potocas

. Pra minha mãe, que continua achando que eu exagero quando digo que a educação na Itália é uma merda: saiu a lista das melhores universidades do mundo, e a primeira instituição italiana da lista aparece só em 174o lugar. A segunda, em 204o lugar.

. Carol assassinou o controle remoto da televisão da sala, de tanto babar nele. Nossos celulares também sofreram um pouco mas voltaram à vida sozinhos.

. Sexta-feira passada foi um dia de desvirginamento. Primeiro foi o lance da escolha do Rio pras Olimpíadas. A cena: eu sentada no chão do banheiro enquanto a Carol brincavana sua banheirinha, dentro do box, com o vidro de shampoo (é lógico que ela prefere o vidro de shampoo a todos os 1.874,5 brinquedinhos de banho que tem). O laptop num canto embaixo da pia, acompanhando a eleição no site do COI e no Twitter. And the Oscar goes to… Rio de Janeiro! Dei um grito, Carol chorou, tive que pegá-la no colo, molhei o banheiro inteiro, ela começou a rir e eu também, fiquei me abanando que nem Miss Universo ganhando o cetro e a coroa, chorando e rindo feito uma idiota. O outro desvirginamento foi o seguinte: deixamos a Carolina na casa da Arianna pela primeira vez enquanto fomos fazer outra primeira vez, uma ópera, no teatro Lyrick (é assim mesmo, com k no final, tá; não pode ser um bom sinal, e realmente não é) na esquina da rua da Arianna. Fomos cedo pra lá, jantamos, e quando começou a ficar meio em cima da hora saímos como se fosse a coisa mais natural do mundo. Depois soubemos que ela brincou, falou e dormiu; o Ettore me ligou praticamente na última estrofe da ópera avisando que ela tinha acordado e tava chorando. Saímos correndo pela rua feito uns doidos, mas era fome, coitada; bastou a mamadeira hipercalórica da noite (3 biscoitos de criança, sem gordura nem glúten nem ovo nem açúcar, que se dissolvem rapidamente na mamadeira; 2 colheronas de creme de arroz, milho e tapioca, muito comum por aqui; 2 colherinhas de um pozinho com açúcares e vitaminas especiais pra crianças com baixo peso) pra ela sossegar. Dormiu no carro e não reacordou, felizmente.

. A ópera: era Rigoletto, com certeza uma das menos badaladas. O único trecho conhecido é “La donna è mobile”“. Eu não conhecia NADA da história e nem tive tempo de catar na Internet, então fui no escuro mesmo. A experiência foi interessante porque, poxa, eu nunca tinha ido à ópera e gosto muito de música clássica. Mas tudo tem um porém, não é mesmo. Nesse caso os poréns eram vários. A acústica do Lyrick é HORRÍVEL, como já tínhamos constatado há alguns anos no espetáculo do Stomp. Isso porque ele não foi concebido como teatro; era uma fábrica de sei lá o quê (acho que produtos químicos, não lembro) que fechou ou faliu (também não lembro; veja que contadora de histórias que eu sou) e mais tarde foi reaproveitada. Uma das partes virou clube de bocha com um bar nos fundos que vive cheio de desocupados jogando carta nos fins de semana. A outra parte virou esse teatro absolutamente hediondo, por fora e por dentro. O espaço entre as desconfortáveis poltronas é microscópico. Nas laterais do palco há painéis reproduzindo os afrescos de Giotto na basílica de San Francesco, com direito às partes danificadas pelo terremoto de 97 e tudo. Enfim, um horror.

E aí começa o espetáculo. Era uma montagem modernosa – ODEIO. Adoro novidades e mudanças, mas acho que há algumas coisas – muito poucas, na verdade – que devem ficar como sempre foram. Balés clássicos e óperas são algumas delas. Tristeza ver o Rigoletto de salopete jeans e uma mochila de plush rosa-choque como corcunda. Simplesmente não dá.

O coro. O coro não era desafinado, mas não cantava em conjunto. Volta e meia a voz de um dos cantores sobressaía, o que, até onde eu sei, não deve acontecer.

Os cantores. Não entendo nada de ópera, mas não gostei de nenhum. Pouquíssima potência vocal (se bem que pode ter sido tudo culpa da acústica), vozes que sumiam afogadas pela orquestra com uma frequência um pouco excessiva. A cantora que faz a filha do Rigoletto não alcançou várias notas, embora tenha tentado com empenho.

O cenário. O cenário praticamente não existia, e talvez tivesse sido melhor não colocar cenário nenhum. Porque em um certo ponto da história desce do teto uma GRADE ao longo do palco inteiro. O Rigoletto se esgoelando na frente da grade e a filha dele atrás. Quem acha que colocar qualquer coisa entre o público e o que o público deve ver é uma idéia de jerico levanta a mão. Quase fiquei vesga tentando ver a desgraçada da mulher piando por trás da grade. Pra quem estava sentado bem na frente talvez não tenha incomodado tanto, mas quanto mais longe você fica, mais os contornos da grade ficam fuzzy e viram uma coisa só, uma mancha cinzenta que cobre a maldita da cantora, deixando-a meio fora de foco. A sensação era a de estar dirigindo num temporal, sabe, quando você tem que se esforçar pra distinguir o que está vendo porque tudo está no meio daquele cinzume todo. Desagradável.

O figurino. Já falei da salopete do Rigoletto, mas não disse que a Maddalena era gorda e estava usando um corpete preto com as costas cheias de amarrações, com direito a banha espremida entre elas, calças pretas justas que a deixavam com um culote gigantesco e botas de cano alto que em uma certa cena ela tinha que tirar, revelando batatas da perna imensas. Também não disse que a sua peruca ruiva era tão, mas tão artificial que de onde eu tava dava pra ver os reflexos da luz no nylon. Vergonha alheia total.

Mirco e Gianni fugiram correndo no primeiro intervalo e foram tomar cerveja no bar do clube de bocha. Eu, Chiara e Yari resistimos bravamente. A música de Verdi é muito boa e fechando os olhos dava pra se divertir. Quando começaram as primeiras notas de La Donna è Mobile sentia-se no ar a vontade coletiva de cantar junto, bater palminhas ou pelo menos fazer nãnãnãnãaaanãnã, coisa que felizmente ninguém fez (embora todo mundo tenha aplaudido na hora errada O TEMPO TODO). Dá arrepios mesmo e só aquele trechinho já compensou todo o resto. Imagino como deve ser legal ver uma ópera que você conhece melhor, tipo Carmen ou alguma do Mozart. Fiquei tão empolgada que comprei um Nozze di Figaro pela Amazon; deve chegar essa semana.

Enfim, fui embora quando o Rigoletto já estava chorando a morte da filha, de modo que não perdi muito. Quando finalmente deitei na cama estava me sentindo refreshed. Gostei.

. Meus novos melhores amigos, bodybugg e Chalene, estão derretendo minhas banhas a olhos vistos. Perdi 9 quilos (considerando o peso máximo a que cheguei, embora só tenha começado a malhar e contar calorias seriamente depois de já ter perdido uns três) até agora e minhas coxas estão ficando duras feito pedra. Essa semana tenho um trabalho chato pra entregar, mas semana que vem vou voltar a cumprir minha promessa de não pegar mais traduções gigantes pra poder organizar a minha vida direito, e vou começar o ChaLEAN Extreme, inclusive fazendo as receitas do programa. Vamos ver o que vai acontecer em 90 dias. Porque não sabemos ainda onde vai ser a festa de aniversário da Carolina, mas eu vou usar o que eu quiser, e não o que couber. Estou prometendo; podem cobrar.

. Divirtam-se com a imprensa internacional sobre o caso Berlusconi.

Le Figaro
Le Monde
Spiegel Online (cortesia da @FrauGlaeser)
Guardian
CNN International (adorei a descrição do Berlusca como “flamboyant”)
El País

rio 2016

A data da escolha tá chegando, e é LÓGICO que estou torcendo pelo Rio. Gosto de Madri mas, sinceramente, não a vejo como uma cidade esportiva. Chicago acho que deve ser sem graça (o logo é a coisa mais corporativa que eu já vi). Tóquio é longe demais, por favor. Rio, Rio please. Pra não falar que seria assim, “não, Francesca, esse mês não estou aceitando trabalhos porque estou no Rio, sabe. Aliás, dá licença que agora eu vou descer a rua pra ver a final de canoagem aqui na Lagoa, tá? Se eu vou a pé? Sim, sim, claro. Amanhã tem final de [inserir esporte qualquer aqui] no Maracanã e hoje vou dormir na casa da minha avó que fica pertinho, sabe, e vou lá ver o jogo/a competição/whatever. E depois de amanhã tem competição de [idem] lá no complexo da Barra e vou dormir na casa do meu pai pra chegar lá cedo. Foi mal aê pra vocês na Itália.” Abalou Bangu total.

Seria uma roubalheira daquelas estratosféricas? É ca-laro, até aí nenhuma novidade. Mas eu acho que o saldo seria positivo de qualquer maneira, embora com certeza aquém do possível, como sempre. Acredito que rolaria uma levantada de moral, uma sacudida forte, algo que acordaria o povo e faria com que as pessoas exigissem mais de quem os governa. Pode ser sonhação acordada minha, wishful thinking total, mas sei lá. Acho que uma cidade tão absurdamente phoda merece.

(Na minha opinião, a primeira providência a ser tomada, a primeiríssima da lista, seria eliminar aquela abominação que anuncia os voos no Galeão. Aquela com voz de propaganda de motel. Aquela tão preocupada em parecer sexy que ninguém entende o que ela diz. Sim, aquela mesma. Morte pra ela.)

Não preciso nem dizer que se o Rio ganhar eu vou chorar moooooito.

alimentação e bodybugg

Em três semanas de bodybugg perdi 3 quilos. Ótimo, exatamente dentro do meu objetivo, até porque mais de um quilo por semana não é saudável.

Como eu já disse antes, acaba-se aprendendo muito sobre alimentação. Eu, por exemplo, aprendi que termino o dia SEMPRE com déficit de carboidratos e excesso de proteína. Isso porque, como também já comentei, meu lanche é sempre uma barrinha de cereais ou um iogurte, já que fujo de fruta feito o diabo da cruz. Mas isso não tá dando certo; às vezes me sinto sem energia e também não quero desmanchar o meu café da manhã (leite, pão com presunto e queijo; proteína pura) que eu adoro pra poder entrar na percentagem certa de proteínas.

A solução inicial foi roubar a papinha de maçã com banana da Carolina (não a papinha tradicional que tem amido de milho pra transformar a coisa num creminho, mas uma variedade que só tem a fruta mesmo, além do ácido ascórbico pro negócio não escurecer). Agora descobri que a Valfrutta lançou uma linha do que eles chamam de “mousse”, e que logicamente mousse não é, de 100% de fruta. Fora a combinação maçã-damasco, que acho meio bizarra (além de não gostar de damasco, lógico), o resto eu encaro numa boa. Vou experimentar, mas tenho a impressão que vai salvar a minha vida.

Olha, eu sou chata pra comer, admito. Mas melhorei muito desde que me mudei pra Itália e como trocentas coisas hoje que eu jamais sequer cogitaria há alguns anos. Mas não tem jeito, fruta não rola. Simplesmente não rola. A única fruta que eu como feliz da vida é banana, no Rio vão-se umas três por dia, mas a banana d’água amadurecida no porão do navio que vendem aqui não merece nem ser chamada de banana; só o cheiro me dá enjoo. Até as frutas das quais eu gosto, tipo morango, cereja, uva sem caroço, ficam mofando na geladeira porque o meu gostar delas é uma coisa assim muito distante, sabe, se deixassem de existir eu com certeza não ficaria de luto. Maçã, pera, tangerina, eu só como uma vez na vida outra na morte, e tenho que fazer um esforço eLorme pra terminar. E não é só preguiça – porque, convenhamos, não existe coisa menos prática do que algo que você tem que lavar, descascar E descaroçar pra comer, e que ainda por cima suja as suas mãos. Não gosto mesmo, ponto. Infelizmente não gosto. I’ll have a power bar any day. Então vou ter que enganar o meu céLebro com essas moussezinhas de frutas, pra ele pensar que eu estou comendo uma coisa industrializada superprática e deliciosa e que não deixa as minhas mãos meladas. Saco.

o avião

Então. Estamos indo pro Rio hoje, eu, Mirco e Carol. De Air France.

Juro que uma das coisas que mais me deixou bolada nessa história foi aquele lance dos dois fulanos que não embarcaram porque estavam com o passaporte vencido. Na boa… Como é que uma criatura sai de casa pra um vôo desse quilate COM A PORRA DO PASSAPORTE VENCIDO? Será que sou só eu a louca que sabe a data de vencimento dos documentos – passaporte, da carteira de motorista, da identidade italiana? Já vi gente perder vôo interno na Europa porque tava com a carteira de identidade vencida. Não entendo.

uia

Acabou de tocar a campainha. Fui toda sorridente abrir a porta achando que era a Arianna, pra sessão vespertina de babação de neta, mas dei de cara é com um padre. Com aquele negocinho de água benta na mão. Confesso que fiquei sem reação: apesar de saber que de vez em quando eles passam pra benzer as casas, isso nunca tinha acontecido com a gente. Aliás, acho que eu nunca tinha visto um padre tão de perto, se vocês querem saber.

Vejam bem, eu não tenho nada contra padres, individualmente falando, embora ache que qualquer pessoa que escolha uma estrada de celibato e puxação de saco papal e estudos muito sérios de contos da Carochinha e histórias pra boi dormir não pode estar muito bem da cabeça. Eu só não quero é que venham me torrar a paciência e me catequisar. Coitado, duvido que quisesse me catequisar, mas tenho certeza bissoluta que ele ficaria esperando uma oferta no final da baboseira lá dele. Jamais me passou pela cabeça deixá-lo entrar, logicamente, apesar de saber que uma bênção sem sentido e uns esguichos de simples H2O sejam completamente inofensivos; digamos que é contra a minha religião ;) Mas também nunca pensei de antemão em que tipo de resposta dar nesse tipo de situação. De modo que quando ele sorriu e perguntou “Posso?”, eu sorri muito educadamente e disse com o máximo de delicadeza possível, “Não! Desculpe, mas não!”. Ele ficou me olhando com cara de bunda; também não deveria estar preparado pra essa resposta vinda de alguém obviamente não muçulmana. Depois sorriu, apontou pro enfeite cor-de-rosa pendurado na porta e disse, “De qualquer maneira, felicidades por esse evento tão feliz”. Sorri de volta, agradeci, pedi licença e fechei a porta.

Enquanto isso, em Terni, um professor que retirava o crucifixo da parede da sala de aula antes de começar a lecionar e o pendurava respeitosamente outra vez antes de sair (lembro-vos que o crucifixo não tem nada que estar ali, to start with; as escolas do governo são laicas, por lei) foi suspenso e multado. O mundo laico italiano está dando o maior apoio pra ver se consegue-se livrar o cara da sentença absurda e aproveitar o fuzuê pra acabar com essa palhaçada de crucifixo em tudo o que é lugar público. Um juiz judeu chegou a ser preso porque se recusou a trabalhar num tribunal com um crucifixo gigante pendurado bem atrás dele na parede, mas já foi liberado. Não preciso nem dizer que nenhuma das duas histórias ganhou muita notoriedade na imprensa.

É por essas e outras que eu quase, quase tirei o crucifixo do meu quarto do hospital e deixei um post-it no seu lugar dizendo “Volto logo”.

au, au, au, o obama é animal

Eu não tinha prestado muita atenção ao discurso do ômi porque tava trabalhando e vendo TV ao mesmo tempo, e além do mais o intérprete da TV italiana não era lá grandes coisas. Acabei perdendo esse trechinho aqui, ó, do discurso morno do Obamão:

“We are a nation of Christians and Muslims, Jews and Hindus and non-believers”.

Procurem em 12.30, aqui.

Agradeço à Barbara por ter me dado o toque :)

a reforma ortográfica

E visto que o post de ontem falava da língua como uma coisa Bela, vamos à minha opinião, que obviamente só interessa a mim mesma, sobre a reforma ortográfica.

Uma grande palhaçada.

Tudo bem que acentos complicam a vida tanto quanto o falecido ph de pharmácia. E isso quem lhes diz é uma pessoa louca por acentos, que os acha charmosérrimos e muito fáceis de usar. Apesar de absolutamente AMAR o trema, de achá-lo utilíssimo e ridiculamente fácil de usar, entendo que a tendência é ele sumir mesmo, pela dificuldade que a maioria das pessoas têm de usá-lo. Entendo que toda língua é uma coisa viva e blah blah blah. Minha pulga atrás da orelha com a reforma não é, acreditem, fruto de uma mente retrógrada que tem medo de mudanças.

O problema, COMO SEMPRE, é o motivo da reforma. Já martelei aqui um quagüilhão de vezes que pra mim uma coisa certa feita pelo motivo errado torna-se automaticamente menos certa. Todos os motivos por trás dessa reforma ortográfica são uma palhaçada, e portanto pra mim a reforma é uma palhaçada.

O lance é que não é por causa das diferenças ortográficas que há pouco escambo cultural entre os países de língua portuguesa. Não há porque não há; imagino que o motivo principal por trás disso seja a insignificância econômica dos países que falam a nossa língua, já que quem não tem riqueza não se impõe de nenhuma maneira, tanto menos culturalmente. Se a causa das escassas trocas não é a ortografia, então pra que diabos tentar uniformizá-la?

Pior: diferenças ortográficas são facilmente, instintivamente contornáveis. Até o Leguinho entenderia se eu dissesse pra ele “cadê a gatinha que você adoptou?” em vez de “cadê a gatinha que você adotou?”. As reais diferenças entre as variantes do português, no entanto, caem na categoria “não instintivamente contornáveis”, pois são de natureza gramatical (pensem nas mesóclises e no uso de estar + a + infinitivo em vez do nosso estar + gerúndio, que eu acho muito mais legal – sou totalmente gerundófila), de estilo (o português é bem mais formal do que o brasileiro, a começar pelo uso pomposo de títulos como Senhor Engenheiro etc) e principalmente de vocabulário (temos o famoso exemplo de “bicha”, que em Portugal quer dizer “fila”, mas há muitos e muitos outros completamente alienígenas). Nada disso será resolvido com a nova reforma ortográfica.

Então quer saber? Por enquanto vou continuar com meus tremas, que amo. Vou tentar me familiarizar com os novos não-acentos, o que será muito difícil. E depois vamos ver no que vai dar