legolas, o melhor cachorro do mundo

Todo cachorro é o melhor cachorro do mundo. O seu também é. Mas o meu era mais.

Ele nadou no mar em Ipanema. Ele roeu e comeu muito coco. Ele levou folha de palmeira seca pra casa. Ele tinha um fã-clube enorme de porteiros, na Lagoa e na Tijuca. Ele amava andar de carro. Ele fez com que todas as amigas da minha avó perdessem o medo de cachorro. Ele uma vez roubou um filé mignon inteiro da pia da minha avó e apareceu todo murcho e arrependido ainda com o plástico pendurado na boca. Ele se jogou na Lagoa umas duas ou três vezes. Ele adorava dormir no ar condicionado. Ele vinha dormir no meu quarto de madrugada, fugindo dos roncos da minha avó. Todos os meus amigos da faculdade o conheciam e o adoravam. Ele ficava me encarando até eu acordar. Ele trazia tênis (sapato e chinelo não serviam, só tênis mesmo) pras visitas verem quando chegavam em casa. Ele veio de avião pra Itália e fez dez minutos de xixi no primeiro poste que viu quando chegou. Ele virou o melhor amigo do Demo. Uma vez peguei ele e Demo atravessando a rua em Santa Maria, na faixa de pedestres. Ele dormia sentado no galinheiro enquanto a Arianna dava comida pras galinhas. Ele ficava deitado na horta da Arianna, em meio às alfaces, feliz da vida. Na Itália, ele aprendeu a substituir os tênis por pedaços de lenha; uma vez, sem nenhum pedaço à mão, pegou uma lenha ACESA da lareira e saiu correndo pela casa com aquele negócio em brasa na boca, abanando o rabo e todo prosa. No verão, quando o calorão tá brabo, almoçamos na cozinha de baixo, que dá pro quintal, e os cachorros ficam aproveitando o fresco com a gente, em torno da mesa. Uma vez a Arianna tinha deixado uns jornais com piche embaixo dos móveis, pra pegar um camundongo que tinha sido visto no quintal; o Legolas deitou com o rabo bem embaixo do armário e o piche grudou no rabo dele. Só percebemos porque, quando lhe demos um pedaço de carne, ele ficou feliz e abanou o rabo e ouvimos o barulho do jornal. Tivemos que cortar um monte de pelos pra poder soltar o jornal. Ele era amigo dos gatos, que roubavam a sua ração. Ele adorava casca de fruta, principalmente de melancia. E adorava as frutas também. Gostava muito de peixe e devorava um frango assado inteiro em minutos. Nunca teve tártaro e nunca perdeu um dente sequer. Ele avisou à Arianna que o Demo tinha morrido, quando ela chegou em casa. Ele sempre ignorou a existência da Carol. Ele gostava de sorvete e de ovo cru. Ele “falava”, resmungando quando falávamos com ele. Ele não sabia uivar. Ele uma vez matou um pombo na casa da Arianna. Ele dormia horas no caminhão do Mirco, na oficina. E quando ficava muito sujo o Ettore limpava ele com jato de ar comprimido e ele nem ligava. Ele fazia muita companhia pra Arianna. Na primeira vez que viu neve ele a comeu. Ele bufava quando se jogava no chão. Ele ficava encarando a Arianna na horta até ela se tocar e lhe dar um pepino recém colhido. Ele deixava o Camillo sentar com a bunda na cara dele. Ele nunca reclamou de ter que tomar banho. Quando brincava de jogar bolinha ele nunca queria soltá-la, e, na dúvida sobre o que fazer com a bola, largava-a na tigela de água e depois não conseguia beber água porque a bola estava lá boiando e ocupando espaço. Ele tinha uma mancha preta na língua.

Então vocês me desculpem mas o meu cachorro foi o melhor cachorro do mundo e ponto final.

ele

Na sexta à tarde levamos o Leguinho ao veterinário pra ver o tal negócio esquisito que nasceu nas costas dele. Hoje de manhã eu e papai levamos a criança ao consultório. Foi devidamente drogado e carregado com um certo esforço pra cima da mesa. O doutor, muito simpático, não conseguiu pegar nenhuma veia porque veia de velho é assim mesmo, ainda mais depois de tranqüilizante. Acabou-se fazendo uma infiltração ao redor do coiso. O corte foi profundo, muito profundo, mas os tecidos abaixo do subcutâneo estavam saudáveis. O doutor aconselhou a nem fazer histológico pra eu não ficar paranóica, até porque ele já tem dez anos e se a patologia desse alguma coisa horripilante quem é que teria coragem de acabar com a qualidade de vida dele dando quimioterapia.

São sete da noite e acabei de passar na Arianna. Quando abri a porta da garagem ele veio todo bêbado me cumprimentar, sentou do meu lado por uns minutos e depois voltou pra garagem, que é mais fresca. Antes de subir os degraus me deu uma olhada de cortar o coração, com aqueles olhos vermelhos e caídos, e depois capotou, suspirando. Deixei-o lá roncando ao lado da máquina de lavar roupa, com o Leo vigiando. Um retângulo raspado nas costas, uma ferida cirúrgica bem feita com cinco pontos borrifado com antibiótico azul e um pedaço raspado em duas patas, onde tentou-se pegar uma veia.

A coisa pior disso tudo é que ele não tá velho. Tipo, o Leo dá dois passos e cansa, é rabugento, já perdeu não sei quantos dentes, é chato. O Leguinho não tem nem tártaro! Come tudo, não é alérgico a nada, nunca tomou remédio de nada, nunca reclamou de coisa nenhuma,se dá bem com todo mundo, não enche o saco e ainda por cima pula e brinca como se tivesse 10 meses e não 10 anos, com aquela maldita bolinha ridícula na boca. Não consigo imaginar o meu negão doente, ainda mais com doença de velho, e ainda mais perto de morrer, porque cachorro grande morre cedo. Eu sei que amanhã ele vai estar melhor e vai passar o dia se entupindo de melancia e brincando com os gatos, como sempre, mas mesmo assim é horrível.

novos bichos

Almocei na casa da Simona hoje, e conheci Gilda, a cachorrinha que a companheira da veterinária do gato da Simona achou na rua, abandonada. É uma figura, totalmente pointer mas sem rabo, abana a bunda loucamente, te olha desconfiada com a língua de fora, é alegre. Mas não se dá bem com Pidocchio (piolho), a gata preta, que é surda e por isso não pode sair de casa.

Vou pedir pra Simona me mandar uma foto da Gilda pra botar aqui e vocês vão ver que simpatia : )

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Meu penúltimo aluno do dia, um arquiteto simpático e inteligente que é a cara do Ewan McGregor, mete a cabeça dentro da minha sala de aula verde.

– Quê que foi? Entra, menino.
– É que temos um convidado especial hoje.

ELE ENTRA NA SALA DE AULA COM UM FILHOTE DE TERRANOVA NOS BRAÇOS. VOCÊS NÃO ESTÃO ENTENDENDOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO

Basicamente ele foi avaliar um projeto sei lá onde, na roça, e achou o coitadinho abandonado no meio do capim, com aquela cara de desamparado. Resolveu levá-lo pra casa, já que ele mesmo mora meio na roça, em uma casa grande, com três filhos, e a cachorra da família já está muito velha e quase subindo no telhado. Que sorte do filhote!

Compreensivelmente, quase tive um treco quando vi o cachorro. Coitado, de tão amedrontado ele nem se mexia; peguei-o no colo e senti o coraçãozinho disparando. Me olhava com aqueles olhos bonzinhos e eu quase chorei. Dei aula com o filhote dormindo no meu colo, roncando, com a cabeça apoiada na mesa.

o amor é lindo

Hoje a gatinha, que se chama Giulietta, trouxe um camundongo morto pra casa. Devidamente devorado, da cabeça aos pés. E depois, pra complementar o café da manhã, foi comer a ração do Leguinho. Na mesma tigela, com ele.

cats and dogs

Eu não canso de observar bichos. Nesses dias dormindo na Arianna, tentamos ficar o máximo de tempo possível com os meninos, já que ficam o dia inteiro sozinhos em casa, coitados. Então saímos da oficina, passamos em casa pra jantar e tomar banho, e corremos pra Arianna. Levamos todos pra passear ali em torno mesmo, até a estação and back. Leo e Demo são desobedientes e por isso vão de coleira. Só que não foram acostumados e ficam o tempo todo tropeçando, se enrolando e empacando. Leguinho, o único obediente, vai solto, porque depois das nove não há ninguém ali na rua, só na praça, tomando sorvete. Virgola vai no carrinho de bebê que o Ettore achou inteirinho fora de uma caçamba de lixo há muitos anos, e desde então virou o Virgolamóvel. Imagino que quem nos vê deve achar que somos malucos: uma cachorra loura num carrinho de bebê, um preto imenso solto, com a língua de fora e a bunda rebolativa, e dois cachorros retardados, com coleiras improvisadas, com cara de quem comeu e não gostou.

De manhã acordo sempre muito cedo, com os malditos galos se esgoelando lá fora, e aproveito pra dar uma volta com os meninos. Solto todos, porque às seis da manhã não incomodam ninguém. Todos os dias o Leguinho vai fazer o cocô dele láaaaaaa longe no campo, comemora, volta, rouba um toco do depósito de lenha do quintal, deita no gramado na minha frente e começa a roer o toco e comer a casca (cada louco com sua mania, after all). Os mongos do Leo e do Demo desaparecem e só voltam pra casa quando já estamos saindo, as línguas de fora, as patas cheias de lama. Perdemos uns cinco minutos pra arrebanhar os dois pra dentro e fechar o portão.

E ainda tem as gatas.

Eu sou uma dog person inconversível, vocês sabem. Tenho pouca paciência com bichos arrogantes como gatos, mas alguns me conquistam. A Priscilla, dengosa como era, passava os domingos inteiros no meu colo. Mas a Priscilla, única gata suja do mundo, que fazia cocô pelo quintal inteiro, menos onde havia terra pra enterrar, foi convenientemente despachada com três filhotas pra casa de uma prima da Arianna, que estava precisando se livrar de uns ratos asquerosos. A filhota preta ficou com a tia do Mirco, que é quem está cuidando das galinhas, dos patos, dos gansos, dos pombos e dos coelhos enquanto o povo está na Holanda. E em casa ficou uma das filhotas tigradas, que por sorte é dengosa que nem a Priscilla. Literalmente escala o seu corpo até chegar no seu colo, arranha a sua perna pedindo carinho, deita de barriga pra cima, suspira, ronrona, morde o rabo do Legolas. Um amor! :)

uia

A notícia não boa da semana é que a namorada dos cachorros está no cio outra vez. Toda hora ela vem encher o saco dos meninos, estacionando-se do lado de fora do portão do quintal e tentando os coitados com olhares sensuais e piscadelas. O resultado é que todos ficam de mau humor, a não ser o Demo, que é leve e consegue escalar mesmo a cerca mais alta, e some a noite inteira. Chega de manhã ou de madrugada exausto, chorando pra que alguém lhe abra o portão. Até aí tudo bem, sempre foi assim. Só que hoje de manhã ele apareceu, depois de mais uma noitada de sexo selvagem, com um buraco na testa, tão fundo que se vê até o osso. Não se sabe o que aconteceu; pode ter sido outro cachorro, pode ter sido um carro, alguém pode ter dado uma porrada nele. O fato é que o Ettore ficou impressionado com o tamanho da cratera, e chegou até a ter pena do bicho – e quando chega a esse ponto é porque realmente é A CRATERA. Não quero nem ver.

querem uma foto patografada, querem?

Quem viu La Prova del Cuoco na quarta-feira viu duas fotos do Legolas sendo mostradas no ar, ao vivo. A história é a seguinte: a Antonella, a apresentadora mais bonita, simpática, atolada e gorducha da TV italiana, tem um labrador chamado Oliver, que estava procurando uma namorada. Começaram a chover e-mails e cartas na redação do programa, invariavelmente acompanhadas de fotos de cachorros, machos e fêmeas, pequenos e grandes, velhos e jovens, feios e lindos, labradores, microcães, pugs, vira-latas e até outros bichos. Ela lê as cartas no ar e ainda há uma galeria de fotos. Semana passada resolvi mandar duas do Leguinho pra ver no que dava. Uma é inédita, uma dele deitado no chão de boca aberta e língua de fora, com um pedaço de pau na bocona, e a outra é essa. Antonella leu uma parte do meu e-mail no ar: esse é o meu cachorro brasileiro, Legolas, que brinca com os gatos – ou algo desse tipo. Mostrou as fotos e fez voz de criança pra dizer como era lindo ele dando beijo na gatinha.

Cachorro popstar são ooooooutros 500… ;)