domenica di pasqua

E hoje foi o dia de morgar.

Eu acordei cedo, como sempre, e terminei Life & Times de Michael K, que é meio angustiante mas é bonito. Comecei Cose di Cosa Nostra, de Giovanni Falcone (aquele juiz famoso que foi morto em um atentado, já falei dele aqui). Mirco levantou ao meio-dia e quarenta, porque eu fui acordá-lo. Perdemos assim o café da manhã de Páscoa na tia do Mirco, que aqui tradicionalmente tem torta de Páscoa (tipo um pão com queijo na massa, delicioso), salames (no caso deles, feito em casa), ovos cozidos e outras coisitas mais. Mas fomos diretamente pro almoço, sempre na casa da tia, e o menu foi aquele de sempre: stracciatella (ovo batido com parmesão e jogado diretamente no caldo de frango pra cozinhar rapidinho, ficam tipo uns gruminhos de ovo com queijo deliciosos), que eu amo, e cordeiro, que normalmente é na brasa mas não sei por que dessa vez resolveram fazer à milanesa. Eram costeletas, e de acompanhamento alcachofras fritas. Eu fiquei só na stracciatella mesmo, porque acho carneiro, sobretudo costeleta, complicado demais pra comer, tem que ficar separando gordura e coisa e tal. Frito, então, tô fora.

Voltamos pra casa e enquanto o Mirco chapou no sofá fui adiante com o livro do Falcone. Me deu dor nas costas, fiz uma hora de step vendo o DVD de X-Men 2, tomei banho, voltei a ler, e às oito acordei o Mirco. Fomos direto pra casa da tia jantar – dessa vez tinha galo castrado cozido, que fica difícil de engolir sem uma batatinha ou um arrozinho, então passei uma certa fome, no problem. Voltamos pra casa cedo e chapamos como se não tivéssemos ido dormir cedíssimo ontem.

Aliás: ontem à noite fomos à missa de Páscoa na Basílica de Santa Maria, porque era o batizado do filho do Marco e da Michela. Só que nem eu nem Mirco entendemos nada dessas coisas e esquecemos que a igreja devia estar entupida e não conseguiríamos nem ver a cara do pimpolho. Dito e feito. Primeiro que chegamos à igreja e estava tudo às escuras. O que diabos estará acontecendo, nos perguntamos. Resolvemos perambular um pouquinho pra ver se alguém nos via – aí estaríamos livres pra escapar – mas os batizáveis provavelmente estavam no altar maior, lá no fundo, e no escuro não dava pra ver nada mesmo. Curiosos pelo escuro, resolvemos esperar pra ver o que acontecia. A igreja já é assustadoramente grande iluminada, mas naquele estado posso imaginar perfeitamente como os fiéis se sentem pequenos e humildes e submissos à potência de deus. Dali a pouco entra uma procissão de diáconos, laicos (a Michela me explicou durante a missa quando morreu o pai do Lello, mês passado), e depois finalmente entraram os frades franciscanos, com uma velona gigante. Acho que o escuro simboliza a vida senza Cristo, e a luz que tudo ilumina é Cristo renascido, sei lá. O frade que acendeu a velona era um pitéu, um perfil grego, um nariz estupendo, cabelos agrisalhando, um pedaço de mau caminho. Cantaram uns negocinhos, todo mundo na platéia acendeu suas velinhas (rigorosamente compradas na igreja, imagino), e começou a missa, que é sempre transmitida também no telão gigante porque senão quem senta lá atrás não vê nada do que rola no altar maior. E aí nossa curiosidade acabou e voltamos pra casa pra dormir.

Que sexta-feira deliciosa, com cara de sábado! Acabei não trabalhando porque meus alunos viajaram, então aproveitei pra ir de bicicleta até Santa Maria, uns cinco quilômetros. Deixei a bici na Arianna, peguei Leguinho e Demo e fui a pé até a barraca da Rita comprar abobrinha e maçã. Na volta pra casa passei no Angelucci pra trocar o pneu traseiro da bici que tava meio assim assim. Fiz uma faxina rápida, almoçamos pappardelle com molho de javali, e à tarde não fiz nada além de usar o Office Planner da IKEA pra ter uma idéia de como vai ficar nosso escritório na casa nova. À noite Gianni e Chiara vieram jantar: fiz risoto de lagostim, salmão e açafrão, e de secondo os canolicchi que trouxemos da Holanda, gratinados no forno. Tinha tempo que eu não os via direito, e aproveitamos pra botar o papo em dia.

findi

O fim de semana foi o mais light possível. Sábado Mirco chegou pra almoçar em um horário decente, em torno das três, e em vez de chapar na cama, os dois, resolvemos ir fazer compras, nosso programa preferido de sábado. Largamos as compras em casa e fomos pegar os cachorros. O tempo tava ótimo, um solão gostoso, um arzinho fresco; carregamos os meninos na mala da Uno e lá fomos nós. Mas não deu pra ficar muito porque o vento trouxe nuvens que esconderam o sol, e começamos a sentir frio. Acabamos jantando na Arianna mesmo, que fez pizza no forno a lenha do quintal. Diliça.

E domingo não foi muito diferente: de manhã Mirco foi votar, almoçamos na Arianna, visitamos a gatinha que pariu dois gatinhos de manhã cedo (a outra gata na foto é amiga dela, dormem juntas e aparentemente essa outra gata fez as vezes de parteira), voltamos pra casa, vimos TV, falei com minha mãe no Skype, Moreno veio pra cá e fomos juntos pro cinema em Perugia. Comemos um sanduba no Pans & Company e depois vimos Inside Man, que não é nada de especial – né carne né pesce, como se diz aqui. E vamos dormir cedo porque amanhã a labuta nos espera.

casa dolce casa

E pra compensar a canseira de ontem, e porque o Mirco trabalhou o dia inteiro, fiz só uma vitamina rápida pro café da manhã e sentei ao computador pra projetar nossa cozinha no Kitchen Planner da IKEA. Passei o dia INTEIRO só nisso – parei pra almoçar na casa dos tios do Mirco, e depois do almoço ele dormiu até as oito da noite – e devo dizer que me diverti horrores. Aproveitei pra também esquematizar a nossa futura lavanderia e pra catar inspirações de móveis na internet. Jantamos uma pizza no Penny Lane e chapamos. De vez em quando um domingo nada assim cai muito bem.

saco cheio

Esse clima britânico JÁ ENCHEU OS COLHÕES. Não pára de chover e fazer frio há semanas e ninguém agüenta mais, tá todo mundo deprimido e doente e sem saco e sem conseguir se concentrar. PORREEEEEEEEEE!

Meno male que hoje tem o terceiro episódio de Lost.

passeio

Aproveitamos que não tava chovendo e, apesar do ventinho gelado, fomos levar Leguinho e Demo pra passear em Santa Maria. Como gostamos de andar a pé! E como os cachorros são bobos e passeiam todos orgulhosos! Leguinho obedece e não puxa a coleira, mas o Demo não foi acostumado e pula o tempo todo, se enrola nas minhas pernas, responde às provocações de microcães chatos, um porre. Mas ele é tão bonzinho que sempre o levamos junto, apesar da encheção de saco que ele às vezes é.

Os efeitos dessa stepação toda dia sim e dia não são basicamente dois: uma parte da celulite está indo embora e sendo substituída por musculinhos durinhos que eu não lembrava mais que tinha, e meus joelhos estão mais detonados do que joelho de jogador de futebol. Não vejo a hora dessa merda de tempo melhorar de vez pra eu poder botar o nariz pra fora e caminhar, correr, sei lá, pelo menos pra alternar com o step. Bosta.

Mas a primavera está pra chegar, eu sei, apesar da neve no país inteiro. Porque os três sinais cardinais já começaram a dar o ar da graça: semana passada uma mosca entrou aqui em casa, anteontem achei um percevejo morto fresquinho em cima da máquina de lavar roupa, e, mais importante porque pontualíssimo, meu cactus querido começou a espichar botõezinhos cor-de-rosa. São as primeiras flores aqui de casa, todo ano. Bom :)

step by step

Fiz 45 minutos de step hoje de manhã, vendo Priscilla the Queen of Desert. Compramos o DVD porque eu amo esse filme e o Mirco ama as paisagens australianas. É uma das coisas mais divertidas que eu já vi, o visual é es-pe-ta-cu-lar, e, cá pra nós, o Guy Pearce é um pedaço de mau caminho até quando faz papel de viado com batom azul e avestruz na cabeça dançando Ce Ce Penniston.

begoninha

É ótimo ter a manhã livre, porque resolvo um milhão de coisas, mas assim já é demais. Se não trabalho, não ganho, e realmente não tô podendo, ainda mais com futuro apartamento pra mobiliar, né. Quem me salva é a Begonia, que sempre consigo enfiar nas minhas manhãs livres. Me divirto ensinando português, ela aprende rápido e é uma fonte inesgotável de satisfação pro professor, e ainda ganho bem. Magavilha.

giri

Aproveitei a manhã livre pra resolver várias coisas em Bastia e Santa Maria: passei no caseificio pra comprar ricota fresca, scamorza e caciotta, dei um pulo na Rita pra comprar maçã e tomate-cereja, na volta passei na depilação e enquanto ela terminava uma cliente fui à biblioteca de Bastia me inscrever.

No Rio eu cheguei a freqüentar uma biblioteca no Leblon quando era pequena – minha mãe já estava na Secretaria de Cultura e na época acho que fazia alguns trabalhos pras bibliotecas – e eu li tudo que é Asterix e A Inspetora que achava por lá. Mas era uma bibliotequinha meio tabajara e aqui eu ainda não tinha entrado em uma.

Antes não tivesse.

Fica no segundo andar de um prédio de apartamentos e escritórios (aqui é muito comum misturar tudo) que fica em cima de uma loja imensa de vestidos de noiva. Empurrei a porta encostada e dei de cara com uma sala não muito grande, com algumas divisórias horríveis e etiquetas amarelas escritas com letra garranchuda dividindo as seções dos livros. Logo atrás de mim entrou uma turma de colégio, com um bando de pré-adolescente fazendo barulho atrás da professora – excursão, putz. Uma das duas bibliotecárias me dispensou solenemente pra atender os delinqüentezinhos, e me deixou nas mãos da outra.

A Bibliotecária Loura é assim: uma senhora de uma certa idade mas que ainda não sabe disso, de vestido vermelho e botinha, batom vermelho, faixa vermelha na cabeça cobrindo as raízes dos cabelos platinados. A clássica funcionária pública ineficiente e clinicamente histérica. Levou três horas pra copiar meu nome na ficha, e isso só depois de me olhar como um E.T. quando eu disse que só queria me cadastrar, porque não tinha tempo de escolher nada. Não pode fazer ficha sem levar livro, disse. Anotou tudo de caneta na ficha, com aquele garrancho hediondo, pra depois inserir tudo no computador. Me acompanhou até a meia-prateleira de livros em língua original; nada digno de nota, então catei umas anotações no caderninho fofo que a Newlands me deu em novembro e achei uns nomes perdidos de livros em italiano que os meninos tinham sugerido na mailing list do curso de narração. Acabei levando Tre Cavalli, di Erri de Luca, que não sei quando vou conseguir ler. Algo me diz que não vou gostar, mas não dava tempo de escolher melhor.

Ainda dei aula de português pra Begonia, passei na Libreria Grande pra pegar um livro de Sociologia, e fui direto pra escola pegar o Michael pra ir a Cascia. Detesto ir a Cascia. Bando de adolescentes delinqüentes! Terça-feira é um porre mesmo.