Se minha memória não me falha, comprei esse livro por sugestão da Amazon. Como o título e a capa não diziam muita coisa, fui ler os reviews, que eram tão entusiasmados que acabei me deixando influenciar. Mas deixei ele quietinho na estante, junto com muitos outros que comprei e ainda não consegui ler, sem conseguir furar as múltiplas filas de leitura da minha vida – pós-graduação, vários clubes de leitura, grupo de estudo, desafios de leitura, podcast. O tamanho dele o deixa menos convidativo – é grosso e desconfortável demais pra ler na cama, pesado demais pra levar na bolsa.
Aí um dia ele aparece na minha timeline de alguma rede social, já não lembro qual. Pensei que podia ser uma boa ideia de livro de ficção pra alternar com as outras coisas mais intelectualmente desafiadoras que ando lendo, algo pra substituir o Alias Grace, que eu tinha terminado. Olhei pra ele, ele olhou pra mim, rolou um sentimento, comecei.
Rapaz… Que livro. Que livro!
Quem me conhece sabe que eu sou chata pra caramba não só com relação a tudo na vida, mas principalmente quanto à língua escrita. Há muitos livros que eu amo porque contam histórias, ou explicam conceitos, que eu considero interessantes e inteligentes. Mas são raros os que conseguem conjugar conteúdo shopster e forma, linguagem, modo de escrever, fora do comum. E quando isso acontece, eu sou fisgada na hora. The Nix é um deles.
O primeiro texto em inglês que eu realmente gostei de ler foi um conto do Roald Dahl. Não lembro mais qual era, mas eu ainda tava estudando no Britannia, era adolescente e não gostava de ler em inglês. Esse conto me pegou com as suas descrições inesperadas, com as associações de palavras pouco usuais – acho que foi a primeira vez que li algo como “terribly good”. Roald Dahl ainda é um dos meus escritores preferidos, certamente o contista que eu mais admiro no mundo inteiro ever. Depois dele fui ler Tolkien, por influência de um colega de turma do Britannia, e daí não parei mais de ler em inglês. Hoje 99% do que eu leio é nessa língua, e com o tempo eu fui ficando cada vez mais chata, porque tem MUITA coisa de qualidade, mas obviamente são poucos os que realmente conseguem fazer magia com as palavras.
Um exemplo de maga absoluta, sacerdotisa do inglês é a Zadie Smith – seu White Teeth é uma obra-prima de deixar qualquer um de queixo caído. Esse ano eu li Eleanor Oliphant is Completely Fine, de Gail Honeyman, que é um absoluto deleite, definitivamente a melhor leitura do ano (um obrigado gigantesco à rainha Vevila, que me passou essa maravilha). The Nix está na mesma categoria.
O autor é Nathan Hill, que eu até então desconhecia. Não sabia absolutamente nada sobre o livro antes de começar a ler, pois escolhi ler só os reviews sem spoiler. A história tem mil camadas, mas em nenhum momento você se perde; tudo é muito bem amarrado. As personagens são muito bem desenvolvidas e as situações inusitadas são maravilhosamente críveis e descritas com palavras escolhidas a dedo. Camelo e lata de sopa de tomate da Campbell’s na mesma cena? Tem. Qualquer coisa que eu disser além disso vai ser spoiler, então paro por aqui.
Coisas assim bem escritas têm dois efeitos possíveis sobre mim: ou me dão vontade de parar tudo o que eu tô fazendo pra sentar e escrever alguma coisa, qualquer coisa, ou deixam em mim a certeza de que jamais devo escrever mais nada na vida, nem receita de bolo, porque é impossível sair algo tão habilidoso quanto o que eu acabei de ler. De qualquer forma, fui dormir com um sorriso no rosto – literalmente; quando dei por mim, estava deitada no escuro sorrindo, ouvindo os roncos do Mirco ao meu lado, pilhada demais de felicidade pra conseguir dormir. Sonhei com o livro a noite toda.
Acabei de ver que tem em português, então aconselho vivamente que leiam. Ótimo presente de Natal. Busquem nas livrarias de bairro, perguntem se tem na sua biblioteca de estimação.