hm

Revolução lá na agência hoje. Depois da minha aula que termina às dez, subi pra traduzir e caí na reunião geral, com as novas meninas que estão trabalhando no planning, no lugar da Vanessinha, que fez muito bem em sair daquela gaiola das loucas e já achou emprego em Perugia, e da Laura, que ganha mais e se estressa menos escrevendo horóscopo pra jornal. Várias mentiras foram soltas no discurso da chefa, como sempre, inclusive a loucura de que todo mundo lá dentro se dá suuuuuuuuperbem. Mas pelo menos ganhamos cadeiras novas. Ainda estamos desconfortáveis, porque as escrivaninhas são altas demais e meus cotovelos estão cobertos de calos, além da dor nos ombros. Mas melhor do que nada.

Então agora estamos com um setor de planning com três meninas completamente inexperientes: uma é amiga da chefa, o que não é boa coisa, e, nunca tendo trabalhado de verdade na vida, é completamente lenta e zen, despreocupada demais pra um trabalho desses. As outras duas jamais fizeram nada de parecido na vida. Vamos ver no que vai dar. Ainda bem que só fico lá em cima por algumas horas por dia…

outro programa de índio

Como se não bastasse o programa de índio gastronômico de ontem, hoje acordamos às cinco da manhã pra passar em Ponte San Giovanni, onde mora a nova namorada do Moreno, encontrar com os pombinhos e nos dirigir a Castiglione della Pescaia, na Toscana, na costa do mar Tirreno. Não é longe do lugar onde estive com os Salames há dois anos, lembram? O Moreno faz mergulho e queria mergulhar no fim de semana. Nós, em vez de aproveitar o domingo pra dormir, acompanhamos os dois, que têm empregos SUUUUUUUUUPERlight e nunca estão cansados nem preocupados com dinheiro, acordamos de madrugada e enfrentamos três horas de carro numa estrada bonita mas cheia de curvas.

Castiglione é bonitinha, mas nada de especial. Moreno tinha achado na internet uma companhia que faz passeios de barco de um dia, com almoço a bordo e tudo. Escolhemos um que ia até a Isola del Giglio e depois até a Isola di Giannutri, ambas parte do Arcipelago Toscano, um parque marinho protegido por lei. Moreno todo babando com o mar, aaaah, uuuuuh, e eu pensando, vê-se que você nunca foi a Angra, né, filho. O Tirreno é muito mais bonito e limpo do que o badalado Adriático, dizem (nunca vi a costa Adriática e não posso dizer), mas definitivamente não é o Caribe. Caribe mesmo é a Sardenha, parece. Não sei, vocês sabem que o assunto mar não me interessa, absolutamente.

Enfim. A viagem até o Giglio dura duas horas e aproveitamos pra dormir, todos tortos, apoiados nos braços sobre a mesa como crianças de castigo na escola. Chegamos ao Giglio às onze e pouco, e foi o tempo de subir com o ônibus até a parte antiga da ilha, onde há um castelo fortificado, dar uma olhada rápida e voltar. O que eu sei sobre a ilha é só o que o capitão do barco, muito simpático, explicou: que antigamente havia alguma atividade de agricultura, mas como a ilha é toda rochosa, não era muito prático, e quando começou essa coisa do turismo de massa toda a atividade da ilha se voltou pra isso. Hoje não se planta bissolutamente nada na ilha. O nome não significa lírio (que é o que significa giglio), até porque ali não há flores mas só cactus e arbustos de aspecto africano, ressequidos e retorcidos, mas parece que tem origens gregas: os navegadores antigos largavam cabras nas ilhas por onde passavam, de modo que, se precisassem aportar, tinham uma reserva de comida. Parece que a palavra que deu origem a “giglio” significava cabra. Muito romântico.

A ilha mesmo não tem nada de particular: só tem três praias, duas das quais não utilizáveis porque absolutamente rochosas. A única praia de areia, chamada Campese, é realmente bonita vista do alto, com o mar turquesa e tal, mas é relativamente pequena, entupida de gente, e, como tudo na Europa, caríssima. Mas o castelo é interessante e foi uma pena não termos tido mais tempo pra passear pelos becos.

À uma da tarde embarcamos de novo e almoçamos a bordo: risoto de frutos do mar, fritto di mare (anéis de lula, polvinhos e camarões fritos) e torta de damasco. O tempo, que pela manhã cedo estava estranho e oferecia o risco de não permitir a ida até Giannutri, finalmente melhorou, e lá fomos nós.

Se o Giglio já é ridiculamente pequeno, Giannutri é um ovinho de codorna. Só tem uma família que vive ali em modo regular – são 11 pessoas. Há algumas dezenas de casas de praia, de gente milionária que conseguiu construir ali antes que tudo virasse parque de proteção ambiental e fosse proibido fazer casa. A minúscula ilha só tem dois lugares onde é possível atracar, mas tem também uma vila romana, em estado lastimável, que nem nos demos ao trabalho de ir ver de longe porque está fechada pra restauração. Ficamos na praia mesmo, de cascalho. Eu, que odeio mar, fiquei na sombra de um barco lendo Dawkins, enquanto o Mirco e Moreno dormiam ao sol e Marta, que é professora de natação, dava seus mergulhos. A água é bonita, mas tem muito ouriço, o chão não é de areia mas de cascalho, ou seja, escuro, e a praia é realmente minúscula. Passado o nosso tempo de recreação, começou a trovoar e chuviscar. Todo mundo correndo pro barco, voltamos pra Castiglione della Pescaia. Dormimos os quatro durante as duas horas de viagem. Tomamos banho no quarto de hotel onde o Moreno dormiu e fomos jantar na casa de um amigo dele.

Queridos… Acho que vou entrar no negócio de venda de peixe. O cara vende peixe, mas vocês têm que ver a casa dele. Piscinona, dois andares, toda equipada, gramadão, tudo novinho, tinindo. E um cachorro lindo, Coby, um labrador banana que não saiu de perto da gente o tempo todo, rezando pra que caísse algum mexilhão pros lados dele. Comemos pra cacete, tudo fresquíssimo, lógico – entrada fria de batata e lulinhas, mexilhões, depois spaghetti com mexilhões e vongoli, depois fritto di mare, e, finalmente, sorvete que tínhamos comprado na cidade. Diliça!

Saímos de lá tardão e, como as placas de trânsito na Itália têm a desagradável mania de desaparecer depois de um certo ponto, fomos parar em Grosseto em vez de pegar a direção geral de Siena. Perdemos uma meia hora. E ainda encontramos um monte de lerdos na estrada, voltando do fim de semana como nós. A estrada é estreita e não dá pra ultrapassar, e levamos um tempão pra chegar em casa.

Foi legal? Foi. Mas eu teria preferido ficar em casa. Pelo menos o Mirco deu uma dormidinha…

Minha faxineira ganha mais do que eu, porque não paga impostos, e tira férias mais longas do que eu. Isso que é democracia.

E é por isso que hoje passei o sábado faxinando e passando roupa, adubando as plantas, coisa que me prometi fazer todo sábado até o inverno chegar, e arrumando a casa. Mirco trabalhou o dia inteiro e aproveitei a tarde pra examinar o novo catálogo da IKEA, que já está online. Sinceramente? Adoro esses sábados perdidos : )

À noite fomos jantar com Moreno e a sua nova namorada, Marta, na festa da lesma. Só os meninos gostam de lesma, mas como tem sempre alguma outra coisa pra comer – torta com lingüiça, penne alla norcina – resolvemos topar. Mas além da fila imensa, só tinha lesma no menu! Acabei me acontentando de um sanduíche de lingüiça, mas com esse maldito pão umbro sem sal. Ô programa de índio!

auguri!

Não comentei, mas perdi outro casamento: Hiro, o japonês mais popular do Rio de Janeiro, casou com a Fabulosa Barbara no domingo. Tenho certeza de que foi uma festa muito maneira e fiquei tristíssima de não poder ir. Quando recebi o convite, que chegou junto com o DVD de Curtindo a Vida Adoidado, deu aquela dor no coração. Mas agora que eles estão vindo pras Zoropa a gente vai dar um jeito de dar um pulo em Londres pra visitá-los : ) Aguardem-nos, meus amores : )

Dawkins

Em vez de levar o Dickens pra viagem, que pesa muito, levei The Blind Watchmaker, do Dawkins. Não consegui terminar porque estava sempre cansada demais pra ler na cama, mas já detonei a metade. E estou adorandooooooo. Porque é tudo o que você sempre quis saber sobre a vida na Terra, uma diliça. Fora que, já falei, sempre gosto de lembrar dos termos médicos e biológicos que já fizeram parte da minha vida mas hoje não mais.

Como é bom aprender! Tem gente que se realiza trabalhando. Eu acho uma bosta trabalhar, apesar de gostar do que faço. Se pudesse não trabalharia nunca, jamé, sai pra lá. Mas aprender coisas me deixa completamente doidona. Nessas horas eu fico querendo ter filhos crescidos pra discutir animadamente coisas como meiose, capacidade de replicação do DNA, RNA ribossomal e transportador, qual é o sentido da vida (o sentido da vida é mandar o DNA pra frente, e só, e quer missão mais nobre?).

***

Já mandei o pedido de inscrição pra universidade de novo. O documento que faltou no ano passado já chegou. Será que dessa vez vai?

desabafim

Como foi bom ter ficado em casa ontem! Passei a manhã inteira subindo fotos pro Flickr e guardando os panfletos, bilhetes e ingressos da viagem na pastinha que criei pra não perder essas coisas, que tipicamente se espalham pela casa e caem no limbo infinito de onde nunca mais saem. Almocei com o Mirco, passei roupa à tarde e fui comprar fruta fresca na Rita. Tive uma leve enxaqueca, é verdade, mas fingi que não era comigo pra poupar um comprimido.

E agora estou me preparando psicologicamente pra voltar a trabalhar.

Não me levem a mal, acho ótimo finalmente ter um contrato de trabalho decente e todos aqueles direitos trabalhistas legais, mas é que trabalhar longe de casa (leia-se não almoçar em casa) é chato pacas. E ter chefe maluca é muuuuuito desagradável. O pessoal do “nosso” lado da força está todo debandando. Só sobramos eu, Simona (que está procurando outras paragens) e Stefano, que é mais ou menos imune à loucura da chefa. O resto já foi-se. É tão chato trabalhar assim! Podia ser uma coisa tão legal. Só gente jovem, motivada, um trabalho interessante (falo da agência de tradução), clientes do país inteiro e tradutores do mundo inteiro, uma casa linda com vista pro rio e cerejeira no quintal… Mas é um porre. Impressionante como uma maçã podre inutiliza um barril inteiro de maçãs legais. Uma maluca consegue infernizar a vida das pessoas ao redor de uma maneira realmente impressionante. Quero ver até quando EU vou resistir. Porque vocês sabem que eu não tenho nem papas na língua nem paciência com gente maluca, e ainda por cima vulgar. Aturo muita coisa, mas vulgaridade não.

bosta

Então eu chego e leio na Cora o comentário sobre a morte do turista português na praia, no Rio.

E então eu quero só contar três historinhas botenses:

. Pouco antes de viajarmos, deu no jornal um acidente causado por um idiota bêbado que rodou OITENTA quilômetros na contra-mão na SUPERSTRADA, antes de finalmente bater de frente no carro de uma família de chineses. Morreram três, e tem mais uma em vias de, no hospital.

. Maria nos contou na sexta que morreram uns turistas portugueses em um acidente envolvendo dois italianos idiotas que apostavam corrida na estrada em Marbella, um com uma Ferrari e outro com uma Maserati. Um dos carros voou e caiu em cima do carro dos portugueses, que estava vindo pelo outro lado da estrada. Morreram todos. Todos os turistas, lógico. Imbecis sempre se salvam, por algum motivo misterioso.

. Assim que chegamos um peruviano bêbado também entrou na contra-mão na superstrada (aqui até tipo de acidente segue a moda, aparentemente) e rodou quase vinte quilômetros antes de bater em outro carro e matar não sei quantos.

Vou te dizer, tem que ter muita coragem pra ter filho nessa merda de mundo hoje em dia, viu.

Madri – Roma

Acordamos cedo. Faborit fechado nesse fim de semana, então todo mundo saiu sem tomar café, menos eu, que tinha comprado pão, presunto e queijo ontem no supermercado, ha ha. Chegamos no aeroporto na hora e sem problemas, porque o metrô de Madri é ótimo, mas o vôo da bosta da Air Madrid atrasou de novo. Duas horas. E ainda teve turbulência e um pouso de merda. Gianni, que tem medo de avião, quase teve um treco e jurou que tão cedo não voa pra lugar nenhum.

Chegando em Roma, o que fomos fazer, imediatamente? Comer macarrão, lógico. No Autogrill, que é caro e não é lá essas coisas. Mas não tínhamos almoçado e já eram quase três da tarde; estamos perdoados. Quando botamos o pé fora do aeroporto, fomos recebidos por um bafo quente dos infernos. Ligamos pro hominho do estacionamento, que veio nos buscar de van e foi parando recolhendo a galera até sair gente pelo ladrão. Pegamos o carro e tocamos pra casa. Ainda passamos na Arianna pra cumprimentar os cachorros mas Ettore tinha saído com o Leguinho. Então voltamos pra casa pra desfazer malas, guardar coisas e fazer piadina e ovo mexido pro jantar. Nem acredito que amanhã tirei férias e posso ficar em casa o dia inteiro arrumando casa e passando roupa! Que diliça!

Madri

Último dia de viagem, todo mundo doido pra voltar pra casa pra rever as fotos e arrumar as malas e comer a comidinha de sempre. Bundeamos muito pela cidade, seguindo as ruas que a Maria tinha marcado no mapa pra nós, ao redor da Calle Toledo. Almoçamos no Burger King, sanduíche e saladinha, e enquanto todos foram pro hotel dormir eu passei na livraria do El Corte Inglés pra catar La Loca de la Casa, da Rosa Montero, que eu tenho em português e AMO, e mais dois que o José me indicou, um do Carlos Ruiz Zafón e um do Arturo Pérez-Reverté. Quando começar a ler digo o que achei.

À tarde mais bundeadas, em ritmo mais lento porque não nos agüentávamos em pé, e acabamos jantando cedíssimo no 100 Montaditos de novo. Fomos dormir cedo e eu não agüento mais olhar pra cara de Madri.