Há alguns dias nossa querida vizinha fofoqueira, a Foca Monaca, nos surpreendeu. Eu sei que ela freqüenta a tia chata do Mirco, mas não imaginava que se lembrasse dos nossos nomes, até porque não damos muita confiança. Mas outro dia cheguei em casa depois de uma aula com o Paulo Cintura, às dez da noite, e dei de cara com ela e a família pegando um arzinho fresco em cadeiras de plástico no jardim de casa. O yorkshire histérico, que acho que se chama Jimmy mas não tenho certeza, começou a latir. Aí veio a surpresa, porque ela começou a falar com o cachorro, vai lá, Jimmy, vai lá com a Letizia, olha quem é, é a Letizia, Jimmy! E eu pensando, comé que essa mulher lembra do meu nome? Porque aqui, mesmo todo mundo me chamando de Letizia que nome mais italiano não existe, o fato de que eu não sou italiana faz com que todos esqueçam meu nome, automaticamente, como se eu me chamasse Mohamed, Ivanova, Suely Maria, Rosemary, Tanaka, Shun-Li ou outra coisa que eles não conseguem pronunciar. Estranhamente, quando eu chamei o cachorro veio, em vez de continuar latindo como sempre faz. Veio, e ainda deitou no chão, no meio da rua, de barriga pra cima. Enquanto fiquei lá coçando a barriga dele, porque afinal de contas ele é histérico e chato mas é sempre um cachorro, leia-se gente boa, a Foca se aproximou e começou o interrogatório:
– Ué, cadê o Mirco?
– Não sei, acabei de chegar, ainda não nos falamos. Não sei nem se está em casa.
– Eu achei que você trabalhasse com ele.
– Também trabalho com ele. Mas dou aula de inglês em Perugia quando não estou na oficina [reparem no meu estranho bom humor nesse dia; em vez dos tradicionais sim e não resolvi ser explicativa]
– Ah tá… E volta a essa hora?
– Pois é, coisas da vida.
– Você faz a contabilidade da oficina?
– Faço, entre outras coisas.
– Ah tá… E não tem secretária não?
– Não, sou eu a secretária agora, só que eu não fico lá oito horas por dia.
– Ah tá…
Nisso chega o Mirco de lambreta. Olha ele aí, eu digo. Por isso que ele não ligou como faz sempre quando termino de dar aula, porque tava de lambreta.
– Ué, mas ele usa lambreta? E o carro?
– Fui jantar na casa da Arianna [o Mirco não chama os pais de pai e mãe, mas de Ettore e Arianna]
– Ah tá… Mar por quê, o carro quebrou?
– Não, é que tá fresquinho, gosto de andar de lambreta. E eu queria parar na estrada pra pegar um girassol pra Z [sou eu], mas estavam todos muito longe da beira da estrada, não consegui.
– Ah tá… Então essa lambreta é de vocês, não sabia…
– Bom, vamos subir, né? Boa noite!
– Boa noite, boa noite!
Na manhã seguinte saímos cedo pra oficina e vimos a Foca sentada, de camisola lilás de babados, no balancinho do quintal. Dormindo.