socorro

Acabamos de voltar do jantar de aposentadoria do Ettore. Mirco resolveu fazer no Giovanni, aquele lá na casa do cacete onde fomos alguns domingos atrás, depois da IKEA. Só pra vocês darem uma choradinha básica de inveja, o menu, em detalhes:

– De entrada fria, a tradicional tábua de queijos e frios que eu não sei onde ele arruma, porque tudo é delicioso. Tinha: salame de ganso, de javali e de cervo, mortadela de javali, um tipo de salame chamado finocchiona, temperado com funcho, que eu abomino, e capocollo. Tinha dois tipos de pecorino, um fresco e um maduro, tinha caciotta com nozes, com azeitonas, com pimenta-do-reino e com peperoncino.
– De entrada quente, mozzarella derretida enroladinha como um charuto em uma fatia de bacon fresco, uma ameixa enrolada no bacon com uma minifolha de hortelã por cima, e uma espécie de pastelzinho de forno com recheio de lingüiça e uva.
– Depois outra entrada quente, um aspargo enrolado em presunto, gratinado com um molho de queijo.
– Depois uma acqua cotta (água cozida) maravilhosa. A acqua cotta, como o nome sugere, é um dos muitos pratos da cozinha pobre italiana, que é uma delícia, justamente por ser tão simples. Aquela história: quem não tem cão caça com gato, e em períodos de vacas magras neguinho saía inventando receitas com coisas simples pra enganar o estômago, e saíam coisas ótimas. A acqua cotta é uma espécie de sopa boba que pode ser feita com um monte de coisas. Essa era de grão-de-bico e batatas, e era uma das melhores sopas que eu já tomei na minha vida.
– Depois o primo piatto, clássico risoto de cogumelos, muito gostoso.
– Depois o secondo, stinco di maiale (a batata da perna do porco) assada com batatas. Eu gosto, mas já não agüentava mais, então provei só um pedacinho.
– Salada, que dispensei.
– A primeira sobremesa: bavaroise de vinsanto, aquele vinho doce onde você mergulha aqueles biscoitos duros de amêndoas, os cantucci. As sobremesas do Giovanni nunca têm chocolate, então eu dispenso.
– A segunda sobremesa: uvas embebidas em chocolate branco com gotinhas de chocolate amargo por cima. Comi só as gotinhas. E ainda tinha pedacinhos de torta de damasco.
Tudo isso regado a vinho tinto e branco, e finalizado com grappa, limoncello e licores. E carne de vitela pros dois muçulmanos da oficina, Mustafa, marroquino, e Hussein (esse é da Croácia, go figure).

Rolem de inveja, mortais.

domesticidades

Não sou como a Adriana, que tem verdadeira alergia às tarefas domésticas. Pelo contrário, até me divirto, se estiver de bom humor e não-exausta, claro. Mas as roupas… Cacete, são definitivamente as partes mais chatas da administração doméstica. Detesto todas as fases: a fase de separar a roupa suja em coloridos, brancos, roupa de trabalho do Mirco manchada de tinta, roupas de lã que não vão na máquina; a fase de encher o cesto e ir lá fora, mesmo quando não tá frio, encher a máquina de lavar; estender a roupa, que porreeeeeeeeeeeee; e passar, que graças aos céus agora a faxineira resolve pra mim porque passar roupa É UM SACO. Além de ser uma perda de tempo absurda.

Então quando começou a passar na televisão o comercial da nova secadora de roupas da Rex, que funciona a vapor e deixa a roupa praticamente passada, quase babei. Mas ainda não tive coragem de ver o preço. Tenho medo…

codice della strada

Desde que o Mirco, num raro momento de estupidez injustificada, comprou o rádio pro meu carro, passei a fazer parte da odiosa categoria de motoristas que não sabem que a pista da esquerda é pra ultrapassar e não pra passear. É que o rádio é tão vagabundo que pula com qualquer buraco no chão (aliás, pula até nas curvas, mas é detalhe), e as estradas do interior do Malawi são uma merda. A pista da direita, freqüentada por caminhões, é uma coisa assim estilo Rio-Santos, sabe. Então eu tô lá cantando com o George Michael e de repente um solavanco e a bicha pára de cantar, e só volta tipo 3 minutos depois. É muito irritante, sabem. Então eu fico na esquerda, que é mais lisinha, sempre com o zoio no retrovisor, e quando vejo alguém vindo desembestado pela esquerda, dou a seta e volto pra buracolândia.

Pergunta se alguém deixa de piscar o farol pra mim, mesmo depois que eu já dei a seta avisando que vou dar passagem?

ho ho

O clímax do dia foi o programa Le Iene, falando sobre a construção da linha TAV (Treno Alta Velocità). Tipo assim, uma comédia, se não fosse trágico. O projeto TAV custa na Itália muitíssimo mais do que nos outros países europeus onde já existe. Não houve licitação, mas concessão, que, olha só, foi dada à empresa de um ex-Ministro da Infra-Estrutura. No meio tem a Ferrovie dello Stato, tem a Fiat, tem subsidiárias da FS, tem empresas privadas. O projeto foi feito igual à minha cara e alguns trechos já tiveram que ser refeitos. O impacto ambiental é grave em algumas áreas. A coisa já saiu com uma dívida tão grande que, pensem, SE A ITÁLIA TIVESSE COMUNICADO QUE NÃO TINHA 66 BILHÕES DE EUROS PRA BANCAR O PROJETO, NÃO TERIA ENTRADO NA COMUNIDADE EUROPÉIA. Tão sacando a gravidade da coisa? Fica melhor ainda: o órgão que controla as obras pertence, tchãrãaaaa, não a terceiros imparciais, como seria de se esperar em qualquer país civilizado, mas aos diretamente envolvidos. E a divisão de 40% de fundos bancados pelo governo e 60% pela indústria privada é uma mentirona, porque essa indústria privada pegou empréstimo… do governo!

Gente, isso aqui é só um Brasil que come mais macarrão. Juro.

hm

Comecei Desire of the Everlasting Hills, sempre do Cahill, sobre o mundo antes e depois de Jesus. Eu, que não entendo nada dessas coisas, estou aprendendo pra burro. Mas estou achando tudo tão parcial… Meio jesuítico, sabe. Tenho a sensação de estar dentro de um livro de catequismo. Uma certa irritação. Mas conhecimento nunca é demais.

sabadão

Sabe o que é um dia sem fazer nada? Não fiz nada. Na-da. Coisa boa!

Depois do jantar fomos pra casa do Gianni ver a Roberta, que veio passar o fim de semana aqui no interior do Gabão. Quando ela foi trabalhar na Ferrero, em Torino, eu avisei pro Gianni que no início ela viria toda hora “pra casa”, mas que à medida em que arrumasse a sua vida por lá “casa” passaria a significar Torino, e as visitas aqui no Cambodja ficariam cada vez mais raras. Agora que o estágio foi transformado em contrato a tempo indeterminado, o namorado é novo e o trabalho é sempre mais interessante, a garota só dá as caras aqui uma vez a cada dois meses e olhe lá. Gosto muito da Robi, mas torço muito por ela também, porque é uma garota esperta e boa, e dou a maior força pra ela ficar por lá mesmo e sumir desse buraco.

Mas o lance é que estamos nos programando pra ir a Viena no feriado da Madonna (8 de dezembro), e Robertinha também vai, com o novo namorado. Dicas são bem-vindas.

Perugia

Saí cedo de casa. Deixei o carro no estacionamento do mercado em Ponte San Giovanni e peguei o ônibus das 8 e quinze pra subir pra Perugia. Fui me matricular, de novo. Acho que dessa vez vai. Que horas vou estudar, não se sabe, mas um jeito a gente sempre dá. Faltava um documento, que até o ano passado não servia, então voltei pra casa só com o comprovante de pagamento e tenho que mandar todos os documentos juntos pelo correio.

Acendam velinhas.

passa-parola

Por sorte essa semana todos os últimos estudantes cancelaram tudo ao mesmo tempo, e posso voltar pra casa em um horário mais humano. O que significa passar na Rita pra comprar verdura fresca pra grelhar pro jantar. Também significa receber recado de uma das minhas ex-alunas, as Oche Farmaciste. Essa até que é a menos oca, anzi, é boazinha e sei que gostaria de aprender inglês direito. A gente já tinha se encontrado na Rita antes porque ela trabalha na Farmacia Comunale ali perto. Uma amiga sua precisava de um professor de inglês pra filha, deixou recado com ela, que, não sabendo meu telefone, deixou recado com a Rita, que deixou recado com a Arianna, que me ligou avisando. Roça é isso.

livrim

Besides the innovation of speaking the unspoken moral law aloud, one should note the lesser – but hardly unimportant – innovation of the weekend, which got its start in the Jewish Sabbath (or “Ceasing”). No ancient society before the Jews had a day of rest. The God who made the universe and rested bids us do the same, calling us to a weekly restoration of prayer, study, and recreation (or re-creation). In this study (or talmud), we have the beginnings of what Nahum Sarna has called “the universal duty of continuous self-education”, Israel being the first human society to so value education and the first to envision it as a universal pursuit – and a democratic obligation that those in power must safeguard on behalf of those in their employ. The connections to both freedom and creativity lie just beneath the surface of this commandment: leisure is appropriate to a free people, and this people so recently free find themselves quickly establishing this quiet weekly celebration of their freedom; leisure is the necessary ground of creativity, and a free people are free to imitate the creativity of God. The Sabbath is surely one of the simplest and sanest recommendations any god has ever made; and those who live without such septimanal punctuation are emptier and less resourceful.

The Gifts of the Jews, de Thomas Cahill

Nem de longe tão interessante quanto o How the Irish… Mas é porque eu tenho uma quedinha pelos celtas, eu sei.