ultimamente

Bom, tudo confirmado. Sexta-feira que vem partimos pro Canadá pra visitar a eowynzinha, que não vejo há anos.

Mas além dessa viagem muita coisa anda acontecendo.

Com o fim do inverno os pedidos de couchsurfers começam a chover na minha inbox. Há duas semanas hospedamos um casal de americanas, sorridentes e gentis mas sempre estranhas, como todos os americanos que já acolhemos até agora. Resolvemos que fomos os últimos americanos que hospedamos. Não tenho paciência pra gente que vem dormir na minha casa e não me traz nem um cartão-postal, e, pior, nem deixa um testimonial no site depois. Ingratidão tem limite. Pra compensar, semana passada recebemos um canadense de origem chinesa que é absolutamente um a-mor. Passou três dias com a gente, foi à faculdade comigo assistir a uma aula sobre a máfia, me ajudou a entreter meus colegas de turma que vieram jantar aqui na quinta. Foi embora na sexta, com sua moto BMW comprada na Alemanha e com a qual ele gira pela Europa há três anos. No final da tarde de sexta chegaram dois alemães, um rapaz e uma moça, amigos e colegas de turma: estudam medicina na terra natal e agora estão fazendo quatro meses de internato em cirurgia em Roma. Superfofos, educadéeeeerrimos, curiosos, com aquele italiano arrastado cheio de erres guturais. Almoçaram na Arianna hoje com a gente e foram embora de trem pra Roma. Digamos que foi uma semana intelectualmente muito produtiva, visto que o nível das conversas foi sensivelmente mais alto do que a nossa média aqui no interior do Zaire.

Hoje e amanhã rolam eleições por aqui. Todas as pessoas racionais que eu conheço estão se cagando de medo porque a probabilidade daquele TRASTE do Berlusca voltar ao poder é muito, muito alta. Só pra dar um exemplo do nojo, semana passada, numa entrevista no programa do igualmente nojento e seu baba-ovo particular Bruno Vespa, ele estendeu a mão ao apresentador e disse, está sentindo esse cheiro? É cheiro de santidade.

Sem comentários.

Voltando à quinta-feira, foi um dos jantares mais divertidos que já demos. Meus colegas são muito legais e espertos, apesar de novinhos – eu não estaria sempre com eles na faculdade se fossem idiotas, logicamente – e demos muita, muita risada. Pra mim é particularmente divertido porque eu pra eles sou tipo uma musa inspiradora, sendo (bem) mais velha e vivida e ainda por cima estrangeira – além de interessantíssima, lógico, mas isso ça va sans dire. Tipo assim um role model. Acho estranho porque não sou role model nem pra mim mesma, e além disso tenho uma grande admiração por todos eles, então me sinto realmente honrada. Acharam a casa “maneiríssima” e não adiantou dizer que não é exatamente uma casa “de adulto”, séria, porque os móveis são todos IKEA, vocês sabem, e a decoração não é o que se pode chamar de convencional. Não com um poster do Tin Tin na sala e um mapa do Hobbit no corredor, com aquecedores coloridos e coelhos e patos de pelúcia dividindo espaço com os livros de fantasia e ficção científica na estante, com caixas de som em forma de flor. Mas, resumindo, foi uma noite ótima. Comemos feijão com arroz e farofa e conversamos até as duas da manhã. No dia seguinte amanheci rouca de tanto falar e dar risada.

Estou terminando The Lions of Al-Rassan, do Guy Gavriel Kay, pela terceira vez. Antes dele li The Last Light of the Sun, sempre dele, e que se passa no mesmo mundo. Ele manda MUITO bem, adoro. Depois desse não sei o que vou ler; talvez o livro estranho que o Jim (o canadense chinês) deixou pra mim, com uma dedicatória linda. Mas tenho muita coisa me esperando na estante e pretendo começar alguma coisa que eu sei que vou adorar, pra poder levar pra viagem sem correr o risco de ficar empacada com um livro chato e nenhuma outra alternativa literária. Porque pra mim isso é absolutamente mor-tal.

Maaaaaaaaaaasss… Por último, mas não menos importante, quinta que vem é o aniversário dessa paca que vos escreve. A viagem vai ser comemoração mais do que suficiente, mas pretendo levar brigadeiros pra faculdade – sabe como é, festinha na escola nunca é demais. Como sempre, lembro-vos que a paca simplesmente a-do-ra presentes.

www.votaprovenzano.org

A aula de Linguaggi della Devianza hoje não foi aula. Assistimos a um semidocumentário rodado antes que prendessem o Bernardo Provenzano, aquele chefão da máfia que ficou foragido por 43 anos até ser “capturado” logo depois das eleições de 2006.

A idéia do documentário, que saiu da cabeça de um palermitano, foi sensacional: criar uma falsa campanha eleitoral com o Provenzano candidato a primeiro-ministro, com direito a site, santinhos e carro com alto-falante. Levaram esse carro, com aquele outdoor gigante em cima, com a cara do foragido (na época não se sabia que aspecto ele tinha, não depois de tanto tempo fugido, logicamente; usava-se um retrato falado que depois viu-se que era incrivelmente parecido com o cara mesmo) sorridente, a Palermo, Nápolis e Turim. E filmaram as reações das pessoas.

Foi uma coisa divertidíssima.

Em Palermo chamaram logo a polícia e a “campanha” foi interrompida, e o diretor foi forçado a cobrir a cara do Provenzano com um lençol. As pessoas reclamavam, diziam que aquilo piorava a imagem da Sicília, que com certas coisas não se brinca. Têm razão, e só sabe disso quem passou a vida numa cidade como Palermo, que por anos a fio via atentados de todos os tipos rolando em plena luz do dia, gente justiciada, gente dissolvida em ácido, gente jogada em tanques de cimento.

Em Nápolis também chamaram a polícia e interromperam a campanha, mas a coisa foi mais séria ainda: o político local que mais se rebelou e que chamou a polícia e exigiu que parassem com aquilo tudo era candidato nas eleições daquele ano… pelo partido de um senador que foi condenado por associação mafiosa. E que fazia parte da comissão nacional anti-máfia. O detalhe é que a notícia dessa condenação não saiu em NENHUM jornal nem televisão. Nunca vou me cansar de dizer o quanto a Itália é um país divertido.

Em Turim, onde, como em todo o norte, pensa-se que a máfia é uma coisa daqueles delinqüentes lá do sul, todo mundo achou tudo engraçadíssimo, o carro deu mil voltas na cidade, neguinho comentava que tanto fazia o Provenzano como outros políticos ladrões, foi tudo muito light.

Os comentários que neguinho deixou na internet foram terrificantes: muita, muita gente mesmo chamando o diretor e os produtores do documentário de comunistas, quando todo mundo sabe que a máfia é muito democrática e compra políticos de todas as facções, muita gente dizendo que pelo menos os mafiosos têm honra (col cazzo!), e coisas desse tipo.

Uma parte do documentário entrevistou uma professora universitária cuja tese de mestrado foi o mercado de músicas mafiosas. Isso mesmo que você ouviu. Rings a bell, doesn’t it, pra quem mora no Rio e já prestou atenção às letras de certos funks. CDs vendidos nas lojas, com o nome da máfia local na capa e tudo, na maior naturalidade. As letras são sempre singelas, tipo “aos traidores a gente corta o peito no meio”. De arrepiar os cabelos.

E a reportagem que foi ao ar em vários canais italianos quando “acharam” e “prenderam” o chefão? A ênfase foi toda dada ao coitado do boss que dormia numa casa caindo aos pedaços cedida por um pastor de ovelhas, a como ele dormia numa cama desconfortável, comia ricota e chicória e queijo com mel (juro), ao fato de que as benditas ovelhas foram dadas a uma família da mesma cidadezinha depois que o pastor foi preso. De como foi possível que esse homem não tivesse sido encontrado mesmo tendo colocado os pés fora da Sicília somente uma vez, não se falou. De como a notícia da sua prisão foi dada DEZ MINUTOS depois de anunciada a vitória da esquerda (e portanto a prisão foi feita durante o governo da direita), não se comentou. Do fato de que estranhamente começaram a morrer membros do sexo masculino da família Lo Piccolo, não se disse nada, ainda que se soubesse que os dois candidatos a sucessor do Provenzano fossem um rapaz Lo Piccolo e um Denaro – logicamente, da família Denaro não morreu ninguém. Do tal SE-NA-DOR condenado por envolvimento com a máfia, nem sinal.

Vir pra Itália é quase como nunca sair do Brasil…

matrimonio all’italiana

Acabamos de voltar do casamento de M. e M. (são quase 8 da noite). Foi assim um evento retumbante, e eu TINHA que dividir essa coisa com vocês.

O noivo é amigo de infância do Mirco, praticamente um irmão. Conheceu a noiva num barzinho aqui em Bastia, ela engravidou “acidentalmente” uns cinco meses depois, casaram-se no civil (com comunhão de bens, pro desespero do nosso contador em comum) um dia antes de mim e do Mirco, e hoje fizeram o casamento na igreja e o batizado do coitado do filho, que é uma fofura. A garota não quer nada com a hora do Brasil, morava numa espelunca em Ponte San Giovanni, aquela cidade-dormitório cheia de imigrantes, num prédio habitado por marroquinos e prostitutas, com o pai caminhoneiro e a mãe doméstica. Eu já tinha visto os pais antes, ambos sem dente na metade da boca, cabelos oleosos e roupas de viscose cheias de bolinhas. Também já tinha conhecido a sobrinha, que o Mirco logo comentou, todo orgulhoso do seu vocabulário erudito, que “tem cara de pobre”. Tem mesmo.

Toda a história deles é muito muito esquisita, aquele esquisito que te dá nervoso, sabe, a começar pela gravidez “acidental”, passando pela comunhão de bens (ela não trabalha, ele tem um empregão trabalhando pouquíssimo e com um salário que por essas bandas nem diretor de agência de banco tem), incluindo um carro comprado no nome dela que não vale um figo seco mas que precisaram pegar um empréstimo pra pagar os 16.000 euros que custou, uma cozinha que é dois terços da nossa e custou QUATRO VEZES o preço, incluindo uma máquina de café embutida de 800 euros (o detalhe é que ela não toma café e ele é que nem o Mirco, bebe mas não liga), e culminando nesse casamento absurdo que deve ter custado uns 25.000 euros. O empréstimo que eles pegaram é muito maior do que o nosso e pelo dobro do tempo – 30 anos! – apesar do nosso apartamento ser maior. Ele é funcionário de uma empresa e ela não trabalha, enquanto que o Mirco é DONO de microempresa e eu trabalho, só pra vocês entenderem a proporção do horror.

Mas tudo bem, ele tá feliz (ela, não tenho dúvidas, já que tirou a sorte grande), o filho é uma gracinha, ele é um ótimo pai e é isso o que conta, não é mesmo, meus queridos.

Mas vamos ao casório. Foi na igreja ao lado da basílica de S. Maria, onde praticamente todos os amigos do Mirco se casaram. Começou ao meio-dia, com uma hora de atraso porque tinha trânsito no caminho (uma feira de agropecuária aqui em Bastia). Cerimônia compriiiiiiiiiiida, chatérrima, crianças correndo e berrando interrompendo o padre, eu sentadinha (vocês não tinham nenhuma dúvida de que eu me recuso a ficar de pé em igreja, né, por favor) com os dedos coçando de vontade de pescar o livro do Guy Gavriel Kay de dentro da minha bolsa da Furla pra me distrair. Pelo menos a igreja é toda coloridinha, fofinha, e tinha muitas coisas legais pra ficar olhando no teto e nas paredes. Aqui o casamento é assim, ó: os convidados e o noivo não esperam dentro da igreja pela entrada bombástica da noiva; fica todo mundo lá fora, fofocando e batendo papo, inclusive o noivo. A noiva chega, desce do carro, cumprimenta praticamente todo mundo, entra todo mundo junto, sem dama de honra, sem padrinhos, sem o pai levando a noiva, sem nada. Não tem padrinhos de casamento. Os noivos ficam horas ajoelhados enquanto o padre fala, e depois é igual ao que a gente conhece, aquela ladainha surreal de até que a morte os separe, troca de alianças, etc. Dentro da igreja, todo mundo com óculos escuros gigantes apoiados na testa. A maioria espalhafatosos, Dolce e Gabbana e Dior, alguns mais discretos, Prada e Armani, uns poucos com Ray-Bans nondescript, espécimes Chanel raríssimos. Tinha mãe de sobrancelha pintada a lápis dando safanão em criança mal educada, tinha homem de paletó de xantungue, tinha bota branca de cano alto, tinha bebê de colo vestido de Burberry da cabeça aos pés. Divertidíssimo.

O noivo estava com um terno preto com um leve toque de PURPURINA AZUL. Sapatos de bico mais fino que chocolate belga, de verniz cor de coca-cola, com umas espécies de rachadurinhas amareladas. E sobrancelhas feitas, com direito a uma ferida bem no meio das duas.

A noiva, por quem não nutro a mínima simpatia e que só agüento socialmente, e mesmo assim só porque está com um amigo do Mirco, estava… Não sei nem por onde começar. O vestido era assim… Uma espécie de bustiê com uma parte de elástico atrás, um negócio esquisito. Por cima, um bo-le-ro hediondo. Ela não tem a pele muito boa, uma cor amarelada de ex-bronzeada, cheia daquelas bolinhas não identificadas. Em plena luz do dia os detalhes dermatológicos saltam aos olhos, vocês sabem. A saia era mal cortada, deixando ver a marca da calcinha, com as costuras mal feitas, sabe, quando o tecido enruga dos lados da linha de costura. O comprimento, incompreensível. A maquiagem parecia uma coisa assim feita por mim, ou seja, uma merda. Mas o melhor ainda estava por vir. Os cabelos. FRISADOS. Montados no alto da cabeça como um pudim. Com direito a mecha pendente por cima do ombro e tudo. Tudo isso coroado não com grinalda, florezinhas, véu, nada disso, crianças: com um pedaço de TRE-PA-DEI-RA. Artificial. Trepadeira mesmo, não tão horripilante como aquela jibóia que você tem num pote de maionese na cozinha, mas quase. Tive que me controlar pra não rir quando a vi, ainda mais com o Mirco falando “olha, olha” com sotaque umbro (leia-se óia, óia).

A irmã da noiva, a mãe da cara-de-pobre, é imensa. Imensa. Baixinha e imensa. Estava espremida em um vestido mais ou menos dourado. Mirco disse que parecia um Ferrero Rocher.

Até a roupa da sobrinha cara-de-pobre era horrorosa, com uma manga furadinha mais curta e sem sentido por cima da manga comprida, e uma saia com um caimento horripilante.

Céus.

E pensar que foi tudo carissimissimíssimo. Eu, com uma camisa da Zara linda que custou exatamente 4,99 euros em Roma e uma saia preta da Sisley bem cortadíssima que custou 10 na liqüidação, sapatos da Arezzo que herdei da minha mãe e minha bolsa linda da Furla que não vou dizer quanto custou na liqüidação, só pude rir. Less is more, definitivamente.

A recepção foi numa casa de festas muito bonita perto de onde morávamos antes, quase em Cipresso. Com direito a piscina ornamental (com ponte), casinha de bonecas e outros brinquedos pra crianças, etc. Serviço ótimo, comida idem. Primeiro, como sempre, o antipasto (um bufê gigante) no lado de fora, à sombra de quiosques. Depois todo mundo vai pra porta do salão pra saber onde vai sentar: tradicionalmente os noivos fazem, eles mesmos, um tabelão com os convidados distribuídos em cada mesa. Cada mesa tem um nome; tem quem escolha nomes de frutas, de cantores, de filmes, de cidades… Sendo muito criativos, eles escolheram flores, como 99% dos noivos italianos.

Nós caímos numa mesa com um casal que já conhecíamos e já recebemos em casa pra jantar, a irmã dessa garota, um outro casal formado por um vendedor de carros muito conhecido aqui na zona e sua namorada até então anônima, o dono da loja de móveis mais in de Santa Maria, amigo de infância dos meninos (a mulher dele chegou mais tarde, com a filhinha pequena), e um outro cidadão que não conseguimos descobrir quem era, porque passou o dia inteiro calado. Acabou que rimos horrores, falamos muito de viagens, de comida, de filmes, e foi bem legal. Mas acabou às oito da noite, e eu não agüentava mais. Socializar cansa.

TRADOS

Pra quem não conhece, TRADOS é uma ferramenta de tradução assistida. Um programa de tradução, por assim dizer. Carérrimo e cheio de mumunhas, dublê de quebra-galho e enchedor de saco, que eu já tinha visto mas nunca entendido. Meu maior cliente, a agência aberta por um ex-manicômio e onde hoje trabalham, fixos, outros 6 sobreviventes da Chefa Escrota, montou esse curso em dois sábados. Hoje foi o módulo básico, pra aprender aquele mínimo mínimo que serve pra usar o programa. Passei o dia numa sala de aula com meus ex-colegas e uns tradutores que não conhecia, ouvindo um instrutor de Arezzo falar sobre o programa mais chato do mundo de usar. Como eu adoro uma sala de aula, não importa muito o assunto (desde que não envolva números, naturalmente), foi um dia interessante, apesar do assunto ser pesado. O curso foi num hotel lá na casa do cacete, em Perugia, com almoço incluído. A senhora que administra o hotel é francesa mas está aqui há duzentos anos e preparou um almoço umbro como deus comanda, segundo o ditado: muita verdura grelhada, vagem crocantinha, lombo de porco cortado fininho, lentilhas, cicerchie (uma prima do grão-de-bico), um pão feito com farinha vecchio stile, moída no moinho de pedra (fica com um sabor muito, muito particular).

Gastronomia à parte, aprendi muita coisa. O programa é muito bem bolado mas logicamente tem mil falhas, e depende da organização e disciplina do tradutor (tô fodida); as opiniões sobre o quanto o TRADOS pode ajudar são muito divergentes e eu me coloco na trincheira daqueles que acham que ajuda só e exclusivamente quando se trabalha com muitos trabalhos bem parecidos, e mesmo assim ajuda somente a manter a uniformidade, mas não acelera o trabalho tanto assim (ainda mais no meu caso, já que sou rapidíssima em condições normais de temperatura e pressão, sem ajuda de coisa nenhuma). Provavelmente não justifica o investimento pesado, não só de grana – uns 700 EUROS, darlings – mas também de tempo, já que leva meses pra domesticar o programa bem o suficiente pra não alongar ainda mais o trabalho tendo que perder tempo descobrindo como funcionam os comandos e coisa e tal.

Mas o insight mais importante veio durante a conversa com o José: chegamos à conclusão de que nosso trabalho um dia será pra lá de mecanizado. Pra escapar dessa tem que passar pra tradução criativa, e nesse campo praticamente só sobram publicidade, que eu adoro fazer, e literatura, que eu AMO e sonho em fazer. E a paciência pra tentar achar meu lugar ao sol nessas áreas, vocês têm? Eu não. Então vamos empurrando com a barriga, até quando der. E quando não der mais a gente decide o que fazer.

linguaggi della devianza

Esse é o nome da matéria opcional que estou fazendo esse ano (além de Diritti Umani, que só começa na metade de abril). Traduzido pro português seria algo como “linguagens dos comportamentos desviantes”. Devianza no lugar de crimine ou reato, porque nem todo comportamento considerado oficialmente fora da lei é visto como fora da norma pelas pessoas (exemplo clássico: baixar música ou filme pela internet), e nem todo comportamento considerado fora da norma é crime (e aqui os exemplos infelizmente são muitos. Eu pessoalmente transformaria em crime grave estacionar ocupando mais de uma vaga, but that’s just me). Devianza é mais abrangente, e ecco a explicação do nome da matéria. É opcional mas é badaladíssima e todo mundo faz; normalmente no primeiro ano, de forma que só eu e uma polonesa da minha turma estamos lá infiltradas no meio dos calouros.

O curso foi inventado na minha faculdade. Nem poderia ser de outra forma, visto que a subcultura da máfia é uma coisa interessantíssima e enraizada na Itália de uma maneira impressionante. A professora é uma gordinha engraçada com um sotaque toscano fortíssimo, ex-juíza, revoltada e sacana, que usa uns colares enormes que eu adoro por cima de roupas horrorosas.

Começamos falando do conceito de devianza, mais ou menos isso que eu expliquei ali em cima, e depois pra descrições breves das mil disciplinas que fazem parte da criminologia: criminalística, antropologia física e cultural, vitimologia, entre outras muitas. Como foi a primeira aula tudo pareceu meio teórico, mas os comentários farpadíssimos da prof apimentam qualquer assunto, e me diverti muito. Tenho a impressão de que vai ser o melhor curso do ano. E vou contando as novidades pra vocês porque acho que esse tipo de assunto é sempre muito interessante. E quem não gostar que feche o seu Thunderbird.

ainda os chineses

Depois daquele chinesismo intenso de ontem fiquei sabendo de fonte segura que chegou um “lote” de SETECENTOS chineses pra estudar italiano lá na faculdade. SETECENTOOOOOOOOOOOS!

Vai ser numeroso assim lá na China.

hm

Ou sou eu que sou maluca ou os chineses são realmente muito estranhos.

Estou sentada numa escrivaninha no corredor do primeiro andar da universidade. Antes que vocês se assanhem, não, não tem wireless aqui (e parece que nem vai ter tão cedo), mas já que não consegui cancelar meu contrato com a maldita Vodafone tive que ficar com a maldita Internet Key, que obviamente lá em casa não funciona, porque os celulares não pegam e o maldito trequinho funciona com uma maldita SIM card. Então. Essa escrivaninha teoricamente deveria funcionar como outra recepção, além da que fica na entrada principal, mas porteiros vivem em manadas e ficam todos juntos lá embaixo. Então a bichinha vive ocupada por alunos que se refugiam atrás do balcão dela pra estudar. Hoje não tinha ninguém, estranhamente, e me aboletei com o laptop pra trabalhar escutando Mozart antes de começar a aula de espanhol.

Tudo isso pra explicar que já vieram uns oito chineses em quarenta e cinco minutos, todos correndo, me perguntar onde fica o laboratório F. Não me incomoda o fato deles me acharem com cara de velha demais pra ser estudante e portanto concluírem que sou porteira. O que me incomoda é que pra todos eles eu falei a verdade, que não sei onde fica o laboratório F, mas que provavelmente fica no subsolo porque aqui nesse andar só tem salas de aula normal e não laboratórios, e que é melhor ir perguntar lá na portaria, no andar térreo. E TODOS eles fizeram que sim com a cabeça e imediatamente pegaram o corredor aqui do segundo andar. Primeiro em uma direção, depois na outra, e depois, vencidos, finalmente desceram as escadas.

Será que sou eu que perdi totalmente a minha capacidade comunicativa ou são os chineses que são bizarros mesmo?

jackendoff

Porque o livro é foda. Difícil escolher um só trecho pra botar aqui; meu livro tá todo recheado de marcadores post-it. Quem tiver paciência que leia e se deleite.

By analogy, the “authorities” ruled that prepositions shouldn’t end sentences in English either. Since that time, generations of children have been drilled on this rule, with little effect except in their formal writing. And ending sentences with prepositions is still very much alive in English.

Such proscriptive teaching of grammar, which evidently doesn’t work very well, contrasts strikingly with aspects of English sentence patterns that probably nobody has ever thought to teach. Here’s an example. Look at the four sentences in (1).

(1)
a Joan appeared to Moira to like herself.
b Joan appeared to Moira to like her.
c Joan appealed to Moira to like herself.
d Joan appealed to Moira to like her.

Without thinking about it consciously, you have automatically inferred that each of these sentences has a different combination of who is to like whom. (…)

How do we come to understand these sentences this way? It obviously depends somehow on the difference between ordinary pronouns such as “her” and reflexive pronouns such as “herself”, and also on the difference between the verbs “appear” and “appeal”. But how? Whatever reasons there may be, I’m sure no one is ever taught about contrasts like this by their parents or teachers or anyone else. Yet this aspect of English grammatical patterns is deeply ingrained, much more so than the taught prohibition against ending a sentence with a preposition.

I can’t resist another example, because it’s so striking. There is an alteration called “expletive infixation” that many speakers perform on words of English under conditions of extreme exasperation, as in (2).

(2)
How many times do I have to tell you? I’m not talking about the Allegheny River! Can’t you get it into your stupid head that I’m talking about the Susque-goddam-hanna?

Even if you’re too refined ever to use an expression like this, I’m sure you recognize it. Now the interesting thing is that we have pretty clear intuitions about how to use this infix. It sounds natural in the examples in (3), but decidedly odd in those in (4).

(3)
uni-goddam-versity
manu-fuckin-facturer

(4)
Jacken-bloody-doff
ele-goddam-phant

(…)

I’m fairly certain none of us was ever taught the principle (or pattern) that says where it is possible to insert an expletive infix into English words. Yet we readily use this prniciple to make intuitive judgmenets about new cases. At the same time, the principle is not so obvious to conscious introspection.

(…)

Since adults aren’t consciously aware of the principles of mental grammar (and the examples just presented provide further illustration), they certainly can’t explain these principles to children – if children could understand the explanations in any event!

In fact, the most an adult can do is supply the child with examples of the patterns, in the form of grammatical sentences, or corrections to the child’s sentences. For instance, notice that in the dialogue I quoted above, the mother isn’t saying “‘Nobody’ and ‘not’ are both negative words, and you shouldn’t use two negatives in a sentence.” She is just supplying the child with a correct form. This means that the child has to figure out the patterns of the language – that is, the child has to construct his or her own mental grammar.

(…)

Where does that leave the learning of language? On the basis of what the child hears in the environment, and in the (near-) absence of teaching and of conscius awareness of what is being learned, the child manages to acquire a command of the grammatical patterns of the language – that is, manages to construct a mental grammar. This isn’t the way we’re accustomed to thinking of language learning. We usually think of it in terms of something like French class in school, a highly structured situation in which the teacher and learner bring a lot of conscious attention to bear on rules and regulations. The child’s learning of grammatical structure just doesn’t seem to be like that. The child learns by speaking and being spoken to.

(…)

A suggestive parallel to the unconscious learning of language might be the process of learning to skip, which requires complicated patterns of muscle coordination. It’s impossible to describe to a child how to do it; the best we can do is demonstrate. And when the child figures out how to skip, it will be impossible to get him or her to explain it. Rather, the process of constructing the patterns takes place outside of consciousness; the major part of the learning is experienced as “just intuitive”.

Patterns in the Mind: Language and Human Nature – Ray Jackendoff