il mondiale di calcio

Começou a animação pra Copa. Eu ADORO Copa, Olimpíadas de qualquer tipo, competições internacionais em geral. Mas não adoro esses eventos porque gosto de torcer pelo Brasil; nunca fui fanática por coisa nenhuma a não ser por leitura, e meu patriotismo é só aquele mínimo com o qual todos nascemos. Não tenho aquela ânsia de defender o verde-e-amarelo, não fico desesperada com partidas perdidas. Gosto porque os jogos são sempre interessantes e bonitos, porque as bandeiras são coloridas, porque os nomes dos jogadores são bizarros, porque rola um espírito de competição que deve ter seu lado ambíguo pra quem joga, já que todos os jogadores se conhecem e freqüentemente jogam no mesmo time pela maior parte do ano. Gosto e pronto. Mas na verdade quando assisto a uma partida – e na Copa eu assisto a QUALQUER partida com a mesma emoção – fico sempre triste por quem perde (desde que não seja a Argentina, claro) e feliz por quem ganha.

Não sinto falta de torcer “entre brasileiros”. Acho que me divertiria do mesmo jeito entre meus amigos italianos. Sinto falta é daquela maluquice coletiva que rola no Brasil, do asfalto pintado e das bandeirinhas que atravessam as ruas. Aqui futebol é coisa muito, muito séria mesmo, mas eles não são chegados a essas farofadas, vocês sabem. Então nem parece que tá rolando nada. Você sabe que tá rolando TUDO, mas não aparece nada na superfície, sacam. É muito bizarro.

babel

E depois de uma manhã rodando em lojas de móveis e uma tarde trabalhando feito doida, fomos jantar na casa da Arianna. Só que a Stefania tinha chegado da Holanda com o Rob, o pai do Rob e a namorada do pai do Rob. Vocês não podem imaginar a quantidade de risadas que demos, e a dor de cabeça que nos ficou depois de uma soirée falada em 4 línguas diferentes – cinco, se contarmos o dialeto incompreensível do Ettore. Os pais do Rob são fofinhos, branquinhos, holandesinhos, cheirosinhos, arrumadinhos, e falam aquela língua estranha que ninguém entende. Gostaram de tudo, e olha que a comida nem tava essas coisas. Até fava crua com queijo pecorino eles comeram, porque o tio do Mirco insistiu. Nada de cachorros na sala porque a namorada tem medo; Leguinho e Demo ficaram lá fora chamando a gente de vez em quando. Mas foi um jantar muito divertido :)

pranzo primo maggio

O almoço de primeiro de maio normalmente se faz em restaurante. O patrão paga e come junto com os funcionários. No ano passado resolvemos fazer na casa da Arianna, porque dinheiro não dá em árvores, e esse ano repetimos a experiência.

Quem se ocupou da cozinha foi o tio Guerriero, claro, o Homem dos Dedos Gigantescos, porque quando o assunto é cozinha é ele quem manda e fim de papo.

Ótimo, porque vai cozinhar bem assim na casa do chapéu. O menu:

Coratella di agnello con torta al testo – uma espécie de ensopadinho medonho com os órgãos internos do cordeiro. Tradicionalmente servido com a famosa torta al testo, que compramos no Leo, um velho que só faz isso na vida há anos, em Tordandrea.

Fischioni al sugo d’oca – fischioni è um outro nome pra tortiglioni, uma massa curta que eu nunca compro porque detesto, e acho que só combina com o molho de ganso mesmo. Apesar de menos temperado do que eu normalmente gosto, estava MUITO bom. Mas a morte do molho de ganso é, pra mim, o gnocco. Gnocchetti al sugo d’oca è assim qualquer coisa.

Agnello arrosto e cappone arrosto – cordeiro e galo castrado, assados no forno a lenha. Nunca cozinham porco pro almoço de primeiro de maio porque tem sempre algum muçulmano na “equipe”.

Patate arrosto e insalata – batatas no forno e salada fresca, da horta.

E, de sobremesa, o tiramisù, que o Guerriero levou horas batendo pra não ficar com gosto de ovo.

Os cachorros fizeram a festa com o tanto de ossos que ganharam e aquele monte de gente andando pra lá e pra cá. Brincaram tanto que às sete da noite estavam todos estendidos pelo chão, destruídos, massa falida total. Gatos idem.

Da esquerda pra direita: Maurizio, o Hominho, de Brufa; Stefano, gigantesco, de Cannara, com a mão apoiada no Mustafa, o Marroquino dos Dentes Marrons; Marco, de Bastia; Yavo, maluco da Costa do Marfim, que trabalha só ocasionalmente na oficina porque não sabe fazer nada (não sabe nem de que planeta veio… Mas é uma figuraça e é sempre a alegria da festa, apesar de ninguém entender o que ele diz); Ettore, Mika (irmão do Dejan, o sérvio que está em pé) e Mirco. E, claro, Leguinho e Demo. Faltou o Hussei, que apesar do nome é da Croácia, e o Rinat, que é do Usbequistão. E Jorge, equatoriano, que está de licença médica e ninguém sabe por quê.

jantar

Pra variar, jantamos fora. Dessa vez com Mario e Maria Rita, que já estavam saindo pra jantar com outros amigos e nos incluíram no programa. Fomos à Locanda dei Golosi, lá na casa do chapéu, onde fomos com Spartaco e cia há pouco tempo. O mesmo garçom fedorento, socorro! Mas comemos bem, e batemos altos papos.

Nessas horas é que eu vejo como a vida é estranha. Meu namorado é lanterneiro, Mario tem uma loja de flores e a mulher, siciliana, é ex-cabeleireira e ex-caixa da Metro. O outro casal era uma advogada grávida e um contador. O outro casal é uma caixa da Coop e um técnico de informática. Variedade é isso. Lógico que não rola discutir cinema ou literatura com essa gente, mas eu acabo sempre dando risada e aprendendo alguma coisa. De vez em quando é até bom socializar, sabe…

show

Acabamos de chegar do show do Califano, no Country, a boate in de Bastia. Saímos de casa achando que iria ser a maior roubada, mas até que não. Marco e Michela nos convenceram a pagar 25 paus por cabeça, jantar e show incluídos. Eu não conheço o Califano, não sei nada dele, não gosto de música italiana e odeio boate, mas juro que me diverti.

O Country é uma boate estranha. Como a maioria das discotecas daqui, eles também oferecem jantar (vocês me digam por favor qual atividade social italiana não envolve comida). Foi a primeira vez que jantei em discoteca, e o menu não era de todo ruim: muitos antipasti (mil folhas de verdura e queijo, prosciutto crudo, saladinha de camarão com feijão branco), três mini-porções de macarrão (três receitas diferentes: minignocchi com lingüiça e molho branco, um cappellettão com recheio de alcachofra, e ravioli com recheio de ricota e espinafre), um secondo (duas fatias de ótima carne de panela) e um contorno (tortinha de verdura). Ficou faltando só a sobremesa, até porque o show começou tardão e praticamente neguinho engoliu a carne pra poder atravessar a pista de dança entupida e ficar mais perto do Califano.

A história desse cara parece que é a seguinte: cantor de um sucesso só, que aliás eu não conheço, ele também é um famoso compositor. As letras não são ruins, e a voz, apesar da idade, das drogas e da gordura, ainda é firme. A ponta do nariz quase chega na boca; presumo que a cocaína tenha destruído todo o tecido cartilaginoso de sustentação do pobre apêndice respirador. Óculos escuros, copinho de Campari sempre à mão, camisa branca de linho, e uma certa dificuldade pra respirar. Alternava um golinho de Campari com uma sprayzada da bombinha pra asma. Eu não conhecia NENHUMA das músicas, mas o grupo que o acompanhava tocava bem direitinho, e reconheci um ritmozinho de bossa nova em muitas das canções. O pessoal, lógico, conhecia tudo, e cantava junto o tempo todo. Ele parecia feliz, apesar de estar tocando numa boate ridícula de uma cidadezinha ridícula do interior do Zaire; o show foi relativamente curto, começou logo depois uma seleção muito boa de músicas mas o DJ falava o tempo todo por cima, me irritei e fomos embora até que meio cedo. Foi muito menos pior do que eu esperava.

jantarzim de novo

E ontem teve outro jantar maneiro. Dessa vez fui sozinha, com o pessoal do curso de narrativa que fiz em Perugia em novembro passado. A mailing list do curso é muito movimentada, e o pessoal que mora aqui no interior do Zaire resolveu combinar de se encontrar de pessoa. Aqui da vallata tinha eu e a Laura, que é napolitana mas mora em Tordandrea; tinha Arturo, outro napolitano, e Maurizio, ambos de Gubbio, e Matteo e Livia, que vieram de Veneza. Mais tarde apareceu a outra Laura, que é de Rovigo mas mora em Perugia e é superfã da Newlands, além de ser um amor de pessoa, e a louca ensandecida da Monique, belga naturalizada italiana, amiga do Arturo. Jantamos no Dal Mi’ Cocco, trattoria tradicional de Perugia, que serve pasta fatta in casa, tem cardápio (hilário) escrito em dialeto perugino e coisa e tal. Como eu tinha almoçado três pedaços gigantes de torta al testo com duas lingüiças e mais tanto de queijo e lombinho defumado na casa da mãe da Michela, não estava com a mínima fome e nem curti tanto assim o jantar. Mas a serata foi muito legal, respiramos cultura (hohoho) e sobretudo rimos muito. Como é bom conversar com gente que gosta de ler :))))) O jantar bizarro teve direito inclusive a garçom intelectual, que, ao ouvir a Monique dizer que os belgas eram mais machos que os franceses, exclamou, enquanto servia as tagliatelle:

– É, mas Vercingetorix é Vercingetorix, né. Teve todo aquele lance de Alesia e tal.

As opiniões gerais sobre a minha pessoa foram unanimamente duas: minha saia de tweed da Animale é um escândalo de linda, ao ponto que até os meninos repararam, em momentos diferentes, e eu sou interessante de-más pra não escrever algo de decente e participar de algum concurso de literatura. A julgar pelos primeiros prêmios que muita porcaria anda ganhando por aí, I stand a good chance. Vamo esperar passar esse período de provas na faculdade, né, lindos. Depois quem sabe eu me aventuro.

jantarzim

Ontem fomos jantar com os meus ex-alunos, os Três Mosqueteiros, lembram? Bom, na verdade primeiro fomos visitar a Mosqueteira Flavia, que está se recuperando de um pós-parto complicadíssimo e não pode botar os pezinhos fora de casa. Rimos muito com o filho mais velho, Francesco, que apareceu na sala vestido de legionário. Perguntamos quem ele era, e estávamos todos esperando algo tipo Maximus, mas ele vem com “Ettore, quello di Troia”, e nós aaaaaaaaaaah! Ele continuou falando de personagens históricos, da Ilíada, da Odisséia de Ulisses, de Orlando Furioso, e todos nós de boca aberta, porque afinal o garoto só tem cinco anos. Ainda recitou a fala final do Aragorn em um dos filmes, com espada na mão e tudo (espada cujo nome ele sabia, by the way). Depois desse choque cultural, fomos jantar num restaurante que o Spartaco tinha reservado, com um nome cafonissimo, La Locanda dei Golosi. O lugar fica meio lá nos cafundós, pros lados da FeRnanda, e é elooooooorme. Nosso garçom era um gordo fedorento que faz aula de informática com o Spartaco, e mais um adolescentão bonitinho e educado. Levamos horas pra ser servidos, com toda aquela gente, e ainda levamos esporro por conta de umas crianças incrivelmente mal educadas que ficavam torrando a paciência dos garçons, coitados, que passavam abarrotados de pratos e bandejas pra lá e pra cá. Não adiantou explicar que os filhos não eram nossos; estavam perto da nossa mesa, então eram de nossa reponsabilidade moral.

Fora a incrível dor de garganta que senti mais tarde, por ter dado tanta aula a semana inteira e ter me esgoelado pra me fazer ouvir no restaurante lotado, o jantar foi muito legal. Os meninos são ótimos, as esposas idem, todo mundo gosta de viajar, todos são organizadinhos e certinhos e enlouquecem com a incompetência italiana, enfim, rola uma grande compatibilidade. O papo foi ótimo e demos muita risada. Chegamos em casa revigorados.

o uzbequistão é aqui

Ontem jantamos na casa do Marco e da Tania. O Marco estudou com o Gianni e o Mirco, e a Tania é do Uzbequistão (!!!). Gastronomicamente foi uma grande decepção, porque a gente tava crente que ia rolar uma culinária uzbeq, mas que nada: Tania foi de canneloni mesmo, depois teve rosbife (aqui rosbife não tem nada a ver com o verdadeiro roast-beef, mas enfim) e supplì, aquele bolinho de arroz frito. Tinha salada russa, mas eu abomino maionese, e combinada com pepinos em conserva, então, não tem santo no mundo que me faça comer. O doce, com creme de nozes e mel, parecia muito com os doces que a família sérvia faz sempre, e tava bem gostoso. Chiara levou uns pasteizinhos em gosto com recheio de Nutella, mas não valia a pena engordar por aquela besteirinha. Até que me comportei, mas hoje de manhã já fiz meia hora de step pra compensar.

A Tania é uma garota legal. Não sabemos nada do passado dela, e seu italiano ainda é muito carregado de sotaque russo (e ela come todos os artigos), mas é uma garota legal. Como Chiara e Gianni são sempre boa companhia, acabou que passamos uma serata bem gostosinha. De vez em quando – mas não sempre – é bom socializar.

poupe-me

Essa semana tá rolando a Eurochocolate, em Perugia. É uma feira internacional do chocolate, e é a coisa mais inútil que eu já vi. Tudo é caríssimo, a cidade fica entupida de gente e mal dá pra andar na rua, e afinal de contas chocolate é sempre chocolate: o europeu é definitivamente, mas DEFINITIVAMENTE superior ao brasileiro e ao americano, então qualquer marca que você comprar por essas bandas vai ser muito boa. Pra que diabos tanto furdúncio em torno de uma coisa que você pode perfeitamente comprar no supermercado?

A cidade vira uma zona, o trânsito fica pior do que já é, são milhões de tendas, de mostras, de palestras. Mas amostra grátis que é bom, nada, né, nêga.

juruna

O programa de índio hoje foi o seguinte: acordamos às quatro da manhã, Moreno passou pra nos pegar e lá fomos nós rumo a Castellammare di Stabia, perto de Nápolis (Julie, se eu tivesse ficado sabendo disso antes teria te avisado, mas só combinamos tudo tarde da noite no sábado!), levar o cachorro do Moreno pra uma exposição.

O Moreno é um amor, mas tem umas infantilidades que realmente me irritam. Gastou uma grana comprando um filhote de Dobermann, ridiculamente chamado Akyn, gasta mais uma grana preta pra adestrar o bicho, comprando ração top de linha, acessórios desnecessários, e toda aquela parafernália da qual só cachorro com pedigree, frágil e geneticamente esquisito, precisa. E ainda por cima resolveu entrar no mundo das exposições caninas. Valha-me!!!

Curiosos, eu e Mirco aceitamos o convite e resolvemos fazer companhia pro coitado do Moreno, que nunca participou dessas coisas e não queria chegar lá sozinho, sem saber o que fazer.

A viagem foi light, o cachorro, que é um amor, dormiu numa boa o tempo todo, fedendo terrivelmente dentro da sua gaiolona de plástico. Chegamos no tal lugar da exposição e já tinha um povo chegando. Moreno parou um senhor de Messina, com um dobermann insuportavelmente chato, agitado, forte e latidor, pra perguntar como funcionava e coisa e tal, porque era a primeira vez dele e blah blah. O cara foi superantipático – não existe gente legal com cachorro chato, é uma lei universal – e só faltou rosnar pro Moreno. Então deixamos tudo pra lá e entramos na cara dura mesmo.

A coisa rolou no que eu presumo que seja um local pra atividade física de alguma escola ou instituição. Enquanto os organizadores, atrasadíssimos, ajeitavam os cartazes da Purina e formavam o ringue onde os cachorros desfilam, nós ficamos observando o pessoal que chegava.

Eu não gosto de dobermanns. São bonitos, mas não gosto da personalidade deles, muito menos da dos donos. Era um preconceito que revelou ser absolutamente fundado, porque o que vimos de gente maluca, esquisita, chata, mal educada, prepotente, ridícula, não tá no gibi. A mulherada de óculos escuros gigantes, os homens com camisetas de criadores, botas, jeans Dolce & Gabbana, enfim, os sólitos ridículos. Crianças mimadas chorando o tempo todo, muita gente fumando o tempo todo, gente discutindo coisas idiotas tipo o ângulo da perna posterior do cachorro, o tipo de corte da orelha, e outros assuntos de vital importância pra ordem mundial.

Uma gordinha simpática pára o Moreno e pergunta o nome do cachorro. Quando o Moreno responde “Akyn”, ela solta um gritinho de alegria. É meu filho! É filho da minha Brisal! (pra quem não sabe, quando falamos de pedigree todos os cachorros da mesma ninhada ganham nomes ridículos que começam necessariamente com a mesma letra. A ninhada do Akyn foi a primeira da Brisal, e todos os filhotes têm nomes que começam com A.) Pronto! Encontramos alguém amigável e que conhecia os bastidores da coisa, pra nos explicar como funcionava o esquema. Moreno foi pagar a inscrição no container que funcionava como secretaria, pegou o livrinho de competições novinho em folha do Akyn, e começamos a estudar o panfleto com a programação do dia, com os nomes de todos os participantes por categoria, e espaço pra anotar as notas.

O Akyn foi o primeiro a desfilar, na categoria baby macho preto. Em teoria o início da exposição estava marcado pras dez, mas, faz-me rir, além de estarmos na Bota estamos em Nápolis, claro que começou quase na hora do almoço. Enquanto isso, a gordinha, que se chama Valentina e é de Gênova (sotaque maravilhoso), nos disse pra arrumar uma bola e cansar o Akyn pra ele abrir a boca pro juiz. Como assim, Bial? O cachorro tem que abrir a boca pra mostrar a mandíbula pro juiz. Ah, tá. Pra isso basta deixar o bicho irritado de tanto tentar pegar a bola e não conseguir, jamais – até porque está preso à coleira.

Quando o Akyn já estava com meio metro de língua de fora, a Valentina pendurou o número 1 no pescoço e levou o cachorro pro meio do ringue, porque o juiz já estava chamando. A coisa funciona assim, de acordo com o que ela me explicou: alguém leva o cachorro pro ringue, o juiz olha o cachorro parado, examina as medidas, anota aquelas coisas idiotas todas, depois a pessoa dá uma corridinha besta com o cachorro, o juiz examina o cachorro correndo e anota mais umas coisas idiotas, depois outra pessoa que o cachorro conhece fica do lado de fora do ringue tentando chamar a atenção do bicho, pra ele ficar naquela posição de desenho animado, todo esticadinho, alerta. O juiz examina o ângulo das pernas do cachorro, as orelhas, coisa e tal. O cachorro então ganha um pouco mais de coleira e pula na direção da bola – o juiz anota o cachorro em situação de ataque, anota outras baboseiras e depois dá a nota.

Detalhe: o juiz, um siciliano com uma cara de mafioso que dá até medo, é o bambambã de dobermanns no país, e um dos maiores criadores. O cara é supermetido em política, e foi ele quem conseguiu tirar o dobermann da lista das raças consideradas agressivas, aquelas que têm que andar com mordaça à noite. Então tá.

O resultado do Akyn (que ganhou o último lugar entre os 3 competidores, mas era também o mais jovem e mais agitado de todos, tadinho) era tão ridículo que meu cérebro se recusou a decorar tudo, mas lembro muito bem que no papelzinho tinha escrito “olhos redondos demais”, “bom pescoço” (pra mim bom pescoço é todo aquele que segura direito a cabeça, mas enfim), “move-se bem”, “coluna inclinada demais”. É mole? Depois ainda tive que me controlar pra não rir enquanto a Valentina checava a dieta do Akyn: você dá carne moída crua misturada à ração? E o miolo de pão? Ele tem que engordar, Moreno, esfarela umas torradas na comida dele, umas seis por refeição. E o parmesão (obs.: parmesão de verdade custa em torno de DOZE EUROS por quilo.)? E o fio de azeite, você dá?

SOCORRO!

Saímos de lá quase às duas da tarde. Por sorte não nos perdemos, porque achamos tudo horroroso e muito suspeito. TODOS OS CARROS SÃO AMASSADOS. Todos. TO-DOS. Ninguém usa capacete quando anda de lambreta. NINGUÉM. Vimos mil lambretas pequenas, pra uma pessoa só, carregando duas, mais bolsas e caixas. O trânsito é uma loucura, os sinais de trânsito estão ali só pra enfeitar, buzina-se o tempo todo, grita-se em dialeto incompreensível pra nós pobres mortais – eu adoro a língua napolitana, acho uma delícia, mas não entendo bissolutamente nada. Fiquei passada por não ter conseguido falar com a Julie, que certamente teria nos mostrado a parte legal da cidade. Eu consegui até dormir na viagem de volta, apesar do fedor do Akyn, e ainda fomos jantar na Arianna depois.

Vou te dizer: cachorro nota 10 é o meu. É o dela, são os dela, os dele. Essa palhaçada de pedigree, de ração mais cara que camarão, de queijo ralado, de azeite de oliva, de toalhinhas umedecidas com lustra-pêlo, todo esse circo mi sta sui coglioni. O que a falta do que fazer não faz com as pessoas, viu.