io ricordo. Ignorante come una cucuzza, non ha mai voluto né studiare né applicarsi ad altro che non fosse la precoce analisi dello sticchio, eppure è sempre stato promosso a pieni voti per intervento del Padreterno (o del padre, più semplicemente). Non ha mai frequentato l’università, pur essendo iscritto a medicina (e meno male per la salute pubblica). A sedici anni, guidando senza patente la potente macchina del padre, travolge e uccide un bambino di otto anni. Praticamente Giacomino non paga, paga invece il padre, e assai profumatamente, alla famiglia del bambino. In età adulta costituisce una società che si occupa di servizi. La società fallisce due anni dopo, Cardamone non ci rimette una lira, il suo socio a momenti si spara e un ufficiale della guardia di Finanza che vuole vederci chiaro si trova di colpo trasferito a Bolzano. Attualmente si occupa di prodotti farmaceutici (figurati! Ha il padre che gli fa da basista!) e spende e spande in misura di gran lunga superiore ai probabili introiti.
Appassionato di macchine da corsa e di cavalli, ha fondato (a Montelusa!) un Polo-club dove non si è mai vista una partita di questo nobile sport, ma in compenso si sniffa che è una meraviglia.
Se dovessi esprimere il mio sincero giudizio sul personaggio, direi che trattasi di uno splendido esemplare di coglione, di quelli che allignano dove ci sia un padre potente e ricco. All’età di anni ventidue contrasse matrimonio (...) con Albamarina (per gli amici, Baba) Collatino, alta borghesia commercializia di Palermo. Due anni dopo Baba presenta istanza di annullamento del vincolo alla Sacra Rota, motivandola con la manifesta impotentia generandi del coniuge. M’ero scordato: a diciotto anni, vale a dire quattro anni prima del matrimonio, Giacomino aveva messa incinta la figlia di una delle cameriere e l’increscioso incidente era stato al solito taciato dall’Onnipotente. Quindi i casi erano due: o mentiva la Baba o aveva mentito la figlia della cameriera. A parere insindacabile degli alti prelati romani, aveva mentito la cameriera (e come ti sbagli?), Giacomo non era in grado di procreare (e di questo si sarebbe dovuto ringraziare l’Altissimo). Ottenuto l’annullamento, Baba si fidanza con un cugino col quale aveva già avuto una relazione, mentre Giacomo si dirige verso i brumosi paesi del nord per dimenticare.
In Svezia gli capita di assistere a una specie di auto-cross massacrante, un percorso tra laghi, dirupi e montagne: la vincitrice è una stanga bionda, di professione meccanico e che di nome fa appunto Ingrid Sjostrom. Che dirti, mio caro, per evitare la telenovela? Colpo di fulmine e matrimonio. Ormai vivono assieme da cinque anni, ogni tanto Ingrid torna in patria e si fa le sue corsettine automobilistiche. Cornifica il marito con svedese semplicità e disinvoltura. (...) Corre voce, assolutamente non controllabile, che magari* l’austero professor Cardamone padre ci abbia inzuppato il pane con la nuora. E questa sarebbe la pecca di cui ti ho accennato all’inizio. Altro non mi viene a mente. Spero d’essere stato pettegolo come desideravi.
Nicola.
*magari em italiano quer dizer "talvez", ou então, quando está no exclamativo, vira "quem dera!". Em siciliano quer dizer "também".
Como fiquei pastando no sofá o dia inteiro, terminei Disgrace (que achei realmente uma desgraça, chatíssimo) e comecei e terminei Magdalene. Fiquei curiosa: quem será que teve a idéia de transformar esse livro em filme? Porque o tema é até interessante, com grandes possibilidades de aprofundamentos e ramificações, mas o livro é escrito em linguagem quase infantil, e com uma superficialidade que não cai bem, considerando-se a seriedade do assunto. Confesso que fiquei meio desorientada, meio "ué, mas é só isso?". Mas agora quero ver o filme.
Hoje comecei La Forma dell’Acqua, de Andrea Camilleri. Já comentei aqui o quanto gostei de La Mossa del Cavallo, que é absolutamente fe-no-me-nal. Esse que comecei hoje é o primeiro de uma série de gialli (romances policiais) que têm* como protagonista o Commissario Montalbano, e que inspiraram uma série televisiva de sucesso no ano passado. Esperamos que La Forma dell’Acqua seja bom o suficiente pra fazer minhas narinas pararem de abrir e fechar de tanta raiva por ter perdido tempo lendo dois livros chatos.
* O verbo tá no plural porque gialli é plural de giallo, não fiquei inguinorante do dia pra noite não, tá?
Por que ninguém me disse que Disgrace é TODO escrito no presente – estou falando do tempo verbal? Por que ninguém me disse que esse livro é chato, chato, chato, cansativo, vazio, que parece escrito por uma criança, em frases curtas, com metáforas bobas? Por que esse livro ridículo ganhou o Booker Prize? Deve ser pelo mesmo motivo pelo qual o Paulo Coelho ganha prêmios na França.
Estou quase terminando e a única passagem interessante até agora é:
"(...) Sometimes I have felt just the opposite. That desire is a burden we could do well without."
"I must say," says Lucy, "that is a view I incline towards myself."
E que diabo são essas frases sem nenhuma contração pronome-verbo? Vai ver que na África do Sul é assim, os pais falam com os filhos como se fossem âncoras do telejornal, com os verbos todos por extenso...
(Claro que existe uma outra hipótese possível: a de que eu seja muito burra e ignorante e não tenha entendido algum mecanismo literário inovador inventado pelo Coetzee. Mas continuo achando o livro uma porcaria. Infelizmente eu tenho esse problema incurável: tenho pena de livros, tanto dos deixados nas prateleiras quanto dos largados lidos até a metade. Por isso agora tenho que terminar de ler.)
Meu lanterneiro se compadeceu da minha crise literária depois que eu acabei de ler a gueixa e me levou pra passear na Libreria Grande. Ganhei de presente:
. Toujours Provence (Peter Mayle)
. Encore Provence (Peter Mayle)
[O primeiro da série, A Year in Provence, não tinha. Hmpf.]
. The Magdalen (Marita Conlon-McKenna)
. Disgrace (J. M. Coetzee)
. La Forma dell’Acqua (Andrea Camilleri)
Fiquei feliz :)
Ah, estou lendo Memoirs of a Geisha, que comprei na lojinha furreca do aeroporto de Ciampino domingo passado. Depois digo o que achei.
Desde segunda-feira eu e as meninas (Carmen e Claudia) passamos as manhãs na loja do Fabrizio o Louco, limpando e arrumando a loja pra reabertura no dia 26 de fevereiro. Só que, além do maluco do Fabrizio, a furiosa mulher dele, Rossella, também vem trabalhar. Eles são duas das pessoas mais grezze – toscas – que eu já conheci na minha vida. Gritam o tempo todo, brigam sem parar, xingam, maledizem, bestemmiano. Rossella é a cara da irmã malvada de um dos personagens de South Park que agora não lembro quem é – aquela garota feia de aparelho fixo, toda atarracada. Ela fuma feito uma chaminé, tem um sotaque perugino hor-ro-ro-so, e passa metade do seu tempo falando mal do Fabrizio e da sogra, e a outra metada enaltecendo o monstruoso filho Saverio, que aliás é um capítulo à parte em termos de falta de educação.
Se o Fabrizio já é chato, estressado e estressante nas CNTP, imaginem com uma mulher dominadora feito a Rossella. Tudo o que ele faz a irrita, e vice-versa. As paranóias dele deixam qualquer um maluco, mas ela já o atura há tantos anos que o saco já encheu, e ao primeiro sinal de maluquice ela liga o berrador e não pára mais. Hoje, depois que o Fabrizio pediu a nós pra varrer a loja pela enésima vez – coisa inútil, já que ainda estávamos tirando a poeira das prateleiras e jogando papel absorvente empoeirado no chão – a Rossella simplesmente começou a bestemmiare feito um marinheiro:
- Mavvafanculo tu e quella troia della tu’ mamma che ti ha parturito! Porca puttana della maiala, sacro imperatore Giustiniano, ma che pugnetta che sei! (vão tomar no cu você e aquela piranha da tua mãe que te pariu! – o resto são xingamentos sem sentido, inventados na hora, uma coisa que sempre me faz rir muito aqui na Itália. E quanto a pugnetta, que aliás nem sei se tem dois tês, só preciso dizer que gn se pronuncia como nh, como em gnocchi, e que “sei” é a segunda pessoa do singular do verbo ser.).
Além dessas chaturas, ainda há dois agravantes: UM - tanto o Fabrizio como a mulher são ignorantões e grosseiros clássicos, e adoram discutir sua vida sexual e ginecológica com quem quiser ouvir (e com quem não quer também), o que, considerando o charme e a elegância do casal, é de dar náuseas no pobre ouvinte. DOIS - como todo bom italiano, são dois hipocondríacos. Quem me conhece, e quem lê esse blog há algum tempo, sabe que eu sou completamente fria e calculista em relação a doenças. Tenho plena consciência de que se você acreditar muito firmemente que alguma parte do seu corpo está doendo, ela vai doer de verdade. Achei que tivesse me livrado dessa maluquice curtidora de doenças quando parei de trabalhar com a Martinha, que é um amor mas todo dia tinha uma dor nova (incluindo dor no olho.), mas hoje ouvi um festival de queixas doloríficas, tanto da parte da Rossella quanto da Carmen. Uma tem dor nas costas, a outra rebate dizendo que tem vertigem. Uma diz que se não segura na prateleira cai da escada (porra, então por que não me deixou subir quando me ofereci pra ficar lá em cima passando garrafas de Barolo pra quem ficou embaixo?), a outra contra-ataca dizendo que tem “predisposição à dor óssea”. Uma reclama que não dorme bem, a outra dá um direto de esquerda afirmando que tem “ataques de afã” quando deita na cama. Caralho, exclamou a princesinha! Acabei perguntando por que as duas donzelas não tinham ido ao médico ainda, se essas coisas incomodavam tanto. Ficaram quietas e mudaram de assunto, as duas.
Têm sido manhãs cansativas. Subir e descer da escada carregando caríssimas garrafas de vinho cobertas de poeira definitivamente não é legal. Fazer isso ouvindo a Rossella dizer o quanto o filho dela é mais inteligente até do que os professores da escola é menos legal ainda – ainda mais quando eu conheço o monstrinho e sei que não só ele é ignorante como os pais, mas também é incrivelmente, mas INCRIVELMENTE mimado e mal-educado. Hoje terminamos de tirar o pó de TODAS as prateleiras, TODOS os potes de molho e garrafas de vinho e pacotes de cogumelos secos e ervas pra risoto. Amanhã só precisamos colocar no lugar os queijos e salames, e limpar o chão. Mas vou estar sozinha com o Fabrizio, que já sei que vai começar a pregação catequista pra cima de mim. Pelo menos não vai ter ninguém fumando do meu lado.
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Ontem fui a Perugia com a Carmen buscar o laudo da ressonância magnética do joelho do Mirco. Houve ruptura de um pedacinho posterior do menisco lateral esquerdo, o que significa que terá de ser feita uma artroscopia pra remover o pedacinho, que o incomoda muito. Sexta-feira vou falar com o ortopedista dele pra marcar essa cirurgia e tentar convencê-lo a me deixar assistir.
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Estou lendo “Sob o Sol da Toscana”, de Frances Mayes, que a FeRnanda me emprestou sexta-feira passada. Tive que começá-lo logo, antes de Huxley, porque a FeRnanda é que nem eu, ciumenta dos livros, e quer que eu o devolva logo. Aliás, tem um da Sark que eu deixei com ela pra ela treinar Inglês, e esqueci de pegar...
O livro é delicioso. A autora é americana e mora em Cortona, última cidade toscana na zona de fronteira com a Umbria, não muito longe daqui. Conta suas desventuras na casa que ela e o marido compraram ali em Cortona: as reformas, as maluquices italianas, a dificuldade de ter horários cumpridos aqui, descrições de jardins, dicas de botânica, receitas gostosas. Realmente uma delícia de livro. Pena que é traduzido, porque o Inglês da FeRnanda não é lá essas coisas. Não tem jeito: livro traduzido é uma merda até quando foi traduzido bem.
Que o mundo novelesco brasileiro anda cada vez mais estranho, eu ja sabia. Mas a coluna Controle Remoto do Globo de hoje (coluna que nunca leio, alias, porque estando por fora da programaçao brasileira nao entendo nada do que é publicado) me assustou:
O fim
Em ‘Kubanacan’, o Esteban falso, na verdade, é Leon, o filho de Rubi que acabou de nascer. Ele voltou do futuro para mudar o curso da história e impedir que Alejandro explodisse o mundo com a Fênix.
Fiquei imaginando o que diabos o autor andou bebendo pra escrever uma porcaria assim. A começar por todos os nomes proprios presentes nesse paragrafo. Titulo incluido.
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Como pra dar apoio moral ao Mirco, que ontem deu uma carada numa parte de um caminhao que um marroquino deixou no meio do caminho e agora ta com a cara cheia de band-aid, hoje dei uma testada violentissima na porta de um dos armarios da cozinha. Na hora vi estrelinhas, e cai sentada no chao chorando de dor. E ainda ganhei um galo e uma ferida sobre o olho direito. Essa mania de me auto-flagelar me tira do sério às vezes.
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Aqui na Italia o Rei Retornou ontem, mas as sessoes tao lotadas e provavelmente so conseguiremos ver o filme amanha à tarde. Muito me espantou esse interesse pelo filme, embora eu saiba que 99,9% da galera que vai ao cinema assisti-lo nunca ouviu falar dos livros, e so vai pra ver o Orlando Bloom mesmo. Ou entao é falta de coisa melhor pra fazer. Lembrem-se de que as opçoes de lazer aqui no interior da Nicaragua sao muito poucas.
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Leiam Tales of the Unexpected. Roald Dahl comanda o batatal, de verdade.
Ah, e ontem finalmente consegui por as maos no ultimo presente da Marcia Aguiar, que tinha mandado o pacote pro endereço velho do escritorio, ou seja, a casa do chefe: Women in Love, de D. H. Lawrence! Adorei, porque do reveillon pra cah jah li o espetacularrrrrrrrrrrr 1984 (George Orwell) e estou na metade de The Scarlet Letter (Nathaniel Hawthorne), e depois nao tenho mais nada pra ler! Esses dois ultimos eu comprei na maior livraria aqui da Zona, com a Carmen, no dia de folga que ganhei quando o pai do Chefe Idiota morreu. Comprei também Charlie and the Chocolate Factory, de um dos meus autores preferidos, Roald Dahl, Atonement, de Ian McEwan, e Animal Farm, também de George Orwell, que eu nunca tinha lido (foi mal, tenho algumas grandes lacunas literarias).
Mas quando eu acabar o Women in Love o que é que eu vou lerrrrrrrrrrrrr?
Quando eu digo que a Itália é um país muito engraçado, neguinho acha que eu estou exagerando. Mas vê se não é verdade:
Essa semana teve greve dos transportes públicos. Não precisa nem dizer que cada cidade fez um horário diferente – em algumas a greve foi só de manhã, em outras durou algumas horas de manhã e outras à tarde, em outras ainda começou no final da tarde e terminou à meia-noite (isso não contando as cidades onde o horário pré-estabelecido não foi respeitado e a coisa durou o dia todo). Un casino, como se diz aqui – uma zona.
E a famosa patente a punti (a carteira de motorista com o sistema de pontos)? Lembro-me de ter comentado aqui a indignação da galera com o novo sistema. A quantidade de gente que logo na primeira semana já saiu perdendo zilhões de pontos foi impressionante – inclusive meu amadíssimo Chefe, que leva uma média de duas multas por mês, e continua sendo idiota a ponto de encaixar o cinto de segurança ANTES de sentar no carro, enganando assim seu carro igualmente idiota (uma Mercedes), que pára de apitar quando “sente” o cinto encaixado, mesmo que o motorista esteja sentado sobre ele. E qual é a última novidade da patente a punti? O sistema informático que controla toda essa farofada está sobrecarregado e à beira do colapso. Palavras do TG (telegiornale): il sistema rischia di andare in tilt.
E a televisão? O único programa ao qual assisto, Striscia la Notizia, é uma palhaçada só. Anteontem desmascararam uma “maga” que bota anúncio no jornal dizendo que curava hepatite B e C através de um ritual feito de madrugada, na praia. Mandaram um falso cliente atrás da mulher com uma microcâmera. Era uma criatura magra, de cabelos vermelho-fogo, óculos abelhão, cara de gafanhoto – me lembrou muito a professora de Divination do Harry Potter, só faltava o xale etéreo enrolado no pescoço. Ela olhou os exames do cara, falou que as transaminases iriam baixar tantíssimo depois do ritual, que pedia só 250 euros antecipados porque afinal de contas acordar de madrugada não é mole, entre outras imbecilidades. Quando o repórter apareceu e se apresentou, a mulher entrou em tilt! Entrou correndo em casa, disse que ia chamar a polícia, que era realmente uma curandeira, que absorvia a doença dos “pacientes” e por isso cobrava caro; depois jogou fora os exames do paciente com cara de Bart Simpson (I didn’t do it, nobody saw me doing it, can’t prove anything), xingou o repórter, que àquela altura se controlava herculeamente pra não desabar de rir, de tudo que se pode imaginar. Eu dava tanta risada que quase me saiu vinho pelo nariz* (Rubesco da Lungarotti, ótimo custo-benefício, menos de 6 euros a garrafa). E ontem à noite, no mesmo programa, o vira-lata Willy, que de vez em quando dá as caras por lá, deitou na mesa, passeou pra lá e pra cá, se assustou com a vespa gigante de espuma que volta e meia é lançada do teto (em homenagem ao Bruno Vespa, um jornalista com cara de sapo que é meio ídolo e meio odiado por aqui). Imaginem um telejornal onde há um cachorro que passeia por sobre a escrivaninha, tapando os repórteres? Claro que é um programa muito longe de ser sério, mas a coisa toda não deixa de ser altamente surreal, principalmente se levamos em conta o cenário totalmente trash (aliás, italiano em matéria de cenário trash é campeão. TODOS os programas têm cenários do nível do Qual é a Música. Juro.).
*E vamos aproveitar a deixa pra entrar numa particularidade da língua italiana, que aliás reflete muito bem a personalidade megalomaníaca deles: os verbos reflexivos. Tudo que é verbo pode, dependendo da situação, virar reflexivo. Como eu disse ali em cima, em italiano não se diz que saiu vinho pelo meu nariz, mas ME saiu vinho pelo nariz. Eu não comprei um carro: mi sono comprata una macchina (ou, mais coloquialmente, mi sono fatta una macchina). Não cortei os cabelos: mi sono tagliata i capelli. Marta não fez uma roupa com a costureira: si è fatta fare un vestito. Eu não tomo banho de manhã: mi faccio la doccia la mattina. Os homens não fazem a barba: si fanno la barba.
Eu demorei a entrar nesse esquema egotrip linguístico, mas volta e meia me pego pensando em um Português reflexivo que só consigo detectar como estranho quando dou o rewind mental e paro pra analisar o que falei.
Leiam Marcovaldo, leiam Gli Indifferenti (angústia pura), leiam La Mossa del Cavallo (stupendo!), leiam Il Deserto dei Tartari, leiam La Coscienza di Zeno (fe-no-me-nal), leiam I Malavoglia (e vos desafio a não chorar no começo, no meio, no fim), leiam coisas legais, e deixem Pirandello pra lá que o cara era chato bagaray – ou sou eu que sou alérgica a teatro e linguagem teatral em geral?
Preciso de livros, meu estoque anda baixo. Sugestões sao bem-vindas.
Vocês não têm IDÉIA da cotovelada que eu dei na quina da janela da sala hoje de manhã cedo. Sabe aquela dor que te joga no chão chorando, o que automaticamente faz o seu cachorro entrar em pânico e vir correndo na sua direção, abanando o rabo, tentando te lamber, bufando, não entendendo nada? Então. Foi assim. Uma das janelas estava aberta pra entrar um arzinho (gélido, diga-se de passagem), e eu, Amélia matutina, fui passar pano úmido no chão depois de varrer os quilos de pêlo do Legolas que se acumulam por toda a casa. Numa dessas passadas, puxando o rodo na minha direção, o cotovelo subiu normalmente, mas encontrou a quina da janela. E foi aí que eu vi tudo preto e caí no chão chorando de dor. E foi aí também que meu braço direito morreu para o mundo, e agora se recusa a fazer qualquer movimento mais esdrúxulo ou pegar peso de qualquer natureza. TÁ DOENDO PRA CACETE. E nem posso passar Gelol, porque a pancada foi tão forte que passou pela camisa de manga comprida e pelo moletom, e me deixou um arranhão vermelhíssimo.
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O frio realmente chegou pra ficar, parece. Pra ir do escritório ao almoxarifado recomeçou a lenga-lenga do tira-e-bota casaco.
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Ontem sucumbi à vontade de junk food e tracei um cheeseburger com molho quatro queijos na nossa pizzaria preferida. Digo junk porque hamburger é mentalmente associado a junk, mas nem tava tão trash assim: hamburger sequinho, pouco molho, pão de dimensões razoáveis, uma porção de batatas fritas sequinhas dividida por dois. Matou a fome e a vontade, e não me deixou com consciência pesada. E hoje estou pronta pra mais um dia de atum e saladinha. Uhuu.
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Terminei Moby Dick! E comecei Regina’s Song, do casal Eddings (o que a Marta me deu de presente semana passada). Eu gosto do estilo deles, embora ultimamente eles tenham começado a se repetir demais, e a usar itálicos demais. O assunto também me interessa; uma coisa meio thriller, meio C.S.I., meio psiquiatria forense e não. O prognóstico é de uma semana de leitura. Veremos.
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Preciso dar um livro de presente de aniversário atrasado pra irmã do Mirco, yoga, zen, cozinheira e não falante de nenhuma outra língua diferente do italiano. Aceito sugestões.