apidêite universitário

Isso aqui tá uma modorra só, né não. Mas é que não tem nada de interessante acontecendo, nada do qual valha a pena falar.

Mas eu vou falar assim mesmo, nem que seja só pra encher o buraco.

Falei das provas da faculdade, mas não entrei em detalhes. O primeiro detalhe é o resultado da terceira prova, de Informatica Generale I: 19/30, colando. Porque a parte de múltipla escolha era ridícula, tipo “o que acontece quando você clica numa célula de Excel? a) ela fica mais escurinha b) ela fica amarela c) a borda fica mais escura d) aparece uma cruzinha”, mas a parte discursiva pedia a descrição dos módulos de um sistema operativo. E como o meu interesse por computadores é o mesmo que por funções do segundo grau, é lógico que eu não tinha estudado nada. Como também não freqüentei as aulas, porque o horário era o mesmo de uma aula do segundo ano, não tinha nem a minha supermemória pra me ajudar. Então colei – eu e todo mundo; a sala estava uma zona. Mas como também não tenho muita paciência com prova, e normalmente sou a primeira a sair, em vez de esperar a alma gentil ao meu lado terminar de copiar toda a sua resposta gigante da folha de caderno escondida entre as coxas e a cadeira preferi escrever só os pontos mais generalizados que ela fez o favor de me ditar antes de escrever a sua própria resposta, e não dei mais explicações. Fui mesmo a primeira a sair e voltei pra casa lendo FotR no ônibus.

A prova de Linguistica Italiana II foi um porre porque a professora é chatíssima, devagar quase parando, com uma vozinha de garotinha (uma coisa que eu ODEIOOOOOOOOOOOO) e a mania de rir dos seus próprios comentários, que logicamente não são engraçados. Em vez de fazer meia dúzia de perguntas simples e mandar o examinando pra casa, ela ficou com cada estudante PELO MENOS vinte minutos. Considerando que éramos muitos, muitos mesmo, a coisa se prolongou até as seis e meia da tarde (começou às onze). E metade dos alunos foi deslocada pro dia seguinte. O mais legal é que se você for esperto nem precisa estudar, porque você passa o dia inteiro sentado numa sala ouvindo a professora fazer mais ou menos as mesmas perguntas a todo mundo, e as mesmas respostas de todos os alunos (aqueles bem preparados, lógico). De tanto ouvir, você acaba aprendendo, mesmo que não tenha estudado porcaria nenhuma. Eu tinha freqüentado metade das aulas (desisti da outra metade quando percebi que eram todas rigorosamente iguais umas às outras, e ainda por cima exatamente idênticas aos capítulos do livro, exemplos iguais e tudo) e também tinha estudado, porque vocês sabem que eu sou doente e gosto de gramática, lingüística, semântica etc. Ela não dá trinta pra ninguém. Tudo o que ela perguntou eu respondi, só não soube dar um exemplo de uma classificação idiota de um parâmetro de textos argumentativos, mas mesmo assim fiquei feliz com o meu 27. Não se esqueçam que eu sou a única que trabalha de verdade na turma inteira; os poucos colegas que têm emprego trabalham só nos fins de semana, servindo pizza. Então tá ótimo.

A prova de Linguistica Generale foi ótima. O professor é um amor mas é muuuuuuuuuuuuuito confuso. Mas o livro que ele escolheu é ótimo e eu AMO a matéria, então foi um prazer estudar. Tirei 26 na prova e resolvi tentar aumentar a nota fazendo a prova oral. Pra isso li o livro extra do programa, Patterns of the Mind, de Jackendoff, um dos cobras da lingüística moderna (mas um patamar abaixo de Chomski, logicamente). O livro é MUITO, MUITO, MUITO maneiro. Uma das coisas mais legais que eu já li, e não é porque eu sou doente e gosto desses assuntos bizarros. É escrito MUITO bem e se lê como um romance, praticamente. Fala-se do processo da fala, de como as crianças aprendem a falar, dos experimentos que se fazem pra provar esse ou aquele ponto, das afasias estranhas, da American Sign Language e de como o seu estudo ajudou a compreender o conceito de gramática mental, entre outras coisas. Recomendo altamente, mesmo que você tenha pela lingüística o mesmo interesse que eu tenho sobre a descrição dos sistemas operativos.

Mas essa lenga-lenga universitária toda foi só pra introduzir o conceito que vocês já tão carecas de saber, que é o quão merda é o sistema educacional italiano. Já começa pelo maldito libretto, a caderneta, onde o professor anota a notinha do aluninho. Não existe isso em nenhum outro lugar do mundo, até onde eu sei, e os alunos italianos que vão estudar em outros países da Europa dentro do projeto Erasmus (do qual eu não posso participar porque não sou cidadã européia, senão eu não estaria mais aqui, lógico) são sacaneados lindamente por isso. Depois passamos pro fato de que quase todas as provas são orais, o que consome uma quantidade incomensurável de tempo e de paciência e de nervos. Não meus, porque eu não fico nervosa com prova, mas quase todo mundo fica. Temos também o fato de que os professores são todos velhos, porque vocês sabem que italiano não morre nunca, vive pra sempre, e também não larga o osso, de modo que todos os cargos importantes em todos os setores da sociedade são ocupados por velhos, em sua maioria imensamente desatualizados e retrógrados. Também dá-se uma importância imensa às notas e às provas, coisa que todo mundo sabe que quer dizer muito pouco. Vide o exemplo da prova de Linguistica Italiana acima: eu teria tirado 27 mesmo que não tivesse estudado, de tanto ouvir as respostas dos outros.

Junte tudo isso e você tem um fenômeno tipicamente italiano: a síndrome do libretto. Você vai lá, faz a sua prova, o professor antes de decidir a nota pega o seu libretto e o examina com cuidado. Se as notas forem todas altas, o professor dificilmente vai te dar uma nota baixa, mesmo que você a merecer, pra não estragar o libretto. E não sou eu que estou dizendo: os próprios professores dizem! “Olha, você na verdade mereceria um 25, mas vou dar 28 pra não estragar o libretto”. Suuuuuuuuuperjusto. O professor de Linguistica Generale chegou ao cúmulo de se recusar a “verbalizzare” (anotar no libreto) o 21 de uma colega moldava, porque ela só tinha 30 em todas as provas anteriores. Ela não tinha estudado e não queria fazer a prova oral pra aumentar a nota, nem queria fazer a prova de novo na próxima chamada, em junho, e estava contente com o 21, bastava ter passado na prova. Ele se recusou terminantemente e ela vai ter que tentar de novo em junho, junto com todo mundo que não passou na primeira vez ou que não teve tempo ou vontade de estudar pra primeira chamada. Tem futuro um país assim? (a pergunta é logicamente retórica).

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A campanha eleitoral já começou, pras eleições em abril, e como sempre é uma baixaria só. Eu, que já quase nunca ligo a televisão, passei a NUNCA ligar a televisão, porque só de ver a cara do Berlusca tenho ânsia de vômito. Então estou completamente desatualizada sobre o assunto, não me perguntem nada.

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Estamos programando as próximas férias, no feriado de primeiro de maio, que aqui vira um feriadão com o 25 de abril (que nunca consigo lembrar o que é). Tínhamos pensado em ir a Jerusalém com Gianni e Chiara, mas quando ficamos sabendo que era uma excursão organizada pelos padres que a Chiara freqüenta achamos melhor mudar de rota: temos mais medo do risco de ouvir não sei quantos rosários por dia no ônibus do que de potenciais atendados. Então agora estamos procurando passagem pro Canadá, pra passar uma semana com a eowyn (que pra mim vai ser sempre eowyn e nunca Andrea, não tem jeito). Mais updates depois.

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Vocês sabem que eu tenho tendências fanático-literárias, e minhas bibliopaixões vão e vêm tão ciclicamente quanto as marés. Estou num revival total de Tolkien. Atualmente estou morando dentro do RotK. Além disso trabalho com os filmes rodando em loop infinito no DVD, desde que comprei a versão extended. E ainda por cima estou matando as aulas de inglês na faculdade pra freqüentar um curso sobre Tolkien e CS Lewis na universidade da irmã da Chiara. O detalhe é que ela estuda teologia e a faculdade fica atrás da Basilica Inferiore de Assis. O professor é um franciscano argentino muito sério que nunca ninguém tinha visto rir, até o momento em que eu disse que o meu cachorro se chama Legolas. O curso na verdade tem um nome tipo glória, fé e não sei mais o quê em Tolkien e CS Lewis, mas não importa: só poder ouvir alguém (um alguém muito preparado; ele escreve artigos e participa dos congressos no mundo inteiro) falando dos meus livros preferidos EVER (e de tabela do mundo onde eu gostaria de viver) é uma bênção (no pun intended). Somos só 5 alunos, uma das quais uma freira de nacionalidade não definida que nunca ouviu falar dos livros nem viu os filmes mas gostou do nome do curso (exatamente o meu oposto), um nerd feio e um nerd com uma tatuagem em élfico MUITO MANEIRA e enorme no antebraço direito. Arregalei os olhos quando vi, mas ele foi embora antes deu poder pedir pra ver de perto. Jamais faria uma tatuagem em mim mesma, mas se tivesse que fazer seria uma daquelas.