eu e o balé, o balé e eu

Eu sempre adorei balé clássico. Quando era pequena eu ia sempre ao Municipal porque um irmão da minha avó trabalhava lá e arrumava ingressos. Perdi a conta de quantas vezes já vi Copélia, Giselle, O Quebra-Nozes, o Lago dos Cisnes e alguns outro menos badalados. Adoro, adoro.

Fiz balé quando era pequena, até a pré-adolescência, mas sendo gorda, grandalhona e claramente desprovida de qualquer migalha de graciosidade, era óbvio que a coisa não era pra mim. Mas herdei algumas coisas dessa experiência breve, além dos pés “dez pras duas” que estragam todos os meus sapatos porque os calcanhares batem um no outro. Ganhei uma ótima propriocepção, ou seja, a capacidade de entender a posição das diferentes partes do meu corpo no espaço, e muito senso de observação. Vejo isso quando faço ioga com a Petulla, ou quando começo um novo DVD de ginástica que nunca vi na vida. Normalmente não preciso que a pessoa explique os detalhes do movimento ou da postura; percebo sozinha se estou fazendo direito e não costumo deixar nada de lado, porque peguei o hábito de observar o movimento ou a postura do outro da cabeça aos pés.

(Tudo isso seria muito mais útil se eu fosse uma pessoa naturalmente graciosa, mas não sou. O fato de conseguir reproduzir movimentos não significa que meus movimentos sejam fluidos ou leves; não são. Eu sou um rolo compressor.)

Outra coisa boa foi o ritmo. Se tem uma coisa que me enlouquece é ver gente que não consegue acompanhar o ritmo. Principalmente quando se fala de aeróbica, onde a música normalmente tem uma cadência bem marcada e o volume é alto. Não consigo entender; eu não consigo fazer os movimentos fora do ritmo nem tentando!

(Isso também seria mais útil se eu fosse uma pessoa naturalmente graciosa, mas não sou. Logo, não sou capaz de dançar. Nada. Quer dizer, se eu tentar pelo menos fico no ritmo, mas sou uma coisa inolhável, não rola.)

***

Ontem fui ver o Quebra-Nozes dançado pelo Bolshoi no Opéra de Paris, que passaram no cinema em Perugia. Mirco e Daniele foram ver o Sherlock Holmes 2 (eu detestei o primeiro e não tenho intenção de ver a continuação) e eu fiquei lá, sozinha, com um monte de mães com filhas empolgadíssimas ensaiando piruetas nos degraus largos da escada enquanto o balé não começava. Achei uma ideia maravilhosa essa de passarem balés. O ingresso é caro (15 euros contra os 8 de um filme normal), mas é compreensível: eles pagam os direitos ma só passam uma vez, em um horário, logo é justo cobrar bastante. Eles fizeram uma programação bem legal, com todos os outros espetáculos transmitidos ao vivo (esse era gravado); achei que não ia dar ibope mas tava bem cheio, só com os lugares na fila do gargarejo dando sopa. Sim, o áudio é uma merda, não é a mesma coisa que ver ao vivo, lógico, mas quem não tem cão caça com gato, certo, Biscoito?.

Ainda não fui ver a versão que tenho em casa em DVD, também com o Bolshoi, mas suspeito que é a mesma que passaram ontem. O bailarino principal é com certeza o mesmo; nunca iria esquecer aquelas ventas abertas que lhe dão aquela aparência meio equina. Os figurinos são definitivamente os mesmos da minha versão. A impressão que eu tenho é que é mesmo a mesma versão, editada de maneira diferente, porque algumas tomadas em close eu tenho certeza de que não tenho.

Aí quando eu falei pro Mirco que eu adoro esse balé, apesar de não ser o meu preferido, e que tenho em DVD, e que o ingresso era caro pra cacete, ele perguntou “mas então por que diabos você vai ver a parada de novo?”. Balé é um negócio esquisito, sabe, como música clássica, mas com mais detalhes porque é visual e não só auditivo. Nas montagens tradicionais a música é a mesma, a coreografia é a mesma (ai de quem tocar nas coreografias do Petipa), os figurinos são mais ou menos semelhantes. Então apesar de ser tudo muito parecido, cada versão é única. Eu tenho um Lago dos Cisnes dançado pelo Nureyev que é um escândalo, porque o homem era de um universo paralelo, nunca vai haver outro bailarino como ele; até quem não entende nada da coisa enxerga a diferença abissal entre ele e o resto do mundo. Mas não gosto da Fonteyn como cisne. Tenho duas outras versões do Lago, uma com uma primeira bailarina espetacular e outra um pouco menos. Gosto mais do bailarino que dança com a bailarina um pouco menos, mas prefiro os figurinos e algumas coreografias um pouco alteradas da versão com a primeira bailarina espetacular. Um dos meus combos música-coreografia-figurino preferidos no mundo inteiro, ever, não é exatamente essa aqui mas é parecida, com a música um pouco mais acelerada e na versão para dois casais de bailarinos (a versão que eu tenho é mais legal ainda, acreditem):

Essa também é ótima, apesar do vestido horripilante, totalmente não-espanhol, e da péssima qualidade do vídeo. A coreografia é pra uma bailarina só e a mulher abala Paris em chamas.

2 ideias sobre “eu e o balé, o balé e eu

  1. Caraca! Puxou uma referência do Chico Anísio do fundo do baú!

    Agora, se você consegue fazer dez pras duas, e se acha pouco fluida, não tem o menor problema; sempre poderá fazer posição de sentido. Apesar de isso não ser lá muito útil, já que você não é militar… :-)

  2. Letícia,

    Só agora descobri que você ressucitou o blog. Estava sentindo falta do seu humor ácido. :)

    Gosto mais de música clássica que de balé, mas acho que todo mundo um dia assistiu o Quebra Nozes. Prefiro as nozes.

    Feliz Natal e cosquinhas na Carol!

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *