mas vai ser fodida assim no inferno

Não venham me dizer que sorte não existe.

Comprei a lambreta, caí da lambreta.

Peguei a Punto do Mirco, destruí a Punto.

Pego o Volvo do Mirco, fura o pneu do Volvo NO MEIO DA ESTRADA.

Pego a Uno da oficina, toda recauchutada – freios novos, óleo trocado, amortecedor novo, MOTOR novo porque o velho morreu domingo passado, bateria nova – e a Uno falece NO MEIO DA ESTRADA. Mais precisamente em frente à igreja de Rivotorto, no exato lugar onde o pneu do Volvo estourou há duas semanas.

Melhor arranjar um emprego embaixo de casa, sabe. Movimentar-me está ficando perigosamente azarado.

pacamania

A IG pediu, eu respondo.

Eu sou chata, mas não tenho muitas manias bizarras. Deixa eu ver…

1) A de balançar os pés quando estou sentada, como a IG. Mania que muito me irrita mas que não consigo abandonar (senão não seria mania, duh!).

2) A de cutucar os cantos das unhas com as outras unhas, sempre da mesma mão. Isso resulta em i) aumento exponencial da quantidade de cutícula a ser removida e ii) um uso excessivo da musculatura do antebraço, causando dores musculares inclusive. A única vantagem é que o antebraço é a única parte do meu corpo que não tem celulite.

3) Falar sozinha. Em tudo que é língua. Quando dirijo, então…

4) Ler tudo o que é letrinha que eu vejo, automaticamente. É absolutamente inevitável, como quem tem dons matemáticos e tem mania de somar os números das placas dos carros que vê. Eu não posso ver nada escrito; tudo o que é letra que eu vejo, eu leio. Mas é realmente automático: quando me dou conta, já li. Isso inclui tudo, tudo, tudo: adesivo de carro, outdoor, manchetes nos jornais pendurados na banca, livro na mão de uma pessoa distante, letreiro de loja atrás do repórter enviado na televisão, post-its colados no monitor da secretária, a marca gravada nos botões da roupa da chefa. Can’t help it.

5) Mania horrível de deixar tudo pra amanhã, que é um dos meus piores defeitos. O Mirco é exatamente o contrário e sei que melhorei muito seguindo o exemplo dele, mas os genes paternos são mais fortes e sei que nunca serei totalmente eficiente por causa disso…

ela

Lógico que uma terça-feira pós-segunda de onze horas de aula, uma terça-feira que começou com Cascia e terminou com uma hora e meia chatérrima com o Homem Mais Feio do Mundo, não poderia terminar bem. Cheguei em casa com uma das piores crises de enxaqueca que já tive. Tinha tomado o remédio ao meio-dia, quando senti a primeira pontada, e ela ficou dormente o dia inteiro, pra me atacar de surpresa justamente no meio da coisa com o Homem Mais Feio do Mundo. Não sei como cheguei viva em casa, mas voei pra cama chorando de dor. Nessas horas o Mirco fica assustado porque não sabe o que fazer. Consegui me arrastar pra tomar banho e fui direto dormir.

então…

Então acordei cedo mas não fui caminhar porque estou muito cansada ainda. Acordo sempre cedo, com o sol, mesmo se o quarto estiver totalmente escuro. Dou bom dia pras minhas plantinhas, todas devidamente transferidas do Móvel Hediondo da sala pra varanda ensolarada, faço a cama e normalmente depois vou correr, mas hoje não deu, realmente. Então sentei aqui pra atualizar a paca, porque não quero mais acumular semanas de posts mentais que não vão pro papel. Tive que escolher entre responder a mil e-mails acumulados ou atualizar a paca. A paca venceu. Muito provavelmente não vou conseguir escrever nada a ninguém durante a semana por causa das aulas com o Homem Mais Feio do Mundo, mas no fim de semana juro que vou tentar.

aria di cultura ;)

Tínhamos um almoço combinado em Gubbio já há quase um mês. Com o pessoal do curso de narração, que se mantém sempre em contato através da mailing list. Então eu acordei cedo, fui caminhar – de camiseta de manga curta! – ouvindo música, tomei meu banhinho, fiz vitamina de banana e laranja pro café da manhã e tocamos pra casa da Arianna. Tivemos que pegar o carro do Ettore, porque o do Mirco tá esperando o pneu novo e a Uno que eu dirijo não chega viva a Gubbio nem rezando. Direto pra estação de Perugia, onde a Laura (a.k.a. Ola’ porque, vocês sabem, apelido aqui é quase sempre a repetição do nome até a sílaba tonica, então o pessoal chama a Laura assim: O La’, vieni qua!) já estava esperando. Trinta segundos depois apareceu a outra Laura, a Bortoloni, com o namorado. Os dois têm um estúdio gráfico e ela é a maior fã da Newlands. Muda como um peixe, mas é um amor de menina. Ola’ montou no carro com eles e lá fomos nós pra Gubbio.

A estrada é horrível, cheia de curvas e subidas, e fica impraticável quando neva pesado, mas a paisagem é um deslumbre. Aquelas casonas antigas de pedra sentadas sobre as colinas, campos cultivados, bosques de oliveiras, carneirinhos pastando. A Umbria é um desbunde mesmo. E a chegada a Gubbio é sempre triunfal, porque ela fica amontoadinha aos pés do monte cujo nome esqueci, e as torres e construções superantigas são visíveis já de longe; a cidade parece desenhada. Com o céu azul de hoje, então, nem vos digo.

Estacionamos na praça principal e o Matteo veio ao nosso encontro. O resto do pessoal tava esperando à sombra de uma banca de jornais. Matteo é de Veneza, estuda Letras; a namorada, pequeniniiiiiiinha, se chama Virginia e estuda Relações Internacionais em Trento, mas a família é de Terni, aqui na Umbria. Livia é de Riccione, se não me engano, e não me lembro que coisa faz; o namorado tem cara de salame, desses com jaqueta acinturada e colarinho alto, mas não parece ser má pessoa. Arturo é ginecologista, de origem napolitana mas mora em Gubbio há anos e ajudou a parir metade da cidade, então andar com ele pelas ruas é como andar em Ipanema com o Hiro: paradas a cada trinta segundos pra cumprimentar alguém. Sabe O cara legal? É o Arturo. Demos uma volta no centro pra esperar o Maurizio, e fomos batendo papo, falando de livros e filmes (o que mais?) e discutindo menus. O Maurizio trabalha na Coop, o supermercado, e dirige um minicentro cultural de cinema na cidade. Depois de um aperitivo rápido num barzinho quase na praça, fomos pro “restaurante” que o Arturo tinha reservado.

De restaurante não tinha era nada, como muitos bons lugares pra se comer por aqui. Cardápio limitadíssimo, mesas na cantina subterrânea com teto em arcos, salames pendurados no teto no andar térreo. Um lugar típico, em suma. Todos acabamos pedindo a mesma coisa: Piattone del Re (Pratão do Rei), um pratão realmente enorme com as seguintes coisas, a serem comidas nessa ordem, conforme explicou o proprietário quando nos serviu: crostini (pão tostado) de dois tipos, com molho à bolonhesa e com lardo (a parte gorda do porco fatiada. Banha, digamos.), depois feijão manteiga ligeiramente apimentado, comido com um pedaço de torta al testo, que em Gubbio se chama crescia (pronuncia-se crêsha), depois ovos mexidos com lingüiça despedaçada em cima de uma meia fatia de torta, depois lombinho fatiado em uma caminha de rúcola e vinagre balsâmico, depois batata assada e berinjela à milanesa, depois fatias de torta com prosciutto crudo, depois fatias de queijo com trufa negra. Parece um mundo de comida, e é, quando vista toda junta num pratão gigante, mas na verdade cada porção é pequena (MEIA batata assada, UMA fatia de berinjela, UMA fatia de queijo por cabeça) e a gente comeu muito bem, sem se entupir. Mirco até continuou com fome depois (classic…) e ainda comeu uma fatia de torta com lingüiça e verdura. O vinho não era local, e de uma variedade que eu nunca tinha experimentado, mas uma delícia. Estávamos numa ponta da mesa com Maurizio e a mulher, que é enfermeira e chegou depois, direto do turno da noite. Altos papos.

Dali fomos direto a Fossati di Vico, a estação de trem mais próxima a Gubbio, pra deixar a Livia e o namorado. Bortoloti e o namorado também tiveram que ir embora mais cedo. Maurizio e Sonia foram pegar as filhas na sogra e levá-las pra passear no parque. Nós restantes resolvemos ir a Perugia pra Virginia, namorada do Matteo, visitar a avó, e depois fomos ao cinema. Como todo mundo já tinha visto tudo o que tava passando, fomos ver Notte Prima degli Esami, que é MUITO engraçado e nada idiota. Demos muita risada, até eu, que vivi os anos 80 brasileiros e não italianos. Muita coisa em comum, lógico, e muita risada com a moda cafona da época. O elenco é terríiiiiiiiiiiiivel e a atuação da maioria dos jovens e desconhecidos atores é péssima, mas o texto é muito engraçado. Saímos do cinema desopilados e com fome, e fomos ao centro de Perugia comer pizza na Mediterranea, a melhor pizza da cidade. De novo, altos papos. Infelizmente tivemos que nos despedir do Matteo, da Virginia e do Arturo, e fomos levar a Ola’ em casa, em Tordandrea, onde mora o tio do Mirco.

Eu tenho muita sorte com esses colegas de turma dos poucos cursos que faço. Esse pessoal é muito legal, muito simpático, aberto, CULTO, divertido. Tipo assim o pessoal do curso de italiano, que são das melhores pessoas que já entraram na minha vida. Lulu, Syrléa, Valéria, Fabiano, Serginho, Leo… Todas pessoas maravilhosas de quem tenho muito orgulho de ser amiga e de quem sinto uma falta imensa. Esse pessoal do curso de narração foi um achado pra mim. São meus primeiros amigos só meus por aqui (a FeRnanda não conta porque já virou irmãzinha), a nossa amizade começou por termos alguma coisa grande em comum e que ainda é o ponto central das nossas conversas, ao vivo ou por mailing list, e a sensação de finalmente ter com quem conversar é absolutamente maravilhosa. Mirco adorou todos e deu muita risada a noite inteira. Ficamos de nos ver de novo em maio, porque no início do mês tem a feira do livro em Torino, e no meio do mês tem a festa dos Ceri em Gubbio, aquela coisa louca que presenciamos no ano passado. Não posso deixar escapar essa gente da minha vida.

era ora, cazzo!

Primeira saída de lambreta do ano, uhu! Fui a Bastia comprar umas plantinhas e uns fichários bonitos pra organizar a minha papelada da universidade. O dia tava lindo, glorioso, fresco mas com o sol que esquentava a pele, uma diliça. Quase – quase – fiz a faxina com prazer, com as portas das varandas escancaradas. Adoro esse início de primavera. Adoro terminar o dia de trabalho com luz no céu ainda. Me sinto outra.

gomma bucata

Estava quase na altura da saída pra Rivotorto, ultrapassando um velhinho e ouvindo Green Day nas alturas, quando começo a ouvir um barulho estranho. Putz, o pneu. Bosta. Não tinha onde encostar na estrada, então rodei mais uns cem metros e peguei a saída. Como em Rivotorto nada acontece nunca e ninguém passa, consegui parar o carro em uma espécie de baia lateral, sem incomodar ninguém. Desci e olhei o pneu: completamente estourado, caramba. Liguei pra escola pra avisar pra Simona que eu chegaria atrasada, porque nunca troquei pneu e provavelmente iria demorar. Ela teve a feliz idéia de ligar pro meu aluno engenheiro brilhante, que, morando em Bastia, tinha necessariamente que passar por ali. Cinco minutos depois lá vem ele com o seu Toyota. Trocou o pneu em inglês e lá fui eu, a oitenta por hora como uma velhinha, até a escola. Conversamos por uma hora e nos despedimos. Mas ganhei uma aluna particular, a mulher dele, obá. O resto do dia foi light; sexta-feira é o dia dos alunos educados: um engenheiro, um filho de dentista, um filho de médico, um médico. E que coisa linda sair da escola com um pouquinho de luz ainda no céu! Dilissa!

i cavalli

Os cavalos me reconheceram hoje :) Quando desci do carro vieram todos na minha direção. Não vi o potrinho, mas tive que entrar correndo no galpão pra dar aula porque cheguei em cima da hora. Quando saí, lá vieram eles de novo pra perto de mim. Estou eu distribuindo as maçãs quando sinto um bafo no meu braço. Era o potrinho, que não sei como tinha conseguido fugir da cerca! Tinha uma feridinha pequena na lateral direita do pescoço, sem dúvida por causa do arame farpado, e me olhava com aqueles olhinhos tristes e assustados de quem não conhece nada de bom nessa vida. Dei-lhe uma maçã pequena que ele pegou com os dentes, mas sem saber bem o que fazer com ela, ficou lá, com a fruta presa na boca, os beiços arreganhados, sem ir nem vir. Acabei cortando a bichinha em pedaços e só assim ele comeu. Depois coçou a coxa no meu carro. Fiz muito carinho nele, que no início se assustou mas depois curtiu.

A cada dia que passa mais eu tenho vontade de virar vegetariana.

opá

Estou eu indo tranqüilamente pra faculdade, pra assistir à aula de sociologia, quando escuto, já nas redondezas do estacionamento, um ploft. E depois do ploft um barulho de coisa metálica se arrastando no asfalto – namely o meu cano de escapamento. Sorte que deu pra estacionar e assistir à aula normalmente; no intervalo liguei pro Mirco, e depois da aula ele veio com o Moreno e várias ferramentas pra dar uma olhada. O escapamento simplesmente explodiu, o que não é surpreendente, considerando a qualidade do asfalto de todas as estradas de todos os percursos que eu faço rotineiramente. Pra ir a Ponte San Giovanni (à livraria ou ao Ipercoop) todo mundo dirige na esquerda, porque a pista da direita de toda a estradinha que atravessa a cidadezinha de Collestrada é uma sucessão infinita de crateras lunares. Quando vou de scooter pulo feito um cabrito. Pra ir pra Foligno, idem; a superstrada anda detonadíssima na pista da direita, onde rodam os caminhões. As ruazinhas por trás da Coop de Foligno, por onde passo pra evitar dar uma volta enorme no caminho pra escola, são esburacadérrimas e tem um buraco em especial que eu JAMAIS consigo evitar no caminho de volta pra casa, à noite (cês sabem que eu não enxergo nada à noite), e o barulho que o carro faz quando passa por ele é assustador.

Então foi isso, a descarga bateu em alguma coisa e estourou. Mirco desmontou a bichinha e voltou pra casa com o carro fazendo o maior barulhão. Deixou o Volvo comigo e lá fui eu pra Foligno ouvindo Loreena McKennitt :)