Segovia

Depois do café no Faborit fomos direto pra estação de Príncipe Pio pegar o ônibus pra Segovia. A estação dessa companhia de ônibus, a Sepulvedana, fica logo fora da estação de metrô, e perto dela a rodoviária do Rio é um luxo só. Cara, que lugar horrível! Tudo imundo, o chão aquele preto de borracha com bolinhas típico de elevador imundo do Centro, guichês confusos com cartazes manuscritos colados no vidro com durex seco e amarelado, uma coisa horrenda. O ônibus é igualmente nojento e passei a viagem inteira sentada durinha, sem encostar a cabeça. E a rodoviária de Segovia… É hedionda. Com direito a teto desmontando e malucos passeando enchendo o saco dos passageiros.

Vimos Segovia rapidinho porque não agüentávamos mais bater perna. A cidade é bonita mas, novamente, não é indispensável para a sua salvação eterna (ao contrário de Roma, que, não custa lembrar, é tudo na vida). A coisa que eu mais gostei é uma característica particular da arquitetura local cujo nome em espanhol não acho em lugar nenhum (tinha no guia da Chiara mas não decorei). Basicamente as paredes são “estampadas” com grandes “carimbos” enquanto o cimento ainda está fresco, de forma que fica uma espécie de alto-relevo com lindos formatos geométricos distribuídos uniformemente. Como se fosse um papel de parede em relevo. Lindo! Tirei dois milhões de fotos porque os motivos são maravilhosos. Almoçamos por lá mesmo, empadas e quiches, e continuamos o passeio.

O ponto forte da cidade é o famoso aqueduto romano, gigantesco e em perfeitas condições depois da última reforma, apesar dos mais de 2000 anos de idade. Bonito de se ver. E depois tem a catedral, muito bonita, e o famoso Alcázar, cuja parte dos fundos lembra o castelo da Cinderela na Disney. Tudo bonito e tal, mas enchemos logo o saco e voltamos pra Madri.

Direto ao El Corte Inglés pra comprar coisitas no supermercado, e um vinho tinto pra levar pra Maria no jantar. Porque jantamos na Maria. Ela fez ótimas bruschette com tomate, brie e manjericão, e depois, crianças, ba-ca-lhau. Eu sempre odiei bacalhau. Eu, meu irmão e meu pai sempre fomos considerados os párias da família porque não comíamos o bacalhau legitimamente português que minha avó sempre fez, em receitas variadas. Mas dessa vez não tive como escapar, e como há alguns anos a minha política tem sido de provar novamente de tudo pra ver se acabo gostando (e normalmente acabo mesmo, com a exceção de azeitonas, tomate cru e pimentão, que continuo achando abominações alimentares), comi. E gostei. Tinha batata, tinha brócolis e tinha molho branco, todos ótimos camufladores, mas estava gostoso mesmo. E fechamos a noite com um bom bate-papo regado a vinho tinto e mousse de chocolate. Olé.

El Escorial

O friozinho até que tava bom. Mas a chuva forte realmente é um porre, e como era a última coisa que esperávamos que fosse acontecer, ninguém tinha levado guarda-chuva (eu sempre levo um quando viajo). Resultado: depois do café tarde no Faborit fomos direto pra H&M comprar guarda-chuvas de bolinhas. Acabamos ficando lá fazendo compras, aproveitando as segundas rebajas, coisa que na Itália não rola. Comprei várias coisinhas básicas baratinhas, com descontos de 70%. Dali fomos pra Zara, e mais compras em rebajas. O Gianni acha que nós compramos muita roupa, mas a verdade é que só compramos quando viajamos. E sempre em liqüidação, então não nos sentimos culpados.

Passeando no centro, descobrimos a Cervezaria 100 Montaditos. Levamos um certo tempo pra descobrir como funcionava a coisa, mas basicamente cada mesa tem um bloquinho com 100 “modelos” de minissanduíches. Você escreve do lado quantos quer e eles montam os sandubinhas pra você. Cada sanduba é um euro. Tem desde coisas clássicas, tipo tortilla española, salmão com Philadelphia, queijo Brie, até outras combinações tipo atum defumado com cebola (o melhor de todos) e coisas desconhecidas que eu não anotei e agora não tenho como ir catar no dicionário. Bem legal o lugar. O pão é uma baguetinha quentinha e crocante e os recheios são todos muito gostosos. Ótima idéia.

Depois de voltar ao hotel pra largar as sacolas de compras, pegamos o metrô até a estação de Moncloa pra pegar o ônibus das 15:45 pra El Escorial. A viagem dura pouco menos de uma hora e é engraçado como as partes populadas ao longo da estrada parecem tudo menos a Espanha. As novas casas nos novos condomínios têm telhados pontudos e escuros, parecendo um subúrbio americano. Os galpões das grandes lojas e fábricas parecem os que vimos ao longo das estradas holandesas perto de Rotterdam. Tudo muito não-espanhol, engraçado.

El Escorial, outro patrimônio histórico da humanidade, tem uma história particular que não estou com saco de escrever. É bonito mas não é assim imperdível, apesar de algumas obras de arte interessantes de Tiziano e outros, e da igreja muito bonita.

Aí aconteceu o seguinte: estávamos cansados e com frio, mas Gianni descobriu um restaurante italiano (Rompicapo, Plaza Juan de Herrera, 1) em frente à estação de ônibus. Falamos com um dos garçons, um siciliano, e ele avisou que antes das nove o lugar não abria. Eram tipo seis e meia da tarde. Inacreditavelmente, todos acharam normalíssimo esperar mofando na estação até as nove da noite, pra comer um prato de massa, porque quatro dias sem massa os botenses não agüentam. Eu, incrédula, doida só pra tomar banho e dormir, depois de um sorvete, de uma vitamina, de um McChicken, de um pedaço de pizza tabajara, não importa, tive que aturar mais de duas horas de espera só pra comer macarrão. Eu AMO macarrão e como todos os dias feliz da vida, mas não entro em pane se tiver que me virar com outras coisas por um certo período. E certamente não deixo que comida ruim estrague as minhas férias. Mas esses italianos, vou te contar, ô gente chata e cri-cri!!! Detalhe: depois dessa palhaçada toda Gianni ainda achou o macarrão cozido demais e que o molho de tomate era de lata. Mas faça-me o favor!!! O meu macarrão estava ótimo: ravioli em forma de flor com recheio de camarão e peixe e molho de atum. Depois ainda comi verduras grelhadas – graças aos céus obedeceram ao meu pedido e eliminaram o maldito pimentão. Papo vai, papo vem, acabamos perdendo o ônibus no último minuto. E o próximo saía mais de meia hora depois. A estação já estava fechada e estava FRIO e estávamos cansados. Chegamos em Madri tardão e na estação de metrô só havia gangues de latino-americanos. Aliás, ô gente feia, valha-me…

 

Madri

Quando acordamos, estava frio. FRIO. E chuviscando. Desde 1987 não fazia tanto frio em Madri em agosto. Melhor, porque turismo no calor escaldante é de matar. Subimos e descemos a Gran Vía, paramos na Plaza de España pra tirar fotos na estátua do Don Quijote, voltamos de metrô até Sol. Fizemos compras rápidas no supermercado do El Corte Inglés, coisinhas tipo iogurte, leite com nescau, frutas, pra deixar no frigobar do hotel. E fomos almoçar de novo no Museo del Jamón.

Dessa vez os meninos cismaram que queriam experimentar o famoso jamón iberico, que custa OITENTA EUROS O QUILO. Nenhum prosciutto italiano custa tanto assim, e a curiosidade foi maior do que a prudência. Resultado: as partes bem curadas estavam ótimas, as outras tinham gosto de carne crua. E eu toda feliz com a minha omelete baratíssima e absolutamente sem surpresas.

Depois de um merecido descanso no hotel, finalmente fomos ao Prado. Senhores, é um dos museus mais legais que eu já vi. Não é gigantesco como o Louvre e não requer dias e dias de visita nem refinadas técnicas de orientação espacial. Mas TODOS os quadros do acervo são interessantes. Adoramos. Lógico que os meninos não agüentavam mais ver raptos das sabinas nem afrodites nem virgens marias com o menino jesus nem naturezas mortas, e por isso a nossa visita foi relativamente veloz, mas mesmo assim eu a-do-rei o museu. A visita a Madri poderia perfeitamente incluir só a visita ao museu, que já valeria a pena.

Mas o dia não terminaria assim tão facilmente: depois do banho pegamos o metrô até a estação Colón (uma praça sem graça que dói) pra encontrar a Maria. Maria é de Lisboa, trabalha na embaixada portuguesa em Madri e é a namorada do primo da Chiara, que é de Merano mas mora em Milão. Estão nessa ponte aérea há um ano, imaginem. Ela fala um italiano misturado com português, francês, inglês e espanhol, então as conversas são divertidíssimas. Passeamos pelo bairro onde ela mora, Salamanca, que é lindo e chique, e fomos andando a pé mesmo na direção do bairro de Malasaña. Atravessamos a Chueca, o bairro gay da cidade, que lembra um pouco Santa Teresa sem as ladeiras. Paramos em um bar muito estranho em Malasaña pra tomar uma cerveja, aquele povo todo fumando dentro me irritando, mas tudo muito informal, diferente daqui da Bota, onde tudo é motivo pra neguinho se montar todo de Dolce e Gabbana da cabeça aos pés. Maria, com mapa na mão, nos guiou até um restaurante onde já tinha comido uma vez e gostado. Chama-se La Fragua de Sebín e recomendo fortemente: Divino Pastor, 21. O menu era tão interessante que levei horas pra decidir. Acabamos comendo todos pratos diferentes:

De entrada, tomates verdes fritos en ensalada con cebolla confitata y frutos rojos, revuelto (ovos mexidos) de morcilla (tipo um chouriço, delicioso) con piñones, manzana ácida y patatas paja (sim! Existe batata palha na Espanha!), e croquetas de jamón y boletus (cogumelos). Depois: eu comi filetitos de ciervo sobre membrillo asado (uma espécie de geléia durinha) con salsa de boletus y foie (tudo delicioso, fora a geléia que não toquei), Mirco foi de solomillo de buey con puré de calabaza (carne de vaca com purê de abóbora) y idiazábal (um tipo de queijo) y patatas rejilla (não sei explicar). De sobremesa, eu fui de coajada de oveja con salsa de nozes y sorbeto de miel e Mirco de tatin de manzanas calientes. Já não lembro mais o que Gianni, Chiara e Maria comeram porque os nomes eram todos assim longos e complicados feito pedigree de cachorro. O vinho também não lembro mas estava muito bom, e o jantar foi muito agradável. Mais uma caminhada até o metrô Bilbao, e dali voltamos direto pro hotel, de barriga cheia.

 


Toledo

Não ouvimos o despertador tocar e quando o Gianni ligou avisando que estavam descendo pra tomar café e nos esperavam no Faborit, pulamos da cama e em dez minutos estávamos na rua. Só que…

Hoje é quinze de agosto e ninguém trabalha na Europa no dia quinze de agosto. O Faborit estava fechado e acabamos tendo que nos contentar com uma bosta de café e muffins massudos no Starbucks ao lado. Nas calçadas, muita gente voltando da movida, a night dos madrileños. Às sete da manhã tinha gente tomando a última cerveja com bocadillo de jamón, muita gente cambaleando pela rua, muita gente rindo alto e cantando como se ainda estivesse na discoteca. Gente maluca.

Pegamos o metrô até a estação Atocha Renfe, a tal do atentado, onde já tínhamos ido ontem pra pegar as passagens pra Toledo que o Gianni tinha reservado pela internet. A estação é linda, com uma espécie de floresta tropical dentro, com direito a mil tartarugas banhantes e tal. Uma umidade quase estilo Manaus, mas é interessante porque é inesperado. Fiquei fã. Especialmente das tartarugas. Pegamos o trem rápido pra Toledo, que, ao contrário do Eurostar pseudoveloz italiano, saiu na hora e é muito confortável, sem esmagar seus joelhos no banco da frente. A viagem dura meia hora e a paisagem é tão diferente da paisagem umbra que parecia que estávamos em outro planeta. Nada de casas esparsas aqui e ali ou de campos verdinhos brilhando com girassóis; só distâncias grandes e amareladas, secas, rochosas – o que a gente já tinha visto do avião. A primeira coisa que me veio na cabeça foi Asterix e os Ibéricos: Obelix encontrando os ciganos no meio daquelas planícies pardas e torradas, e todos os ibéricos dizendo “ay” e “olé” o tempo todo, com aquela cara de macho e o peito inchado de orgulho. Fiquei rindo sozinha enquanto o Mirco dormia.

A estação de Toledo é de construção recente, mas o estilo é o mudéjar, aquele mix de espanhol e árabe que eu a-do-ro. Resolvemos ir a pé até o centro, subindo uma ladeira maldita. Estava quente mas não excessivamente senegalês, e o passeio foi agradável. Paramos no quiosque de informações ao turista pra pegar mapas e tal, e entramos na cidade pela Puerta Nueva de Bisagra. Logo depois de uma subidinha chegamos à Puerta Sol, ao lado da Puerta Cristo de la Luz. Pegamos essa segunda pra ver a Mezquita Cristo de la Luz, que parecia muito maior nas fotos mas é interessante como estrutura. Foi a única mesquita que sobrou na cidade, das dez existentes, depois da Reconquista católica. Ainda dá pra ver alguns afrescos nas paredes, e nas escavações arqueológicas de vez em quando vê-se uma cabeça de fêmur, um pedaço de íleo, uma costela de alguém enterrado no subsolo do templo. Uma ponte improvisada passa por cima desse sítio arqueológico e leva a um jardinzinho discreto com uma fonte no meio, e só essa agüinha e as plantinhas em volta já baixam a temperatura sensivelmente. Atravessando o jardim chega-se a uma espécie de terraço aberto de onde se vê a parte superior da Puerta Sol, linda, e a vastidão ressecada lá embaixo, intercalada com partes modernas da cidade.

Dali fomos à Plaza de Zocodover, antigo mercado de animais nos tempos dos mouros, que não tem nada de particular além de um McDonald’s bem disfarçado. Velhinhos e velhinhas batiam papos animados nos bancos da praça e turistas alugavam Segways. O sonho do Gianni era andar naquele treco, e lá foram ele e Mirco pagar 12 euros pra ficar 20 minutos aboletados naquelas coisas. Acharam divertidíssimo e começaram a planejar uma atividade parecida, de aluguel de Segway, em Assis. Então tá.

Depois da brincadeira, fomos ao Museo Santa Cruz pra ver obras de El Greco, sempre muito esquisitas e modernosas pra época, e uma tapeçaria linda, o famoso Astrolabio. Descemos a Calle Cervantes e paramos pra almoçar ali mesmo, em um buraco com cara de restaurante improvisado na beira da praia, cheirando a DDT. No fundo do lugar, as mesinhas com a famigerada toalha de plástico. Os meninos comeram salada; eu não sou fã de verdura crua e ataquei de judías con jamón – ervilhas (não as redondinhas mas a vagem da ervilha) refogadas com presunto, uma delícia. Ainda encaramos um peito de frango grelhado e uma racion de presunto com pão. Voltamos à Zocodover pra digerir por meia horinha e voltamos ao batente. A Catedral, onde não entramos porque o ingresso era caro demais e pagar pra entrar em igreja é o fim do mundo, é realmente um desbunde. Até 1851, se não me falha a memória, Madri não tinha catedral porque fazia parte da arquidiocese de Toledo ou alguma coisa assim. Ainda hoje Toledo é um centro importante da igreja católica na Espanha. E a catedral é bonita MESMO.

A Chiara é muito interessada em artes e queria ver El Entierro del Conde de Orgaz, sempre do El Greco, na igreja de S. Tomás. O quadro é interessante mesmo, mas eu acho El Greco deprimente demais. Seus amarelos me angustiam. A igreja mesmo é feia que dói, e dali saímos pra bundear pela cidade, já que tínhamos visto tudo o que podia ser visto (o Alcázar está fechado pra reformas). Andamos, andamos, andamos até as pernas caírem. Mas, sinceramente, qualquer cidadezinha histórica italiana ou francesa bota Toledo no chinelo, apesar de ser patrimônio da UNESCO e coisa e tal. Não me pareceu uma cidade típica nada. Tipo, você vê Assis e a cidade é arquitetonicamente uniforme e bem conservada. Toledo não é nada e é tudo ao mesmo tempo. Mas nem seria esse o problema se fosse tudo puramente histórico – um lugar que mudou de mãos mil vezes não pode mesmo ser homogêneo em termos de aparência – mas a minha impressão é sempre a da mesma decadência e o mesmo deixa-pra-lá de Madri. Não sei. Gostei de Toledo, mas não ameeeeeeei.

Paramos de novo na Zocodover pra comer Crispy McBacon antes de descer pra matar o tempo, porque tínhamos reservado o trem tarde da noite. E chegando em Madri paramos pra tomar vitamina de manga com leite em uma espécie de bar numa das ruelas que saem da Puerta del Sol. Gianni chocadíssimo com a quantidade de viados e xingando o Zapatero a torto e a direito, e eu morrendo de rir. Nem precisa dizer que foi a cabeça bater no travesseiro e o soninho vir, né.

Mais sobre Toledo aqui.

Madri

O nosso pacote turístico não incluía café da manhã, então acordamos e saímos à caça de um lugar legal pra comer. Acabamos descobrindo um lugar legalzinho a cinqüenta metros do hotel. Anotem aí: se chama Faborit, são espanhóis mesmo e só têm duas lojas, em Madrid e Barcelona. A decoração é legal, não servem café em copos de isopor mas em xícaras e mugs bem bonitas e modernas, o chocolate batido é uma delícia e os meninos provaram o cappuccino e aprovaram, os croissants também, e ainda têm uma boa variedade de sanduíches salgados, pra gente como eu que tem pavor de café da manhã doce. O menu café da manhã custa 2,15 euros (se não me engano) e inclui um café/leite/cappuccino/chocolate etc mais um minisanduíche ou um doce – croissant, enroladinho, etc. O pessoal é simpático e há jornais espalhados pros clientes lerem. Mas tem uma placa na parede: atenção aos seus pertences porque nesta zona operam muitos batedores de carteira profissionais. Atenção ao verbo “operar”, que achei quase de uma licença poética.

Resolvido o problema do café da manhã pro resto da semana, resolvemos ir caminhando na direção do Parque del Buen Retiro, que fica pertinho do hotel. Na verdade nossa intenção era ver logo de cara o Museo del Prado, mas, quem diria, fecha às segundas. Então vagamos pelo parque, que é muito bonito e bem cuidado, até a hora de almoçar.

Onde comer? Quando você está em companhia de italianos isso será SEMPRE um problema de vida ou de morte. Eu sou chatinha pra comer, mas se tenho que passar uma semana à base de porcarias porque não acho um lugar decente, pra mim não é o fim do mundo. Pra eles é o fim do mundo com direito a juízo final negativo, sem trocado pra pagar o Caronte. Acabamos entrando, mais por curiosidade do que pelos pobres sanduíches expostos na vitrine. O susto: vinte milhões de presuntos pendurados nas paredes, cada um com o seu copinho de plástico pendurado embaixo, pra recolher as gotas da gordura que derrete. O balcão de aço inox todo amassado não era muito convidativo, e menos ainda as mesinhas lá no fundo, com toalha de plástico. Muito menos as paredes de azulejos velhos, cor de burro quando foge. Também não era atraente a gritaria. Mas a rapidez com que os balconistas fatiam o presunto, TUDO NA MÃAAAAAAAAAO, é impressionante. Tentei fazer um vídeo mas do ângulo em que eu estava o negócio não saiu. Os meninos comeram bocadillos de pão francês com o famoso jamón espanhol, delicioso mas cortado em fatias tão grossas que dava até tristeza, e eu preferi ficar na tortilla española mesmo, que nada mais é do que uma omelete com batatas. Tudo isso ouvindo os meninos discutirem como será que eles fazem pro presunto ficar assim tão diferente do prosciutto italiano (pra mim, honestamente, é tudo a mesma coisa).

Do Museo do Jamón fomos a um museu propriamente dito, o Centro de Arte Reina Sofía, que é todo modernoso e abriga obras modernosas também. Só fomos lá pra ver a exposição do Picasso e babar no Guernica, lógico, mas quando subimos ao segundo andar e demos de cara com todas aquelas instalações contemporâneas, telas brancas (algumas com pontinhos, como uma do Miró que o Gianni fotografou escondido) e outras idiotices pseudoartísticas, resolvemos decidir corredo aonde ir depois. Sentamos num banco em frente a uma instalação ridícula com xales espanhóis colados numa parede, abrimos o mapa e logo apareceu uma daquelas mulherzinhas que têm o emprego mais chato do mundo, que é de ficar passeando pelas salas do museu pra evitar que japoneses sorridentes tirem fotos com flash dos quadros. Puxou papo e o Gianni, com pena da mulher com o emprego mais chato do mundo, deu trela. Pronto! Acho que nunca ninguém tinha falado com ela antes, então se assanhou toda e foi chamar as amigas. As três juntas praticamente decidiram o nosso itinerário pro resto da semana e ainda deram dicas práticas, do tipo tirem as jóias e coloquem a mochila no peito e não nas costas porque aqui tem muito batedor de carteira… Filha, eu passei anos esperando o 157 na boca do Dona Marta pra voltar do Princesa, cê acha que eu vou dar mole em Madri?

Itinerário decidido, abandonamos nossas amigas do Reina Sofía. Pegamos o metrô e fomos direto pra Plaza de Toros, que é muito bonita, apesar de não ser cronologicamente antiga. A tristeza de ver que hoje tinha espetáculo… Pobre touro. O interessante é que os preços dos ingressos dependem se o lugar fica no sol ou na sombra. Os ricos ficam na sombra e pagam uma fortuna. Os pobres ficam lá torrando no sol, vendo o coitado do boi morrer espetado. Mais pão e circo do que isso, só o carnaval tupiniquim…

Deitamos sob os pinheiros de uma colina gramada atrás da Plaza, pra decidir o que fazer. Ainda estava relativamente cedo e resolvemos que dava tempo de dar um pulo no estádio do Real Madrid pra dar uma zoiada. O metrô já tava pago mesmo, não custava nada… Então lá fomos nós naquele calor dos infernos ver o diabo do estádio. A visita guiada custa acho que 9 paus, e como nenhum de nós é particularmente fã de futebol, acabamos só entrando na loja do time, que tem uma janela que dá pro interior do estádio. Aliás, a loja do Real Madrid, lotadíssima de gente comprando baboseiras caríssimas com Ronaldos mal desenhados ou esculpidos, é simplesmente o lugar mais chato do planeta. Saímos correndo pro hotel, e enquanto o Mirco tirava um ronco eu fui escrever cartões-postais.

Aí fiquei pensando sobre a minha primeira impressão sobre a cidade. Madri definitivamente NÃO é uma cidade fascinante. Mais suja do que as poucas outras que já vi aqui na Europa. E notei sobretudo a tristeza das vitrines: o vidro é sempre engordurado, tudo que era branco ficou encardido, os cartazes pendurados são escritos a mão ou feitos pelo filho do dono em fonte Comic com desenhos disformes e quase irreconhecíveis de omeletes, copos de cerveja, sanduíches de presunto. As revistas nas bancas de jornal, aquelas que ficam por trás dos painéis de vidro e que não são trocadas nunca, estão todas esmaecidas pelo sol africano. Assim como as garrafas de refrigerantes expostas nas vitrines. As lojas de roupas têm manequins horrendos, e as roupas parecem ter sido jogadas ali sem nenhum critério. Achei, como dizer, decadente pacas. Sabe aquelas lojas velhas, caindo aos pedaços, no centro do Rio? Estruturas não só antigas, mas velhas, mal conservadas, deprimentes? É assim. Claro que há alguns prédios lindos, lindos, e claro que as mulheres dão de mil a zero nas italianas, porque não usam quilos de maquiagem no rosto, não têm todas o mesmo corte e a mesma cor de cabelo, não usam salto quando não é pra usar salto, enfim, são NORMAIS. As pessoas são simpáticas e solícitas e falam um espanhol que eu entendo (odeio, mas entendo tu-di-nho, coisa que não acontecia na Argentina, por exemplo), mas, cacetes estrelados, COMO FUMAM! Fumam em tudo que é lugar e isso é uma das coisas mais irritantes da Europa. Acredito que um dia vão acordar pra vida, como já aconteceu na Irlanda, na Itália e em outros países que proibiram fumo em lugares públicos, mas até lá, putz, que porreeeeeeeeeeeee.

Tínhamos todos cismado com a paella. José, meu colega de trabalho de Barcelona, tinha me avisado que paella no jantar é que nem cappuccino depois do almoço, coisa de turista. Mas o Gianni e a Chiara são um porre pra comer e acham paella pesado demais pro almoço, então lá fomos nós pedir informações pro mocinho bonito da recepção: onde comer paella no jantar? Ele recomendou um lugar não muito longe do hotel, na Calle de la Reina, então encaramos a caminhada de 10 minutos e chegamos no tal restaurante. O nome La Paella de la Reina brilhava em neon verde sobre a porta de madeira sem charme. O menu colado na porta estava torto e amassado, mas praticamente tudo o que tinha ali a gente gostava, então resolvemos encarar. Não saiu barato, mas a paella estava ótima – só o Mirco não gostou. O vinho branco estava uma delícia e voltamos contentes pro hotel.


Madrid

Acordamos cedo, banho, café etc, e passamos na Arianna pra dar tchau pra cachorrada antes de pegar Gianni e Chiara em casa. Em vez de estacionar no estacionamento de longa permanência do Fiumicino, que custa os olhos da cara, deixamos o carro em um dos muitos estacionamentos que surgiram nos arredores do aeroporto. Eles levam você ao terminal com um furgãozinho ou minivan, mais fácil do que o shuttle do estacionamento “oficial”, que tem horário pra passar e para em todos os pontos, feito cata-jeca.

O vôo, com a Air Madrid, atrasou pra cacete. E depois de embarcar ainda nos deixaram mofando dentro do avião por quase uma hora antes de finalmente decolar (eu dormi e nem percebi, mas me contaram hehehe). Um pouco de turbulência depois, chegamos a Madrid. Compramos os passes semanais pro metrô (18 euros por pessoa, viagens ilimitadas, ótima pedida) e fomos pro hotel Vincci, perto da estação Sevilla. O hotel é legal: 4 estrelas, bem localizado, bem decorado, quarto moderno, chuveiro di-vi-no, camas confortáveis, TV a cabo, ar condicionado, enfim, o básico necessário.

Saímos pra procurar lugar pra comer. Seguimos a Calle Mayor até a Plaza Mayor, e continuamos andando até encontrar uma filial da Vaca Argentina, uma cadeia de restaurantes com, lógico, carne de primeira. Só queeeeeeee… Essa mania espanhola de jantar tardíssimo é um saco. Às oito e meia estávamos morrendo de fome, depois de só um sanduíche vagabundo no aeroporto de Roma, mas ainda estava tudo fechado. Batemos na janela do restaurante pra perguntar a que horas abria e responderam lá de dentro, às nove. Como estávamos todos desmaiando de fome, paramos num boteco pra dividir um bocadillo de jamón – o famoso sanduíche de presunto. O lugar era bem boteco mesmo, azulejos antigos, relógios parados nas paredes, duas máquinas caça-níqueis, balcão de inox todo amassado, guardanapos no chão, cara de sujo. Numa das mesas, duas senhoras distintas tomavam cerveja e comiam batatas chips. O sanduíche estava bom, embora o aspecto não fosse dos melhores, mas o lugar me deu uma certa depressão. Às nove e um estávamos plantados na porta do restaurante, que ainda estava abrindo a porta, hohoho : )

Fomos atendidos por um garçom indiano e comemos muito bem. O vinho estava bom, e o preço foi honesto. Na volta paramos na Plaza Mayor pra encontrar um amigo do Gianni que também estava viajando pela Espanha com a namorada. A praça é bonita mas nenhuma Brastemp. Muita gente sentada no chão comendo salada, sorvete, sanduíche; muito adolescente DEITADO no chão sujo, um cheiro de xixi humano no ar, fui ficando irritada e ainda bem que a conversa não durou muito. Voltamos pro hotel e ainda paramos num mercadinho chinês pra comprar água mineral e iogurte.

e vamos aos livrinhos desse ano…

  1. Coraline (Neil Gaiman)
  2. Un Filo di Fumo (Camilleri)
  3. Pecore Nere (Kuruvilla, Mubiayi, Scego, Wadia)
  4. Tutti Giù per Terra (Giuseppe Culicchia)
  5. La Guerra degli Antò (Silvia Ballestra)
  6. Of Mice and Men (John Steinbeck)
  7. Cathedral (Raymond Carver)
  8. The War of the Worlds (H. G. Wells)
  9. Swallowing Grandma (Kate Long)
  10. Tre Cavalli (Erri de Luca)
  11. The Ghost Writer (Philip Roth)
  12. Ask the Dust (John Fante)
  13. A Short History of Nearly Everything (Bill Bryson)
  14. Il Birraio di Preston (Camilleri)
  15. Equador (Miguel de Sousa Tavares)
  16. Life & Times of Michael K (Coetzee)
  17. Cose di Cosa Nostra (Falcone)
  18. Il Cammello e la Corda (D. Seminerio)
  19. La Concessione del Telefono (Camilleri)
  20. The Cement Garden (Ian McEwan)
  21. La Vampa d’Agosto (Camilleri)
  22. Orality and Literacy (W. Ong)
  23. Sidetracked (Mankell)
  24. The Fifth Woman (Mankell)
  25. One Step Behind (Mankell)
  26. Firewall (Mankell)
  27. A Farewell to Arms (Hemingway)
  28. Il Libro Nero del Cristianesimo (Jacopo Fo & outros)
  29. Post Mortem (Patricia Cornwell)
  30. David Copperfield (Dickens)

Confesso: roubei.

A casa onde funciona a escola ocupa um pedaço de terreno entre duas ruas, uma estreita, onde estacionamos quando todos os nossos carros não cabem no quintal da frente, e que é a entrada principal e o endereço oficial, e outra em um nível mais alto, ao longo do riacho Topino. Ali também tem outra entradinha, um portão pequeno pra pedestres. Ou seja, a rua de cima passa na altura do segundo andar da casa, onde fica a agência de tradução, e a rua de baixo passa na altura do andar térreo, onde fica a escola.

A casa à direita da escola fica mais próxima da rua, não é centro de terreno. Não tem comunicação com a rua do riacho, não tem saída por aquele lado. É uma casa bonita mas convencional, ocupada por uma família típica italiana, com três gerações morando juntas. E agora chegamos ao xis da questão: o quintal dos vizinhos. Eles têm uma área bem grande atrás da casa, e mantêm uma horta lindinha, toda fofinha, plantam uvas e têm um pomar delicioso. Devem ser umas dez ameixeiras, uns cinco pessegueiros e mais algumas macieiras aqui e ali. O problema é que eles não fazem porra nenhuma com essa fruta toda.

As ameixeiras estão ENTUPIIIIIDAS de frutas. Lindas, roxonas, praticamente pintadas a mão. Até eu, que não sou chegada em fruta, fico fascinada quando vejo as árvores. E me dá uma tristeza no coração quando olho pro chão do pomar e o vejo coberto de ameixas podres, restos roxos adocicando no chão, sem jamais ter alegrado um céu da boca.

 Eles não vendem nem dão, já perguntamos. E desde o ano passado, quando o pessoal da escola começou a catar as ameixas dos ramos que passavam por cima do muro e entravam no nosso terreno, eles podaram tudo, fica tudo dentro do terreno deles. Ontem tomei uma decisão: roubar é feio, mas, sinceramente, desperdiçar comida é o cúmulo da falta de educação. Então subi até o terraço de trás, na altura do rio, por cima do pomar. Estiquei o braço o mais que pude e colhi oito ameixas LINDAS dos ramos mais altos. Firmes, coloridas, promissoras. Deixei a sacolinha cheia no carro e corri pra cozinha pra experimentar uma. Achei que ainda não estaria madura porque realmente estava duríssima, mas, queridos… Isso é que é ameixa, caramba!!! A polpa ainda não é aquele amarelão, e o sabor ainda é meio azedinho, mas eu prefiro assim mesmo porque não gosto de doce. Durinha, uma beleza, até porque detesto me lambuzar – a falta de praticidade é um dos motivos pelos quais não sou chegada em frutas.

Mirco já detonou a metade. Roubei também uma maçã, por curiosidade, porque agora não é época mas se a ameixa é boa assim, a maçã também tem possibilidade de ser. Mas não consegui chegar até os pêssegos, imensos. Por meio palmo de distância eles não vão ser comidos por ninguém, e vão cair no chão, e por ali ficar. Tristeza.

 

diploma pra quê?

Tava pensando no que a Bia falou outro dia, de como essa paranóia do diploma universitário no Brasil é chata, de como é ridículo valorizar só quem foi à faculdade, como se quem não tivesse estudado fosse um retardado, de como deve ser chato, pra quem não gosta de estudar, ser forçado a fazê-lo por pressão da sociedade. Eu sou a primeira a dizer que sou vítima dessa paranóia. Mas porque sei que no Brasil isso é realmente um fator diferenciador – afinal de contas, a classe média faz questão de ir à faculdade, ainda que seja uma merda de faculdade particular qualquer, um “supermercado” de cursos, como diz meu pai. Quando conheci a FeRnanda, a primeira coisa que perguntei foi o que ela tinha estudado. Acho que a coisa não teria ido adiante se ela tivesse dito “tenho o 2o grau incompleto” ou coisa e tal, simplesmente porque isso significaria que não teríamos LA-DA em comum, zero assunto pra conversar.

Aqui na Bota a coisa muda de figura. O Mirco não fez faculdade, o que eu acho um desperdício porque ele poderia estar fazendo algo muito melhor agora se tivesse estudado, mas em família de gente ignorante o estudo não tem importância, e lá foi ele direto trabalhar depois da escola técnica. A maioria dos nossos amigos aqui não fez faculdade, e todos têm casa comprada, carros novos, viajam todo ano e freqüentam os mesmos lugares que nós (digo eu, formada) freqüentamos. Ou seja, na prática o diploma universitário aqui não faz diferença. Ninguém deixa de ser respeitado porque não é formado, e ninguém tem vergonha de dizer que é pedreiro, eletricista, motorista de ônibus. São empregos normais, trabalhos dignos, e, aliás, muito rentáveis – muito mais do que o meu, por exemplo ; )

Só queeeeeeeee… Dando aula a tantas pessoas diferentes, eu percebo logo de cara quem é formado e quem não é. Bastam 5 minutos e eu sou capaz de dizer se o aluno estudou ou não. Vejam bem, não é questão de burrice, porque faculdade nunca fez ninguém ficar mais inteligente – o que conheço de antas formadas não tá no gibi – mas de hábito de estudo e de raciocínio lógico, de capacidade de abstração. Meus alunos formados – engenheiros, médicos, arquitetos, psicólogos – fazem perguntas cabíveis, tomam notas, percebem coisas em inglês na rua e anotam pra me perguntar depois, lêem mais rápido, sabem exatamente o que a questão pede, fazem dever de casa, LEMBRAM das coisas. Meus alunos não formados, e isso vale pra TODOS, muitas vezes não perguntam nada (sinal de que não estão entendendo nada, vocês sabem), não anotam nada, escrevem devagar, precisam que eu repita vinte vezes a mesma coisa (não porque são burros, mas porque não estão acostumados a ter que entender o que diz o professor, e levam mais tempo), demoram muito pra ler, não fazem associações cruzadas (inclusive porque a maioria só trabalha e não lê, não vai ao cinema, não vê televisão, não usa internet, ou seja, não tem pontos de referência), depois de uma semana vêem um verbo que já vimos antes e se comportam como se nunca o tivessem visto antes, e, principalmente, demoram MUITO pra entender o que uma questão está pedindo. De conseqüência, respondem errado – não porque não sabem a resposta, mas porque não sabem o que devem responder. É dificílimo pra eles reproduzir uma história que acabaram de ler, por exemplo. Não conseguem botar os acontecimentos na ordem certa nem filtrar o que é importante e o que não merece ser contado. A capacidade de síntese é zero, a imaginação é menos vinte e perguntas hipotéticas são quase impossíveis de compreender. Têm grande dificuldade em seguir instruções, e não preciso dizer o quanto isso é crucial, pra qualquer área profissional. É impressionante a diferença que o hábito de estudar tem.

Então eu continuo achando que é importante, sim, ir à faculdade – ou, pelo menos, estudar um pouquinho. Por motivos diferentes, mas continuo achando. Porque mesmo que você tiver escolhido ser pedreiro porque não é chegado a estudar, vai ser um pedreiro melhor se tiver estudado um pouquinho a mais. Vai se comunicar melhor com o cliente, vai entender por que faz as coisas que faz e vai descobrir meios pra melhorar, vai trabalhar mais rápido porque a memória vai ajudar e o cérebro vai ficar mais veloz, vai reparar em outros modos de trabalhar quando viajar e observar as coisas com olhos de quem entende do riscado. Se eu só assento tijolos sem nunca me perguntar por que se faz desse jeito aqui onde eu moro, quando for a outro lugar não vou reparar no tijolo assentado de outro jeito, que pode ser mais eficiente do que o MEU jeito. Certo?

Mr Phoda

“Miss Mowcher!”

I looked at the doorway and saw nothing. I was still looking at the doorway, thinking that Miss Mowcher was a long while making her appearance, when, to my infinite astonishment, there came waddling round a sofa which stood between me and it, a pursy dwarf, of about forty or forty-five, with a very large head and face, a pair of roguish grey eyes, and such extremely little arms, that, to enable herself to lay a finger archly against her snub nose as she ogled Steerforth, she was oblighed to meet the finger half-way, and lay her nose against it. Her chin, which was what is called a double chin, was so fat that it entirely swallowed up the strings of her bonnet, bow and all. Throat she had none; waist she had none; legs she had none, worth mentioning; for though she was more than full-sized down to where her waist would have been, if she had had any, and though she terminated, as human beings generally do, in a pair of feet, she was so short that she stood at a common-sized chair as at a table, resting a bag she carried on the seat. This lady; dressed in an off-hand, easy style; bringing her nose and her forefinger together, with the difficulty I have described; standing with her head necessarily on one side, and, with one of her sharp eyes shut up, making an uncommonly knowing face; after ogling Steerforth for a few moments, broke into a torrent of words.

David Copperfield, Charles Dickens