eu e os eosinófilos, os eosinófilos e eu

Aconteceu. Não é oficial, porque não fiz nenhum teste, mas os sintomas não deixam dúvidas: virei uma pessoa alérgica. Pior, uma alérgica pertencente à categoria de alérgicos que não sabem a que coisa são alérgicos. Sabe aquela pessoa que passa o dia espirrando, você pergunta se ela está resfriada e ela responde que não, é alérgica. Segue a pergunta óbvia, alérgica a quê?, e a pessoa responde “não sei o quê, sou só alérgica”. Essa sou eu.

Sempre detestei o assunto alergia. Detesto coisas idiotas, e alergia é uma reação exagerada – logo, idiota – do seu corpo a coisas que não fazem mal a uma imensa parcela da população. Nunca fui alérgica a nada na vida, mas aparentemente conforme a idade vai avançando, meu corpo vai me traindo mais e mais.

A primeira vez foi há mais ou menos um mês, quando fui visitar os pais da menina israelense da turma da Carol. Eles moram literalmente depois da casa do caralho, lá nas colinas; o lugar é deslumbrante, mas eu, que já tinha acordado com o nariz entupido e achei que fosse um início de gripe, fiquei com o nariz completamente tapado depois que cheguei lá. Pode ter sido qualquer coisa: ciprestes, feno, pólen, pois roça tem uma cacetada de alergênicos. Só comecei a pensar que pudesse ser alergia quando os olhos começaram a arder e quando vi que quando tentava assoar o nariz, não saía nada, ou seja, era um edema da mucosa e não produção excessiva de muco. Xinguei todos os meus eosinófilos, um por um, mas no dia seguinte passou e esqueci do assunto.

Ontem tive o mesmo problema, que pelo jeito vai continuar por um bom tempo porque hoje acordei toda entupida de novo. Só consigo desentupir o nariz com um remedinho da Vick que é viciante e desconfortável de usar, praticamente um jato de eucalipto narinas acima que ainda deixa um sabor residual na garganta. E os olhos estão ardendo de novo.

Alergia é uma coisa difusa por aqui. Não sei se tem a ver com o fato da exposição aos agentes alergênicos ser esporádica, porque é só nesse começo de primavera que as plantas produzem pólen feito doidas. Fato é que o negócio é tão sério que em alguns canais aparece, além do homem do tempo, o homem do pólen, que dá previsões “meteorológicas” específicas sobre a presença do pólen. Você olha o mapa da Itália, procura a sua região, lê a legenda e sabe se o lugar onde você mora vai estar entupido de pólen nos próximos dias ou não. Sempre achei isso divertidíssimo, embora entendendo perfeitamente a utilidade pra quem sofre de alergia crônica. Agora vou ter que passar a prestar atenção também. E vou ter que ir conversar com a substituta da minha médica vesguinha (é uma pediatra siberiana que está no lugar dela; já a conhecia porque o filho dela tem mais ou menos a idade da Carol e brincaram juntos algumas vezes no parquinho) pra ver o que ela pode me dar pra aliviar essa merda. Não dá pra ficar jogando eucalipto na fuça o dia inteiro e piscando os olhos como um recém-nascido pra espantar a ardência, e, pior, não dá pra viver com o nariz entupido, que acabei de decidir que é o sintoma mais irritante do mundo, dentre todos os que existem, junto com a coceira. Acho que nem vou fazer teste de nada porque as coisas que devem estar causando a minha alergia são inevitáveis – essa zona é cheia de ciprestes, tem feno em tudo que é lugar, as árvores TODAS jogam coisinhas alergênicas no ar – de modo que seria só por curiosidade mesmo. Vamos ver o que a siberiana vai dizer…

method

Não, não é sponsored post. Sou tiete mesmo.

Nunca tinha ouvido falar deles. Mas aí um dia a Lu, gentil como sempre, me manda de presente, quando a Carol era bebê, um kit com o sabonete líquido e o hidratante pra bebês, na fragrância (doravante chamada “cheiro” senão fica parecendo catálogo da Avon) rice milk and mallow. Mallow, aquele do marshmallow (sim, eu também não sabia nada sobre o assunto, mas fiquei curiosa e fui pesquisar na época). O cheiro é uma delícia e diferente de tudo o que você já sentiu até hoje, especialmente no quesito bebês. Adorei a embalagem esperta, com a tampa do sabonete líquido funcionando como cambuquinha pra enxaguar a cabeça da criança, embora no caso da Carol a coisa não servisse pra nada porque com tanto cabelo era mais rápido usar o chuveirinho mesmo. Adorei a gráfica da embalagem. Adorei o fato de que os produtos eram naturais. Então fui lá no site olhar mais coisas, e virei fã.

Logicamente não vendem aqui no interior do Zaire, mas toda vez que vamos a algum lugar onde vendem os produtos – UK, França, EUA – compramos alguma coisa. Quando fomos a Orlando há um ano compramos aquelas folhas de amaciante que se usam na secadora, no mesmo cheiro rice and mallow, que aliás não estou vendo no site – totalmente viciante, uso direto com a roupa de cama e a casa toda fica com aquele cheiro maravilhoso. Compramos também o sabão líquido pra lavar roupas, que infelizmente não tem no mesmo cheiro, mas o outro perfume que escolhi, fresh air, também é ótimo, bem cheiro de limpinho mesmo, mas sem ser overwhelming como costumam ser os sabões em pó. É concentradíssimo, então a embalagem é pequena (e linda), ocupa pouco espaço, e o lance do pump é bem legal. Uso sempre menos do que eles mandam e mesmo assim lava muitíssimo bem. O amaciante também é ótimo.

Em Paris, em agosto, comprei o refil do sabão pra lavar roupa e esse aqui pra limpar o vaso, que tem uma embalagem maneiríssima e um cheiro delicioso mas não limpa melhor do que os produtos que uso normalmente.

E quando fomos a Boston, em outubro, comprei pencas de coisas pela drugstore.com e mandei entregar no hotel. Compramos esse sabonete líquido pra lavar as mãos que faz espuma e tem cheiro de limonada (a Lu esse ano mandou outros quatro de presente pra Carol; o da Minnie tem cheiro de morango, ela ficou louca), o pump é fácil de usar porque não precisa fazer força e a espuma é fácil de enxaguar. Perfeito pra crianças (e fica lindo no banheiro). Trouxemos o detergente pra lavar pratos, nessa embalagem ma-ga-vi-lho-sa, com cheiro de tangerina delicioso e delicadíssimo pra pele (pra mim, que já tinha mãos sensíveis nas CNTP e mais ainda depois da psoríase, foi uma bênção). O limpador genérico também é muito bom; compramos na versão pink grapefruit, um clássico deles, que é delicioso, e limpa bem. Só não funciona direito pra vidros porque deixa marca. Compramos esse sabonete líquido pras mãos numa versão que não estou vendo no site, de manjericão e com a embalagem preta, MARAVILHOSO. O bicho dura que é uma beleza: está desde outubro enfeitando a pia da minha cozinha e não está nem na metade. Considerando que usamos (o Mirco adorou) todo santo dia… Testei as pastilhas pra máquina de lavar louça também, mas como a água aqui é dura pra cacete e precisa botar a quantidade certa de sal pra não deixar tudo manchado de branco de tanto calcáreo, não deu muito certo. Erro sempre a dose do sal; prefiro comprar as pastilhas que já vêm com sal e negocinho pra dar brilho, tudo junto. É química pra burro mas não tem outro jeito. Mas o cheiro de pink grapefruit quando eu abria a máquina era uma delícia! E também compramos esse sabonete líquido pra criança, mas sinceramente não fiquei apaixonada porque tem uma consistência meio esquisita e tem que jogar muita, muita água pra conseguir enxaguar direito. O cheiro de maçã verde é bem gostoso, apesar de lugar-comum. E trouxemos uns três ou quatro sabonetes líquidos pras mãos diferentes, que ainda não usei.

As embalagens são todas divinas, ficam lindas no banheiro, na cozinha. E o fato da empresa ser “green” também é importante, lógico, não só pra gente usar menos substâncias químicas em casa, principalmente quando tem criança na jogada, mas também pra poluir menos o ambiente, já tão fodido. Os cheiros são todos bem diferentes e ainda por cima eles lançam muitos produtos em fragrâncias que ficam disponíveis por tempo limitado; se eu morasse nos EUA compraria todos que saíssem. CLARO que tudo custa mais do que os produtos que a gente acha no supermercado, mas duram muito, muito mesmo, e a qualidade vale a pena. Altamente recomendável.

para todo mal há multa

Foi só eu falar que nunca tinha sido multada e pronto, fui.

Hoje foi uma manhã atarefadíssima: deixei a Carol na escola, fui aos correios pagar uma conta pro Mirco, fui à acupuntura em Perugia, de lá fui direto pra Assis pro Commissariato pedir informações sobre a renovação do meu permesso di soggiorno, passei na livraria pra pegar a primeira impressão-teste (não sei como se chama isso em português) de um livro que eu traduzi pra fazer as últimas correções e estava voltando pra casa, apertadíssima pra fazer xixi, quando fui parada pela polícia. Me pegaram com o radar a laser.

Eu estava vindo pela Via Campiglione, “il Campiglione” para os íntimos, uma estrada que sai lá do meio do monte onde fica Assis e vai direto pra Bastia sem passar por Santa Maria. Saindo daqui pra Assis a vista da Basílica é linda, dos fundos, que normalmente não é a parte mais fotografada. Vindo de Assis pra Bastia, primeiro tem uma ladeira em descida (lógico, porque Assis fica no alto e Bastia na fundo do vale) em meio a oliveiras e vinhedos, que depois vira um retão, e só lá pra frente é que aparecem algumas casas e hotéis. Não entendo o limite de velocidade de 50 km/h, porque apesar de ter casas e hotéis eu NUNCA vi ninguém andando a pé por ali, porque não tem comércio nenhum a não ser uma loja de material de construção. Mas sempre respeitei. Hoje, apertadíssima e com pressa de começar a preparar o almoço antes de sair de novo, dali a 20 minutos, pra pegar a Carol, peguei meio pesado. A guarda fez sinal com aquela plaquinha vermelha, dei a seta e encostei.

– Bom dia.
– Documentos, por favor.
– Aqui estão.
– A senhora estava indo a 74, o limite é 50.
– Ui. Peço desculpas.

Ela ficou desconcertada.

– Infelizmente vou ter que multá-la.
– Claro!
– São 150 euros e três pontos da carteira.
– Paciência, quem mandou superar o limite.

Ela ficou parada olhando pra minha cara.

– Eu achei que o limite de 50 começasse um pouco mais à frente, mais perto dos hotéis.
– Não, é lá atrás, tem placa.
– Não vi, estava concentrada em chegar logo em casa pra fazer xixi.
– Bom, vou ali com o meu colega preencher a notificação, ok?
– Ok.

Lembrei que o endereço na minha carteira ainda é aquele antigo, de Cipresso, e fui lá avisar a eles.

– O boleto pra pagar chega em casa?
– Não, senhora, vou preencher agora pra senhora.
– Ok.
– A senhora tem 30 dias pra reclamar.
– Reclamar do quê? Era eu quem estava dirigindo, a placa está lá, fui eu que não vi. Errei, fazer o quê. Pago hoje mesmo pela Internet.

O policial começou a rir.

– Esse bom senso da senhora anda em falta na Itália…
– Ahá, mas eu não sou italiana, seu pulissa… Aliás, falando em bom senso, cês podiam dar uma apertada no pessoal que estaciona igual à cara deles, que tal?
– Pra multar todo mundo que estaciona errado a gente precisaria praticamente de um policial pra cada cidadão…

E foi assim que ganhei a minha primeira multa por infração de verdade desde que comecei a dirigir. Paciência.

ikea e edredons

Eu sou fã de carteirinha da Ikea. Não porque ache as coisas ótimas; todo mundo sabe que móvel da Ikea é trash, não dura nada e coisa e tal. Na verdade isso pra mim é uma vantagem, porque quando encher o saco da decoração atual não vou ficar com remorso de jogar tudo fora e começar de novo (ao contrário da mentalidade reinante aqui, que ainda prefere coisas que durem a vida inteira. Deus me livre!). A única coisa da nossa casa que não é Ikea é a cozinha, coisa da qual aliás me arrependo porque nenhum outro fabricante de cozinhas tem tamanha variedade de sistemas de arrumação interna. Também não acho as coisas particularmente lindas; fora alguma peça verdadeiramente bonita aqui e ali, com um toque beeeeem diferente e que eu adoro, a maioria é ou totalmente normal, à beira do sem-graça, e há coisas muito feias também. Mas eu gosto da filosofia da coisa toda, de como as lojas são organizadas, das almôndegas, dos preços baixos, da possibilidade de montar as coisas do jeito que você quiser porque tudo é modular e compatível com todo o resto, do jeito que eles criam ambientes lindos com móveis simplérrimos. E dos tecidos. Ai meus sais, os tecidos!

Parece que é uma coisa bem sueca isso de usar tecidos e estampas pra decorar a casa, de mudar a palheta de cores de todos os tecidos de um cômodo pra mudar completamente a cara do ambiente. Então os tecidos são caprichados, bem diferentes, alegres, inusitados. Fiz capas pras almofadas da sala com um tecido branco estampado com silhuetas de animais feitos de origami (não achei no site pra mostrar) bem diferente :-)

Mas a minha atual paixão são as “fronhas” pra edredom. Isso foi uma coisa que eu descobri quando fui à Holanda pela primeira vez, porque na casa da Stefania era assim. Aparentemente nos países nórdicos não se usa o lençol de cobrir por baixo do edredom, mas sim uma espécie de fronhona gigante pra envelopar o próprio edredom, que assim não fica criando mafuá na cama cismando de se separar do lençol de cobrir. Tem uma outra vantagem, que é poder mudar a cara do quarto toda vez que se troca a roupa de cama. E tem outra vantagem ainda, que eu só fui descobrir depois: como não tem o lençol de cobrir, é uma coisa a menos pra ajeitar na hora de fazer a cama, e como o edredom é pesado, ele praticamente vai pro lugar sozinho, você dá uma jogada assim e ele vai! Fazer a cama é vapt-vupt.

Nós fomos outro dia com a Petulla e Moreno & cia e compramos esse, que fica lindo na cama. Tenho três bem alegres pra cama da Carol, dois dos quais não estão mais no site: um com uma paisagem estilizada com céu azul e uma colina verdejante, um com umas árvores estilizadas e compramos mais esse, que fiquei meio com o pé atrás porque parecia sóbrio demais mas no final das contas gostei.

E chega porque esse é simplesmente o post mais mal escrito que já saiu da minha cabeça.

vita da casalinga (vida de dona-de-casa)

Mais ou menos, já que a faxineira vem duas vezes por semana pra dar aquela geral, minha mãe passa roupa e no final das contas o que eu faço de trabalho de casa é só cozinhar. Também só faltava eu ter que fazer mais alguma coisa, com a Carol sendo assim tão time consuming. A parte da dona-de-casa entra no setor intelectual da minha vida atual. Porque embora eu esteja tentando trabalhar um pouquinho, passo a maior parte do tempo sentada no meu acampamento no sofá da sala, ou dando mamadeira pra Carol, ou tentando dar o peito, ou esperando que ela arrote, ou trocando fralda. E nessa logicamente a televisão fica ligada o tempo todo, de modo que acabo assistindo aos programas que as donas-de-casa assistem.

Eu e minha mãe já demos tanta, tanta risada com o nível de “cafonismo” (TM mirco) e de hediondidade da televisão italiana que a Carol chega a acordar quando está no colo de uma das duas. Eu sei que vocês já tão carecas de saber que a TV italiana é o horror, o horror, mas eu juro, tem que ver pra crer. Os cabelos, as golas, os sapatos, a maquiagem… Jisúis! Por isso que esse país tá desse jeito. Não tem absolutamente LA-DA de interessante pra ver o dia inteiro! Acabo vendo e revendo os mesmos filmes over and over. Aliás, a coisa mais chata de bebê (além de sleep deprivation, é claro) é que você nunca, nunca fica com as duas mãos livres ao mesmo tempo. Freqüentemente não fica nem com uma só das mãos livres. E conseqüentemente não dá pra ler. De madrugada, durante as mamadas interminavelmente lentas e quando eu prefiro não ligar a TV pra ver se a Carol aprende que à noite não se faz nada além de dormir, seria maravilhoso poder ler alguma coisa. Qualquer coisa. Mas tá na cara que tão cedo não vai dar. Que puxa…

um dia de fúria

Eu me considero uma motorista muito civilizada. Não buzino, dou a precedência sem rancor, sempre ligo a seta antes de virar, de sair de uma vaga ou numa rotatória, paro na faixa de pedestres pro povo atravessar, não supero o limite de velocidade, não estaciono onde não devo. Não incomodo, enfim. Mas tem o seguinte: quando eu sei que estou com a razão, eu peito. Não me interessa se quem tá errado é um caminhão jamanta gigante (a única exceção são caminhões que transportam animais vivos, esses eu não peito por motivos óbvios): se o cara tá errado, eu encaro. Quer furar fila? Na minha frente não passa DE JEITO NENHUM. A única vez que me pegaram, digamos assim, foi um dia em que um idiota me pegou distraída e me ultrapassou na rampa de saída pra Foligno, já na parte zebrada, muuuitos metros depois do fim da faixa tracejada que dava direito à ultrapassagem, e obviamente me deu um susto danado. Jurei que nunca mais aconteceria, e desde então fico ligadona toda vez que pego uma saída da estrada. Se vejo alguém vindo desembestado pela minha esquerda com pinta de quem quer me ultrapassar na rampa, jogo o carro pra esquerda coladinho na faixa. Meu sonho é um dia empurrar um filho da puta desses pra esquerda até ele bater com a fuça no guardrail a 120 km/h. Se depender dos motoristas italianos, um dia vou conseguir.

Mas então. Isso dito, estava eu hoje saindo do estacionamento do Ipercoop muito placidamente, sem pressa nenhuma. Desde que ampliaram o estacionamento, parece que nem eles conseguem dar jeito no labirinto que aquilo ficou, e toda vez que vou lá mudaram alguma coisa na conformação das saídas. Hoje, por exemplo, a saída do estacionamento coincidia com a fila de entrada no posto de gasolina, que vende combustível com desconto pra quem tem a carteirinha do supermercado. Então tá, né, não tem jeito, vamos encarar a fila. Parei no sinal de Stop e liguei a seta, pedindo que alguém deixasse eu passar. Só que no carro que poderia ter dado permissão pra eu passar, que não estava na minha frente mas bem pra minha direita, o motorista estava ocupado contando dinheiro, com direito a lambida no polegar e tudo. Atrás dele, uma fila gigantesca de motoristas putos da vida, já todos com as mãozinhas fazendo o gesto italiano de “ma che cazzo succede?”, internacionalmente traduzido como “wtf?”. E aí eu, apertadíssima pra fazer xixi, fiz uma coisa antipática, mas não necessariamente errada: fui e passei. Veja bem, não atrapalhei ninguém, não furei a fila, não dei fechada em ninguém. Simplesmente considerei a distração do cara como permissão pra passar, que mais cedo ou mais tarde ele ou alguém teria me dado mesmo. Passei e o cara nem percebeu, tanto que as buzinas começaram a tocar só um momento depois e o cara ainda demorou um pouco pra chegar na bunda do meu carro. Pelo retrovisor vi que ele tava putinho, gesticulando feito um doido. Juntei as mãozinhas e inclinei a cabeça, indicando que só passei porque ele tava dormindo no volante feito um dois de paus. Caraca, o homem virou bicho! Quando vi que ele tava soltando o cinto de segurança corri pra fechar o pino da porta. Bem na hora, porque ele veio até o meu carro e tentou abrir! Eu olhando muito pacatamente pra cara dele, e ele gesticulando feito um maluco: “eu tava dormindo, é? Agora quem espera na fila tá dormindo, é?”. E eu imitando o que ele estava fazendo, fingindo que contava dinheiro. O cara ficou lá agitando os braços e eu: “vai me bater? Vai me bater?”. Até que ele cansou e voltou pro carro, e lá ficamos nós parados na fila, eu ouvindo minha musiquinha e ele fazendo gestos de “Mas veja só, macacos me mordam”.

Na próxima vez juro que eu desço do carro correndo antes do cretino e me coloco em posição de combate de caratê (na verdade vai ser uma pose da Chalene mas ninguém precisa saber disso) no meio da rua. Com a raiva que eu fico quando essas coisas acontecem, claramente visível na minha cara, du-vi-do que alguém tenha coragem de me encarar.

hihihi

Estou com preguiça de sair de casa e mandei o Mirco passar no supermercado antes de vir pra casa almoçar. Deixei a lista com ele – escrita em português.

– Alô.

– Sou eu. Não tô entendendo uma coisa aqui na lista.

– Hm.

– Pipi de micro…

– Pipoca de microondas.

– Tá. “Pa” e um rabisco…

– Pão. [o rabisco era o til]

– “1 dz de o” e um rabisco.

– Uma dúzia de ovos. [aqui não se compra NADA em dúzias]

– “Forma de papa”…

– Forma pra pudim.

– Ahn?

– Aquelas formas redondas com um buraco no meio, pra fazer pudim, bolo etc.

[silêncio]

– Entendeu?

– Não.

– Aquelas grandes que a Arianna usa pra fazer bolo.

– Ah, não as pequenininhas pra muffin então?

– Não, essa eu tenho. A minha de pudim tá vazando, por isso preciso de outra nova.

– Mas é feita de quê?

– Cacete, é uma forma, Mirco, vai no forno. De alumínio, antiaderente, de silicone, tem vários tipos.

– Eu tô aqui nas panelas mas não tô vendo nenhuma forma.

– Mirco, onde tem panela também tem forma. Não tem nem aquelas quadradas?

– Tem uma que tá escrito “lasanheira”.

– Então perto dessa deve ter pelo menos uma redonda.

– Não tem.

– Se tiver sem buraco, traz que eu boto um copo no meio. Basta que seja redonda.

– Não tem!

– Tem aquelas retangulares altas pra fazer pão?

– Tem.

– Tem aquelas redondas baixas com as bordas trabalhadinhas pra fazer torta de fruta?

– Tem.

– Então tem que ter uma de bolo também, como eu tô dizendo.

– Não tem.

– Não tem nenhum funcionário do supermercado pra perguntar?

– Não.

– Então vai lá pegar o pipi de microondas e vem almoçar.

– Tá.

Conhecendo a figura, ele não vai sossegar enquanto não comprar uma forma, qualquer uma. Se bobear é capaz de chegar em casa com uma em formato de ursinho ou coisa parecida.

dezembro, mês do desgosto

Acho essa coisa do Natal um porre. Porre, porre, porre. Parente da alegria forçada do Carnaval, sabe. Só que pelo menos Carnaval tem desfile, aquela cafonalha que eu adoro. Natal, nem isso. Presépios ridículos representando uma cena idiota que nunca existiu. Músicas chatas, chatas, chatas. A proliferação de coisas hediondas verdes e vermelhas. Presentes que nunca, nunca agradam. Nem das comidas de Natal eu gosto: aqui praticamente só sou fã de cappelletti in brodo, e mesmo assim prefiro cappelletti com molho de tomate do que em caldo de galo castrado.

Sim, estou de péssimo humor. Esse mês tem sido UM SACOOOO. Só trabalhos chatos. O tempo não ajuda; não pára de chover há semanas e eu vou ficando mais e mais rabugenta. Hoje até que abriu um solzinho, mas todo mundo já sabe que amanhã volta a chover e não se sabe quando vai parar. A sensação é que não vai parar nunca.

Ontem saí de casa tipo às dez da manhã pra comprar um lápis de olho urgente que o meu acabou e ir ao supermercado comprar pão, banana e sorvete porque veio gente jantar aqui em casa*. Imaginei que no meio da manhã de uma terça-feira não haveria confusão em Bastia Umbra. Doce ilusão. As ruas entupidas de gente, todo mundo de carro porque chovia a cântaros, e todo mundo estacionando à italiana, ou seja, onde dava na telha. Da minha casa até o centro, distância tão ridícula que quando não chove a cântaros eu cubro a pé ou de bici e que quando sou forçada a pegar o carro percorro em exatamente três minutos, levei dez. No estacionamento minúsculo da Coop, páro e ligo o pisca-alerta enquanto espero alguém sair e liberar uma vaga. Não passam dez segundos e uma Lancia Musa buzina forte atrás de mim, querendo entrar na vaga pra deficientes físicos que tinha acabado de ser liberada (estranhamente, por um carro de deficiente físico). Contei até vinte pra não sair e cobrir a mulher de porrada – ela não precisava buzinar porque tinha espaço atrás de mim pra manobrar, e não deveria ter estacionado ali porque A PORRA DA VAGA ERA PRA DEFICIENTES FÍSICOS. Finalmente sai uma senhora do supermercado com um carrinho com tipo três coisas dentro. Levou duas horas pra botar aquilo na mala da Panda e mais duas pra enfiar o carrinho na fila e pegar a moeda de volta. Estaciono, mas a vaga era apertada porque o cretino à minha direita tinha estacionado o BMW velho feito a cara dele. Consigo abrir a porta só um pouco, e sair dali com 1) casaco, 2) guarda-chuva (odeio guarda-chuva, mas dessa vez realmente não dava pra evitar), 3) sacola de compras, 4) a minha bolsa foi uma operação delicada. Quando consegui entrar no supermercado estava quase chorando de ódio de tudo e prometendo a mim mesma ir morar numa caverna sozinha.

Também não saí mais de casa o dia inteiro. Fiz uma faxina light, almoçamos tarde e dei uma dormidinha básica (não tinha dormido nada à noite sonhando com o último livro da trilogia da Robin Hobb). Quando acordei e fui trabalhar percebi que as 5 laudas que a Sabrina tinha me encomendado pra hoje de manhã eram um contrato. Como eles sabem que eu não faço tradução legal, nunca me mandam nada desse tipo, então eu nem sempre pergunto do que se trata quando me oferecem trabalho pelo telefone. Quando abri a merda do file e vi o maldito contrato tive ganas de jogar o computador pela janela. Já era tarde demais pra recusar, pois às cinco da tarde eles jamais achariam outro tradutor que entregasse até as nove da manhã de hoje. Lá fui eu fazer a porra do contrato, praticamente procurando cada vírgula no dicionário. Quando acabei respirei fundo e fui pra cozinha fazer o jantar.

*O jantar:

O curry que compramos no Grand Bazaar em Istambul está rendendo. O Mirco toda hora pede pra eu fazer. O Silvio nunca tinha ouvido falar de curry, mas a Oana gosta de coisas estranhas, então fiz peito de frango com curry. Em vez do arroz selvagem que costumo fazer como acompanhamento, fui de batatas gratinadas porque o Silvio, ao contrário da maioria dos italianos, adora uma batata e tenho que aproveitar essas poucas oportunidades batatais que aparecem em ocasiões sociais. Ficou tudo ótimo. Regamos com guaraná pra piorar mais ainda a mistura maluca de comidas incombináveis, e fechamos com um Barattolino Sammontana de cream caramel com pedacinhos de biscoito de chocolate. Brinquei muito com o Michele, que tem 7 meses e é um amor. O jantar salvou o dia.

E lá fui eu ler até as 3 da manhã. Mas isso é outra história.

weather talk

O tempo está uma bosta há praticamente uma semana. Chove de norte a sul sem parar. A gente aqui no vale ainda tá mais protegidinho, mas parece que estamos mesmo no olho do furacão: no norte neva neva neva, no sul venta venta venta, chove, um saco. Tetos de galpões saem voando, caminhonetes caem de pontes sopradas pelo vento, árvores caem sobre linhas elétricas e interrompem o trânsito de trens, as ilhas estão isoladas porque com o mar agitado não há barca que faça a travessia.

Aqui ontem choveu o dia inteirooooooooo. Não vejo a luz do sol há dias, o que vai sugando toda a minha energia aos poucos. Essa noite o vento, meu pior inimigo, tava tão forte que eu não dormi nada, levantei mil vezes pra conferir se as janelas tavam fechadas direito, pra botar os vasos menores de plantas em uma posição mais protegida, pra ver se o regador não tinha voado, pra amarrar as laterais da mesa da varanda que ficavam batendo, putz. Agora estou aqui me arrastando, tentando me concentrar em um trabalho chatérrimo infinito que está praticamente me deixando vesga. Porreeeeeeeeeeeeeeeee.

a pranta

Lembram que eu falei daquela planta estranha, azulada, que eu achava que não ia dar flores esse ano? Ledo engano. Não só deu as flores, como as antenas ficaram mais altas do que no ano passado. Não há dúvidas de que vou ter que trocar a bichinha de vaso, mas a Arianna falou pra eu esperar o tempo “assentar” pra não traumatizar a coitada. Agora que o tempo assentou – uma merda de tempo, mas pelo menos tá assentado, pois dificilmente voltará a esquentar – posso cuidar do assunto. Assim que eu desatolar de trabalho, lógico.