carolinices e a era da pracinha

Carol anda uma ferinha. Aprendeu a subir na poltrona e nas cadeirinhas de plástico tamanho criança que ficam na varanda. Há semanas tenta pegar o paninho de pia Perfex-like, se esticando toda nas pontas dos pés. Começou a fase dos tantrums quando não consegue o que quer, e quase sempre tenho ataque de riso porque o beiço estica todo pra frente e com aquela cabelação toda a cara dela fica muito engraçada. Anda tentando se vestir sozinha, o que na verdade significa que ela pega qualquer coisa de tecido que vê pela frente, inclusive toalhas e tapetes, e bota na cabeça, puxando pra um lado e pro outro como se eventualmente a eventual gola do objeto fosse passar pela cabeça dela e ela acabasse vestida. Eventualmente. Tem dias que só come se for sozinha, logicamente fazendo uma lambança danada. Eu nem olho pra não ter um treco. Tem loucura por cachorro, porque quando vai pra Arianna aquele pamonha do Demo se joga no chão na frente dela pra ela ficar lá dando tapinhas nele, puxando as orelhas, coçando a barriga, puxando o pelo, beliscando as costas, então tenho que segurá-la toda vez que passa um cachorro na frente, pra ela não sair correndo atrás. Aprendeu a piscar o olho (leia-se fechar os dois olhos) quando a gente diz “pisca”, a esfregar a barriga quando eu digo “lava a barriga”, a botar a língua pra fora quando a gente diz “como a Virgola bebe água?”, a fazer sim com a cabeça. Conhece todos os seus livros preferidos pelo nome e vai lá pegar quando a gente pede. E por aí vai.

E com o tempo melhorando começou a era da pracinha. Aqui atrás de casa tem um parquinho, mas não rola. Porque fica nos fundos dos prédios desvalorizadores de bairro aqui do meu, uma espécie de conjunto habitacional quadradão estilo mussolínico, infelizmente habitado pela pior gente que há: os napolitanos. Desconfiei logo na primeira vez em que fomos lá: muitas, muitas crianças gordas, usando roupas cafonas, meninos pequenos de cabelo comprido, mães gritando nomes equivalentes aos Jennifers e Wellingtons brasileiros (uma desgraçada botou o nome de Illia no filho, pena de morte nela), crianças comendo bolinho Ana Maria tabajara do Lidl e jogando a embalagem no chão. E foi aí que comecei a ouvir o sotaque. Socorro. Logo depois houve um encontro de primeiro grau muito, muito estranho. Um menino lourinho de óculos fundo de garrafa, de uns oito, nove anos, se aproximou da Carolina, sorriu e PREPAROU UM CHUTE na direção dela. “Ma sei scemo?”, exclamei, “Tá maluco, meu filho?”. Olha a resposta do psicopatinha: “Quero que ela chore pra eu descrever suas lágrimas”. WTF??? “Faz isso de novo e você vai ver quem vai sair chorando, seu louco!”, gritei, e saí literalmente correndo.

Então passei a frequentar o parquinho atrás da escola primária, no centro da cidade. Outro nível, embora viva cheio de romenas perpetuamente grávidas e rodeadas de crianças ranhentas. De muçulmanas não vemos nem a cor, porque a coitadas não podem se dar ao luxo de ficar passeando por aí sozinhas, mostrando a figura na medina (vamos repetir o mantra “a religião é uma merdammmmmmmmm a religião é uma merdammmmmm”). Mas a maior parte é de italianas mesmo, coisa que pode ser vista pela qualidade das roupas das crianças, os carrinhos de marcas conhecidas e não genéricos de supermercado que parecem frágeis como se fossem feitos de canudos de plástico, pelos nomes normais dos pimpolhos, pela ausência de gritos histéricos e inúteis à distância típicos de mães que estão cagando pro que os filhos estão fazendo, porque quando você realmente está tentando educar seu filho vai lá e diz o que tem que dizer em vez de ficar berrando “Giovanniiiiiiiiiiiiiiiii” a três quilômetros de distância sabendo que o Giovanni vai cagar e andar e continuar batendo no coleguinha.

O parquinho é grande e vive entupido de crianças de todos os tamanhos, de modo que a Carol fica entretidíssima, andando feito uma barata tonta de lá pra cá, pegando folhas e pedrinhas que ela leva de um lugar pro outro, de olho na bola dos meninos, querendo pegar os parafusos (don’t ask) das bicicletas dos outros e molhar a mão na torneira de água potável perto dos bancos. Volta pra casa exausta e começa a beliscar o próprio pescoço (sinal de que está com sono) já às sete da noite. Ainda não conversei com nenhuma mãe porque ela ainda não interage com as outras crianças e fica perambulando sozinha, mas sei que daqui a pouco vai rolar. Por enquanto tá bom assim: queimo muitas calorias power walking até o parquinho, paro na Coop pra fazer compras se precisar, ela vai falando “boyoboyoboyoboyo”, “manhamanhmanhamanha”, “atcheatcheatcheatche” sem parar na volta, e chegamos em casa devidamente exercitadas.

Incidência de TSI em espécimes de Carolinus filhadepacae

Abstract

O presente estudo analisa a incidência e o caráter de Terríveis Semanas Insones (TSI) em espécimes de Carolinus filhadepacae, com o objetivo de determinar suas causas e de identificar possíveis soluções. Episódios de TSI tem grande importância econômica e de saúde pública, visto que genitores com déficit de sono rendem menos no trabalho e tendem a dirigir mal, comportar-se mal com terceiros, comer mal e pular sessões de exercícios físicos.

Materiais e métodos

O estudo foi realizado observando um espécime de Carolinus filhadepacae no seu habitat natural, em dois meses consecutivos (outubro e novembro de 2009).

Descrição

No mês de outubro de 2009 o espécime em questão apresentou somente uma TSI, após a qual voltou a sleep through the night (STTN) como vinha fazendo anteriormente. Durante a TSI de outubro o espécime não só despertava várias vezes durante a noite, mas não era capaz de adormecer novamente, permanecendo por longos períodos (de 1 a 3 horas) em um estado que os observadores chamaram de “assanhamento intenso”. Tal estado incluía ficar em pé, falar, rir, escalar os genitores e procurar brinquedos. Entretanto, era claro o estado de necessidade intensa de sono, pois o espécime continuava a esfregar os olhos com as mãos e a coçar a cabeça, sinais claros de vontade de dormir.

O episódio de TSI no mês de novembro de 2009 durou quase o mês inteiro, mas assumiu um caráter completamente diferente. De fato, não houve poucos episódios de despertar total com assanhamento intenso e atividade física acelerada, mas sim numerosos episódios de leve despertar, não necessariamente relacionados à perda da chupeta, rapidamente resolvidos com apenas alguns segundos de colo.

Conclusão

A diversidade dos episódios e a ausência de relações óbvias com eventos particulares levou os observadores a concluir que sua possível causa seja o aparecimento da primeira dentição, que apresenta sintomas claros (esfregação das gengivas, excesso de salivação, irritabilidade, resmungos contínuos).

Mais estudos são necessários para determinar possíveis soluções para o problema, visto que os tradicionais geis contra dor nas gengivas e paracetamol não foram eficazes. Espera-se, contudo, que não haja mais episódios de TSI nos próximos meses.

ainda carolinices

Carol não pode ficar pelada (leia-se só de fralda) porque ela ABRE a merda da fralda. Então tenho que botar um biquini por cima, o que a Lulu deu ou o que a Chiara deu, e aí ela fica olhando pras bolinhas do biquini e esquece das abas da fralda.

Já estamos conseguindo ajoelhar segurando nas barras do berço! (Ela desistiu de ficar em pé no berço depois que bateu com a cara nas barras). Fico com ela sentada no tapetão da IKEA com bichos bordados, joaninhas que apitam etc, e ela começa a me escalar, empurrando com os pés até ficar em pé. Outro dia empurrou com tanta força que acabou voando por cima da minha perna e bateu com a cabeça no chão – não deu tempo de segurar. Chorou, mas foi por causa do susto porque desde então já deu outras cabeçadas e não reclamou mais. A irritação por ainda não conseguir ficar em pé sozinha, sem apoio, é intensa.

Obsessão total e desenfreada pelas seguintes coisas: minhas Havaianas roxas, o revestimento de borracha do controle remoto da sala e uma embalagem de Ovomaltine vazia.

Estamos gostando de Shaun the Sheep, que passa todos os dias depois de Two and a Half Men.

Quando ela não quer mais comer, das duas uma: ou finge que está com sono ou fica olhando pra baixo fingindo que não é com ela. Que ódio.

carolinices

. Ontem fiz papinha de legumes com truta. Porque aqui tem papinha de truta, salmão, linguado, avestruz, coelho, cavalo, essas coisas.

. Altas tentativas infrutíferas de engatinhar pra frente. De marcha a ré até que vai, mas pra frente tá difícil.

. Entramos naquela deliciooooosa fase de jogar coisas no chão. Vinte vezes seguidas.

. É a mesma fase da criança que rola ensandecidamente assim que você tira a fralda suja. Tipo, vontade de atirar dardos tranquilizantes na fera pra poder trocar a fralda, saca.

. Ainda não aprendemos a sentar, mas estamos quase lá.

. Quando não havia controles remotos nem celulares, no que é que as crianças ficavam vidradas, hein?

relou!

Falta de saco pra escrever é foda, né. É que ando sem tempo também, lógico. Porque não são só as coisas óbvias de bebê que tomam tempo; a Carol é particularmente time-consuming porque não mama no peito então tem que adicionar todas aquelas coisas chatas de mamadeira, esterilizar, lavar, esquentar, you name it.

Ela já fez três meses e melhorou muito, em tudo. Ela sempre soube a diferença entre noite e dia, tanto que mesmo nas primeiras semanas, com o Maldito Refluxo, de madrugada ela nunca deu escândalo. Agora ela mama à noite, entre dez e meia-noite, dependendo da hora em que voltamos pra casa (de casa de amigos ou de jantar fora), e só acorda de manhã cedo – passou um tempão acordando suiçamente às cinco todos os dias, mas já tem três dias que ela parece estar preferindo o turno das seis e meia. Depois passa a manhã inteira mamando e dormindo, mamando e dormindo, até mais ou menos a hora do almoço. Dificilmente dorme à tarde, mas não importa. Ficamos conversando – porque ela fala PRA CARALHO – ou lendo livros juntas ou treinando tirar e botar a chupeta na boca, essas coisas. Ela é tão interativa e engraçada e simpática que quando acontece dela dormir várias horas seguidas eu sinto falta da companhia dela. Além de ser cabeludérrima (já dá pra botar fivelinha e tudo), ela é muito expressiva e risonha, parecendo ser beeeeem mais velha do que é. Não sou eu quem estou dizendo, tá, antes que venham me encher; em TODOS os lugares onde vamos neguinho pergunta quantos meses ela tem, porque ela é pequena (parecia geneticamente impossível, mas, senhores, ela não tem fome) mas tem essa cara de senhorita, e todo mundo responde “três meses!!! Parece que tem três anos!!!”. Com pouco mais de um mês ela já tinha perdido aquela cara de bebê Estrela inexpressiva que recém-nascido tem.

Ela fica com a pele ao redor dos olhos vermelha quando faz xixi e imediatamente depois fica com soluço. Ela adora tomar banho. Ela empurra a mamadeira pra longe delicadamente com as mãos quando precisa parar de mamar pra dar um arroto básico. E dá um tapão na mamadeira se você for idiota, não entender o gesto e insistir. Ela ADORA ver televisão. Ela ri pra todo mundo. Ela já coça a cabeça. Essa semana aprendeu a puxar o nosso cabelo. Ontem quase rolou no berço; mais alguns dias de prática e consegue. Ela fica com a cabecinha em pé durinha há muuuito tempo. Ela entrou na fase de enfiar as mãos – às vezes ao mesmo tempo – na boca. Ela puxa a chupeta da boca pela fitinha do prendedor de chupeta. Ela tem cabelos impenteáveis, com vontade própria, que crescem pros lados e pra cima. Ela testa o sabor do leite com a língua antes de mamar, que não é boba. Ela ri pra gente quando ficamos de frente pro espelho com ela no colo. Ela não é muito chegada em carrinho; gosta mais disso aqui. Ela não fica nem dois minutos com a fralda molhada, de modo que provavelmente a primeira palavra que ela vai falar vai ser “xixi”. Ela adora o bercinho dela e ultimamente só cai no sono quando é colocada lá. Tudo isso, notem bem, sem ja-mais ter deixado a garota berrar. Nada de método cry-it-out aqui; bebê tem que ser acudido quando chora E PRONTO.

O único defeito grave dela é essa aversão à comida. Não só é completamente peitofóbica, mas nem mesmo com a mamadeira rola uma refeição em paz, ela fica se remexendo, virando a cabeça, dando tapa na mamadeira, rindo e tentando falar e mamar ao mesmo tempo, um verdadeiro porre. Isso pode vir a ser útil no futuro, já que a última coisa que eu desejo pra ela é ser compulsiva com comida, gorda e complexada que nem eu, mas por enquanto está sendo um problemão. Embora não seja exatamente magricela, também não é cheinha, e não está ganhando peso como deveria. Vamos ter que desmamá-la mais cedo, porque de repente rola algum problema com o raio do leite que vai desaparecer com a entrada dos sólidos.

Digamos que atualmente a única coisa que eu pediria a deus é tempo pra 1) ler e 2) malhar. Porque estou eLorme de gorda. O tempo horroroso lá fora não ajuda, já que não dá pra sair com ela no meio do vento gelado e chuva. Acabamos ficando em casa, eu logicamente me entupindo de besteira, praticamente compensando tudo o que ela não come. Socorro.

A burocracia pra gente viajar não anda ajudando, mas provavelmente iremos ao Rio no final de maio, pra passar uns dois meses. Dedinhos cruzados, faz favor.

de amamentação

Não sei por que ninguém explica isso pras grávidas logo no começo: amamentar não é fácil. Nem toda criança já nasce sabendo o que fazer e pega o peito direito, arrota e capota. Amamentar também é doloroso: o peito racha, quando você tá cheia de leite o peito dói, tem mulher que tem mastite, e outras mazelas. Amamentar suja tudo: eu não tenho uma cascata de leite que esguicha só de pensar na minha filha, como acontece com algumas mulheres, mas de qualquer maneira quem está amamentando sempre corre o risco de vazamentos e tem que usar aqueles absorventes malditos pros seios. Eu descobri o LilyPadz há muito tempo, porque a Chalene usa pra achatar os mamilos e evitar o efeito “farol alto”, e depois a Lu comentou no blog e eu lembrei da existência do negócio e comprei (pela internet, lógico, que aqui no Zaire não existem essas modernidades). Recomendo altamente.

Eu conhecia a La Leche League nos EUA mas não sabia que elas estavam presentes no mundo todo. Dei mole, pesquisei tanta coisa na internet mas não sei por que negligenciei esse aspecto da maternidade. E agora estou com um bebê que tem pavor do peito por motivos compreensíveis, mas que quando está de bom humor e aceita, só pega o esquerdo. Impressionante como não há santo que resolva: o direito ela não quer de jeito nenhum. Pesquisando por refluxo acabei caindo no site da LLL italiana, e entrei em contato com a orientadora deles em Foligno. No primeiro sábado de março vou ao encontro mensal pra ver se me dão algum conselho útil. No dia anterior temos uma ultra marcada pra avaliar o nível do refluxo e ver se é necessário usar outros remédios mais fortes, embora a pediatra tenha dito que dificilmente vai ser o caso da Carol, já que ela tá ganhando peso normalmente. Paciência, paciência, tem que ter paciência.

A Dri tava falando que se um dia tiver filho vai tacar logo uma fórmula se o bebê não for do tipo que já nasce programado pra mamar, pra evitar essas encheções de saco. Entendo completamente. Só que leite artificial só tem desvantagens: além das mais óbvias, a falta de anticorpos naturais, a falta de bonding com o bebê e a grana que se gasta, há outras. A lavação e esterilização de mamadeiras e bicos é um porre e toma um tempo enorme. A fórmula preparada tem que ser consumida em pouquíssimo tempo, senão tem que jogar fora. Se o bebê começa a mamar mas deixa uma certa quantidade na mamadeira e dorme, você tem que jogar fora o resto, pois em pouco tempo o leite fermenta e estraga (ou perde as propriedades nutricionais, não entendi direito). A sua diaper bag, já entupida de fraldas, lenços umidecidos, mudas de roupa, chupeta, changing mat etc, vai ficar mais entupida ainda com mamadeiras, recipiente pro leite em pó, garrafa de água mineral. Leite artificial tende a dar uma certa prisão de ventre. E no caso específico da Carol o leite artificial é a maior roubada, porque demora duas vezes mais pra ser digerido. Se ela já leva uma vida pra digerir o meu, imagina o artificial! A coitada da garota ia ficar que nem galinha fabricadora de ovo em granja, de olhos esbugalhados acordada o dia inteiro só comendo e fazendo cocô. Não rola. Vou insistir no peito até quando der, e começar com sólidos assim que possível. E torcer pra ela ter saído mais italiana do que brasileira e a-do-rar uma saladinha, em vez de comer só por obrigação moral como eu.

de amizades gravídicas

Então você tem uma amiga que está grávida.

Faça um favor a ela e dê seu presente logo, antes do bebê nascer, pra ela poder se programar e só comprar o necessário e não ficar com zilhões de coisas a mais ou repetidas, e pra poder dar tempo dela trocar o presente se não gostar. E se o bebê for uma menina, POR FAVOR ESQUEÇA O ROSA. Porque as pessoas em geral não têm muita imaginação e praticamente todo mundo vai dar algum presente cor-de-rosa. Eu comprei um monte de coisas lilás, creme, cinza com detalhes coloridos, mas praticamente todos os presentes que ganhei foram cor-de-rosa. Putz.

Faça um favor maior ainda e NÃO VÁ VISITÁ-LA ANTES DO BEBÊ FAZER UM MÊS. Se possível, não antes dos três meses. Porque como eu disse antes, no início você não tem tempo nem pra fazer xixi. Se você aparecer pra visitar, mesmo telefonando antes, é altamente provável que 1) ela esteja amamentando (no meu caso, só de pensar em amamentar em público eu choro de nervoso, tenho que sair correndo e me esconder), 2) a criança esteja dormindo, o que significa que a mãe vai querer aproveitar pra dormir também, 3) a criança esteja berrando e você não vai conseguir conversar e ainda vai ficar um clima superchato, 4) os pais vão estar ocupados com outras coisas bebezais, tipo trocando uma fralda cagada, e não vão poder nem querer te dar atenção, 5) a casa vai estar uma zona, 6) tudo isso ao mesmo tempo. Mãe nenhuma do mundo está pronta pra socializar no primeiro mês. Sua amiga vai ligar quando estiver pronta pra receber visitas novamente. Eu não atendo nem o telefone, no máximo respondo a SMS e mesmo assim só quando dá tempo e/ou estou com vontade.

do primeiro mês, refluxo e outras coisas baby-related

Recém-nascidos são facas de dois gumes.

Se por um lado são foférrimos, tchutchucos e sempre surpreendentes, por outro lado demoram muito a ficarem realmente interessantes, porque só começam a interagir de verdade bem mais tarde. Nos primeiros meses um bebê é só um robô com as seguintes funções: CAGAR – MIJAR – CHORAR – MAMAR – DORMIR. Mais nada. Muito chato.

Minto: a Carol já sorri, já ri, já segura a mamadeira, já levanta a cabeça sozinha, já segue a gente com o olhar, ou seja, já é um pouco melhor do que um robozinho cagador. Faz um monte de caretas, se espreguiça com um entusiasmo contagiante, agita os braços feito a Elis Regina, como diz a minha mãe, e faz a gente dar um monte de risadas. Mas na maior parte do tempo ela está cagando, mijando, chorando, mamando ou dormindo. Logicamente sem o menor respeito pelo ciclo circadiano de ninguém, o que torna as madrugadas particularmente desumanas. Até que nem posso reclamar muito porque quando ela não sente dor de nada fica quietinha olhando pra gente, e de madrugada tende – eu disse tende, mas não é garantia de nada – a capotar logo depois de mamar, mas quando dá pra chorar, sai de baixo.

O problema é que a Carol tem refluxo gastroesofageano, um negócio muito chato. Eu pelo menos podia soltar uns palavrões quando a azia atacava com força, mas ela não tem essa vantagem. Então ela chora. Berra. Bem no nosso ouvido. Mas o pior de tudo é que ela é L-E-N-T-A. Considerando a minha velocidade supersônica e a do Mirco idem, só posso concluir que ela puxou o lado Dáquer, porque todo mundo da família do meu pai acha normal almoçar depois das 3 da tarde e chegar atrasado em todos os compromissos. A Carol leva meia hora só pra acordar, o que me dá nervoso só de ver, já que normalmente abro os olhos e pulo da cama praticamente ao mesmo tempo. Fica fazendo barulhinhos bizarros (“É, É, É”) e roucos (por causa do refluxo) e se espreguiçando loucamente durante alguns minutos, só o suficiente pra me acordar, e depois dorme de novo. Pouco depois recomeça, pára de novo, recomeça, fica meia hora nesse processo de acordação. Até que desperta de verdade, azul de fome e portanto berrando. Agora ela não me engana mais: quando escuto o primeiro É É É levanto da cama, empurro o berço (com rodinhas) até a sala, boto a panela com água no fogo, tiro a mamadeira da geladeira, desligo o fogo, boto a mamadeira em banho-maria, troco a fralda dela (da Carol, não da mamadeira) porque se trocar depois da mamada ela regurgita tudo e chora e porque ela não fica suja nem cinco minutos sem dar ataque, sento no sofá da sala, que virou um acampamento, dou a mamadeira um pouquinho com ela ainda meio que dormindo, tento botar pra arrotar (ela é uma menina muito fina e não arrota nunca. Saco.), dou mais um pouquinho, outro arroto (idem), ela dorme no meio da coisa, tento estimulá-la fazendo cosquinha nos pés, ela mama mais um pouco, depois tenho que ficar com ela meia hora mais ou menos em pé no meu colo pro leite não voltar, se tudo correr bem ela já caiu no sono e vai pra cama. Aí eu vou tirar a bombinha do esterilizador, ordenhar feito uma vaca leiteira, botar as mamadeiras cheias na geladeira atrás das outras que já estão lá, lavar a mamadeira que ela acabou de usar, lavar a bombinha, botar tudo no esterilizador, botar o esterilizador no microondas por 7 minutos, levar o berço de volta pro quarto e dormir por tipo meia hora. Até a próxima mamada. E quando não estou fazendo nada disso estou cozinhando, botando roupa na máquina – porque bebê suja roupa BAGARAY – ou pendurando roupa no varal.

Ela não mama no peito porque não dá pra mamar em pé, e ficando na horizontal é batata: o leite bate e volta, cheio de ácido pra queimar o esôfago da coitada. De vez em quando eu insisto porque por mais que a bombinha seja legal, não estimula o peito do mesmo jeito que a boca do bebê estimula, e a tendência é o meu leite secar. Mas ela odeia, vira a cara e se suja toda de leite, me dá tapas, berra, se esgoela. Nada daquelas cenas românticas, bebê olhando amorosamente pra mãe, mãozinha no peito, se sentindo seguro e tranqüilo. Ela fica assim com a mamadeira, mas aí até o Leguinho poderia estar dando de mamar que ela ficaria com a mesma expressão de adoração nos olhos, nem tem graça. Mas ela adora dormir deitada de bruços no meu peito (e eu praticamente sentada, destruindo a coluna), e ri dormindo. Então compensa.

Não preciso nem dizer que tudo isso é MUITO cansativo. Ela toma três remédios diferentes – dois pra cólica e um pro refluxo – e mesmo assim toda hora dá uma chorada power. Normalmente fico com ela à noite e lá pras cinco da manhã minha mãe levanta e vem me render, e eu consigo dormir umas horinhas depois do café. Mesmo assim é muito cansativo pra nós duas, porque ouvir criança chorando, ter que ficar com criança no colo – o que significa que você não pode fazer mais nada, com as mãos ocupadas e a atenção concentrada no bebê – é um trabalhão danado, e emocionalmente desgastante. Nos dias em que ela tá mais chatinha e chorona não dá tempo nem de fazer xixi. Só estou aqui escrevendo porque a Arianna veio visitar e fica horas com ela no colo, e porque essa noite ela dormiu bem e estou razoavelmente descansada, e porque amanhã a faxineira vem dar uma geral aqui no chiqueiro. Só estou aceitando trabalhos com prazos muuuuuuuuuuuuito longos de entrega porque dificilmente consigo ficar uma hora inteira na frente do computador. E o maaaais legal é que não há muito o que fazer com esse diabo de refluxo: tem que ter paciência, porque ela tá ganhando peso mesmo dormindo pouco e mamando menos do que deveria, ou seja, o refluxo não está atrapalhando nada além da nossa sanidade mental. Segundo a pediatra, nesses casos o bebê passa pra sólidos assim que possível (em torno dos 3-4 meses), o que deve simplificar a nossa vida. Ou não.

adendo

Perdoem-me, mas ficou faltando um pedaço nos posts anteriores.

A minha comparação da gravidez com o vestibular e a minha descrição do parto tinham como objetivo ilustrar o seguinte fato inconfutável: que por mais que o resultado final de uma coisa horrível seja maravilhoso, a coisa que você mais deseja no mundo e/ou a pessoinha que você mais ama no mundo, nada disso torna a coisa horrível menos horrível. O fato de ter tido uma filha linda, esperta e só razoavelmente chatinha (mais detalhes em outro post), queridíssima e planejadíssima, não anula a… “hediondidade” da gravidez e do parto. Assim como passar no curso que você escolheu e pra faculdade que você queria não torna o ano do vestibular mais agradável. Gravidez é UM PORRE, parto É UM HORROR HORROR HORROR HORROR HORROR HORROR, e não acredite em quem diz que tudo são flores. Está mentindo. TÁ MENTINDO SIM. Porque a parcela de mulheres que têm uma gravidez superlight (ou seja, totalmente assintomática) e um parto idem é tão ínfima que a probabilidade dessa mulher que diz que “adorou ficar grávida” e que “o parto não doeu nada” ser uma delas é praticamente nula. Portanto ela está mentindo. Não acredite. Se eu faria tudo de novo pela minha Tartaruguinha? Claro. Mas reclamaria o tempo todo de novo, porque vou te contar, não é mole não.

do parto

Acordei mais ou menos à uma da madrugada do dia 26 pra 27 de janeiro pra fazer o enésimo xixi da noite. Só que o xixi veio acompanhado de uma dor muito chata que eu imagino que fosse uma cólica menstrual mais forte (não sei porque não tenho TPM). Na verdade eu tinha passado o dia inteiro sentindo essas dores, mas como fiquei batendo papo com a minha mãe, me distraí e nem prestei atenção. Dessa vez não dava pra ignorar: era forte MESMO. Como veio e passou, sentei no computador pra terminar umas três laudas de um trabalho que eu tinha que entregar no dia seguinte. Terminei às duas da manhã e ainda tentei dormir de novo, mas de vez em quando a dor voltava e não dava mais. Acordei Mirco e mamãe e tocamos pro hospital de Foligno.

Chegamos lá às quatro da manhã. Subimos até o segundo andar e demos de cara com a enfermaria de obstetrícia completamente vazia e às escuras. Ninguém na recepção, nada. Àquela altura eu já tava me contorcendo de dor e começando a mandar praquele lugar toda vez que sugeriam que era melhor eu sentar (também não sei onde queriam que eu sentasse, já que não tinha bancos nem cadeiras em lugar nenhum). Mirco desceu até a entrada do hospital pra catar alguém e voltou acompanhado de uma enfermeira que apontou pra uma salinha. Tocaram a campainha e saíram duas enfermeiras com cara amassada de sono. Uma delas pegou um interfone e falou “grávida em trabalho”. Logo apareceu a obstetra, uma senhora baixinha de óculos com uma cara sorridente que me botou logo pra fazer o traçado tocográfico. Eu avisei a ela que provavelmente já estava bem dilatada, já que de acordo com os últimos exames físicos e ultras a Carol tava prontinha pra nascer há o maior tempão, com a cabeça encaixadona. Mas ela tava com outra grávida na sala de parto e me deixou lá com o monitor. As contrações foram ficando mais freqüentes e eu já tava subindo pelas paredes de dor. Quando ela voltou, meia hora mais tarde, olhou pro monitor e travou-se o seguinte diálogo:

– Xiii, que contrações xexelentas… Pode ser que eu tenha que mandar você de volta pra casa…

– Nãoooooo! Dá pra fazer um exame físico? Eu tenho certeza que estou dilatadaAAAAAARGH!

– Vamos ver…

(Fez o toque)

– Caraca. O colo do útero tá mole feito manteiga, dilatadérrimo!

– …

– ‘Bora, ‘bora! Cadê a camisola?

Botei a minha camisola, apareceu alguém com uma cadeira de rodas, me sentaram na cadeira e me levaram embora pra sala de parto.

– Senhora, onde estão os seus exames?

– Putz, esqueci!

– Como assim, esqueceu? Não estavam na mala?

– Não, porque eu tinha outro traçado marcado pra daqui a quatro horas, os exames estavam perto da porta!

– Vou pedir pro seu marido ir buscar.

Chega a anestesista.

– Ouvi dizer que a senhora está sem os exames.

– Meu marido foi buscar. Mas os resultados da coagulação estavam todos OK. AAAAAARGH!

– Tem certeza? Olha lá, hein!

– Tenho sim, TAP, PTT, fibrinogênio, tudo normal. AAAAAAAAAAAAAAI!

– Vou confiar em você porque tô vendo que você é uma pessoa instruída e entende os riscos em caso contrário.

– Obrigada obrigada obrigadaaaaaaaaaaaaaaaaai!

Sento na borda da cama, curvada pra frente.

– Hm, a sua coluna é tão ruinzinha…

– (em pânico) COMO ASSIM RUINZINHA? AAAAAAAAAAAAAAI!

– Um pouco de escoliose, e os processos vertebrais são pouco visíveis, não tô conseguindo encontrar um ponto de referência… [vejam como ela foi diplomática e escolheu não comentar o fato de que eu engordei feito um javali e isso também não ajudou]

– Confio na senhora, doutoraAAAAAAAAAAAAAAAAAAAARGH!

– Vou tentar aqui… (passa um tempinho) Nada. Vou tentar de novo. (mais um tempinho) Hm, nada… Vou tentar só mais uma vez, senhora, se não der agora não vou ficar furando você não, vamos desistir.

– Pode me furar à vontade, pelamordedeus pelamordedeus pelamordedeus faz parar essa dor malditaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!

– Caramba, não sei como mas eu consegui!

A obstetra sorridente cochicha no meu ouvido:

– Não falei que essa anestesista era batuta?

(Ela passou o tempo todo me dizendo pra ignorar o idiota do ginecologista, que ficou puto porque eu não tava com os exames e era antipaticíssimo, e repetindo que a anestesista era foda e que ia conseguir com certeza.)

Dou um enorme suspiro de alívio quando sinto a anestesia fazer efeito. A dor é substituída por, perdoem-me o TMI, vontade de fazer cocô. Só que eu também estava com vontade de fazer xixi. Quando falei pra obstetra que estava apertada, ela achou que era vontade de fazer cocô, ou seja, o estímulo pra fazer força pro bebê sair. Eu, anestesiadona e totalmente fora do ar de tanto que eu já tava de saco cheio daquilo tudo, nem lembrei de especificar que eu queria era um xixizinho básico. Quando finalmente a obstetra deu o OK pra eu empurrar, chegaram duas enfermeiras suuuupersimpáticas, uma jovem lourinha e uma feia com cara de brasileira, e a pediatra, uma senhora de cabelos grisalhos cortados Chanel. Todas fazendo a maior torcida e me dando os parabéns por estar encarando tudo sozinha (a minha mãe estava na sala ao lado e o Mirco foi sumariamente enxotado por mim), a obstetra repetindo “vai, vai, força que os cabelos estão chegando!”, eu empurrando, sem gritar mas fazendo nnnnnnng! até a garganta doer… e nada. As contrações não eram fortes o suficiente. No final das contas me deram uma oxitocina básica e logo depois a Carol saiu, se esgoelando. Apgar 10 e 10. Nasceu às seis e meia do dia 27. Um parto relativamente rápido e sem complicações, com dois pontos de episiorrafia, mas quer saber… VAI DOER ASSIM NA CASA DO CARALHO. Ninguém merece, juro. Não consigo nem imaginar esse povo que encara trabalho de parto de não sei quantas horas sem anestesia.

Agora… Ô país mais atrasado, vou te contar – Foligno é o ÚNICO hospital de TODA A ÚMBRIA a oferecer epidural grátis e disponível 24 horas por dia. E quando eu dizia que ia ter neném em Foligno porque tinha epidural, todo mundo me olhava de modo estranho e perguntava, “ué, mas por que você quer epidural?”. Juro. Zaireeeeeeeeeeeeeee!

(A minha resposta pronta era “porque não estamos mais na Idade Média, dahling”).