Foi mal ai’, mas to aqui atoladérrima de trabalho, com a televisao ligada nas hipopot… oops, atletas do lançamento de martelo ou coisa que o valha, e nao tenho tempo de escrever sobre a viagem. Assim que der eu volto, escrevo e boto fotos decentes.

Obrigada pela compreensao.

a viagem

Ontem perdi algumas horas de sono estudando o guia Lonely Planet de Istambul, o Wikitravel e as dicas que a Lia me mandou por email. Sempre tento nao me assanhar muito antes de ir a algum lugar que ainda nao conheço, pra evitar desilusoes e tal, mas tenho a impressao que eu vou AMAR Istambul. O lance da pechincha nas lojas me preocupa um pouco, pois nao herdei bulhufas do sangue de comerciante arabe do meu bisavo sirio, mas mesmo assim acho que vou adorar.

Como sempre, antes de qualquer viagem eu ja’ vou planejando tudo o que eu vou comer quando chegar la’. Gostaria de ser menos obcecada com comida, mas agora ja’ era, nasci assim, fazer o que. Ja’ fiz uma listinha e ja’ anotei a pronuncia fonética de todos os pratos que me interessam. Apesar de nao ser dramatica como os italianos e nao deixar que uma ma’ experiencia gastronomica arruine a minha viagem, uma boa refeiçao pode se transformar numa das melhores memorias de uma visita ao exterior. (A lista das coisas que pretendo comer no Rio ja’ tem assim umas duas paginas cheias.)

Outra coisa que nao vejo a hora de fazer é nadar. Nosso hotel tem piscinona, e como eu nao nado ha’ anos – a ultima vez foi na piscina do hotel na Toscana, lembram, com as baby-sitters daquela familia americana milionaria – e agora, vendo os pitéus da nataçao deslizando como peixes na agua azul do Cubo, me deu uma vontade danada. Aqui nao tem esse lance de clube como tem no Brasil; existem piscinas fechadas, que so’ abrem no inverno, e algumas poucas abertas, aonde na verdade o povo vai pra torrar no sol. Paga-se caro pra entrar e nao tem exame médico, é obrigatorio usar touca, se voce sair de la’ de biquini, canga e chinelo, sem tomar banho e secar o cabelo, fica todo mundo te olhando, ou seja, é tudo muito estranho. Entao estou programando varias nadadas na piscina do hotel. Comprei um maio ontem, na liquidaçao, porque o que eu tinha ficou guardado por tantos anos que ficou todo troncho, sabem como é lycra velha. Ainda nao fiz as malas, mas as roupas de banho e os chinelos ja’ estao alinhados no sofa’ do quarto de hospedes, so’ esperando. Nao vejo a hora, looking forward to it, non vedo l’ora.

de olimpiadas etc

Oquei, confesso: fiquei tentada a participar do boicote às Olimpiadas. Também acho os chineses ligeiramente tendentes ao hediondo, odeio o modo com que tratam os animais, a falta de respeito aos direitos humanos etc. Na verdade a cultura oriental em geral nao tem nada a ver comigo: tenho verdadeiro pavor de toda aquela disciplina, nunca fui chegada em uma autoridade, a idéia de nao ser um individuo mas sim mais uma abelha operaria numa colméia gigante me enche de terror, a falta de liberdade de expressao me da’ calafrios, mas o pior de tudo é que eu nao confio, de jeito nenhum, em quem vive pra trabalhar em vez de trabalhar pra viver. Nao confio, nao da’, é completamente incompativel com o, digamos, amago do meu ser. E se ainda por cima esse povo é sujo e escarrador e com alta incidencia de acne, to fora mesmo. O mundo ja’ esta’ uma merda agora, mas sinceramente acho que fazer parte de uma futura (espero que muito hipotética) Pax Chinesa seria MUITO pior.

Mas ai’ a gente para pra pensar e ve que a hipocrisia esta’ em tudo que é lugar, nos americanos que bombardeiam conforme lhes da’ na telha sem pedir autorizaçao de ninguém e que aparecem de mascara cirurgica contra a poluiçao em Pequim mas poluem mais que todo mundo, nos brasileiros que reclamam do governo mas nao impeacham ninguém, nos italianos que se acham superfashion mas compram roupas falsas vendidas por senegaleses e feitas pela mafia, no Papa, no mundo inteiro – estou citando os casos mais proximos a mim; o assunto seria coisa de meses recitando exemplos.

Entao quer saber? Que joguem, que compitam, que se divirtam, que vendam espaço publicitario, que impulsionem a economia chinesa, nao interessa. Embora o espirito geral das Olimpiadas nao seja a integraçao entre os povos, todo mundo sabe, continuo adorando esses eventos internacionais. Nao posso ver uma bandeira, ler um nome diferente, ouvir um hino desconhecido que fico logo toda assanhada. Assisto a todos os esportes, inclusive aqueles dos quais nunca ouvi falar, e nao importa de onde sao os atletas. Adoro as cerimonias de abertura, acho aquela cafonice otima, a alegria dos atletas contagiante, acho tudo lindo. E ca’ pra nos, o estadio Ninho e o Cubo dos esportes aquaticos sao dois desbundes de arquitetura.

Entao agora me deem licença que tenho muito trabalho pra entregar na segunda antes da viagem, e trabalhar com as imagens daqueles pitéus da nataçao na televisao ao meu lado é no minimo inspirador.

probleminha técnico

O meu botaozinho que muda de lingua no Windows sumiu. O espacinho onde ele fica normalmente ainda esta’ la’, mas o botao sumiu. Ja’ mandei a barra coloca’-lo de volta, mas ele nao quer, e nao aparece de jeito nenhum. A soluçao é escrever no Word e colar aqui, mas voce tem paciencia? Nem eu. Se alguém tiver alguma soluçao pro problema, por favor me avise. Pra quem trabalha com traduçao e troca de lingua toda hora nao é so’ um incomodo, é um porre mesmo.

A paca agradece.

de novo

Queria postar sobre isso ontem, mas me embolei com o trabalho e não deu. Foi melhor assim, porque hoje de manhã fiquei sabendo de umas coisas que confirmam que não é maluquice minha.

O lance é o seguinte: essa semana o governo deu o pontapé inicial ao projeto que coloca militares nas ruas de algumas grandes cidades italianas, teoricamente pra aumentar a segurança dos cidadãos. A minha dúvida não era se os militares realmente resolveriam o problema ou não (é LÓGICO que não), mas se era necessário. A resposta também é não, do meu ponto de vista. Apesar de não morar em cidade grande, ocasionalmente vou a Roma e não percebo, nem de longe, aquela sensação de perigo iminente e o instinto de fight or flee que você sente no Rio assim que bota o pé fora de casa. As histórias de crimes que aparecem nos telejornais me parecem incrivelmente sensacionalistas, nunca vêm acompanhados de estatísticas e pra mim são simplesmente coisas que acontecem em qualquer grande cidade do mundo. Mas eu achava que era só eu.

Aí, hoje, no telejornal da La7 (o único canal aberto que não pertence ao Berlusca nem é indiretamente controlado por ele), deram umas estatísticas sobre as causas de morte na Itália. Em primeiro lugar, tchan-tchan-tchan-tchan, acidentes de trânsito. Lógico. Mais pra baixo na classificação temos o que eles aqui chamam de “mortes brancas”, mortes de trabalhadores no local de trabalho devido a negligência ou por não usar equipamentos de segurança. O primeiro detalhe é que as mortes no trânsito são OITO VEZES mais numerosas do que os homicídios, e as mortes brancas, se me lembro bem, três vezes mais numerosas do que mortes matadas. O segundo detalhe é que essa mesma pesquisa, feita por um centro estatístico de todo respeito, mostra que o número de homicídios vem caindo constantemente nos últimos anos. Se além disso você considerar que uma parte importante das mortes matadas estão relacionadas com a máfia, coisa que o exército não conseguiria resolver nem rezando pra todos os santos do mundo, vê-se que os soldados estão nas ruas só pra aparecer mesmo e pros velhinhos acharem que estão superseguros, que é exatamente o objetivo do governo.

Mesmo que o exército conseguisse efetivamente resolver alguma coisa (e já sabemos que não consegue), veja bem: em uma cidade como Roma a proporção é de um soldado pra cada 7.500 habitantes. Mó ajudona, né não! E mesmo que resolvesse, a presença deles é temporária. Mandemos os criminosos em hibernação, e que só acordem depois que o exército for embora!

Militarizar cidades que não estão em estado de emergência de criminalidade nem em guerra civil é a coisa mais demagoga que existe no mundo. Mas tá todo mundo achando ótimo, claro. Enquanto isso o governo faz cortes nos gastos com a polícia; policiais distribuem folhetos de protesto nos engarrafamentos nos pedágios (todo mundo indo al mare), mas isso não aparece nos canais da Rai, muito menos, é claro, nos do Berlusconi.

Esse país tá me cansando, não sei se vocês já perceberam.

das montanhas

Tô pra escrever sobre esse assunto há pelo menos uma semana, desde que rolou o primeiro acidente envolvendo escaladores italianos lá não sei onde (antes dessas 9 mortes noticiadas pelo Globo hoje). A Cora me antecipou, mas parcialmente. Porque enquanto que a minha reação ao ouvir falar da morte desses caras também foi exatamente “whatever”, a do Mirco foi, “ótimo, talvez agora neguinho aprenda”. Começamos a falar sobre o assunto e chegamos à seguinte conclusão: as famílias é que deveriam arcar com as despesas de resgate.

Pensa bem: o cara sai do conforto do seu lar pra escalar uma porra de uma montanha que não faz a menor questão de ser escalada, em condições extremas, sabendo do altíssimo risco de cair/se perder/sumir/congelar/whatever, gasta uma grana pretíssima nisso, e ainda por cima quando cai/se perde/some/congela o governo (local ou do seu país, não sei como funciona direito) ainda tem que mandar helicóptero, outros escaladores, esquiadores, cachorros e o diabo a quatro pra salvar o fulano – tudo isso só pra ter o prazer de voltar do K9 com uma camiseta “I reached the top of K9 and all I got was this lousy T-shirt”. Eu não sei vocês, mas acho uma falta de respeito, um egoísmo, de dimensões intergalácticas. Como já dizia a sábia Eva, a empregada mais nota dez que já tivemos: se tivessem um tanque cheio de roupa pra lavar esse tipo de coisa não aconteceria…

Então eu subi mais um degrau na escala do radicalismo. Porque se o lema do médico é primum non nocere, o de todo ser humano deveria ser primum non encherusacus. Ninguém tem o direito de encher o saco dos outros assim, causando preocupação aos parentes e despesas a quem tem que resgatá-los e tomando o espaço de notícias mais importantes no telejornal. Sendo assim, passei de “whatever” a “antes eles do que eu” e, finalmente, a “já vão tarde”. Amém.

la piel del tambor

El sol había salido y secaba el empedrado de la plaza de España. Los vendedores descorrían los toldos de sus puestos de flores y algunos turistas empezaban a sentarse en los peldaños, todavía húmedos, que ascendían hasta Trinità dei Monti. Quart escoltó al arzebispo escaleras arriba, deslumbrado por el reverbero de la luz en la plaza; una luz romana, intensa, optimista como un buen augurio. A medio camino, una joven extranjera con mochila, tejanos y camiseta a rayas azules, sentada en un escalón, le hizo una foto cuando los dos sacerdotes llegaron a su altura: un flash y una sonrisa. Monseñor Spada se volvió a medias, entre irritado e irónico:

– ¿Sabe una cosa, padre Quart? Es demasiado guapo para ser un cura. Habría que estar loco para nombrarlo párroco de un convento de monjas.

– Lo siento, Monseñor.

– No lo sienta, porque no es culpa suya. Pero reconozco que me fastidia un poco. ¿Cómo se las arregla?… Me refiero a mantener a raya la tentación, ya sabe. La mujer como invención del Maligno y todo eso.

Quart se echó a reír:

– Oración y duchas frías, Ilustrísima.

– Debí imaginarlo. Siempre fiel al reglamento, ¿verdad?… ¿No le aburre ser siempre, además, tan comedido y tan buen chico?

– La pregunta es capciosa, Monseñor. Responderla implica aceptar la proposición mayor.

Paolo Spada lo miró unos instantes de reojo y por fin hizo un gesto aprobador:

– De acuerdo. Usted gana. Su virtud ha vuelto a superar el examen, pero no pierdo la esperanza. Un día lo atraparé.

– Naturalmente, Monseñor. Por mis innumerables pecados.

– Cierre el pico. Es una orden.

– Como mande Su Reverencia.

La Piel del Tambor, Arturo Pérez-Reverte