codice della strada

Desde que o Mirco, num raro momento de estupidez injustificada, comprou o rádio pro meu carro, passei a fazer parte da odiosa categoria de motoristas que não sabem que a pista da esquerda é pra ultrapassar e não pra passear. É que o rádio é tão vagabundo que pula com qualquer buraco no chão (aliás, pula até nas curvas, mas é detalhe), e as estradas do interior do Malawi são uma merda. A pista da direita, freqüentada por caminhões, é uma coisa assim estilo Rio-Santos, sabe. Então eu tô lá cantando com o George Michael e de repente um solavanco e a bicha pára de cantar, e só volta tipo 3 minutos depois. É muito irritante, sabem. Então eu fico na esquerda, que é mais lisinha, sempre com o zoio no retrovisor, e quando vejo alguém vindo desembestado pela esquerda, dou a seta e volto pra buracolândia.

Pergunta se alguém deixa de piscar o farol pra mim, mesmo depois que eu já dei a seta avisando que vou dar passagem?

Ai que maravilha se o tempo ficasse assim o ano inteiro! Depois de almoçar torta al testo com lingüiça na Arianna fomos dar uma volta em Santa Maria com os cachorros (só Leguinho e Demo, porque o Leo tá velho e não quer passear, além de nunca ter se acostumado à coleira. Fica todo paranóico, ô cachorro chato). Uma diliça. A dormidinha básica depois do almoço é muito mais justificada quando você sabe que caminhou quilômetros antes… ; )

Fomos jantar em um restaurante idiota em Rivortorto, idéia de jerico do Marco. Mas pelo menos domingo é dia de ver o Alessandro, o filhinho deles, que é um amor e muito engraçado. Pena que a probabilidade de continuar esperto durante o crescimento é muito pequena, no que depender dos pais. Michela NUNCA leva brinquedo nenhum pro garoto, que passa o tempo rasgando guardanapos. Moram numa casa sem livros, sem filmes, sem computador, sem esportes, sem música nenhuma além do Vasco Rossi, que é um dos muitos cantores italianos que gritam, sem fotos, sem bichos, sem viagem. E pensar que o garoto tem tanto potencial… Cacete.

Foi um sábado produtivo. Fui levar o lixo pra reciclar lá na Isola Ecologica, fui pegar minha saia preta lá nas napolitanas gordas de Santa Maria que consertam roupas, comprei speck fresco pra fazer um risoto com espinafre e scamorza pro almoço, passei no contador pra tirar umas dúvidas sobre o meu contrato. À tarde não fiz la-da porque estava cansadíssima; li e dormi. À noite fomos com Moreno e Marta comer sanduíche de peito de frango no Pans and Company e depois ver WTC. Só o Moreno mesmo pra me tirar de casa pra ver World Trade Center! Como era de se esperar, é um porre. POR-RE. E completamente desnecessário, lógico.

Detesto ver filme chato, fico de péssimo humor.

potocas

. Acabei de roubar um pepino gigante do vizinho lá da escola. Aquele que deixou todas aquelas ameixas lindas apodrecerem nos ramos. Da minha escrivaninha eu não vejo nada lá de fora, mas quando fui abrir a porta pro policial que veio pedir pra levarem embora o Renault Twingo da Elisa que estava estacionado em frente ao portão de outro vizinho, dei de cara com aquele pepinão pendurado (não riam). A planta do pepino é trepadeira (ho ho) e se deixar vai subindo toda vida (ha ha). Estava lá trepada no pessegueiro, toda florida. Não tô brincando, é um pepinão de uns 30 centímetros. Eu detesto, mas o Mirco ama – neguinho aqui adora pepino, as crianças ficam loucas – e o Leguinho idem, então não resisti e roubei. Há outros seus colegas ainda em fase inicial do crescimento, e já que estão crescendo todos pro lado da escola, vão todos acabar na minha geladeira. Com certeza é um destino melhor do que apodrecer no chão.

. Já estão pintando as paredes externas da casa nova, ou melhor, do prédio novo. Está ficando uma lindeza.

. Já comprei minha agenda Moleskine pro ano que vem. Junto com outro livro do Dawkins.

. Comecei The Gifts of the Jews, do Thomas Cahill, aquele que escreveu How the Irish Saved Civilization, um dos meus preferidos. Vamos ver se esse também é bom.

. Estou gripada, sem saco e com uma tradução enorme pra fazer. Que tal?

. Hoje o jantar vai ser frango de padaria. E o pepino do vizinho.

planta também é gente

Sábado é dia de jardinagem.

Desde que tomei vergonha na cara e defini que sábado é o dia de sair adubando tudo, minhas plantas estão com outra cara. Também aprendi a podar os cravos, ainda que o faça com um aperto no coração. Detesto cortar ou arrancar plantas, mas desde que aprendi a podar os vasos estão cheios, verdinhos, cheios de botões de flor. Levo tipo uma meia hora pra adubar tudo, porque tem o adubo líquido pra piante grasse e o outro pra plantas verdes normais, e meu regador é pequeno, mas é uma coisa que eu adoro fazer.

Então agora a salsinha, que era meio tímida, está cabeludíssima. A majorana que peguei na Arianna e tinha ficado naqueles dois toquinhos por meses agora está tão alta que fica pendurada nas bordas do vaso. O hortelã, por natureza planta danada que dá em tudo que é lugar, inclusive onde não foi convidado, mas que aqui em casa, confinado no vaso pequeno, dava só folhinhas pequenas, agora está folhudíssimo. A sálvia, que não dava flor, foi devidamente podada e está linda. Os dois vasos de alecrim – porque eu amo alecrim e boto em tu-do que é comida – também estão grandes e fortes. O aipo que Arianna plantou pra mim, embora jamais chegue a ser um aipão porque o espaço é pequeno, também está um espetáculo e os malditos pulgões não voltaram. O bambu que compramos na IKEA quando minha mãe veio tinha dado uma secada geral inexplicável, já que segui todas as instruções, mas algumas folhinhas permaneceram verdes e resolvi investir no bichinho. Devagarzinho está se recuperando, tenho esperanças. Seu amiguinho, um tipo de ficus com folhas enroladinhas como se tivessem botado rolinhos no cabelo, está muito bem, obrigado. E as piante grasse cresceram bastante – só uma se recusa a aumentar de tamanho, mas deve ser um defeito de fabricação da espécie porque todas as outras estão enormes. Tenho foto delas quando as plantei, em maio, depois boto aqui com as fotos de hoje pra comparar.

Minha única decepção é a azaléia que a Arianna me deu no começo da primavera. Depois que as flores caíram ela simplesmente estacionou. Já adubei, já mudei de lugar, já tentei conversar, mas não tem jeito: não fede nem cheira, está exatamente com a mesma cara com que chegou. Acho que vou levar de volta pra Arianna. Quem sabe em meio a outras flores ela se sente mais ambientada e dá uma rejuvenescida…

As únicas flores que tenho são os cravos, porque sobrevivem bem ao inverno. Tenho pena de comprar gerânios, petúnias, begônias que sei que depois vão morrer quando o frio chegar. De fora minha varanda não é decorativa, não tem a multidão de cores que caracterizam as varandas e janelas européias na bella stagione, quando os gerânios se multiplicam exponencialmente e colorem todas as casas. Mas as minhas plantas são lindas e quando acordo são a primeira coisa que eu vejo, porque eu durmo de lado, virada pra janela, e sempre deixamos um pedaço de persiana aberta. Abro os olhos e vejo minhas plantinhas, e meu dia começa melhor. Quando tenho trabalho no computador trago uma pra dentro pra me fazer companhia.

Se eu tivesse um jardim, nunca mais entraria em casa.

enquanto isso, na sala da justiça…

Meu último aluno de hoje estava vindo de Roma de moto e ficou preso embaixo de um viaduto por causa da chuva. Cancelou a aula, uhuuu, e como Begonia não podia fazer aula, e como o Mirco essa semana está com pouco trabalho, passei na oficina pra pegar o menino e fomos ver o orçamento da cozinha lá pros lados de Perugia.

Rapaz… Como tudo é caro nessa terra, vou te dizer. 7000 euros a cozinha branca, lacada, com eletrodomésticos incluídos. Caro pra cacete. E nem é uma cozinhona assim com ilha, ou uma planta com paredes tortas e reviravoltas acrobáticas. Nada de especial, uma cozinha linear, com um pedacinho pequeno em L, mais nada. 7000 euros. A cozinha que eu projetei usando o programinha da IKEA, também lacada, com eletrodomésticos incluídos, sai por 4100 euros. Só queeeeeeee… Tem um amigo do Mirco, aquele casado com uma garota do Uzbequistão, que é montador de cozinhas. E nos disse pra deixar quieto a IKEA, porque ele já montou muita coisa deles e é uma bosta. Fico meio assim, porque neguinho aqui é muito cheio de frescuras e se a IKEA dá 10 anos de garantia, coisa que ninguém mais dá, não pode ser “elma” (elma merda mesmo, ho ho ho). Mas ele foi enfático, e acabou nos traumatizando. Então não sabemos o que fazer. Bosta. Pobre tem mais é que morrer mesmo.

Dejan, o garoto sérvio que abre a oficina de manhã cedo, acabou de ligar dizendo que ladrões entraram na oficina essa noite. Dessa vez arrombaram até o escritório, o que não aconteceu da outra vez. Ainda não sei os detalhes, mas digo e repito: pobre tem mais é que morrer. Porque VAI SER AZARADO ASSIM NA CASA DO CA-RA-LHO.

domingo frutífero

Depois de uma manhã na oficina, botando umas coisas em ordem, fomos almoçar na Arianna. Chiara pediu umas avelãs de presente, e começamos a catar as muitas que tinham no chão. Arianna já tinha colhido um saco inteiro, e no total deve ter dado uns quatro quilos de avelãs. Leguinho, que não é bobo, come não só a avelã propriamente dita mas inclusive a casca. E já que estávamos por ali, começamos a colher figos também – vou levar alguns pra Simona, já que eu não como e o Mirco não acha nada de especial. Aí passamos pra horta, e pegamos uns tomates, a última abobrinha, e muitas maçãs e peras. Ainda trouxemos um pedaço de planta de peperoncino, aquela pimenta vermelha italiana, pra botar pendurado na varanda pra secar. Depois bato no liquidificador e vira pó, que o Mirco sempre bota no molho de tomate. Também trouxemos ovos frescos, ainda quentinhos, e umas bananas que a Rita deu de presente pra Arianna mas, sendo fruta “exótica”, eles não são chegados. Como estavam mais pra maduras, e eu gosto de banana mais pra verde, me meti a fazer uma cuca de banana. Dessa vez mudei a receita da minha tia e botei banana amassada na massa também. Eu não como doce que não seja de chocolate, mas depois o Mirco vai servir de cobaia.

Minha faxineira ganha mais do que eu, porque não paga impostos, e tira férias mais longas do que eu. Isso que é democracia.

E é por isso que hoje passei o sábado faxinando e passando roupa, adubando as plantas, coisa que me prometi fazer todo sábado até o inverno chegar, e arrumando a casa. Mirco trabalhou o dia inteiro e aproveitei a tarde pra examinar o novo catálogo da IKEA, que já está online. Sinceramente? Adoro esses sábados perdidos : )

À noite fomos jantar com Moreno e a sua nova namorada, Marta, na festa da lesma. Só os meninos gostam de lesma, mas como tem sempre alguma outra coisa pra comer – torta com lingüiça, penne alla norcina – resolvemos topar. Mas além da fila imensa, só tinha lesma no menu! Acabei me acontentando de um sanduíche de lingüiça, mas com esse maldito pão umbro sem sal. Ô programa de índio!

forno

Cacete, essa semana o calor tá DEMAAAAIS. Recorde de temperatura em Perugia, 41 graus. Merda de cidade desgraçada: no calor é sempre um forno, no inverno é sempre uma das mais frias, por causa do vento gelado miserável que sopra no Corso (a rua principal).

Ontem juro que quase chorei de calor. Sentada na minha cadeira nova na sala dos tradutores, uma cadeira desconfortável e velha que esquenta feito o diabo, aboletada em três “sentadores” da IKEA que em casa usamos pra sentar no chão quando faltam cadeiras e que levei pro trabalho pra ficar mais alta na cadeira, eu sentia o suor escorrendo pelas costas. E olha que eu não suo nem em aula de aeróbica. Praticamente um ventilador por cabeça, mas ventilador que sopra ar quente não ajuda muito, vocês sabem. A nossa sala é a mais quente da casa, não sopra nem um fio de vento, e ainda por cima trabalhamos o dia inteiro 1) em escrivaninhas nada ergonômicas porque são 10 cm mais altas do que o normal, e tão espessas que mesmo que a cadeira subisse, as suas pernas não caberiam por baixo da mesa, 2) ouvindo o tlim tlim tlim dos sininhos no pescoço dos 3 cachorros fofos da casa ao lado, 3) ouvindo o telefone tocar o tempo todo na sala ao lado da nossa, onde trabalham a Retardada Contábil 1 e a Retardada Contábil 2, 4) sentindo o fedor da fumaça de cigarro da Chefa, da Laurinha e do Gostosão Gráfico, 5) tendo que responder o telefone da escola, que fica nas minhas mãos enquanto a Simona está de férias. Tudo isso traduzindo uns arquivos em PowerPoint chatíssimos de uma companhia de navios de cruzeiro. Coisas do tipo “o que fazer depois de terminar de beber uma latinha de Coca? A) jogar no mar B) procurar uma lata de lixo C) jogar no chão”. Eu mereço.

Essa noite não dormimos nada. Não tinha jeito, todas as janelas escancaradas, mas se o ar não se move, fazer o quê? O ventilador no máximo virado pra nossa cara, contrariando todas as Leis do Bom Senso Italiano que dizem que é melhor sentir calor do que tomar vento na cara, e nada. Passei o dia arrastando os pés como um zumbi. A única coisa legal foi a minha aluna farmacêutica legal, de Spello, que me trouxe um vasinho de flores porque hoje foi o último dia de aula dela, que em agosto vai pra Seattle com o marido, a trabalho. Achei um gesto tão simpático :)