Tenho que admitir: a doença do calor também me pegou. Não se fala em outra coisa, e eu também não falo em outra coisa: TÁ CALOR PRA BURRO E NINGUÉM AGUENTA MAIS. São as temperaturas mais altas dos últimos 40, 50 ou 60 anos, depende do telejornal. O fato é que tá um calor do cacete, desde junho, e como obviamente ninguém aqui tá preparado pro calor, neguinho passa o dia se abanando, bebendo água, reclamando, suando, e todas as outras atividades deliciosamente relacionadas ao calor intenso.
Eu, sempre avessa a extremos de temperatura e a qualquer coisa que, mesmo de longe, cheire a tropicalidade, estou tendo ataques. Que saudade do ar condicionado gélido da Telemar, da Prudential, do Flash! O escritório aqui, como eu já disse, vira um microondas à tarde. Reuniões se fazem nas mesinhas e cadeiras do jardim, aos pés de uma árvore frutífera não-identificada. O vento quentíssimo que sopra, quando sopra, só piora as coisas, e aprendi a adotar a técnica do pessoal aqui, que aliás se inspira nas casas de países desérticos, que têm muros espessos e poucas e pequenas janelas: deixo meu quarto fechado quando saio pra trabalhar, assim o ar quente não entra e quanto volto na hora do almoço e no fim da tarde o bicho tá fresquinho, uma diliça.
Mas hoje o calor realmente tá incomodando. Os vinte passos do escritório até o almoxarifado já causam exposição solar intensa, e só nesse caminhar já sinto mais morena, o que me deixa assim digamos ligeiramente irritada, pra ser bem eufêmica. Estou nauseada e com dor de cabeça, e LENTA. A lentidão do calor, a pasmaceira dos trópicos, que impede os países quentes de evoluir. Só consigo pensar no meu velho quarto com ar condicionado, eu deitada na minha caminha com um livro na mão, meu cachorro deitado no chão do meu lado, roncando alto. Mas hoje o que vai rolar é a minha cama de molas no meu quarto relativamente quente e desventiladorizado, sem meu cachorro que vai estar roncando no meio dos outros cachorros na casa da Arianna. O que não muda é o livro na mão ;) Ontem comecei Vaniglia e Cioccolato, esqueci a autora, que a mãe da Marta me emprestou, com piedade da minha pobre situação literária. Sabendo o quanto a mãe dela é esperta, e lembrando do olhar penetrante dela quando o deixou nas minhas mãos, tenho certeza de que o bicho foi escolhido a dedo pra mim. Excrusive está sendo muito inspirador. Excrusive estou planejando uma revolução na minha vida quando voltar da Alemanha.
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Excrusive a FeRnanda e o Fabio vão casar! Casam no Brasil, em Ribeirão, em dezembro, pouco antes do Natal. Queria muito poder ir, e vou tentar. E como o Fabio vai voltar pra casa dos pais por enquanto e a FeRnanda vai precisar de um lugar mais barato pra morar o lance agora é juntar grana pro casório e não tem sentido o Fabião pagar aluguel tendo seu quarto na casa dos pais -, pode ser até que role uma divisão do aluguel comigo nesses meses que faltam… Ia ser um super quebra-galho. Precisamos conversar seriamente, eu e FeRnanda, e depois preciso assinar a porra do contrato, mas a danada da mulher, como todos os italianos fanáticos por bronzeado, foi al mare e nao sei quando volta, provavelmente quando eu voltar da Alemanha. Já vi uma máquina de lavar roupa por meros 160 aqui perto; se os preços ficarem em animação suspensa até eu assinar o contrato e poder me mudar de vez, comprá-la-ei (linda mesóclise…).
Também vou precisar de uma TV, mas nesse assunto fico meio cabreira porque aqui, como de resto creio que em toda a Europa, paga-se pra poder ter TV em casa. A diferença, porém, é que a TV italiana tá muito longe de ser uma BBC, e nao tenho certeza de que valha a pena pagar pra ter essa bosta de TV em casa: não só a programação é uma merda, subestima a inteligência do telespectador, só tem menininha pelada rebolando, não tem um documentário interessante nem nada e é ridiculamente parcial ao Berlusca, mas também tem MUITA, muita propaganda todas horríveis. Uma que eu amo de tão tosca é a de uma bebida de cedro que o lanterneiro ama (nao é mal, tem gosto de Sprite, só que é amarelada. É assim meio ginger ale), que vem em garrafinhas toscas SEM RÓTULO, as informações todas na chapinha ou na embalagem de papelão que envolve o six-pack. A propaganda em questao é assim: num fundo preto, um six-pack da bebida, as bolhinhas subindo em uma das garrafas, que está separada, em primeiro plano. Uma musiquinha assim: tanta coisa pra construir, aprender, realizar… Mas reserve um minuto pra mim! Detalhe que a música é cantada por vozinhas femininas em falseto, sobre um fundo digno de música de elevador da pior qualidade. E pra fechar com chave de ouro, uma voz feminina cafona recita o slogan: para vocês e para os seus amigos.